JULHO, MÊS DA "SENHORA DO LUGAR"
Queridos irmãos carmelitas:
Iniciamos o mês de julho que, para nós, é o mês mariano por excelência.
Preparando-nos para as solenidades maiores da nossa Ordem: no dia 16 (Nossa Senhora do Carmo) e no dia 20 (Nosso Pai Santo Elias). Por isso, iniciamos, hoje, uma série de meditações sobre o valor e o significado de Nossa Senhora e do Profeta Elias, para cada um de nós.
I - MARIA E
O CARMELO
Emanuele
Boaga, O. Carm.
1. O Monte Carmelo, situado nos confins entre a
Samaria e a Galiléia, é considerado no mundo bíblico como um símbolo da graça,
da bênção e da beleza por causa de sua rica vegetação (cf. Is 35, 2; Jr 50,19).
Nele pode-se ver também o lugar de renovação da aliança e das intervenções
divinas por meio do Profeta Elias (1Reis 18, 20-46). Encontramos neste monte
rica memória de numerosos gestos e sinais lembrando estes acontecimentos.
2. A presença de um grupo de eremitas latinos neste
monte, por volta das Cruzadas, entre os anos de 1192 e 1209, comprovada
historicamente, torna-o também, um “lugar de Maria”. Um livro-guia para os
peregrinos da Terra Santa, escrito por volta de 1220, testemunha esta verdade:
“O flanco do Monte Carmelo é um lugar muito belo e delicioso onde habitam, os
eremitas latinos chamados de Freis Carmelitas. Existe lá uma pequena igreja
dedicada a Nossa Senhora”.
3. A razão para dedicar sua primeira Igreja a
Maria, Nossa Senhora, significava, na concepção feudal reinante naquele tempo,
não somente o fato de se colocarem a serviço da Igreja, mas também de estarem
completamente à disposição da Senhora, numa consagração pessoal, confirmada com
um juramento. Os primeiros carmelitas escolheram, então, Nossa Senhora como
Patrona. O próprio nome assumido pelo grupo - Irmãos da Bem-aventurada Virgem
Maria do Monte Carmelo - atesta esta verdade.
II - O
CARMELO É TODO DE MARIA
4. Este é um título mariano que não se limita
apenas a indicar a proteção de Nossa Senhora sobre a Ordem dos Carmelitas, e a
dedicação desta à Virgem, Mãe e Patrona, mas quer exprimir também a semelhança
evangélica existente entre a vida de Maria e a dos Carmelitas, com base na
escolha da virgindade. Assim se exprimiam os autores carmelitanos do século
XIII em diante, referindo-se a Nossa Senhora também como Irmã.
5. Desta forma, Maria está presente como Patrona e
Irmã, no itinerário interior do Carmelita, que pode afirmar seguramente O Carmelo
é todo mariano. Nela, cada membro da Ordem encontra o modelo de escuta filial
do Pai por meio de Cristo, no Espírito Santo. Aprende a viver a dimensão
contemplativa que devem desenvolver como sentido da própria vida: encontrar
Deus presente na realidade, renovando continuamente a aliança com Ele e vivendo
à sua luz, em um caminho de fraternidade e de solidariedade para com todos os
seres humanos.
Conformidade e imitação
6. No Carmelo, a vida mariana não é manifestada
apenas com a prática de exercícios particulares de piedade, que também estão
presentes em sua história. Ao invés, expressa-se num modo constante de viver e
de pensar, assumindo uma orientação que abraça o ser integralmente, de forma
que tudo no indivíduo e na comunidade pertença a Maria.
7. No início do século XIV João Baconthorp, o mais
notável dos teólogos carmelitas de sua época, referindo-se às relações de Nossa
Senhora com a Ordem usa a expressão do Profeta Isaias Data est ei... decor
Carmeli, afirmando foi dada a Maria toda a beleza do Carmelo (Is 35, 2).
8. Então, tudo o que faz o Carmelita deve fazê-lo
em honra e glória de Maria, porque - afirma Baconthorp - segundo a Vontade
divina, esta é a razão da existência da Ordem. Maria é realmente a Domina Loci,
ou seja, a Senhora do Lugar, a verdadeira “dona” do Carmelo. Assim, o Carmelita
deve viver de forma autêntica na imitação das virtudes contempladas em Maria,
pois a conformidade com ela, neste caso, é a melhor forma de glorificar e de
manifestar amor crescente à Senhora.
9. Encontramos na expressão Domina Loci, utilizada
por Baconthorp, algo tipicamente medieval: o termo Domina. Dante diria Donna,
ou seja a mãe da família e não a rainha. É a Senhora que mesmo sendo gloriosa
não recusa nem negligencia seu papel de Mãe. Desta maneira, Maria Virgem assume
o cuidado e a proteção pela vida dos Carmelitas, e de outro lado, como
destacava Baconthorp, estes com seus gestos honravam a Senhora do Lugar.
10. A idéia da exemplaridade, ainda que não sendo
nova na Ordem, visto provém da consideração geral do culto mariano próprio do
tempo, é expressa com enorme e significativa força por Baconthorp. Para ele, a
prática da vida carmelitana consiste numa imitação de toda a vida de Maria. Com
o objetivo de reforçar esta idéia, escreveu um comentário à Regra do Carmo. Ao
ler as suas argumentações poderíamos ser tentados a rir, tomando-as por
ingênuas. Entretanto, naquele momento, importava mais a tese que a sua defesa.
