sábado, 15 de outubro de 2022

XXIX Domingo do Tempo Comum

Sta. Margarida Maria Alacoque, virgem
Sta. Edwiges, viúva e religiosa
S. Geraldo Magela, religioso

1ª Leitura (Ex 17,8-13): Naqueles dias, Amalec veio a Refidim atacar Israel. Moisés disse a Josué: «Escolhe alguns homens e amanhã sai a combater Amalec. Eu irei colocar-me no cimo da colina, com a vara de Deus na mão». Josué fez o que Moisés lhe ordenara e atacou Amalec, enquanto Moisés, Aarão e Hur subiram ao cimo da colina. Quando Moisés tinha as mãos levantadas, Israel ganhava vantagem; mas quando as deixava cair, tinha vantagem Amalec. Como as mãos de Moisés se iam tornando pesadas, trouxeram uma pedra e colocaram-na por debaixo para que ele se sentasse, enquanto Aarão e Hur, um de cada lado, lhe seguravam as mãos. Assim se mantiveram firmes as suas mãos até ao pôr do sol e Josué desbaratou Amalec e o seu povo ao fio da espada.

Salmo Responsorial: 120
R. O nosso auxílio vem do Senhor, que fez o céu e a terra.

Levanto os meus olhos para os montes: donde me virá o auxílio? O meu auxílio vem do Senhor, que fez o céu e a terra.

Não permitirá que vacilem os teus passos, não dormirá Aquele que te guarda. Não há de dormir nem adormecer Aquele que guarda Israel.

O Senhor é quem te guarda, o Senhor está a teu lado, Ele é o teu abrigo. O sol não te fará mal durante o dia, nem a lua durante a noite.

O Senhor te defende de todo o mal, o Senhor vela pela tua vida. Ele te protege quando vais e quando vens, agora e para sempre.

2ª Leitura (2Tim 3,14—4,2): Caríssimo: Permanece firme no que aprendeste e aceitaste como certo, sabendo de quem o aprendeste. Desde a infância conheces as Sagradas Escrituras; elas podem dar-te a sabedoria que leva à salvação, pela fé em Cristo Jesus. Toda a Escritura, inspirada por Deus, é útil para ensinar, persuadir, corrigir e formar segundo a justiça. Assim o homem de Deus será perfeito, bem-preparado para todas as boas obras. Conjuro-te diante de Deus e de Jesus Cristo, que há de julgar os vivos e os mortos, pela sua manifestação e pelo seu reino: Proclama a palavra, insiste a propósito e fora de propósito, argumenta, ameaça e exorta, com toda a paciência e doutrina.

Aleluia. A palavra de Deus é viva e eficaz, pode discernir os pensamentos e intenções do coração. Aleluia.

Evangelho (Lc 18,1-8): Jesus contou aos discípulos uma parábola, para mostrar-lhes a necessidade de orar sempre, sem nunca desistir: «Numa cidade havia um juiz que não temia a Deus, nem respeitava homem algum. Na mesma cidade havia uma viúva, que vinha à procura do juiz, e lhe pedia: ‘Faze-me justiça contra o meu adversário!’ Durante muito tempo, o juiz se recusou. Por fim, ele pensou: ‘Não temo a Deus e não respeito ninguém. Mas esta viúva já está me importunando. Vou fazer-lhe justiça, para que ela não venha, por fim, a me agredir!’». E o Senhor acrescentou: «Escutai bem o que diz esse juiz iníquo! E Deus, não fará justiça aos seus escolhidos, que dia e noite gritam por ele? Será que vai fazê-los esperar? Eu vos digo que Deus lhes fará justiça bem depressa. Mas o Filho do Homem, quando vier, será que vai encontrar fé sobre a terra?».

«A necessidade de orar sempre, sem nunca desistir»

Rev. D. Pere CALMELL i Turet (Barcelona, Espanha)

Hoje, Jesus nos lembra que «a necessidade de orar sempre, sem nunca desistir» (Lc 18,1). Ensina com suas obras e com as palavras. São Lucas se apresenta como o evangelista da oração de Jesus. Efetivamente, em algumas das cenas da vida do Senhor, que os autores inspirados da Escritura Santa nos transmitem, é unicamente Lucas quem nos mostra rezando.

