Sto.
Antonio Maria Zaccaria, presbítero
1ª
Leitura (Gen 21,5.8-20): Abraão tinha cem anos quando lhe nasceu seu
filho Isaac. O menino cresceu e foi desmamado. No dia em que Isaac foi
desmamado, Abraão deu uma grande festa. Sara notou que o filho dado a Abraão
pela egípcia Agar brincava com o seu filho Isaac e disse a Abraão: «Expulsa
esta escrava e o seu filho, para que o filho da escrava não seja herdeiro com
meu filho Isaac». Isto desagradou muito a Abraão, por causa de Ismael. Mas Deus
disse: «Não te aflijas por causa do menino e da tua escrava. Concede a Sara
tudo o que ela te pedir, porque de Isaac sairá a descendência que perpetuará o
teu nome. Mas do filho da escrava também farei um grande povo, porque é teu
descendente». Abraão levantou-se muito cedo, tomou pão e um odre de água e
deu-os a Agar. Em seguida pôs-lhe o menino aos ombros e mandou-a embora. Ela
saiu e andou errante no deserto de Bersabé. Quando a água do odre se acabou,
Agar deitou o menino debaixo dum arbusto e foi sentar-se em frente dele, à
distância de um tiro de arco. Dizia consigo: «Não quero ver morrer o menino».
Sentou-se a uma certa distância e o menino começou a chorar. Deus ouviu os
gritos do menino e o Anjo de Deus chamou Agar do alto dos Céus, dizendo: «Que
tens, Agar? Não temas. Deus ouviu os gritos do menino, no lugar onde Ele está.
Ergue-te, levanta o menino e segura-o em teus braços, porque Eu farei dele um
grande povo». Deus abriu-lhe os olhos e ela viu um poço de água. Foi encher de
água o odre e deu de beber ao menino. Deus estava com o menino e ele cresceu,
habitou no deserto e tornou-se um atirador de arco.
Salmo
Responsorial: 33
R. O Senhor ouviu o clamor do
pobre.
O pobre clamou e o Senhor o
ouviu, salvou-o de todas as angústias. O Anjo do Senhor protege os que O temem
e defende-os dos perigos.
Temei o Senhor, vós os seus
fiéis, porque nada falta aos que O temem. Os poderosos empobrecem e passam
fome, aos que procuram o Senhor não faltará riqueza alguma.
Vinde, filhos, escutai-me: vou
ensinar-vos o temor do Senhor. Qual é o homem que ama a vida, que deseja longos
dias de felicidade?
Aleluia. Deus Pai nos gerou
pela palavra da verdade, para sermos as primícias das suas criaturas. Aleluia.
Evangelho
(Mt 8,28-34): Quando Jesus chegou à outra margem do lago, à região dos
gadarenos, vieram ao seu encontro dois possessos, saindo dos túmulos. Eram tão
violentos que ninguém podia passar por aquele caminho. Eles então gritaram:
«Que queres de nós, Filho de Deus? Vieste aqui para nos atormentar antes do
tempo?». Ora, acerta distância deles estava pastando uma manada de muitos
porcos. Os demônios suplicavam-lhe: «Se nos expulsas, manda-nos à manada de
porcos». Ele disse: «Ide». Os demônios saíram, e foram para os porcos. E todos
os porcos se precipitaram, pelo despenhadeiro, para dentro do mar, morrendo nas
águas. Os que cuidavam dos porcos fugiram e foram à cidade contar tudo, também
o que houve com os possessos. A cidade inteira saiu ao encontro de Jesus. E
logo que o viram, pediram-lhe que fosse embora da região.
