Bto Luís Morbioli, penitente. Terceiro Carmelita |
«Quem procurar salvar a vida, vai
perdê-la; e quem a perder, vai salvá-la»
Rev.
D. Enric PRAT i Jordana (Sort, Lleida, Espanha)
Sta Gertrudes Magna, Virgem |
No fragmento do
Evangelho que estamos comentando, Jesus quer sair ao passo dessa concepção
fragmentária da vida que mutila ao ser humano e o leva à frustração. E o faz
mediante uma sentença séria e contundente, capaz de remover as consciências e
de obrigar a fazer perguntas fundamentais: «Quem procurar salvar a vida, vai
perdê-la; e quem a perder, vai salvá-la». (Lc 17,33). Meditando sobre este
ensino de Jesus Cristo, diz São Agostinho: «Que dizer, então? Pereceram todos
os que fazem essas coisas, isto é, quem se casa, plantam videiras e edificam?
Não eles, senão quem presumem dessas coisas, quem antepõem essas coisas a Deus,
quem estão dispostos a ofender a Deus ao instante por essas coisas».
De fato, quem perde a
vida por conservá-la senão aquele que viveu exclusivamente na carne, sem deixar
aflorar o espírito; ou ainda mais, aquele que vive ensimesmado, ignorando por
completo aos demais? Porque é evidente que a vida na carne se perde
necessariamente e, que a vida no espírito, se não se compartilha, debilita-se.
Toda a vida, por ela
mesma, tende naturalmente ao crescimento, à exuberância, à frutificação e a
reprodução. Pelo contrário, se é sequestrada e encerrada no intento d
Reflexões de Frei Carlos Mesters,
O.Carm.
*
Lucas 17,26-29: Como nos dias de Noé e de Ló
A vida corre
normalmente: comer, beber, casar, comprar, vender, plantar, colher. A rotina
pode envolver-nos de tal modo que já não conseguimos pensar em outra coisa, em
mais nada. E o consumismo do sistema neoliberal contribui para aumentar em
muitos de nós esta total desatenção à dimensão mais profunda da vida. Deixamos
o cupim entrar na viga da fé que sustenta o telhado da nossa vida. Quando
tempestade derrubar a casa, muitos dão a culpa ao carpinteiro: “Mau serviço!”
Na realidade, a causa da queda foi a nossa desatenção prolongada. A alusão à
destruição de Sodoma como figura do que vai acontecer no fim dos tempos, é uma
alusão à destruição de Jerusalém pelos romanos no ano 70 dC (cf Mc 13,14).
*
Lucas 17,30-32: Assim será nos dias do Filho do Homem
“O mesmo acontecerá no
dia em que o Filho do Homem for revelado”. Difícil para nós imaginar o
sofrimento e o trauma que a destruição de Jerusalém causou nas comunidades,
tanto dos judeus como dos cristãos. Para ajudá-las a entender e a enfrentar o
sofrimento, Jesus usa comparações tiradas da vida: “Nesse dia, quem estiver no
terraço, não desça para apanhar os bens que estão em casa, e quem estiver nos
campos não volte para trás”. A destruição virá com tal rapidez que não vale a
pena descer para casa para buscar alguma coisa dentro da casa (Mc 13,15-16).
“Lembrem-se da mulher de Ló” (cf. Gn 19,26), isto é, não olhem para trás, não
percam tempo, tomem a decisão e vão em frente: é questão de vida ou de morte.
*
Lucas 17,33: Perder a vidas para ganhá-la
“Quem procura ganhar a
sua vida, vai perdê-la; e quem a perde, vai conservá-la”. Só se sente realizada
na vida a pessoa que for capaz de doar-se inteiramente pelos outros. Perde a
vida quem quer conservá-la só para si. Este conselho de Jesus é a confirmação
da mais profunda experiência humana: a fonte da vida está na doação da vida. É
dando que se recebe. “Eu garanto a vocês: se o grão de trigo não cai na terra e
não morre, fica sozinho. Mas se morre, produz muito fruto” (Jo 12,24).
Importante é a motivação que o Evangelho de Marcos acrescenta: “Por causa de
mim e por causa do Evangelho” (Mc 8,35). Dizendo que ninguém é capaz de
conservar sua vida com seu próprio esforço, Jesus evoca o salmo onde se diz que
ninguém é capaz de pagar o preço do resgate da vida: “O homem não pode comprar
seu próprio resgate, nem pagar a Deus o preço de si mesmo. É tão caro o resgate
da vida, que nunca bastará para ele viver perpetuamente, sem nunca ver a cova”. (Sl 49,8-10).
* Lucas 17,34-36: Vigilância
“Eu digo a vocês:
nessa noite, dois estarão numa cama. Um será tomado, e o outro será deixado.
Duas mulheres estarão moendo juntas. Uma será tomada, e a outra deixada. Dois
homens estarão no campo. Um será levado, e o outro será deixado". Evoca a
parábola das dez moças. Cinco eram prudentes e cinco eram bobas (Mt 25,1-11). O
que importa é estar preparado. As palavras “Um será tomado, e o outro será
deixado” evocam as palavras de Paulo aos Tessalonicenses (1Tes 4,13-17), quando
diz que, na vinda do Filho do homem, seremos arrebatados ao céu junto com
Jesus. Estas palavras “deixados para trás” forneceram o título para um terrível
e perigoso romance da extrema direita fundamentalista dos Estados Unidos: “Lefted
behind!” Este romance não nada tem a ver com o sentido real das palavras de
Jesus.
*
Lucas 17,37: Onde e quando?
“Os discípulos
perguntaram: "Senhor, onde acontecerá isso?”Jesus respondeu: "Onde
estiver o corpo, aí se reunirão os urubus". Resposta enigmática. Alguns
acham que Jesus evoca a profecia de Ezequiel, retomada no Apocalipse, na qual o
profeta se refere à batalha vitoriosa final contra os poderes do mal. As aves
de rapina ou os urubus serão convidadas para comer a carne dos cadáveres (Ez
39,4.17-20; Ap 19,17-18). Outros acham que se trata do vale de Josafá, onde
será realizado o juízo final conforme a profecia de Joel (Joel 4,2.12). Outros
ainda acham que se trata simplesmente de um provérbio popular que significava
mais ou menos o mesmo que diz o nosso provérbio: “Onde tem fumaça, tem fogo!”
Para
um confronto pessoal
1) Sou dos tempos de Noé e de Ló?
2) Romance da extrema direita. Como me
situa diante desta manipulação política da fé em Jesus?
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