S. Simão Stock, presbítero 6º Prior geral da Nossa Ordem |
1ª Leitura (At
13,13-25): Naqueles dias, Paulo e os seus
companheiros largaram de Pafos e dirigiram-se a Perga da Panfília. Mas João
Marcos separou-se deles para voltar a Jerusalém. Eles prosseguiram de Perga e chegaram
a Antioquia da Pisídia. A um sábado, entraram na sinagoga e sentaram-se. Depois
da leitura da Lei e dos Profetas, os chefes da sinagoga mandaram-lhes dizer:
«Irmãos, se tendes alguma exortação a fazer ao povo, falai». Paulo levantou-se,
fez sinal com a mão e disse: «Homens de Israel e vós que temeis a Deus,
escutai: O Deus deste povo de Israel escolheu os nossos pais e fez deles um
grande povo, quando viviam como estrangeiros na terra do Egito. Com seu braço
poderoso tirou-os de lá e durante quarenta anos sustentou-os no deserto e,
depois de exterminadas sete nações na terra de Canaã, deu essas terras como
herança ao seu povo. Tudo isto durou cerca de quatrocentos e cinquenta anos. Em
seguida, deu-lhes juízes até ao profeta Samuel. Então o povo pediu um rei e
Deus concedeu-lhes Saul, filho de Cis, da tribo de Benjamim, que reinou durante
quarenta anos. Depois, tendo-o rejeitado, suscitou-lhes David como rei, de quem
deu este testemunho: ‘Encontrei David, filho de Jessé, homem segundo o meu
coração, que fará sempre a minha vontade’. Da sua descendência, como prometera,
Deus fez nascer Jesus, o Salvador de Israel. João tinha proclamado, antes da
sua vinda, um baptismo de penitência a todo o povo de Israel. Prestes a
terminar a sua carreira, João dizia: ‘Eu não sou quem julgais; mas depois de
mim, vai chegar Alguém, a quem eu não sou digno de desatar as sandálias dos
seus pés’».
Salmo Responsorial: 88
R. Senhor, cantarei eternamente a
vossa bondade.
Cantarei
eternamente as misericórdias do Senhor e para sempre proclamarei a sua
fidelidade. Vós dissestes: «A bondade está estabelecida para sempre», no céu
permanece firme a vossa fidelidade.
Encontrei
David, meu servo, ungi-o com o óleo santo. Estarei sempre a seu lado e com a
minha força o sustentarei.
A minha
fidelidade e bondade estarão com ele, pelo meu nome será firmado o seu poder.
Ele me invocará: «Vós sois meu Pai, meu Deus, meu Salvador».
Aleluia. Jesus Cristo,
a Testemunha fiel, o Primogênito dos mortos, amou-nos e purificou-nos dos
nossos pecados, pelo seu sangue. Aleluia.
Evangelho (Jo
13,16-20): Depois de haver lavado os pés dos
discípulos, Jesus disse-lhes: «Em verdade, em verdade, vos digo: o servo não é
maior do que seu senhor, e o enviado não é maior do que aquele que o enviou. Já
que sabeis disso, sereis felizes se o puserdes em prática. Eu não falo de todos
vós. Eu conheço aqueles que escolhi. Mas é preciso que se cumpra o que está na
Escritura: ‘Aquele que come do meu pão levantou contra mim o calcanhar’. Desde
já, antes que aconteça, eu vo-lo digo, para que, quando acontecer, acrediteis
que eu sou. Em verdade, em verdade, vos digo: quem recebe aquele que eu enviar,
a mim recebe; e quem me recebe, recebe aquele que me enviou».
«Depois de lavar os
pés dos discípulos...»
Rev. D. David COMPTE i Verdaguer (Manlleu, Barcelona,
Espanha)
Hoje, como
naqueles filmes que começam lembrando um fato passado, a liturgia faz memória
de um gesto que pertence à Quinta-feira Santa: Jesus lava os pés dos discípulos
(cf. Jo 13,12). Assim, esse gesto — lido desde a perspectiva da Páscoa —
recobra uma vigência perene. Observemos, somente, três ideias.
Em primeiro
lugar, a centralidade da pessoa. Na nossa sociedade parece que fazer é o
termômetro do valor de uma pessoa. Dentro dessa dinâmica é fácil que as pessoas
sejam tratadas como instrumentos; facilmente utilizamo-nos uns aos outros.
Hoje, o Evangelho nos urge a transformar essa dinâmica em uma dinâmica de
serviço: o outro nunca é um puro instrumento. Tentar-se-ia viver uma
espiritualidade de comunhão, onde o outro — em expressão de S. João Paulo II —
chega a ser “alguém que me pertence” e um “dom para mim”, a quem temos de “dar
espaço”. A nossa língua o tem apanhado felizmente com a expressão: “estar pelos
demais” Estamos pelos demais? Escutamo-lhes quando nos falam?