No Batizado no rio Jordão, na escolha dos Doze apóstolos e na Transfiguração. Quando um discípulo lhe pediu «Senhor, ensina-nos a orar» (Lc 11,1), de seus lábios saiu o Pai Nosso. Quando anuncia as negações a Pedro: «Eu, porém, orei por ti, para que tua fé não desfaleça» (Lc 22,32). Na crucifixão: «Jesus dizia: “Pai, perdoa-lhes! Eles não sabem o que fazem!” Repartiram então suas vestes tirando a sorte» (Lc 23,34). Quando morre na Cruz: «Pai, em tuas mãos entrego meu espírito», do Salmo 31. O Senhor mesmo é modelo da oração de petição, especialmente em Getsêman, segundo a descrição de todos os evangelistas.

— Posso ir concretizando como elevarei o coração a Deus nas distintas atividades, porque não é o mesmo fazer um trabalho intelectual que manual; estar na igreja que no campo de esportes ou em casa; conduzir pela cidade que pela autoestrada; não é o mesmo a oração de petição que a de agradecimento; ou a adoração que pedir perdão; de boa manhã que quando levamos todo o cansaço do dia. São Josemaria Escrivá nos dá uma receita para a oração de petição: «Mais consegue aquele que importuna mais de perto... Portanto, aproxima-te a Deus: esforça-te por ser santo».

Santa Maria é modelo de oração, também de petição. Em Canaã de Galileia é capaz de avançar a hora de Jesus, à hora dos milagres, com sua petição, cheia de amor por aqueles esposos e cheia de confiança em seu Filho.

Pensamentos para o Evangelho de hoje
«Faça o que puder, e o que não puder, peça a Deus!» (Santo Agostinho)

«A oração muda os nossos corações. Faz-nos entender melhor como é o nosso Deus. Mas para isso é importante falar com o Senhor, não com palavras vãs» (Francisco)

«(…) Jacob (…) luta durante uma noite inteira com ‘alguém’, um ser misterioso que se nega a revelar o seu nome, mas que o abençoa, antes de o deixar, ao raiar da aurora (cf. Gn 32,25-31). A tradição espiritual da Igreja divisou nesta narrativa o símbolo da oração como combate da fé e vitória da perseverança» (Catecismo da Igreja Católica, nº 2.573)

A justiça de Deus não é a nossa justiça.

Escrito por P. Américo no site Domus Iesu

Deus ouve as preces daqueles que O invocam. A mensagem deste trecho evangélico não podia ser mais clara. O próprio texto diz que Jesus contou uma parábola para dizer aos discípulos que é preciso orar sempre sem desfalecer. Mas fico com a impressão de que o sentido de toda a parábola vai bem mais além deste simples facto. A viúva é modelo de todos, na medida em que não desiste de resolver a questão que tem entre mãos e isso, aplicado à oração, é um convite a nunca desistir. Mas também a figura do juiz tem um alcance que é necessário realçar: não obstante o procedimento do juiz não seja lá muito «simpático», nem por isso a figura do juiz deixa de ser uma imagem do próprio Deus. E a verdade é que - não pelos motivos que levaram o juiz a atender o pedido da viúva - Deus como que sai de Si mesmo para ir ao encontro de quem a Ele se dirige por qualquer motivo, mesmo que seja para pedir. O juiz, por isso, é imagem de Deus só na medida em que «cede» às insistências da viúva e atende o seu pedido. O próprio Jesus Se encarrega de fazer essa aplicação a Deus, embora não deixando de introduzir uma correção importante à conclusão a tirar: se aquele juiz, que era iníquo, fez justiça à viúva, com muito mais razão Deus, que é justo, ouvirá aqueles que por Ele clamam. Mas, para que isso aconteça, é realmente necessário que não desistamos e continuemos a ter fé, não obstante todas as dificuldades e obstáculos. Sem esta fé operosa e constante, nada é possível.

A justiça de Deus chega sempre. A narração evangélica deste domingo, para além do significado imediato sobre a persistência da oração, insere-se num contexto que poderemos, de alguma maneira, chamar «situação apocalíptica», no sentido mais genérico do termo, ou seja, do momento final em que os problemas são resolvidos definitivamente. Para isso, faz-se como que uma divisão do mundo de forma antagónica: dum lado, estão os opressores que dominam e, do outro, os oprimidos da história que não têm outra solução que não seja invocar em grandes brados o auxílio do Senhor.

