Sto. Antônio Maria Claret, Bispo
Salmo Responsorial: 125
R. Grandes maravilhas
fez por nós o Senhor, por isso exultamos de alegria.
Quando o Senhor fez regressar os cativos de Sião,
parecia-nos viver um sonho. Da nossa boca brotavam expressões de alegria e dos
nossos lábios cânticos de júbilo.
Diziam então os pagãos: «O Senhor fez por eles grandes
coisas». Sim, grandes coisas fez por nós o Senhor, estamos exultantes de
alegria.
Fazei regressar, Senhor, os nossos cativos, como as
torrentes do deserto. Os que semeiam em lágrimas recolhem com alegria.
À ida vão a chorar, levando as sementes; à volta vêm a
cantar, trazendo os molhos de espigas.
2ª Leitura (Hb 5,1-6): Todo o sumo sacerdote,
escolhido de entre os homens, é constituído em favor dos homens, nas suas
relações com Deus, para oferecer dons e sacrifícios pelos pecados. Ele pode ser
compreensivo para com os ignorantes e os transviados, porque também ele está
revestido de fraqueza; e, por isso, deve oferecer sacrifícios pelos próprios
pecados e pelos do seu povo. Ninguém atribui a si próprio esta honra, senão
quem foi chamado por Deus, como Aarão. Assim também, não foi Cristo que tomou
para Si a glória de Se tornar sumo sacerdote; deu-Lha Aquele que Lhe disse: «Tu
és meu Filho, Eu hoje Te gerei», e como disse ainda noutro lugar: «Tu és sacerdote
para sempre, segundo a ordem de Melquisedec».
Aleluia. Jesus Cristo, nosso Salvador, destruiu a morte e fez brilhar a
vida por meio do Evangelho. Aleluia.
Evangelho (Mc 10,46-52): Naquele tempo, chegaram a
Jericó. Quando Jesus estava saindo da cidade, acompanhavam-no os discípulos e
uma grande multidão. O mendigo cego, Bartimeu, filho de Timeu, estava sentado à
beira do caminho. Ouvindo que era Jesus Nazareno, começou a gritar: Jesus,
Filho de Davi, tem compaixão de mim. Muitos o repreendiam para que se calasse.
Mas ele gritava ainda mais alto: Filho de Davi, tem compaixão de mim. Jesus
parou e disse: Chamai-o! Eles o chamaram, dizendo: Coragem, levanta-te! Ele te chama!
O cego jogou o manto fora, deu um pulo e se aproximou de Jesus. Este lhe
perguntou: Que queres que eu te faça? O cego respondeu: Rabboni, meu Mestre,
que eu veja. Jesus disse: Vai, tua fé te salvou. No mesmo instante, ele
recuperou a vista e foi seguindo Jesus pelo caminho
«Que queres que eu te faça? O cego respondeu: Rabboni, meu Mestre, que
eu veja»
+ Rev. D. Pere CAMPANYÀ
i Ribó (Barcelona, Espanha)
Por sorte dele, naquela ocasião quem passa é Jesus,
acompanhado dos seus discípulos e outras pessoas. Sem dúvida, o cego já tinha
ouvido falar de Jesus; haviam-lhe comentado que fazia prodígios e, ao saber que
passa perto dele, começa a gritar: Filho de Davi, tem compaixão de mim! (Mc
10,47). Os acompanhantes do Mestre ficam incomodados com os gritos do cego, não
pensam na triste situação daquele homem, são egoístas. Porém Jesus quer
responder ao mendigo e faz com que o chamem. Imediatamente o cego se encontra
perante o Filho de Davi e o diálogo começa com uma pergunta e uma resposta:
Jesus, dirigindo-se a ele, disse: Que queres que eu te faça? O cego respondeu: Rabboni,
que eu veja! (Mc 10,51). E Jesus concede-lhe a dupla visão: a física e a mais
importante, a fé, que é a visão interior de Deus. São Clemente de Alexandria
diz: Ponhamos fim ao esquecimento da verdade; despojemo-nos da ignorância e da
obscuridade que, como uma nuvem, ofuscam os nossos olhos, e contemplemos Aquele
que é realmente Deus.