Na
sociedade da imagem e da comunicação, isto não é uma mensagem a transmitir,
senão uma tarefa a cumprir, a viver cada dia: «sereis felizes se o puserdes em
prática» (Jo 13,17). Talvez por isso, o Mestre não se limita a uma explicação:
imprime o gesto de serviço na memória daqueles discípulos, passando logo à
memória da Igreja; uma memória chamada constantemente a ser uma vez mais gesto:
na vida de tantas famílias, de tantas pessoas.
Finalmente,
um sinal de alerta: «Aquele que come do meu pão levantou contra mim o
calcanhar» (Jo 13,18). Na Eucaristia, Jesus ressuscitado se faz o nosso
servidor, nos lava os pés. Mas não é suficiente com a presença física. Temos
que aprender na Eucaristia e tirar as forças para fazer realidade que «tendo recebido
o dom do amor, morramos ao pecado e vivamos para Deus» (São Fulgêncio de
Ruspe).
Reflexões de Frei
Carlos Mesters, O.Carm.
* Nos próximos dias, com exceção das festas, o evangelho
diário é tirado da longa conversa de Jesus com os discípulos durante a Última
Ceia (Jo 13 a 17). Nestes cinco capítulos que descrevem a despedida de Jesus,
percebe-se a presença daqueles três fios de que falamos anteriormente e que
tecem e compõem o evangelho de João: a palavra de Jesus, a palavra das
comunidades e a palavra do evangelista que fez a última redação do Quarto
Evangelho. Nestes cinco capítulos, os três fios estão de tal maneira
entrelaçados que o todo se apresenta como uma peça única de rara beleza e
inspiração, onde é difícil distinguir o que é de um e o que é do outro, mas
onde tudo é Palavra de Deus para nós.
* Estes cinco capítulos trazem a conversa que Jesus teve
com os seus amigos, na véspera de ser preso e morto. Era uma conversa amiga,
que ficou na memória do Discípulo Amado. Jesus, assim parece, queria prolongar
ao máximo esse último encontro, momento de muita intimidade. O mesmo acontece
hoje. Há conversa e conversa. Há conversa superficial que gasta palavras à toa
e revela o vazio das pessoas. E há conversa que vai fundo no coração e fica na
memória. Todos nós, de vez em quando, temos esses momentos de convivência
amiga, que dilatam o coração e vão ser força na hora das dificuldades. Ajudam a
ter confiança e a vencer o medo.
* Os cinco
versículos do Evangelho de hoje tiram duas conclusões do lava-pés (Jo 13,1-15).
Falam (1) do serviço como
característica principal dos seguidores e seguidoras de Jesus, e (2) da identidade de Jesus como
revelação do Pai.
* João 13,16-17: O servo não é maior
que o seu senhor.
Jesus
acabou de lavar os pés dos discípulos. Pedro levou susto e não quis que Jesus
lhe lavasse os pés. “Se eu não te lavar os pés, não terás parte comigo” (Jo
13,8). E basta lavar os pés; o resto não precisa (Jo 13,10). O valor simbólico
do gesto do lava-pés consistia em aceitar Jesus como o Messias Servidor que se
entrega a si mesmo pelos outros, e recusar um messias rei glorioso. Esta
entrega de si mesmo como servo de todos é a chave para entender o gesto do
lava-pés. Entender isto é a raiz da felicidade de uma pessoa: “Se vocês
compreenderam isso, serão felizes se o puserem em prática". Mas havia
pessoas, mesmo entre os discípulos, que não aceitavam Jesus como Messias Servo.
Não queriam ser servidores dos outros. Provavelmente, queriam um messias
glorioso como Rei e Juiz, de acordo com a ideologia oficial. Jesus diz:
"Eu não falo de todos vocês. Eu conheço aqueles que escolhi, mas é preciso
que se cumpra o que está na Escritura: Aquele que come pão comigo, é o primeiro
a me trair!” João se refere a Judas, cuja traição vai ser anunciada logo em
seguida (Jo 13,21-30).
* João 13,18-20: Digo isto agora,
para que creiais que EU SOU.
Foi por
ocasião da libertação do Egito ao pé do Monte Sinai, que Deus revelou o seu
nome a Moisés: “Estou com você!” (Ex 3,12), “Estou que Estou” (Ex 3,14),
“Estou” ou “Eu sou” me mandou até vocês!” (Ex 3,14), O nome Javé (Ex 3,15)
expressa a certeza absoluta da presença libertadora de Deus junto do seu povo.
De muitas maneiras e em muitas ocasiões esta mesma expressão “Eu Sou” ou “Sou
Eu” é usada por Jesus (Jo 8,24; 8,28; 8,58; Jo 6,20; 18,5.8; Mc 14,62; Lc
22,70). Jesus é a presença do rosto libertador de Deus no meio de nós.
Para um confronto pessoal
1) O servo não é maior que o seu senhor. Como faço da
minha vida um serviço permanente aos outros?
2) Jesus soube conviver com pessoas que não o aceitavam.
E eu consigo?
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