Esta situação é típica em todo o curso da história dos homens. Antes de mais, é a situação (mesmo politicamente falando) no tempo de Jesus, em que o povo está sujeito a um poder estrangeiro. Por isso se multiplicavam as preces para que chegasse depressa o grande libertador, o juiz e salvador. Depois, descreve também a situação dos cristãos na Igreja primitiva.

Estes tinham uma experiência tal de perseguição que invocavam insistentemente a proteção de Deus. E as circunstâncias adversas chegaram a convencê-los que realmente a segunda vinda de Cristo estava iminente (disso nos dá conta o primeiro escrito do NT, a primeira Carta aos Tessalonicenses). Pensava-se já então que não era possível mudar o mundo senão com meios extraordinários e que, portanto, era necessário que Jesus se manifestasse novamente, numa demonstração de poder, como força salvadora da história.

... Mas não quando nós pensamos. Uma mentalidade de desconfiança e impotência se difunde também entre os homens de hoje, sobretudo face a acontecimentos de dimensão universal que abalam os fundamentos da convivência humana. Aquilo que já se convencionou designar por «pecado social», um pouco para escamotear as responsabilidades pelo «pecado individual», é hoje muito mais avassalador do que nunca. São aos milhões as vozes daqueles que exigem justiça o mais rapidamente possível.

Muitos pensam que esse processo passa necessariamente através duma revolução inter-humana. Outros partem simplesmente do princípio de que este mundo já não tem remédio e recorrem a Deus para que «componha» as coisas à sua maneira... À maneira de Deus, claro, mas, no fundo, desejando que a maneira de Deus seja a própria maneira, que passa, intimamente, por «escaqueirar» (passe a expressão) todos aqueles que não pensam nem agem como eles.

Certamente que Lucas não pensou em todos estes problemas quando propôs a parábola da viúva que pede justiça. Mas é bem possível que tenha pensado ao menos na situação da Igreja primitiva e nas suas dificuldades às mãos das autoridades que a hostilizavam frontalmente. Esta viúva não tem, como parece evidente, a possibilidade de fazer justiça pelas próprias mãos. Como viúva e como oprimida, não tem hipóteses de fazer contas com os seus adversários. Por isso, não lhe resta senão ir importunar o juiz dia e noite até o cansar de tal maneira que acaba por lhe ser feita justiça.

A «lógica” das parábolas, Esta parábola não contém lógica segundo a maneira normal de raciocinar. Aquele juiz poderia ter tido uma reação diferente e bem menos benévola para com a queixosa. Poderia ter mesmo decidido puni-la pela sua atitude importuna e proibir-lhe até a entrada em tribunal. E, de facto, provavelmente, se se tratasse de um caso verdadeiro, teria feito exatamente isso. Mas o objetivo da parábola não é documentar nenhum facto verdadeiro, embora eventualmente Lucas se tenha servido de qualquer caso parecido.

A imagem deste juiz, que faz justiça simplesmente porque já não aguenta ser importunado, aplicado a Deus, pode parecer pouco «digna», mas é, em todo o caso, um convite a imaginar a «situação de Deus» que, todos os dias, escuta os gemidos dos justos que O invocam e que acabará por atender aos seus insistentes pedidos.

Segundo essa perspectiva, então poderemos concluir que o Evangelho está seguro de que Deus fará justiça sobre toda a história dos homens. Por outras palavras, Deus «vingar-se-á» de todos aqueles que oprimem os inocentes e os justos. Obviamente, não me refiro a qualquer ressentimento por parte de Deus (e, por isso mesmo, coloquei aspas acima), mas sim ao facto de que chegará um tempo em que o poder dos injustos, que oprimem os pequenos da terra, terá fim. E, enquanto os pequenos verão a Deus face a face, os outros serão afastados da sua presença para sempre.

É exatamente o mesmo sentido da parábola do rico avarento e do pobre Lázaro. Estas duas parábolas são perfeitamente descritas e complementadas pelo conteúdo do célebre texto de Mateus sobre o Juízo Universal (cf. Mt 25,31-46), que eu convido a ler na íntegra, por se tratar dum dos mais belos trechos evangélicos.