«Pediram-lhe que fosse embora
da região»
Rev. D. Antoni CAROL i Hostench (Sant
Cugat del Vallès, Barcelona, Espanha)
Hoje, no Evangelho, contemplamos
um triste contraste. “Contraste” porque admiramos o poder e a majestade divina
de Jesus Cristo, a quem voluntariamente se submetem os demônios (sinal claro da
chegada do Reino dos Céus). Mas, ao mesmo tempo, deploramos a estreiteza e a
mesquinhez de que é capaz o coração humano que repudia o portador da Boa Nova:
«A cidade inteira saiu ao encontro de Jesus. E logo que o viram, pediram-lhe
que fosse embora da região» (Mt 8,34). E “triste” porque «a luz verdadeira, que
vindo ao mundo (...), mas o mundo não a reconheceu» (Jo 1, 9.11).
Mais contraste e mais surpresa
ainda se reparamos no fato de que o homem é livre e esta liberdade tem a
“capacidade de reter” o poder infinito de Deus. Digamos isto de outra maneira:
a infinita Potestade divina chega até onde o permite nossa “poderosa”
liberdade. E isto é assim porque Deus nos ama principalmente com um amor de
Pai, e, portanto, não nos há de surpreender que ele respeite muito nossa
liberdade: Ele não impõe seu amor: apenas o propõe para nós.
Deus, com sabedoria e bondade infinitas,
governa providencialmente o universo, respeitando nossa liberdade; e também faz
isto quando essa liberdade humana lhe dá as costas e não quer aceitar sua
vontade. Ao contrário do que possa parecer, não se lhe escapa o mundo das mãos:
Deus leva tudo a bom termo, apesar dos impedimentos que Lhe possamos opor. Na
verdade, nossos impedimentos são antes de tudo, impedimentos para nós mesmos.
Podemos afirmar então, que
«frente a liberdade humana, Deus quis se fazer “impotente”. E pode-se mesmo
dizer que Deus está pagando por este grande dom [a liberdade] que nos concedeu
como seres criados por Ele à sua imagem e semelhança [o homem]» (João Paulo
II). Deus obedece! sim, se o expulsamos, Ele obedece e se vai. Ele obedece, mas
nós perdemos. Ao contrário, saímos ganhando quando respondemos como Santa
Maria: «Eis aqui a serva do Senhor! Faça-se em mim segundo a tua palavra» (Lc
1,38).
Reflexões de Frei Carlos
Mesters, O.Carm.
* O evangelho de hoje acentua o poder de Jesus
sobre o demônio. No nosso texto, o demônio ou o poder do mal é associado com
três coisas: 1) Com o cemitério, o
lugar dos mortos. A morte que mata a vida! 2)
Com o porco, que era considerado um animal impuro. A impureza que separa de
Deus! 3) Com o mar, que era visto como símbolo do caos de
antes da criação. O caos que destrói a natureza. O evangelho de Marcos, de onde
Mateus tirou a sua informação, ainda associa o poder do mal a um quarto
elemento que é a palavra Legião, (Mc 5,9), nome dos exércitos do império
romano. O império que oprimia e explorava os povos. Assim se compreende como a
vitória de Jesus sobre o demônio tinha um alcance enorme para a vida das
comunidades dos anos setenta, época em que Mateus escreve o seu evangelho. Elas
viviam oprimidas e marginalizadas, pela ideologia oficial tanto do império
romano como do farisaísmo que se renovava. O mesmo significado e alcance
continua válido para nós hoje.
* Mateus 8,28: O poder do mal oprime, maltrata
e aliena as pessoas. Este versículo inicial descreve a situação do povo
antes da chegada de Jesus. Na maneira de descrever o comportamento dos dois
endemoninhados, o evangelista associa o poder do mal com cemitério e morte. É
um poder mortal sem rumo, ameaçador, descontrolado e destruidor, que mete medo
em todos. Priva a pessoa da consciência, do autocontrole e da autonomia.
* Mateus 8,29: Diante da simples presença de
Jesus o poder do mal se desmorona e se desintegra. Aqui se descreve o
primeiro contato entre Jesus e os dois possessos. É a desproporção total. O
poder, que antes parecia tão forte, se derrete e se desmancha diante de Jesus.
Eles gritam: "Que é que há entre nós, Filho de Deus? Vieste aqui para nos
atormentar antes do tempo?" Sentem que perderam o poder.
