sábado, 22 de junho de 2013

Formação Carmelita

ANIMAÇÃO CRISTÃ DO MUNDO

Do roteiro formativo da OTC de Faro, Portugal

   1. Pelo Batismo cada cristão participa, graças ao Espírito Santo, da missão sacerdotal, profética e real de Cristo. A finalidade primordial desta missão, confiada pelo Senhor à sua Igreja, «é tornar todos os homens participantes da redenção salvadora e, por eles, ordenar efetivamente a Cristo o universo inteiro, dilatando pelo mundo o seu reino para glória de Deus Pai» (AA 2; cf. ROTC 46). Ora, a glória de Deus é o homem vivo (S. Ireneu), regenerado por Cristo a fim de se tornar «participante da natureza divina» (cf. 2 Pd 1,4) e gozar da visão de Deus, pelo dom «da íntima união com Deus e da unidade de todo o gênero humano em Cristo» (LG 1).
    Todos os cristãos – hierarquia, consagrados e leigos – são chamados a esta obra e responsáveis por esta ela. Por isso toda a vocação cristã é, por sua própria natureza, vocação apostolado. Esta vocação é exercida segundo o estado, índole, formação, capacidade, dons e possibilidades de cada um, tendo em conta o seu próprio ofício, as exigências da época e as necessidades do meio onde vive. Se a hierarquia (bispos, presbíteros e diáconos) tem a missão de ensinar, orientar e santificar a Igreja, os leigos são chamados, em estreita união com o Senhor, a participar também na sua obra, evangelizando todos os homens e animando todas as realidades temporais com o Espírito de Deus, a fim de tudo conduzir a Cristo.
    A característica particular do terceiro leigo carmelita é, deste modo, a secularidade, ou seja, o âmbito da sua missão é o de informar as realidades temporais onde atua (família, trabalho, sociedade, política, relações internacionais, saúde, educação, cultura, artes, ciência, investigação, tecnologia, etc.) com o Evangelho como luz, sal e fermento, segundo o carisma do Carmelo. Diz a ROTC 28: «Todos os carmelitas estão no mundo, em certo sentido, mas a vocação dos leigos é a de transformar o mundo secular. Portanto, os terceiros como leigos comprometidos, caracterizam-se pela secularidade, sendo chamados a tratar corretamente com as coisas do mundo e a ordená-las segundo a vontade de Deus. Vivem no século no meio do povo, dedicados às ocupações e ofícios do mundo, nas condições ordinárias e peculiares da família e da sociedade. São, portanto, convidados por Deus a contribuir para a santificação do mundo, empenhando-se no seu trabalho com o espírito do Evangelho e animados pela espiritualidade carmelita como guia. A sua vocação é iluminar e ordenar as atividades do mundo, de modo que se realizem segundo Cristo e assim sejam o louvor da glória do Criador».

    2. Esta obra é possível, pois, embora vivamos numa sociedade que se pretende construir «sem Deus e sem Cristo», dando mesmo por vezes a impressão de que se deve organizar «contra Deus e contra Cristo», se quer fazer prevalecer a sua liberdade e a autonomia das realidades temporais. Por isso o Concílio Vaticano II, na constituição dogmática Gaudium et spes, diz: «Muitos dos nossos contemporâneos parecem temer que a íntima ligação entre a atividade humana e a religião constitua um obstáculo para a autonomia dos homens, das sociedades ou das ciências. Se por autonomia das realidades terrenas se entende que as coisas criadas e as próprias sociedades têm leis e valores próprios, que o homem irá gradualmente descobrindo, utilizando e organizando, é perfeitamente legítimo exigir tal autonomia. Para além de ser uma exigência dos homens do nosso tempo, trata-se de algo inteiramente de acordo com a vontade do Criador. Pois, em virtude do próprio fato da criação, todas as coisas possuem consistência, verdade, bondade e leis próprias, que o homem deve respeitar, reconhecendo os métodos peculiares de cada ciência e arte. Por esta razão, a investigação metódica em todos os campos do saber, quando levada a cabo de um modo verdadeiramente científico e segundo as normas morais, nunca será realmente oposta à fé, já que as realidades profanas e as da fé têm origem no mesmo Deus… Se, porém, com as palavras “autonomia das realidades temporais” se entende que as criaturas não dependem de Deus e que o homem pode usar delas sem as ordenar ao Criador, ninguém que acredite em Deus deixa de ver a falsidade de tais afirmações. Pois, sem o Criador, a criatura não subsiste. De resto, todos os crentes, de qualquer religião, sempre souberam ouvir a sua voz e manifestação na linguagem das criaturas. Antes, se se esquece Deus, a própria criatura obscurece-se» (GS 36). Na mesma linha pronuncia-se a ROTC 29,: «Não deve haver conflito entre o bem temporal e a realização do Reino de Deus, uma vez que tanto a ordem natural, como a ordem espiritual derivam de Deus».