Oração: reconhecer a dependência. Seja como for, não obstante as reflexões feitas até aqui, parece-me que a liturgia da palavra não quer pôr o realce tanto na necessidade de repor a justiça quanto na necessidade de aprofundar o relacionamento com Deus, completando assim a afirmação do domingo anterior que dizia que a salvação é um dom de Deus.

Nessa perspectiva, mais do que considerar o episódio relativo ao combate dos israelitas contra os amalecitas uma «guerra santa», é preciso reconhecer que Israel, sem Deus, é um povo que não tem consistência e identidade própria e que, portanto, tem que estar constantemente unido a Ele para poder sobreviver.

É possível, portanto, e legítimo (já que o objetivo da Bíblia é essencialmente religioso, não nos esqueçamos disso), transpor a narração de «tipo guerreiro» para uma fase ulterior do processo de aprendizagem da fé. Aquele episódio «guerreiro» tem por finalidade ensinar a «pedagogia divina» que Deus propõe ao povo guiado por Moisés. Se, no plano estratégico, digamos assim, o povo é guiado por Josué, no plano espiritual, a sua sobrevivência não é possível sem a intercessão orante de Moisés...

A união com Javé, o reconhecimento da dependência em relação a Ele, é indispensável para que Israel possa sobreviver e se possa reconhecer como povo com características próprias e com uma missão especial.

Do antigo para o novo Israel. As circunstâncias, durante toda a sua história, nem sempre foram favoráveis ao novo povo de Israel, que é a Igreja. Não posso nem pretendo atestá-lo documentalmente nesta sede, mas dá a impressão que as circunstâncias tanto mais lhe são desfavoráveis quanto mais a Igreja julga poder resolver com as suas próprias forças e meios os problemas que a afligem. Daí que o reconhecimento da sua dependência de Deus seja um elemento essencial para ela poder continuar a ser fiel à sua missão. Há, pois, que acrescentar que nem sempre as contrariedades e dificuldades por que a Igreja passa são nocivas à sua transparência e capacidade de convicção.

É indispensável não só não impor nem tempos nem ritmos a Deus, mas também (e talvez ainda mais) ouvir e pôr em prática a sua Palavra. Para ouvir, porém, a sua Palavra, o silêncio implorante é uma condição essencial, porque é esse que possibilita uma escuta fecunda e profícua.

Quando se escuta a Palavra de Deus, então é possível fazer todo o tipo de oração, incluindo o pedido insistente. Mas isso evidentemente não quer dizer que se possa pretender que Deus faça, em vez de nós, aquilo que a nós nos compete fazer. Utilizando ainda a comparação extraída do livro do Êxodo, não nos esqueçamos que, enquanto o profeta Moisés orava no monte, Josué e os seus soldados combatiam no vale contra o inimigo. Não bastava que Moisés estivesse lá no monte em oração.

Seja como for, nesse quadro de fundo, mesmo a oração impetratória é perfeitamente legítima, porque é reconhecer, por um lado, os próprios limites e, por outro, os laços de dependência em relação a Deus; enfim, é reconhecer que a libertação total e a realização integral não dependem exclusivamente do homem.

Orar é pedir e não forçar a Deus. Simplificando o assunto, embora reconhecendo, pelo menos em teoria (catequese), que a oração é «falar e entrar em contacto com Deus», no entanto, há a tendência a esperar sempre que Deus se deixe adequar à nossa vontade. Ora, isso é inverter por completo os dados do problema. A oração cristã não pode ser uma exigência para que Deus mude os Seus planos e não é também finalizada a que intervenha imediatamente como resposta ao facto de orar. Não, não é uma fórmula mágica que resolve os problemas automaticamente. Deve ser é um ato de adesão e aceitação da liberdade, da originalidade e da paciência de Deus.

A este propósito, não quero deixar de assinalar uma passagem do evangelista Lucas em que Jesus diz que Deus nos dará não necessariamente o que pedimos, mas nos dará, antes de mais, o Espírito Santo, para compreendermos o sentido daquilo que nos acontece e para sermos testemunhas dos dons de Deus: «Se vós, que sois maus, sabeis dar coisas boas aos vossos filhos, quanto mais o vosso Pai dará o Espírito Santo àqueles que lho pedirem!» (Lc 11,13). O crente, portanto, não deve «obrigar» a Deus a fazer a sua vontade, mas procurará descobrir, aceitar e pôr em prática a vontade dele.

 

 

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