Queixamo-nos frequentemente e dizemos: Não sei rezar.
Sigamos, então, o exemplo do cego do Evangelho: Insiste em chamar Jesus e, com
três palavras, diz-lhe do que necessita. Falta-nos fé? Digamos-lhe: Senhor,
aumenta a minha fé. Temos familiares ou amigos que deixaram de praticar? Então,
rezemos assim: Senhor Jesus, faz que vejam. A fé é assim tão importante? Se a
compararmos com a visão física, que diremos? A situação do cego é triste, mas
muito mais triste é a daqueles que não creem. Digamos-lhes: O Mestre lhe chama,
apresenta-lhe as suas necessidades e Jesus responderá com generosidade.
"Que eu veja"
O episódio que hoje nos é proposto situa-nos à saída da
cidade de Jericó. Jericó, a “cidade das Palmeiras”, é um oásis situado na
margem do rio Jordão, a norte do Mar Morto, e que dista cerca de 30 quilómetros
de Jerusalém. Na época de Jesus, era uma cidade relativamente importante, onde
Herodes, o Grande, tinha edificado um luxuoso palácio de Inverno.
Além de Jesus, Marcos coloca no centro da cena um mendigo
cego com o nome de Bartimeu (“filho de Timeu”). Este nome, meio aramaico
(“bar”) e meio grego (“timaios”), é um nome perfeitamente inusual no ambiente
hebraico-palestinense onde a história é situada (nunca aparece entre os cerca
de 2.000 nomes próprios que ocorrem no Antigo Testamento); aos leitores romanos
de Marcos, contudo, o nome devia evocar o “Timeo”, um dos mais conhecidos
“diálogos” de Platão. Alguns autores pensam que, mais do que um personagem
histórico, o cego Bartimeu seria uma figura simbólica.
Os “cegos” faziam parte do grupo dos excluídos da sociedade
palestina de então. As deficiências físicas eram consideradas – pela teologia
oficial – como resultado do pecado. Segundo a concepção da época, Deus
castigava de acordo com a gravidade da culpa. A cegueira era considerada o
resultado de um pecado especialmente grave: uma doença que impedisse o homem de
estudar a Lei era considerada uma maldição de Deus por excelência. Pela sua
condição de impureza notória, os cegos eram impedidos de servir de testemunhas
no tribunal e de participar nas cerimónias religiosas no Templo.
Jesus, tem piedade de mim!
O cego da nossa
história está sentado à beira do caminho, provavelmente a pedir esmola. O
estar sentado significa acomodação, instalação, conformismo. Ele está privado
da luz e da liberdade e está conformado com a sua triste situação, sabendo que,
por si só, é incapaz de sair dela. O pedir esmola (o texto refere
explicitamente a sua condição de mendigo – verso 46) indica a situação de
escravidão e de dependência em que o homem se encontra.
Contudo, a passagem de Jesus de Nazaré dá ao cego a
consciência da sua situação de miséria, de dependência, de escravidão. Então,
Bartimeu percebe o sem sentido da sua situação e sente à vontade de apostar
numa outra experiência. A passagem de Jesus na vida de alguém é sempre um
momento de tomada de consciência, de questionamento, de desafio, que leva a pôr
em causa a vida velha e a sentir o imperativo de ir mais além … No entanto,
Bartimeu está consciente da sua debilidade e sente que, sem a ajuda de Jesus,
continuará envolvido pelas trevas da dependência, da escravidão, da instalação
… Por isso, pede: “Jesus, filho de David, tem misericórdia de mim” (vers. 47).
O título “filho de David” é um título messiânico. Portanto, Bartimeu vê em
Jesus esse Messias libertador que, segundo a mentalidade judaica, havia de vir
não só para salvar Israel dos opressores, mas também para dar vida em plenitude
a cada membro do Povo de Deus.
