«Não vos inquieteis
com o dia de amanhã»
Não
vos inquieteis… confiai! Amai! Contemplai e bendizei! A exortação que Mateus
coloca na boca de Jesus dirige-se particularmente às pessoas em risco,
preocupadas pelo presente e pelo futuro, preocupadas com a sua subsistência e
com as suas vidas. Jesus convida a que nos coloquemos nas mãos de Deus, que é
ternura e compaixão para com todas as suas criaturas. Com a mente e o coração
postos na generosidade de Deus, o que realmente importa, o prioritário, é a
busca do Reino de Deus e a sua justiça. Esta deve ser a preocupação fundamental
do seguidor de Jesus. É um chamamento a ser como o próprio Deus: Justo, terno,
compassivo, solidário, amante dos pobres e frágeis; por isso, é tarefa de todos
expressar ao mundo, por meio do testemunho e da fraternidade, a ternura de
nosso Deus Pai-Mãe da vida.
Evangelho
segundo S. Mateus (6, 24-34) - «Naquele
tempo, disse Jesus aos seus discípulos: “Ninguém pode servir a dois senhores,
porque ou há de odiar um e amar o outro, ou se dedicará a um e desprezará o
outro. Vós não podeis servir a Deus e ao dinheiro. Por isso vos digo: “Não vos
preocupeis, quanto à vossa vida, com o que haveis de comer, nem, quanto ao
vosso corpo, com o que haveis de vestir. Não é a vida mais que alimento e o
corpo mais que o vestuário? Olhai para as aves do céu: Não semeiam nem ceifam
nem recolhem em celeiros; o vosso pai celeste as sustenta. Não valeis vós muito
mais do que elas? Quem de entre vós, por mais que se preocupe, pode acrescentar
um só côvado à sua estatura? E porque vos inquietais com o vestuário? Olhai
como crescem os lírios do campo: não trabalham nem fiam; mas eu vos digo: nem
Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como um deles. Se Deus assim veste a
erva do campo, que hoje existe e amanhã é lançada ao forno, não fará muito mais
por vós, homens de pouca fé? Não vos inquieteis, dizendo: “Que havemos de
comer? Que havemos de beber? Que havemos de vestir?” Os pagãos é que se
preocupam com todas estas coisas. Bem sabe o vosso Pai celeste que precisais de
tudo isso. Procurai primeiro o reino de Deus e a sua justiça, e tudo mais vos
será dado por acréscimo. Portanto, não vos inquieteis com o dia de amanhã,
porque o dia de amanhã tratará das suas inquietações. A cada dia basta o seu
cuidado.”
Meditação:
«Naquele tempo, disse
Jesus aos seus discípulos: “Ninguém pode servir a dois senhores, porque ou há de
odiar um e amar o outro, ou se dedicará a um e desprezará o outro. Vós não
podeis servir a Deus e ao dinheiro. »
Jesus
diz-nos, com palavras muito claras, qual é a opção fundamental do discípulo,
seu seguidor: ou Deus, ou o resto. Não dá hipótese, nem espaço, a outras
palavras, a outras possibilidades: ou há de odiar um e amar o outro, ou se
dedicará a um e desprezará o outro. A nossa experiência de vida assim no-lo
ensina também. Nós escolhemos servir a Deus. Somente a Deus. Tudo o resto
passa: só Deus basta!
Jesus
convida-nos a fazer uma escolha. E o seu convite tem um vigor extremo. Nós já
compreendemos que o Reino de Deus é incompatível com o reino do dinheiro, das
coisas, do que passa. No Seu Reino, não se vende nada. A vida é gratuidade,
como o ar, como a água. E quem recebe este Reino gratuitamente, deve também
dá-lo grátis. No momento das tuas decisões qual é o critério da tua opção: o da
entrega e gratuidade ou o do constante ganho (nas relações, nas amizades, na
vida partilhada de cada dia)? Que podes ainda fazer para servir apenas o Deus
da nossa aliança?
«Por isso vos digo:
“Não vos preocupeis, quanto à vossa vida, com o que haveis de comer, nem,
quanto ao vosso corpo, com o que haveis de vestir. Não é a vida mais que
alimento e o corpo mais que o vestuário? Olhai para as aves do céu: Não semeiam
nem ceifam nem recolhem em celeiros; o vosso pai celeste as sustenta. Não
valeis vós muito mais do que elas? »
Quem
tem a Deus tem tudo, quem não tem Deus tudo lhe falta. E por isso procura
insistentemente acumular, procurar, adquirir, consumir, ter. E quando pensa
estar saciado, eis que o tudo que tem lhe faz perceber o quanto mais ainda pode
ter: é uma fuga para a frente na insaciabilidade do ser humano. E isso quando
somos a primeira de todas as criaturas de Deus em amor e dignidade… Diante de
Deus, valemos muito mais que as coisas. E a Providência do Senhor é
imprevisível!
O
ser intrínseco do homem versus Deus na sua generosidade e entrega. Tendemos à
procura de nós, no muito saciar das nossas fomes, quando na Providência de Deus
se sacia o interior mais profundo que alimenta e dá vida em abundância e para
sempre. Dando dignidade à criação e plenitude à humanidade tão amada e querida.
Unindo dignidade à eternidade. Unindo Deus ao nosso querer. Unindo o Todo ao
Tudo para nós.
