quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Sexta-feira da 1ª semana da Quaresma

Evangelho (Mt 5,20-26): Porque Eu vos digo: Se a vossa justiça não superar a dos doutores da Lei e dos fariseus, não entrareis no Reino do Céu. Ouvistes o que foi dito aos antigos: Não matarás. Aquele que matar terá de responder em juízo. Eu, porém, digo-vos: Quem se irritar contra o seu irmão será réu perante o tribunal; quem lhe chamar 'imbecil' será réu diante do Conselho; e quem lhe chamar 'louco' será réu da Geena do fogo. Se fores, portanto, apresentar uma oferta sobre o altar e ali te recordares de que o teu irmão tem alguma coisa contra ti, deixa lá a tua oferta diante do altar, e vai primeiro reconciliar-te com o teu irmão; depois, volta para apresentar a tua oferta. Com o teu adversário mostra-te conciliador, enquanto caminhardes juntos, para não acontecer que ele te entregue ao juiz e este à guarda e te mandem para a prisão. Em verdade te digo: Não sairás de lá até que pagues o último centavo.»

Comentário: Fr. Thomas LANE (Emmitsburg, Maryland, Estados Unidos)

Deixa lá a tua oferta diante do altar, e vai primeiro reconciliar-te com o teu irmão.

Hoje, o Senhor, ao falar-nos do que se passa nos nossos corações, incita-nos à conversão. O mandamento diz-nos «Não matarás» (Mt 5,21), mas Jesus recorda-nos que existem outras formas de matar a vida nos outros. Podemos fazê-lo abrigando no nosso coração uma ira excessiva contra eles, ou tratando-os sem respeito e de forma insultuosa («imbecil»; «louco»: cf. Mt 5,22).

O Senhor chama-nos a ser pessoas íntegras: «Deixa lá a tua oferta diante do altar, e vai primeiro reconciliar-te com o teu irmão» (Mt 5,24), querendo dizer-nos que a fé que professamos quando celebramos a Liturgia deve influenciar a nossa vida quotidiana e determinar a nossa conduta. Portanto, Jesus pede-nos que nos reconciliemos com os nossos inimigos. Um primeiro passo no caminho da reconciliação é orar pelos nossos inimigos, como Jesus solicitou. E se tal nos parecer difícil, então será bom recordar imaginando, na nossa mente, Jesus Cristo morrendo por aqueles de quem não gostamos. Se fomos seriamente prejudicados por outros, oremos para que cicatrizem as recordações dolorosas e para que obtenhamos a graça de os perdoarmos. E, de cada vez que orarmos, peçamos ao Senhor que revisite conosco o tempo e o lugar da ferida - substituindo-a com o Seu amor— para que assim sejamos livres para poder perdoar.

Nas palavras de Bento XVI, «se queremos apresenta-nos perante Ele, também devemos pôr-nos a caminho no sentido de nos encontrarmos uns com os outros. Para isso, é necessário aprender a grande lição do perdão: não deixar que o ressentimento se instale no nosso coração, mas sim abri-lo à magnanimidade da escuta do outro, abri-lo à compreensão, à eventual aceitação dos seus pedidos de desculpa e à generosa oferta dos nossos próprios».

Comentário: Rev. D. Joaquim MESEGUER García (Sant Quirze del Vallès, Barcelona, Espanha)

Se a vossa justiça não superar a dos doutores da Lei e dos fariseus, não entrareis no Reino do Céu.

Hoje, Jesus chama-nos a irmos para lá da legalidade: «Porque Eu vos digo: Se a vossa justiça não superar a dos doutores da Lei e dos fariseus, não entrareis no Reino do Céu» (Mt 5,20). A Lei de Moisés aponta o mínimo necessário para garantir a convivência; mas o cristão, instruído por Jesus Cristo e cheio do Espírito Santo, deve procurar superar este mínimo para chegar ao máximo do amor possível. Os doutores da Lei e os fariseus eram cumpridores estritos dos mandamentos; ao rever a nossa vida, qual de nós poderia dizer o mesmo? Andemos com cuidado, por tanto, para não menosprezar sua vivência religiosa.

O que hoje Jesus nos ensina é a não darmos como certo o fato de que se cumprirmos esforçadamente determinados requisitos possamos reclamar méritos a Deus, como faziam os doutores da Lei e os fariseus. De preferência, devemos por a ênfase no amor a Deus e aos nossos irmãos, amor esse que nos leva para lá da Lei fria e a reconhecer as nossas faltas numa conversão sincera.

Há quem diga: “Eu sou bom porque não roubo, nem mato, nem faço mal a ninguém”; mas Jesus diz-nos que isto não é suficiente, pois existem outras formas de roubar ou matar. Podemos matar as ilusões do outro, podemos menosprezar o próximo, anulá-lo ou deixá-lo marginalizado, podemos ter-lhe rancor; e tudo isto é matar, não com uma morte física, mas com uma morte moral e espiritual.