    3. No entanto, dada a complexidade cada vez maior das realidades temporais, o ritmo acelerado das descobertas científicas e invenções tecnológicas, assim como a natureza profunda das transformações que caracterizam o nosso tempo, bem como o fato de o coração humano estar ferido pelo pecado, não sendo de fato «contra os homens que temos de lutar, mas contra os Principados, as Autoridades, os Dominadores deste mundo de trevas, e contra os espíritos do mal» (Ef 6,12), que procuram desviar as sociedades e os povos de Cristo e do seu Evangelho, torna-se necessário não só um sábio discernimento, sólida e profunda formação, um constante diálogo e cooperação com os homens de boa vontade, mas também uma genuína santidade de vida. Esta só é possível através de uma união vital com Cristo, constantemente alimentada, apoiada e fortalecida pela vida comunitária no seio da Igreja.
    Assim, se por um lado a ROTC 29 continua afirmando que «todavia existe o risco de se fazer um mau uso dos bens temporais. Por essa razão devem perseguir o ideal de orientar as descobertas da ciência e da tecnologia para o aperfeiçoamento material e espiritual da vida humana», a mesma Regra no nº 49 mostra o contributo específico que o terceiro carmelita – e com ele todo o Carmelo – devem dar nesta mesma missão, levando os homens e mulheres do nosso tempo não só a tudo orientarem para Deus por meio de Cristo, mas também a levar a cabo esta obra a partir de uma profunda experiência da união com Deus: «Os terceiros reconhecem e mostram com a vida que as atividades temporais e o próprio trabalho material são participações na obra sempre criadora e transformadora do Pai, verdadeira oferta de serviço aos irmãos e autêntica promoção humana. Testemunhas num mundo que não assimila plenamente ou, rejeita integralmente a união intima e vital com Deus na sua realidade quotidiana, conhecem ou partilham com simpatia as suas esperanças e as suas aspirações mais intimas, porque, chamados a ser “sal da terra” e “luz do mundo”, anunciam ao povo a ciência da salvação (Lc 1,77)».

    4. O apostolado do terceiro carmelita será tanto mais fecundo, quanto mais estiver vitalmente unido a Cristo: «Quem permanece em Mim e Eu nele, este dá muito fruto, porque sem mim nada podeis fazer!» (Jo, 15,5). Deve, pois, existir uma verdadeira coerência entre palavras e obras e uma profunda unidade de vida no terceiro carmelita, homem e mulher de Deus, imbuído de um profundo espírito de oração, sempre à escuta da Palavra de Deus, sempre disponível para segui-la e sempre pronto para pô-la em prática. Esta união vital com Deus depende basicamente do modo como participa e se nutre da Liturgia e dos Sacramentos, como já vimos.
    Os cuidados da família, o exercício da profissão, as ocupações eclesiais, sociais e humanitárias, os tempos de trabalho, de convívio e de lazer, nada o deve impedir de buscar e aprofundar esta união vital com o Senhor em todas as circunstâncias da vida, que ele vive com um profundo espírito de fé, esperança e caridade. Guiado pelo Espírito de Cristo, o leigo carmelita age como fermento na massa, santificando-se levando Cristo aos homens, dando-lhes testemunho de vida cristã pela sua fé inabalável, pela esperança imbatível, pelo amor a toda prova.
    O leigo carmelita, pela sua própria vocação, santifica-se e leva os irmãos a santificarem-se a si mesmos e a todas as coisas, ordenando-as para Cristo e para Deus. Pela fé, ele encontra-se com Deus; "n'Ele vivemos, nos movemos e somos" (At. 17, 28); pela fé conseguimos ver Cristo nos irmãos; pela fé damos o devido valor às pessoas e às coisas; estas realidades, longe de serem obstáculos, constituem valioso auxílio para se chegar a Deus. Pela fé, o leigo carmelita dá o que pode de si mesmo pela expansão do Reino, anima e aperfeiçoa a ordem natural das coisas, é pessoa corajosa e vive da mesma fé, sempre reforçada pela esperança.
    Consequentemente o leigo carmelita é pessoa de caridade; ele não é clérigo, não é religioso, que vive enclausurado num convento; ele vive no mundo e no meio de seus negócios seculares ou temporais e terrenos, e é exatamente neste meio ambiente que ele vive segundo a caridade para com Deus, caridade esta que ele transfere sem nenhum egoísmo à caridade e prática de todo o bem a favor de seus irmãos.  Ele será pobre como Cristo, sem ambição nenhuma, sempre contente e satisfeito com o que Deus lhe deu e muito paciente nas provações; ele será sóbrio, fazendo bom uso dos bens que recebeu da prodigalidade do Pai, pensando muito seriamente nos irmãos que pouco ou nada têm e partilhando com eles de maneira pródiga e generosa, sem mesquinhez e regateio. Será humilde com Cristo, que nunca ambicionou as glórias vãs.
    Viver assim nos dias de hoje, quando há tantas aspirações de galgar os níveis, pondo-se sempre ao serviço do irmão, sincero, honesto e amigo de todos. Estando sempre voltado para Deus, é uma pessoa equilibrada, sabe o que quer na vida e sabe muito bem para que vive. É um verdadeiro apóstolo do e no próprio ambiente: na família, no trabalho, na Igreja, na sociedade; pois para isso foi chamado por Deus: para desenvolver a missão da Igreja e ser fermento cristão nas atividades temporais, nas quais se acha envolvido. Guiado pelo espírito evangélico, age como fermento na massa, levando Cristo aos homens, dando-lhes testemunho da vida cristã pela sua fé inabalável, esperança imbatível e amor a toda prova.

    O leigo carmelita, pela sua própria vocação, santifica-se e leva os irmãos a santificarem-se a si mesmos e a todas as coisas, ordenando-as para Cristo e para Deus. «Exortamos-vos, irmãos […]: Sede sempre alegres. Orai sem cessar. Em tudo dai graças, pois esta é a vontade de Deus a vosso respeito em Jesus Cristo. Não apagueis o Espírito. Não desprezeis as profecias. Examinai tudo, guardai o que é bom. Afastai-vos de toda a espécie de mal. Que o Deus da paz vos santifique totalmente, e todo o vosso ser – espírito, alma e corpo – se conserve irrepreensível para a vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo. Fiel é aquele que vos chama: Ele há de realizá-lo» (1 Ts 5,14-23).

Nenhum comentário:

Postar um comentário

DEIXE AQUI SEU SUA SUGESTÃO