11. Tal tese se tornou muito estimada no Carmelo:
assim como o Carmelita deve imitar Elias, deve também imitar Maria. Isto é
recordado numa famosa obra De institutione primorum monachorum, escrita em
torno do ano 1370. A relação existente entre o binômio Elias-Maria torna-se
fecunda e vital. É esta também uma forma de voltar à tradição da Ordem que
atribui ao santo prior geral Brocardo um célebre testamento: Filhos (...)
continuai, por conseguinte, constantes no bem, abominai as riquezas, desprezai
o mundo e levai uma vida reta, modelada em Maria e Elias.
12. A idéia da conformidade ou da imitação exerceu
grande influxo e tornou-se idéia central que encontramos em muitos escritos
sucessivos e, com nuances próprias em cada época, chegou até nós. Com Maria nos
caminhos de Deus
13. A este tema da conformidade-imitação de Mãe
Patrona, logo se une o da íntima familiaridade com Maria como irmã, que vem
retomado e ampliado sobretudo pelos autores belgas, alimentando um sentido de
familiaridade com Nossa Senhora e estimulando a sua imitação na disponibilidade
e docilidade para com a Palavra do Senhor. Também, a familiaridade de vida com
Maria ressoa no título usado na Ordem, onde encontramos a expressão Virgo
Purissima (Virgem Puríssima ou Virgem das Virgens), com o qual os autores
carmelitas medievais indicam o modelo do próprio ideal contemplativo.
14. Já no século XIV, depois das referências a
Maria Patrona, Mãe de Deus e Mãe do Carmelo, encontramos escritores que
destacam, sobretudo a virgindade de Maria. Em João Maria e o Carmelo de
Chimineto podemos recordar as ligações que ocorrem entre a virgindade de Maria
Santíssima, a capa branca e o título dos carmelitas.
15. Pouco depois, Felipe Ribot, recordado em De
Institutione, afirma que o Carmelo significa aquele que conhece a virgindade.
Para sustentar esta tese, ele se reporta à interpretação já difundida no século
V entre os Santos Padres, segundo a qual a visão da pequena nuvem, portadora de
abundante e fecunda chuva, teria revelado ao Profeta Elias a fecunda virgindade
de Maria. Assim, Elias, o primeiro homem virgem, quer fundar uma Ordem de
virgens para honrar a Maria, a primeira mulher virgem. E esta analogia entre a
virgindade no Carmelo e a virgindade de Maria o faz exclamar: Por força desta
conformidade os religiosos carmelitas chamavam a Virgem de sua Irmã... e pelo
mesmo motivo chamavam-se Irmãos da Bem-aventurada Virgem Maria. Encontramos
pensamentos semelhantes nos escritores dos séculos XIV-XV, revelando-nos quanto
o olhar daquelas gerações de carmelitas estava voltado sobretudo para a Virgem
Maria, em seus mistérios da virgindade e da imaculada conceição. A ternura para
com a celeste Patrona, a Mãe e a Irmã, nutria uma profunda e rica vida mariana.
16. A capa branca vem bem cedo considerada pelos
autores carmelitanos como símbolo da Virgem Maria: no caso, pureza significa
não somente uma mera ausência de pecado e menos ainda, não é simplesmente
sinônimo de castidade, mas indica uma orientação total da própria existência
doada completamente a Deus, sem nada reter para si, mas oferecendo a Deus um
coração puro. Mais tarde, S. Maria Madalena de Pazzi (†1607) verá na pureza de
Maria a beleza da Virgem que atrai Deus a si, e faz desta pureza uma mensagem
para o homem, uma vez que a mesma indica disponibilidade a Deus, fecundidade,
testemunho e profecia.
17. O argumento da Virgem puríssima surge ligado à
característica carmelitana da vida interior passada na intimidade divina. A
devoção mariana conduz a Ordem a considerar que a vida interior em íntima
comunhão com Deus se adquire imitando a vida de Maria em sua intimidade com
Jesus. O Carmelita vê pois, em Maria, realizado de modo maravilhoso e
incomparável, o próprio ideal contemplativo. É comum entre os autores dos
séculos XVI e XVII afirmar que a virgindade cria uma excelente disposição para
a vida interior e contemplativa. É como Virgem puríssima, portanto, que Nossa
Senhora realiza o ideal da vida de intimidade divina.
18. Consequentemente, o Carmelo considera Maria
como a sua flor mais bela, como o seu supremo esplendor. Sem dúvida alguma, sob
esta influência surgem as ternas e bonitas lendas medievais que narram fatos
interessantes: a visita da Virgem durante sua vida, aos eremitas do Monte
Carmelo e que afirmam, Maria teria vivido um certo tempo também como Carmelita.
19. Nestas piedosas lendas vamos encontrar um valor
de referência real. Elas nos revelam, em linguagem simbólica, a mediação de uma
consciência da familiaridade com Maria e, sobretudo, a convicção de que
encontramos na simples expressão das primeiras palavras de uma antiga antífona
(séc. XV-XVI) “Flos Carmeli”, Maria é a flor do Carmelo; e pouco mais tarde,
exprime-se também esta consciência, com a bíblica expressão “Decor Carmeli”,
Maria é o decoro do Carmelo.
20. Ao considerar Maria como a Virgem puríssima, os
escritores mais antigos da Ordem, como Baconthorp, pensam antes de tudo em suas
relações maternais com Jesus e também sublinham a sua virgindade perpétua.
Depois de haver contemplado na Virgem a sua maternidade, examinando as ligações
existentes entre ela, a Mãe de Jesus, e as criaturas remidas pelo Filho se
descobre na Virgem toda pura a sua potente intercessão junto ao trono de Deus e
também a própria Mãe espiritual e a própria Irmã. Assim a invocação à Virgem
passa a ser “Mãe e decoro Carmelo”, Maria é a Mãe e o esplendor do Carmelo.
LEIA, ABAIXO, A MEDITAÇÃO PARA A SOENIDADE DOS SANTOS APÓSTOLOS PEDRO E PAULO.