Antes de referir a intervenção de Jesus, Marcos dá conta da reação
dos que estão à volta de Jesus: repreendiam o cego e queriam fazê-lo calar
(vers. 48). Quando alguém encontra Jesus e resolve deixar a vida antiga para
aderir ao Reino que Jesus veio propor, encontra sempre resistências (que vêm,
por vezes, dos familiares, dos amigos, dos colegas). Estes que repreendem e
mandam calar o cego representam, portanto, todos aqueles que colocam obstáculos
a quem quer deixar a sua situação de miséria e de escravidão para aderir à
proposta libertadora que Cristo faz. No entanto, a oposição não só não desarma
o cego, como o leva a gritar ainda mais forte: “filho de David, tem
misericórdia de mim” … A incompreensão ou a oposição dos homens nunca fazem
desistir aquele que viu Jesus passar e que viu n’Ele uma proposta de vida e de
liberdade.
Jesus parou e mandou
chamar o cego. A cena recorda-nos os relatos do chamamento dos discípulos
(cf. Mc 1,16-20; 2,14; 3,13). Os mediadores que transmitem ao cego as palavras
de Jesus dizem-lhe: “coragem, levanta-te que Ele chama-te” (vers. 49). Ou seja:
deixa a tua situação de miséria, de escravidão e de dependência, porque Jesus
chama-te. O chamamento é sempre, nestes casos, a tornar-se discípulo, a seguir
Jesus no caminho do amor e do dom da vida.
Em resposta, o cego
atirou fora a capa, deu um salto e foi ter com Jesus (vers. 50). A capa
podia estar colocada debaixo do cego, como almofada, ou nos seus joelhos, para
recolher as moedas que lhe atiravam; em qualquer caso, a capa é tudo o que um
mendigo possui, a única coisa de que ele pode separar-se (outros deixaram o
barco, as redes ou a banca onde recolhiam impostos). O deitar fora a capa
significa, portanto, o deixar tudo o que se possui para ir ao encontro de
Jesus. É um corte radical com o passado, com a vida velha, com a anterior
situação, com tudo aquilo em que se apostou anteriormente, a fim de começar uma
vida nova ao lado de Jesus.
Jesus perguntou ao
cego: “que queres que te faça?”. É a mesma pergunta que, pouco antes, Jesus
fizera a João e Tiago (cf. Mc 10,36). A identidade da pergunta acentua,
contudo, a diferença da resposta … Os dois irmãos queriam sentar-se ao lado de
Jesus e ver concretizados os seus sonhos de grandeza e de poder; o cego
Bartimeu, ao contrário, cansado de estar sentado numa vida de escravidão e de
cegueira, quer encontrar a luz para seguir Jesus (vers. 51).
Jesus responde a
Bartimeu: “vai, a tua fé te salvou” (vers. 52). A fé não é a simples adesão
a determinadas verdades abstratas, que o crente aceita acriticamente; mas, no
contexto neo-testamentário, a fé é a adesão a Jesus e à sua proposta de
salvação. Por isso, Marcos termina a sua história dizendo que o cego recuperou
a vista e seguiu Jesus – isto é, fez-se discípulo de Jesus. Ao aderir a Jesus e
à sua proposta de salvação, ao aceitar seguir Jesus no caminho do amor e do dom
da vida (Jesus prepara-Se para entrar em Jerusalém, onde vai fazer dom da sua vida
em favor dos homens), Bartimeu encontrou a salvação: deixou a vida da
escuridão, da escravidão, da dependência em que estava e nasceu para essa vida
verdadeira e eterna que, através de Jesus, Deus oferece aos homens.
O cego Bartimeu que encontráramos a mendigar, sentado à
beira do caminho, à saída de Jericó representava, inicialmente, os pecadores
que viviam longe de Deus e à margem da salvação. Depois de encontrar Jesus,
Bartimeu transforma-se e torna-se o protótipo do verdadeiro discípulo …
Destinatário privilegiado da proposta de salvação que Jesus traz, ele proclama
sem hesitações a sua fé, invoca a ajuda e a misericórdia de Jesus, acolhe sem
hesitações o chamamento que lhe é feito, liberta-se da vida velha e, com
alegria, decisão e entusiasmo, aceita, sem condições, seguir Jesus no caminho
do amor e do dom da vida. É com Bartimeu que os discípulos de Jesus são
convidados a identificar-se.
