sexta-feira, 2 de fevereiro de 2024

V Domingo do Tempo Comum

 S. João de Brito, presbítero da Companhia de Jesus e mártir
Sta. Joana de Valois, rainha da França e fundadora a Ordem das Anunciadas
 
1ª Leitura (Jó 7,1-4.6-7):
Job tomou a palavra, dizendo: «Não vive o homem sobre a terra como um soldado? Não são os seus dias como os de um mercenário? Como o escravo que suspira pela sombra e o trabalhador que espera pelo seu salário, assim eu recebi em herança meses de desilusão e couberam-me em sorte noites de amargura. Se me deito, digo: ‘Quando é que me levanto?’. Se me levanto: ‘Quando chegará a noite?’; e agito-me angustiado até ao crepúsculo. Os meus dias passam mais velozes que uma lançadeira de tear e desvanecem-se sem esperança. – Recordai-Vos que a minha vida não passa de um sopro e que os meus olhos nunca mais verão a felicidade».
 
Salmo Responsorial: 146
R. Louvai o Senhor, que salva os corações atribulados.
 
Louvai o Senhor, porque é bom cantar, é agradável e justo celebrar o seu louvor. O Senhor edificou Jerusalém, congregou os dispersos de Israel.
 
Sarou os corações dilacerados e ligou as suas feridas. Fixou o número das estrelas e deu a cada uma o seu nome.
 
Grande é o nosso Deus e todo-poderoso, é sem limites a sua sabedoria. O Senhor conforta os humildes e abate os ímpios até ao chão.
 
2ª Leitura (1Cor 9,16-19.22-23): Irmãos: Anunciar o Evangelho não é para mim um título de glória, é uma obrigação que me foi imposta. Ai de mim se não anunciar o Evangelho! Se o fizesse por minha iniciativa, teria direito a recompensa. Mas, como não o faço por minha iniciativa, desempenho apenas um cargo que me está confiado. Em que consiste, então, a minha recompensa? Em anunciar gratuitamente o Evangelho, sem fazer valer os direitos que o Evangelho me confere. Livre como sou em relação a todos, de todos me fiz escravo, para ganhar o maior número possível. Com os fracos tornei-me fraco, a fim de ganhar os fracos. Fiz-me tudo para todos, a fim de ganhar alguns a todo o custo. E tudo faço por causa do Evangelho, para me tornar participante dos seus bens.
 
Aleluia. Cristo suportou as nossas enfermidades e tomou sobre Si as nossas dores. Aleluia.
 
Evangelho (Mc 1,29-39): Logo que saíram da sinagoga, foram com Tiago e João para a casa de Simão e André. A sogra de Simão estava de cama, com febre, e logo falaram dela a Jesus. Ele aproximou-se e, tomando-a pela mão, levantou-a; a febre a deixou, e ela se pôs a servi-los. Ao anoitecer, depois do pôr do sol, levavam a Jesus todos os doentes e os que tinham demônios. A cidade inteira se ajuntou à porta da casa. Ele curou muitos que sofriam de diversas enfermidades; expulsou também muitos demônios, e não lhes permitia falar, porque sabiam quem ele era. De madrugada, quando ainda estava bem escuro, Jesus se levantou e saiu rumo a um lugar deserto. Lá, ele orava. Simão e os que estavam com ele se puseram a procurá-lo. E quando o encontraram, disseram-lhe: «Todos te procuram». Jesus respondeu: «Vamos a outros lugares, nas aldeias da redondeza, a fim de que, lá também, eu proclame a Boa Nova. Pois foi para isso que eu saí». E foi proclamando nas sinagogas por toda a Galileia, e expulsava os demônios.
 
«Todos te procuram»
 
Rev. D. Francesc CATARINEU i Vilageliu (Sabadell, Barcelona, Espanha)
 
Hoje contemplamos a Jesus em Cafarnaum, centro do seu ministério, e concretamente em casa de Simão Pedro: «Logo que saíram da sinagoga, foram (...) para a casa de Simão i André» (Mc 1,29). Lá encontra a sua família, a de aqueles que escutam a Palavra e a cumprem (cf. Lc 8,21). A sogra de Pedro está doente em cama e Ele, com um gesto que ultrapassa a anedota, lhe dá a mão, levanta-a da sua prostração e a devolve ao serviço.
 
