PARTICIPANTES DA
MISSÃO DE CRISTO
Do Roteiro Formativo da OTV de Faro, Portugal.
«Eu
vim lançar o fogo sobre a terra e como quero que ele se ateie!» (Lc 12,49); «O amor de Cristo nos compele ao
pensar que um só morreu por todos… Ele morreu por todos, para que os que vivem,
não vivam mais para si mesmos, mas para Aquele que por eles morreu e
ressuscitou» (2 Cor 5,14s); «Em verdade, em verdade vos digo: quem crê
em mim fará também as obras que Eu faço e fará outras maiores, porque Eu vou
para o Pai» (Jo 14,12); «Aquele que diz que permanece nele, esse
deve também andar assim como Ele andou» (1 Jo 2,6)
1.
Vimos como a nossa vocação, enquanto cristãos batizados e enquanto Igreja, é
Cristo, passando todo o processo de conversão pela nossa conformação ao Senhor,
através de uma profunda união interior com Ele. Este chamamento, porém, não é
vão, mas tem sentido, ou seja, indica um rumo, aponta uma direção, conduz a uma
finalidade: a de ser continuadores da missão de Cristo.
A
ela referiu-se o próprio Senhor: «O meu alimento consiste em fazer a vontade
daquele que me enviou e levar à plena realização a sua obra» (Jo 4,34).
Que obra é essa? É a obra da salvação da humanidade (cf. Jo 3,16-17), mediante
a reconciliação do homem com Deus (2 Cor 5,18-20), a fim de em Cristo «congregar
na unidade os filhos de Deus que andam dispersos» (Jo 11,52).
É
precisamente esta obra, consumada por Cristo na cruz (cf. Jo 19,28 s), que é a
razão do Seu envio pelo Pai ao mundo, da Sua vinda e encarnação, numa palavra,
da Sua missão. Foi esta mesma missão que o Pai Lhe confiou, que Jesus, uma vez
consumada a obra da salvação da Sua parte e da parte de Deus (dimensão objetiva
ou oferta da salvação), por sua vez nos confia e quer prolongar através de nós,
membros do Seu Corpo, a fim de em nós, conosco e através de nós, levar a obra
do Pai à sua plena realização, fazendo com que cada pessoa dela se torne
beneficiário (dimensão subjetiva ou aceitação da salvação).
Foi
para continuarmos a sua missão como colaboradores seus (cf. 1 Cor 3,9; 2 Cor
6,1) que o Senhor nos deu o Seu Espírito, o Qual nos enriquece com os dons e
carismas que distribui por nós, tal como o vemos no dia de Páscoa: «Disse-lhes
Jesus: “Assim como o Pai me enviou, eu também vos envio”. Tendo dito isto,
soprou sobre eles e disse-lhes: “Recebei o Espírito Santo. A quem perdoardes os
pecados, ser-lhes-ão perdoados; e a quem lhos retiverdes, ser-lhes-ão retidos”
(Jo 20,21-23).
É
do chamamento a esta missão que decorre a necessidade de conversão e de
completa renovação da nossa vida pelo Espírito de Deus, a fim de nos unirmos e
conformarmos plenamente a Jesus Cristo, vivendo escondidos com Ele em Deus (cf.
Col 3,3), de modo que os nossos desejos e pensamentos, critérios e sentimentos,
gestos e palavras sejam de tal maneira seus que O deixemos passar e
transparecer neles, a ponto de podermos dizer com S. Paulo: «Já
não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim» (Gl 2,20).
2.
Todos e cada um de nós, cristãos, somos chamados a assumir e desempenhar a
nossa parte na missão de Cristo, isto é, a participar dela, cada qual segundo o
dom da graça que lhe foi concedida (cf. 1 Pd 4,10), não nos podendo eximir a
ela, sob a pena de cairmos no desprezo de nós mesmos e dos próprios homens: «Vós
sois o sal da terra; ora, se o sal vier a ser insípido, como lhe restaurar o
sabor? Para nada mais presta senão para, lançado fora, ser pisado pelos homens.
Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder uma cidade edificada sobre um
monte; nem se acende uma candeia para colocá-la debaixo do alqueire, mas no
candelabro, para que alumie a todos os que se encontram na casa. Assim brilhe
também
a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem
o vosso Pai que está nos céus» (Mt 5,13-16). No mesmo sentido devem ser
entendidas a parábola das minas e a dos talentos (Mt 25,14-30; Lc 19,11-27).
Por
isso a Regra afirma: «Pelo Batismo os leigos carmelitas tornam-se
participantes da missão de Jesus Cristo, dando-lhe continuidade na Igreja,
tornando-se assim como que “uma humanidade de acréscimo”, que se transforma em
“louvor da sua glória” (cf. 1 Cf. B. Isabel da Trindade), Ó meu
Deus, Trindade que eu adoro, onde começa por invocar o Espírito Santo para que
esta vocação se realize: «Ó Fogo consumidor, Espírito de amor, “descei sobre
mim” (cf. Lc 1,35), a fim de que na minha alma se faça como que
uma encarnação do Verbo e que eu seja para Ele como que uma humanidade de
acréscimo na qual Ele renove todo o seu mistério» (cf. Obras completas,
Avessadas 2008, 190s e Ef 1,12.14). Aos seculares é reconhecida “uma
participação própria e absolutamente necessária” (AA 1) nesta
missão» (RTOC 24). A missão na qual se prolonga a missão de Cristo, é
própria de cada terceiro, sendo, por isso mesmo, indeclinável, intransferível, inalienável
e inadiável.