* Mateus 8,30-32: O poder do mal é impuro e não
tem autonomia nem consistência O demônio não tem poder sobre os seus
próprios movimentos. Só consegue ir para dentro dos porcos com a permissão de
Jesus! Uma vez dentro dos porcos, estes se precipitam no mar. Na opinião do
povo, o porco era símbolo da impureza que impedia o ser humano de relacionar-se
com Deus e sentir-se acolhido por Ele. O mar era símbolo do caos que existia
antes da criação e que, conforme a crença da época, continuava ameaçando a
vida. Este episódio dos porcos que se precipitam no mar é estranho e difícil de
ser entendido. Mas a mensagem é muito clara: diante de Jesus, o poder do mal
não tem autonomia nem consistência. Quem crê em Jesus já venceu o poder do mal
e já não precisa ter medo!
* Mateus 8,33-34: A reação do
povo do lugar. Alertado pelos empregados que tomavam conta dos porcos, o
povo do lugar veio ao encontro de Jesus. Marcos informa que eles viram “o
endemoninhado sentado, vestido e em perfeito juízo” (Mc 5,15). Mas eles ficaram
sem os porcos! Por isso, pedem a Jesus para ir embora. Para eles, os porcos
eram mais importantes que o ser humano que acabava de ser devolvido a si mesmo.
* A expulsão dos demônios.
No tempo de Jesus, as palavras demônio ou satanás, eram usadas para indicar o
poder do mal que desviava as pessoas do bom caminho. Por exemplo, quando Pedro
tentou desviar Jesus, ele foi Satanás para Jesus (Mc 8,33). Outras vezes,
aquelas mesmas palavras eram usadas para indicar o poder político do império
romano que oprimia e explorava o povo. Por exemplo, no Apocalipse, o império
romano é identificado com “Diabo ou Satanás” (Ap 12,9). Outras vezes ainda, o
povo usava as mesmas palavras para indicar os males e as doenças. Assim se
falava em demônio ou espírito mudo, espírito surdo, espírito impuro, etc. Havia
muito medo! No tempo de Mateus, segunda metade do primeiro século, o medo dos
demônios estava aumentando. Algumas religiões, vindas do Oriente, divulgavam um
culto aos espíritos. Elas ensinavam que gestos errados nossos podiam irritar os
espíritos, e estes, para se vingar de nós, podiam impedir nosso acesso a Deus e
privar-nos dos benefícios divinos. Por isso, através de ritos e despachos,
rezas fortes e cerimônias complicadas, o povo procurava acalmar esses espíritos
ou demônios, a fim de que não prejudicassem a vida humana. Estas religiões, em
vez de libertar o povo, alimentavam nele o medo e a angústia. Ora, um dos
objetivos da Boa Nova de Jesus era ajudar o povo a se libertar deste medo. A
chegada do Reino de Deus significou a chegada de um poder mais forte. Jesus é
“o homem mais forte” que chegou para amarrar o Satanás, o poder do mal, e
roubar dele a humanidade prisioneira do medo (cf. Mc 3,27). Por isso, os
evangelhos insistem tanto na vitória de Jesus sobre o poder do mal, sobre o
demônio, sobre o Satanás, sobre o pecado e sobre a morte. Era para animar as
comunidades a vencer este medo do demônio! E hoje, quem de nós pode dizer: “Eu
sou totalmente livre”? Ninguém! Então, se não sou totalmente livre, alguma
parte em mim é possuída por outros poderes. Como expulsar estes poderes? A
mensagem do evangelho de hoje continua válido para nós.
Para um confronto pessoal
1. O que está oprimindo e
maltratando o povo, hoje? Por que, hoje,
em certos lugares, se fala tanto em expulsão de demônio? Será que é bom
insistir tanto no demônio? O que você acha?
2. Quem de nós pode dizer
que é totalmente livre ou liberto? Ninguém! Então, somos todos um pouco
possessos, possuídos por outros poderes que ocupam algum espaço dentro de nós.
Como fazer para expulsar este poder de dentro nós e de dentro da sociedade?
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