Aproxima-se aos pobres-doentes que lhe levam e os cura apenas alargando a mão; somente com um breve contacto com Ele, que é fonte de vida, são salvados – liberados.
 
Todos procuram a Cristo, alguns de uma maneira expressa e esforçada, outros não são conscientes disso, já que «nosso coração está inquieto e não encontra descanso até que descansa Nele» (São Agostinho).
 
Mas, assim como nós o procuramos porque necessitamos que nos livre do mal e do Maligno, Ele se nos acerca para fazer possível aquilo que nunca poderíamos conseguir sozinhos. Ele fez-nos frágeis para ganhar-nos a nós, «fez-se todo para todos para ganhar ao menos alguns» (1Cor 9,22).
 
Há uma mão aberta que nos espera quando nos sentimos cansados por tantos males; temos bastante com abrir a nossa e nos encontraremos de pé e renovados para o serviço. Podemos “abrir” a mão mediante a oração, tomando o exemplo do Senhor: «De madrugada, quando ainda estava bem escuro, Jesus se levantou e saiu rumo a um lugar deserto. Lá ele orava» (Mc 1,35).
 
Além disso, a Eucaristia de cada domingo é o encontro com o Senhor que vem a levantar-nos do pecado da rotina e do desânimo para fazer de nós testemunhos vivos de um encontro que nos renova constantemente e que nos faz livres de verdade com Jesus Cri
 
Pensamentos para o Evangelho de hoje
«O nosso coração está inquieto e não encontrará descanso até que n'Ele repouse» (Santo Agostinho)
 
«O cristianismo começa com a encarnação do Verbo. Aqui não é apenas o homem que procura Deus, mas é Deus que vem, em Pessoa, falar de Si, ao homem. Deus procura o homem movido pelo seu coração de Pai» (S. João Paulo II)
 
«De muitos modos, na sua história e até hoje, os homens exprimiram a sua busca de Deus em crenças e comportamentos religiosos (orações, sacrifícios, cultos, meditações, etc.). Apesar das ambiguidades de que podem enfermar, estas formas de expressão são tão universais que bem podemos chamar ao homem um ser religioso» (Catecismo da Igreja Católica, nº 28)
 
A febre deixou-a e ela servia-os.
 
Fr. Pedro Bravo, ocarm
 
* A passagem de hoje vem no seguimento da perícope anterior, lida no domingo passado.
Decorre ainda em Cafarnaum e embora a chamem uma jornada típica de Jesus, de facto nela Marcos contrapõe dois dias: o sábado judaico e o domingo cristão. Apresenta-os em três quadros distintos, mas complementares, como uma sequência típica da ação evangelizadora de Jesus, apresentada como modelo para a Igreja.
 
* v. 29. O primeiro quadro (vv. 29-31: Mt 8,14s; Lc 4,38s) decorre no sábado judaico, após a liturgia sinagogal em que Jesus participara (v. 21). Simão e André (v. 16) não tinham ido, Jesus estranhou e vai a “casa” deles para saber o que se passara, pois o motivo devia ser grave. Leva consigo os outros dois discípulos, Tiago e João (v. 19), pois é no seio da comunidade fraterna que Jesus se torna presente e manifesta (cf. Mt 18,20).
 
* v. 30. Os primeiros mostram-lhe a razão da sua ausência: a sogra de Simão está “deitada” (2,4) na cama com tal febre (At 28,8) que temem o pior (v. 31; cf. Jo 4,47.49). Mas Jesus intervém, dando três passos.
 
* v. 31. 1) “Aproximando-se”. O verbo está no particípio aoristo (repetitivo), indicando que Jesus se aproxima sempre de quem sofre e lhe é apresentado na oração. 2) “Tomando-a pela mão” (5,41; 9,27; cf. Gn 19,16), ou seja, tocando a sua existência, amparando-a e assumindo, como Senhor, a direção da sua vida (Sl 73,24s; Is 42,6). 3) “Ergueu-a” (gr. egueirô): o verbo é o termo técnico da ressurreição (6,14.16; 9,27; 12,26; 14,28; 16,6), indicando que ela estava às portas da morte (5,41). Jesus cura-a e ela inicia uma vida nova. Como?
 