«Quem de entre vós,
por mais que se preocupe, pode acrescentar um só côvado à sua estatura? E
porque vos inquietais com o vestuário? Olhai como crescem os lírios do campo:
não trabalham nem fiam; mas eu vos digo: nem Salomão, em toda a sua glória, se
vestiu como um deles. »
Quando
se toca o tempo da vida e da existência percebemos que as vaidades são inúteis.
Quando pensamos poder acrescentar um minuto que seja ao nosso viver, percebemos
que é bem outro quem chama, quem dispõe do nosso tempo, do que somos, quem
marca o tempo da nossa páscoa. Então, é bom que vivamos contemplando a
simplicidade dos lírios do campo (planta que nasce livremente de cuja flor é de
grande beleza). E, na simplicidade, somos bem-aventurados!
Vaidade
das vaidades, tudo é vaidade – diz o livro de Qohelet – qual vapor que se
dissipa no ar. A nossa vaidade maior é compreendermos como o amor de Deus nos
transforma, nos faz caminhar no rumo certo, nos faz generosos e atentos ao que
se passa ao nosso lado. A alternativa
ao “tudo é vaidade” é o enriquecer-se diante de Deus: fazer o bem ao próximo e
para a vida eterna, incenso elevado a Deus com sentido de eternidade. Contemplar
a grandeza de Deus que atua no mais simples, no mais silencioso, no mais
pequeno dos tempos, das horas, da vida. Se assim é, porque nos inquietamos com
tantas coisas inúteis? Carreira, status, poder, exterioridades? Se o que mais
importa é o que levamos dentro?
«Se Deus assim veste a
erva do campo, que hoje existe e amanhã é lançada ao forno, não fará muito mais
por vós, homens de pouca fé? Não vos inquieteis, dizendo: “Que havemos de
comer? Que havemos de beber? Que havemos de vestir?” Os pagãos é que se
preocupam com todas estas coisas. »
Homens
de pouca fé! Não nos inquietemos. Não devemos “preocupar-nos”, porque
preocupar-se e inquietar-se é danoso. Devemos “ocupar-nos” das coisas que
realmente interessam. Que havemos de…? As coisas das quais nos devemos ocupar,
ocupam realmente todo o nosso ser, todo o nosso tempo, todo o nosso espaço,
porque são o motor da nossa fé, o centro do nosso existir, a confiança plena
que depositamos em Deus.
De
Deus somos. N’Ele vivemos, existimos e nos movemos. Dele dependemos com todo o
nosso amor. A imagem dos pássaros do céu, dos lírios e da erva do campo é um
grande elogio à pobreza que se confia, ou totalmente confiada ao amor de Deus e
por isso transformada em beleza e sabedoria. Que havemos de fazer para aumentar
a nossa fé e confiança em Deus? Conjugar os verbos que nos transformam em amor!
«Bem sabe o vosso Pai
celeste que precisais de tudo isso. Procurai primeiro o reino de Deus e a sua
justiça, e tudo mais vos será dado por acréscimo. »
Deus
conhece as necessidades dos que O procuram e “pensa” em nós. Se Deus já pensa
em nós, porque é que pensamos tanto em nós próprios? Se tendo a Deus, tudo será
dado por acréscimo, porque não procurar o que mais necessitamos que é o
testemunho do seu amor?
Procurai
o reino de Deus. Procurai! É realmente neste contínuo procurar, semana após
semana, evangelho após evangelho, que nós intuímos e descobrimos o sentido do
nosso existir. Sem nunca o possuir. Porque infinito no seu dom, na sua grandeza,
no seu fim. Procurar não significa compreender tudo, mas estar disponíveis para
todos os dias aprender. A viver. A amar. A solução para o excesso de
preocupação é uma só: o abandono em Deus que não nos abandona nunca. Somos nós
que teimamos em não nos abandonarmos n’Ele…
«Portanto, não vos
inquieteis com o dia de amanhã, porque o dia de amanhã tratará das suas
inquietações. A cada dia basta o seu cuidado. »
A
ansiedade é um sentimento muito presente no nosso tempo: a preocupação por mil
coisas afastam-nos da temperança e da acalmia que a presença em Deus supõe e
cuja paz beneficiamos. Jesus mostra-nos que o dia de amanhã é um caminho a
percorrer, com certeza, mas que é necessário viver intensamente o hoje, tomando
cada dia o seu cuidado para um amanhã sereno e tranquilo.
Jesus
convida-nos a viver na liberdade de cada dia; quer homens e mulheres livres,
sem viverem a escravatura da ansiedade, do stress, do afã, sem viverem a
escravatura dos nossos medos: medo dos juízos dos outros, medo de engordar e
ficar feios, medo de não estar na moda, medo de ser colocado de lado, medo de
morrer, medo do amanhã. Vivemos sob grandes ameaças: as ameaças que nós
próprios procuramos. Luther King no final de um sermão dizia: “O medo bateu à
minha porta. Responderam o amor e a fé. E, quando abri a porta, não era
ninguém...”. Nós vivemos com mil coisas: a casa cheia, os armários a abarrotar
de coisas inúteis, a vida mil ocupada. E no entanto vivemos sem nos
preocuparmos do que mais importa: respondermos com amor e fé ao que o amanhã
nos oferecer...
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