17 DE AGOSTO
PREPARANDO-NOS PARA A SOLENIDADE DA
ASSUNÇÃO DE NOSSA SENHORA
O Senhor só esteve três dias no
sepulcro, logo ressuscitou e subiu aos Céus.
A morte da Senhora mais parece
também um sono breve. E é por isso que lhe chamam "dormitio",
dormição. Antes de a corrupção lhe poder tocar no corpo imaculado, Deus
ressuscitou-A e glorificou-A nas Céus. A dormição, ressurreição e assunção da
Virgem SS formam o tríplice objeto da festa. Não tendo o pecado penetrado nunca
na Sua alma puríssima, era conveniente que o Seu corpo, isento de toda a mancha
e do qual o Verbo se dignou incarnar, não chegasse a sofrer a corrupção do
túmulo.
A 1º de Novembro de 1950, o Santo
Padre Pio XII definiu o dogma da Assunção as SS Virgem Maria. Proclamava assim
solenemente que a crença segundo a qual Maria, ao fim da vida terrestre, foi
levada em corpo e alma à glória do Céu, faz realmente parte do depósito da fé,
recebido dos Apóstolos. "Bendita entre todas as mulheres", em razão
da Sua maternidade divina, a Virgem Imaculada, que desde a Sua Conceição tivera
o privilégio de ser isenta do pecado original, não devia conhecer a corrupção
do túmulo.
Para evitar qualquer dado
impreciso, o Papa absteve-se inteiramente de determinar o modo e as
circunstâncias de tempo e lugar em que a Assunção deveria ter-se realizado:
somente o fato da Assunção, em corpo e alma, à glória do Céu, constitui o
objeto da definição. Aliás, um dos traços mais marcantes e autênticos do
autêntico Catolicismo é este: nele, ainda quando não se têm os instrumentos
teológico-filosóficos necessários para elucidar de todo uma questão, um senso
especial de prudência impede que se dê o passo derradeiro para o abismo.
Também a Missa, se contenta em
por em evidência a Assunção em si mesma com suas conveniências teológicas. Ela
vê Maria glorificada na Mulher descrita no Apocalipse, na Filha do Rei vestida
num manto de ouro do Salmo 44, na Mulher que, com seu Filho, será a inimiga
vitoriosa do demônio, do Gênesis. Aplica-se os louvores cantados a Judite
triunfante, e, sobretudo, vê a Assunção o coroamento de todas as glórias que
procedem da maternidade divina e que Maria cantou ela mesma no seu Magnificat.
As orações fazem-nos pedir a Deus a graça de podermos, como a SS Virgem, estar
continuamente voltados para as coisas do Alto, esperar a ressurreição feliz e
partilhar da sua glória no Céu.
Na liturgia encontra-se o culto
da Assunção desde o século VI no Oriente. Em Jerusalém, comportava uma
procissão ao túmulo da Virgem. Esta procissão estendeu-se à Constantinopla. Em
Roma, do século VII ao XVI constituía uma das "procissões de ladainhas"
e tinha lugar na basílica de Santa Maria Maior.
São Jerônimo afirma que Maria
subiu ao Céu no dia 18 das calendas de Setembro [15 de Agosto]: "Se alguns
dizem que quem ressuscitou na mesma época que Cristo conheceu a Ressurreição
perpétua, e se alguns acreditam que João, o guardião da Virgem, teve sua carne
glorificada e desfruta da alegria celeste ao lado do Cristo, por que não
acreditar com mais forte razão que o mesmo acontece com a mãe do Salvador?
Aquele que disse: "Honre seu pai e sua mãe" (Êxodo 20, 12), e
"Não vim destruir a lei, mas cumpri-la" (Mateus 5, 17), certamente
honrou Sua mãe acima de todas as coisas, e por isso não duvidamos que o mesmo
aconteceu com a bem-aventurada Maria?.
S. Agostinho não só afirma a
mesma coisa, como também dá três provas disto.
A primeira é que a carne de
Cristo e a da Virgem são apenas uma: "Já que a natureza humana está
condenada à podridão e aos vermes, e que Jesus foi poupado desse ultraje, a
natureza de Maria também está imune a isso, pois foi nela que Jesus assumiu a
sua natureza". A Segunda razão é a dignidade de seu corpo: "O trono
de Deus, o leito nupcial do Senhor, o tabernáculo de Cristo, deve estar onde
Ele próprio está, pois é mais digno conservar este tesouro no Céu do que na
Terra?". A terceira razão é a perfeita integridade de sua carne virginal. Ele
diz a propósito:
"Alegre-se, Maria, de uma
alegria indizível em seu corpo e em sua alma, em seu próprio filho Cristo, com
se próprio filho e por seu próprio filho, pois a pena da corrupção não deve ser
conhecida por aquela que não teve sua integridade corrompida quando gerou seu
filho. Será sempre incorrupta aquela que foi cumulada de tantas graças, que
viveu íntegra, que gerou vida em total e perfeita integridade, que deve ficar
junto daquele a quem carregou em seu útero, a quem gerou, aqueceu, nutriu à
Maria, mãe de Deus, nutriz escrava de Deus.