* “Servia-os” (pl.): ela serve não apenas Jesus, mas também os apóstolos (gr. diakonéô: v. 13; 15,41; Lc 8,3; At 6,2; Hb 6,10). Ao sábado não se cozinhava, servindo-se as três refeições do dia (a da véspera, a do meio-dia e a da noite), preparadas antes e mantidas quentes. Esta é “a refeição” sabática por excelência, a refeição festiva do meio-dia, que se segue ao culto (cf. Ne 8,10). O verbo “servir” está no imperfeito, indicando uma ação continuada: a vida nova que a sogra de Simão recebeu de Jesus, dá novo rumo à sua existência, que agora é posta ao serviço do Senhor e dos irmãos, em especial, dos seus enviados.
 
* v. 32. O segundo quadro (vv. 32-34: Mt 8,16; Lc 4,40s) decorre no primeiro dia da semana (o “Dia do Senhor”, o domingo cristão: 16,2; Ap 1,10; cf. At 20,7; 1Cor 16,2). Este começa uma hora após o pôr-do-sol, quando se veem brilhar no céu os três primeiros astros (Vénus e duas estrelas). Nessa ocasião todos se devem trajar bem e mostrar um ar festivo, agradecendo o sábado, celebrando a criação e aguardando a nova criação. É neste contexto que Jesus age, mostrando que é Ele que dá o verdadeiro repouso e anunciando com os “sinais” (16,17) que realiza (as curas e as libertações), a nova criação.
 
* A fama de Jesus espalhara-se (v. 28) e as pessoas vão ao seu encontro, trazendo-lhe “todos os que tinham males e os endemoninhados”.
Como o judaísmo proibia ao sábado andar mais de 2.000 côvados (880 m: Er 4,5; cf. Js 3,4; Nm 35,5; At 1,12) e curar doentes (a não ser os que estavam em perigo de vida: Mt 12,10p; Lc 13,14; Er 4,3; Yom 8,6), esperam que o sábado passe e comece o primeiro dia da semana para irem ter com Jesus.
 
* Trazem-lhe “todos os que tinham males”, ou seja, todo o tipo de doenças corporais, “e os endemoninhados”, pessoas com doenças psiquiátricas ou do foro psíquico ou espiritual. Como estes doentes não raro não têm controle sobre si mesmos, os antigos atribuíam-nas a forças sobrenaturais, invisíveis, os “demónios”, que se apossavam deles, controlando-os. Os demónios não são o diabo (gr. “o que divide”; he. Satanás, “o adversário”), que existe, mas seres míticos, que agiam, como se cria, tal como as doenças, sob o comando de Satanás (At 10,38). Só Deus tinha poder sobre eles. Os doentes e os possessos eram as pessoas mais marginalizadas em Israel: tidas por impuras, julgava-se que Deus as rejeitara, sendo, por isso, postas de lado e sendo não raro obrigadas a viver à mercê da caridade pública.
 
* v. 33. Manifesta-se então a força do domingo cristão. Toda a cidade se reúne “à porta” (da casa de Pedro: v. 29; 2,1s). Em Marcos, a “casa” (gr. oikós) é cifra da Igreja. O ficarem as pessoas “à porta” simboliza a evangelização cristã (2,2; cf. Jo 10,9; At 14,27; 28,30; 1Co 16,9; Cl 4,3).
 