”O que queres que eu te faça?" O cego respondeu: "Mestre, que
eu veja!" Jesus disse: "Vai, a tua fé te curou".
• A Palavra de Deus que nos é proposta garante-nos que a
situação do homem cego, prisioneiro da escuridão, não é uma situação
incontornável, obrigatória, sem remédio … Jesus veio ao mundo, enviado pelo
Pai, com uma proposta de libertação destinada a todos aqueles que procuram a
luz e a vida verdadeira. Esse Jesus de Nazaré que Se cruzou com o cego à saída
de Jericó continua a cruzar-Se hoje, de forma continuada, com cada homem e com
cada mulher nos caminhos da vida e oferece-lhes, sem cessar, a proposta
libertadora de Deus … É preciso, no entanto, que não nos fechemos no nosso
egoísmo e na nossa autossuficiência, surdos e cegos aos apelos de Deus; é
preciso que as nossas preocupações com os valores efémeros não nos distraiam do
essencial; é preciso que aprendamos a reconhecer os desafios de Deus nesses
acontecimentos banais com que, tantas vezes, Deus nos interpela e questiona …
• O que é que implica aceitar a proposta que Jesus faz?
Fundamentalmente implica – como aconteceu com Bartimeu – tornar-se discípulo …
Ser discípulo de Jesus é aderir à sua pessoa, acolher os seus valores, viver na
obediência aos projetos do Pai, fazer da vida um dom de amor aos irmãos; é solidarizar-se
com os pequenos, com os pobres, com os perseguidos, com os marginalizados e
lutar por um mundo onde todos sejam acolhidos como filhos de Deus, iguais em
direitos e em dignidade; é lutar contra as estruturas que geram injustiça,
opressão e morte; é ser testemunha, com palavras e com gestos, da verdade, da
justiça, da paz, da reconciliação. Quem aceita seguir o caminho do discípulo
escolhe viver na luz e está a contribuir para a construção de um mundo novo.
• Quando reconhecemos o “chamamento” de Deus, qual deve ser
a nossa resposta?
Bartimeu, logo que ouviu dizer que Jesus o chamava, atirou
fora a sua capa e correu ao encontro de Jesus. O gesto de Bartimeu representa,
aqui, a renúncia imediata à vida antiga, ao egoísmo, ao comodismo, à
escravidão, aos comportamentos incompatíveis com a adesão a Cristo e a esse
caminho novo que Jesus o convida a percorrer. É isso, também, que é pedido a
todos aqueles a quem Jesus chama à vida nova …
• Na história do encontro de Bartimeu com Cristo, aparecem
outros personagens, com papéis vários. Uns constituem obstáculos à adesão de
Bartimeu a Cristo; outros apresentam-se como intermediários entre Cristo e
Bartimeu e transmitem ao cego as palavras de Jesus… Este facto serve para nos
tornar conscientes do papel daqueles que nos rodeiam no nosso caminho da fé …
Ao longo da nossa caminhada, encontraremos sempre pessoas que nos ajudam a ir
ao encontro de Cristo e pessoas que (muitas vezes com óptimas intenções) tentam
impedir-nos de encontrar Cristo. Precisamos de aprender a discernir entre as
várias opiniões que nos são propostas e a dar a devida importância a quem nos
ajuda a descobrir o caminho para a verdadeira vida.
• Quem encontra Cristo e aceita o desafio para viver como
discípulo tem, a partir daí, um caminho fácil? De forma nenhuma. Tem de
abandonar a vida cómoda e instalada em que vivia e enfrentar uma nova
realidade, num desafio permanente, num questionamento constante; tem de
aprender a enfrentar as críticas, as incompreensões, os confrontos com aqueles
que não compreendem a sua opção; tem de percorrer, dia a dia, o difícil caminho
do amor, do serviço, da entrega, do dom da vida … É preciso, no entanto, que o
discípulo esteja consciente de que o caminho de Jesus não é um caminho que leva
à morte, mas é um caminho que leva à ressurreição, à vida verdadeira e eterna.
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