3.
Porque participa da missão de Cristo, em virtude do Batismo e graças à unção do
Espírito Santo recebido, o terceiro também participa no tríplice ministério de
sacerdote, profeta e rei do Senhor em que aquela se articula. É a cada uma
destas dimensões que se referem os três números seguintes da Regra.
(1)
«Em
virtude do sacerdócio batismal e dos carismas recebidos, os seculares
carmelitas são chamados à edificação da comunidade eclesial (AA 2-3)
participando “consciente, ativa e fecundamente” (SC 20) na
vida litúrgica da comunidade e empenhando-se para que a celebração se prolongue
na vida concreta. Isto quer dizer que os frutos de seu encontro com Deus se
manifestam em todas as suas atividades, orações e iniciativas apostólicas, e
também na vida conjugal e familiar, no trabalho quotidiano, no repouso
espiritual e corporal e até mesmo nas próprias privações da vida, quando
suportadas com paciência (cf. LG 34) e – como nos ensinam os santos
carmelitas – acolhidas de coração aberto» (ROTC 25). O terceiro
participa do sacerdócio de Cristo, pois o sacerdote é aquele que tem acesso a
Deus e se encontra com Ele, representando o povo e levando o povo para junto de
Deus, sendo, ao mesmo tempo, aquele que leva Deus ao povo. O terceiro imita
assim Maria na visitação, em Belém e na apresentação de Jesus no Templo.
(2)
O terceiro também participa no múnus profético de Jesus Cristo, na medida em
que, como Maria, escuta a Palavra de Deus – que lhe chega em gestos,
acontecimentos, pessoas e palavras –, a acolhe com fé, a guarda e medita no
coração com amor, os discerne e lê, caminhando, cheio de esperança, à sua luz,
que deixa que se irradie sobre todos, transmitindo-lhes a Palavra e apontando a
meta final do Reino de Deus: «Com a participação no múnus profético de
Cristo e da Igreja, o terceiro empenha-se, nas diversas profissões e atividades
seculares, por assimilar o Evangelho na fé, anunciando-o por meio de suas
obras. O seu empenho chega ao ponto de denunciar o mal com coragem e sem
vacilar (cf. CfL 14). Além disso, é chamado a participar seja no
sentido da fé sobrenatural da Igreja, que não pode errar em matéria de fé (LG
12), seja
na graça da Palavra (cf. At 2,17-18; At 9,10; CfL 14) » (ROTC 26).
(3)
Porque unido a Cristo e animado pelo amor, o secular carmelita, animado pelo
Espírito, coopera com Ele na grande obra de reconciliação da humanidade «segundo
a riqueza da sua graça, que Ele derramou abundantemente sobre nós,
infundindo-nos toda sabedoria e prudência, dando-nos a conhecer o mistério da
sua vontade, conforme o beneplácito que n’Ele lhe aprouve tomar para levar o
tempo à sua plenitude: a de em Cristo recapitular todas as coisas, as que estão
nos céus e as que estão na terra» (Ef 1,7-10) de modo que todas as
realidades fiquem permeado pela presença de Cristo e, renovadas pela Sua graça,
nele encontrem a raiz, fonte, unidade, coesão e plenitude para a qual foram
criadas, de modo a que Cristo seja tudo em todos (Col 3,11): «Pela
sua pertença a Cristo, Senhor e Rei do universo, o terceiro participa de seu
múnus real pelo qual é chamado ao serviço do Reino de Deus e à sua expansão na
história. A realeza de Cristo implica, antes de tudo, um combate espiritual
para vencer em nós mesmos a tirania do pecado (cf. Rm 6,12). Mediante
o dom de nós mesmos, empenhamo-nos em servir, na justiça e na caridade, o
próprio Jesus presente em todos os irmãos e irmãs, sobretudo nos pequeninos (cf.
Mt 25,40) e marginalizados. Isto significa dar à criação todo o seu valor originário.
Ao conduzir as criaturas ao verdadeiro bem da humanidade com uma atividade fruto
da vida de graça, o terceiro participa no exercício do poder com o qual Jesus
Ressuscitado atrai a si todas as coisas (cf. CfL 17)» (ROTC 27). Imita
assim a Virgem Maria nas bodas de Caná, que conduz todos a seu Filho Jesus, ensinando-os
a caminhar à Sua luz, experimentando a fecundidade da Sua palavra: «Fazei
tudo o que Ele vos disser» (Jo 2,5).
Só
assim, cheio de zelo como Elias, levando pessoalmente a cabo, em comunhão com
os irmãos, a missão que o Senhor lhe confia enquanto instrumento de comunhão e
de reconciliação (cf.Mal 4,5s), o terceiro carmelita, vive realmente em
obséquio de Jesus Cristo, servindo-o de coração puro e boa consciência, repleto
do Espírito Santo, à imitação de Maria, nossa Irmã e nossa Mãe.
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