* v. 34. Marcos introduz um novo sumário da ação de Jesus. O Reino de Deus anunciado por Ele (v. 15), destina-se a todas as pessoas e abarca o homem todo, todos os aspetos e dimensões da sua vida (física, psíquica, pessoal, familiar e comunitária). Por isso, o Evangelho não se reduz a uma doutrina, nem se limita ao culto, mas manifesta-se em obras de salvação (cf. 3,15; 6,7; 16,20; Mt 11,4s; 1Ts 1,5; Hb 2,4). O judaísmo esperava que no tempo do Messias todas as doenças fossem curadas (Is 35,5s; Jub 23,28-30; Hen 25,5-7; 96,3: Str-B 1,593-596) e o homem fosse libertado do poder de Satanás (cf. v. 24; Hen 55,4; Test Levi 18; Test Sebul 9; At 26,18). É o que Jesus faz: cura “muitos” doentes (3,10) e expulsa “muitos demónios” (6,13). “Muitos”, mas não “todos” (Mt 8,16; 12,15), porque a fé deles ainda era pequena (cf. 2,5; 6,5; 11,22s). “Não deixava que os demónios falassem, porque sabiam quem Ele era”: é um inciso do “segredo messiânico” (v. 24s.44; 3,12p). Jesus não quer que saibam que Ele é o Messias, para não ser confundido com a figura política do messias temporal e guerreiro que todos aguardavam.
 
* v. 35. Num terceiro quadro (vv. 35-39: Lc 4,42s; Mt 4,23), Marcos mostra-nos Jesus retirado num “lugar deserto” (solitário) em oração (6,46). Esta começa cedo, logo de manhã, antes da aurora (cf. Sl 63,1). A oração é a base do ministério de Jesus (cf. At 6,4), que ritma e embebe a sua existência. É dela que brotam a sua palavra e ação e é a ela que conduzem. Na oração, Jesus entrega-se (gr. proseukomai: “orar”, lit. “oferecer”) ao Pai, a quem chama Abbá (14,36); une-se a Ele, adora-o, louva-o, dá-lhe graças; escuta a Sua Palavra; discerne e abraça a Sua vontade; suplica e intercede pelos homens; deixa que nele se renove o dom da graça; haure luz, força e motivação para a sua caminhada.
v. 36. Ao levantar-se, não o vendo em casa, Simão assume pela primeira vez a chefia e vai com os companheiros à procura de Jesus.
 
* v. 37. É em oração que encontram Jesus. “Todos Te procuram” (Jo 6,24; Ex 33,7). Em Marcos, “procurar” (10x: 3,22; 8,11s; 11,18; 12,12; 14,1.11.55; 16,6) significa: “apoderar-se de” (cf. Jo 6,15). Mas Jesus não o permite.
 
* v. 38. “Vamos a outros lugares, para também aí pregar”. A oração é um meio, não um fim, e leva à ação. “Vamos” está no plural porque: a) a missão de Jesus é também a dos seus discípulos; b) quem evangeliza nunca vai só, porque o Senhor está e coopera com ele (16,20). “Para isto saí” (gr. exêlthon: Sir 24,3; Jo 8,42; 13,3; 17,8). “Sair” é usado em sentido absoluto, sem indicar a origem. Jesus alude veladamente à sua “vinda” do Pai, enquanto Filho “enviado” (v. 11) pelo Pai a “pregar” (gr. kerysso) o Evangelho de Deus (v. 14). A evangelização é o que determina a vida e missão de Jesus, que não se deixa prender, nem sequer pelo êxito.
 
* v. 39: Mt 4,23; 9,35; Lc 4,44. Marcos conclui com novo sumário da ação de Jesus, em inclusão com o v. 14. Jesus vai ao encontro de todos, pregando-lhes por palavras o Evangelho e levando-lhes com gestos de fraternidade e obras de poder e salvação. É por estas duas dimensões que, como faces da mesma moeda, passa a evangelização.
 
* Neste episódio, Jesus mostra o estilo de vida, o roteiro e a missão que vai confiar aos seus discípulos – e neles, à Igreja –, a qual deverão prosseguir até ao fim dos tempos, vendo nela a sua tarefa mais urgente e necessária, a sua obra fundamental: a evangelização (cf. 3,14; 6,12; 13,10; 16,15; 1Cor 9,16).
 
MEDITAÇÃO
1. Faço da minha vida um serviço a Deus e aos irmãos?
2. Que lugar ocupam na minha existência a oração, a leitura da Palavra de Deus, a celebração da fé e a vida comunitária?
3. A evangelização é a prioridade da vida e ação de Jesus. Como participo eu nesta obra, que o Pai, por Ele, me confia?

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