No decorrer da nossa vida podemos encontrar muitos adversários, mas o pior de todos eles somos nós próprios quando nos afastamos do caminho do Evangelho. Por isso mesmo, na procura da reconciliação com os irmãos, devemos, em primeiro lugar, estar reconciliados conosco. Santo Agostinho diz-nos: «Enquanto fores adversário de ti próprio, a Palavra de Deus será tua adversária. Torna-te amigo de ti mesmo e te reconciliarás com ela».

Reflexões de Frei Carlos Mesters, O.Carm.

V Centenário do Nascimento (1515-2015)
* O texto do evangelho de hoje faz parte de uma unidade maior de Mt 5,20 até Mt 5,48. Nela Mateus mostra como Jesus interpreta e explica a Lei de Deus. Por cinco vezes ele repete a frase: "Antigamente foi dito, mas eu vos digo!" (Mt 5,21. 27.33.38.43). Um pouco antes, ele tinha dito: “Não pensem que vim acabar com a Lei e os Profetas. Não vim acabar, mas sim dar-lhes pleno cumprimento (Mt 5,17). A atitude de Jesus frente à lei é, ao mesmo tempo, de ruptura e de continuidade. Ele rompe com as interpretações erradas, mas mantém firme o objetivo que a lei quer alcançar: a prática da justiça maior que é o Amor.

* Mateus 5,20: A justiça maior que a justiça dos fariseus. Este primeiro versículo dá a chave geral de tudo que segue no conjunto de Mt 5,20-48. A palavra Justiça aparece nenhuma vez em Marcos, e sete vezes no Evangelho de Mateus (Mt 3,15; 5,6.10.20; 6,1.33; 21,32). Isto tem a ver com a situação das comunidades para as quais Mateus escreve. O ideal religioso dos judeus da época era "ser justo diante de Deus". Os fariseus ensinavam: "A pessoa alcança a justiça diante de Deus quando chega a observar todas as normas da lei em todos os seus detalhes!" Este ensinamento gerava uma opressão legalista e trazia muita angústia para as pessoas, pois era muito difícil alguém observar todas as normas (cf. Rom 7,21-24). Por isso, Mateus recolhe palavras de Jesus sobre a justiça mostrando que ela deve ultrapassar a justiça dos fariseus (Mt 5,20). Para Jesus, a justiça não vem do que eu faço por Deus observando a lei, mas sim do que Deus faz por mim, acolhendo-me como filho ou filha. O novo ideal que Jesus propõe é este: "Ser perfeito com o Pai do céu é perfeito!" (Mt 5,48). Isto quer dizer: eu serei justo diante de Deus, quando procuro acolher e perdoar as pessoas da mesma maneira como Deus me acolhe e me perdoa, apesar dos meus defeitos e pecados.

* Por meio de cinco exemplos bem concretos, Jesus vai mostrar como fazer para alcançar esta justiça maior que supera a justiça dos escribas e dos fariseus. Como veremos, o evangelho de hoje traz o primeiro exemplo relacionado com a nova interpretação do quinto mandamento: Não matarás! Jesus vai revelar o que Deus queria quando entregou este mandamento a Moisés.

* Mateus 5,21-22: A lei diz "Não matarás!" (Ex 20,13) - Para observar plenamente este quinto mandamento não basta evitar o assassinato. É preciso arrancar de dentro de si tudo aquilo que de uma ou de outra maneira possa levar ao assassinato, como por exemplo, raiva, ódio, xingamento, desejo de vingança, exploração, etc.

* Mateus 5,23-24: O culto perfeito que Deus quer. Para poder ser aceito por Deus e estar unido a ele, é preciso estar reconciliado com o irmão, com a irmã. Antes da destruição do Templo, no ano 70, quando os judeus cristãos participavam das romarias a Jerusalém para fazer suas ofertas no altar e pagar suas promessas, eles sempre se lembravam desta frase de Jesus. Nos anos 80, no momento em que Mateus escreve, o Templo e o Altar já não existem. Tinham sido destruídos pelos romanos. A própria comunidade e a celebração comunitária passam ser o Templo e o Altar de Deus.

* Mateus 5,25-26: Reconciliar. Um dos pontos em que o Evangelho de Mateus mais insiste é a reconciliação. Isto mostra que, nas comunidades daquela época, havia muitas tensões entre grupos radicais com tendências diferentes e até opostas. Ninguém queria ceder diante do outro. Não havia diálogo. Mateus ilumina esta situação com palavras de Jesus sobre a reconciliação que pedem acolhimento e compreensão. Pois o único pecado que Deus não consegue perdoar é a nossa falta de perdão aos outros (Mt 6,14). Por isso, procure a reconciliação, antes que seja tarde demais!

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