Por tudo isso não ouso pensar de
outra maneira, seria presunção dizer diferente.Ela foi levada ao Céu
alegremente, como diz o bispo e mártir S. Geraldo em suas homilias: "Neste
dia os Céus receberam a Bem-Aventurada Virgem alegremente com os Anjos
regozijando, os Arcanjos jubilando, os Tronos animando-se, as Dominações
celebrando-A em cânticos, os Principados unindo suas vozes, as Potências
acompanhando com seus instrumentos musicais, os Querubins e os Serafins
entoando hinos, e todos conduzindo até o elevado trono da divina Majestade
(Lucas I, 67).
Ela foi levada ao Céu
honrosamente, pois o próprio Jesus e toda a milícia celeste foram ao encontro
dela. Diz S. Jerônimo: "Quem pode imaginar a glória de que a rainha do
mundo foi cercada quando de sua passagem? Que afeto devoto dedicaram-lhe a
multidão de legiões celestes que foram ao seu encontro! Como eram belos os
cânticos que a acompanhavam até o seu trono! Que fisionomia tranqüila, que
rosto sereno, que olhar elevado quando do braço de seu divino filho que a
exaltava acima de todas as criaturas!
Acredito que neste dia a milícia
dos Céus foi festivamente encontrar a mãe de Deus cercando-a de imensa luz e
conduzindo-a com loas e cânticos até o trono de Deus. A milícia da Jerusalém
celeste estremeceu de inefável alegria, de indizível prazer, de imensa júbilo.
Essa festa, que acontece apenas uma vez ao ano para nós, é ininterrupta nos
Céus, com o próprio Salvador estando com ela durante toda a festa e colocando-a
com alegria junto dele no trono. Se fosse diferente, não teria cumprido sua
própria lei que diz: "Honre seu pai e sua mãe".
O bem-aventurado S. Geraldo
mostra em sua homilias o quanto ela foi celebrada na glória celeste:
"Somente o Senhor Jesus Cristo poderia engrandecê-la com o fez, para que
ela recebesse da própria majestade louvor e honra s, rodeada pelos
coros angélicos, cercada pelas tropas arcangélicas, acompanhada pelo júbilo dos
Tronos, no meio do entusiasmo das Dominações, cercada pela deferência dos
Principados, aclamada pelas Potências, honrada pelas Virtudes, cantada pelos hinos
dos Querubins e pelos cânticos indescritíveis dos Serafins. A própria e
inefável e eterna Trindade alegra-se com ela, aplaude, cobre-a com a sua graça
que excede a todos.
O ilustríssimo grupo dos
apóstolos louva e exalta a Virgem de forma inefável, toda a multidão dos
mártires dirige súplicas a tão grande senhora, o inumerável exército dos
confessores dirige-lhe magníficos cantos?.
O Senhor disse a Pedro: Sepulte o
corpo de minha mãe com o maior respeito, e guarde-o cuidadosamente durante três
dias, pois então virei e o transportarei para o lugar onde não existe corrupção
e o revestirei de claridade semelhante à minha pois é conveniente que haja
acordo entre o que foi recebido e o que recebeu.
S. João Damasceno, de origem
grega, conta coisas maravilhosas a respeito da santíssima Assunção. Em um de
seus sermões ele diz: "Mas como a morte poderia se impor aquela que é verdadeiramente bem-aventurada,
que ouviu a voz de Deus, que carregou a misericórdia do Pai em seu útero, que
concebeu sem contato com homem, que deu a luz sem dor? Como a corrupção ousaria
alguma coisa sobre um corpo que carregou a própria vida"
O Damasceno diz ainda em outro
sermão: "O seio da terra não podia reter o santuário de Deus, a fonte
inviolada. Era adequado que a Mãe fosse elevada pelo Filho, que subisse para
ele como ele descera nela, de que a Mãe usufruísse do que pertence ao Filho".
S. Agostinho também trata em um
sermão, com muitos argumentos, da santíssima assunção: "Antes de falar do
santíssimo corpo da perpétua virgem e da Assunção de sua alma sagrada, digamos
primeiro que a Escritura não se refere a ela depois que o Senhor na cruz
recomendou-a ao discípulo, a não ser aquilo que Lucas relata nos Atos Dos
Apóstolos: "Todos perseveraram, unanimemente, na prece com Maria, mãe de
Jesus". Que dizer então de sua morte? Que dizer de sua Assunção? Já que a
Escritura se cala, deve-se pedir razão que nos guie para a verdade.
Portanto, que a verdade seja a
nossa autoridade , pois sem ela não há autoridade. Baseados no conhecimento da
condição humana é que não hesitamos em dizer que ela sofreu morte temporal, mas
se dizemos que ela foi alimento da podridão, dos vermes e da cinza, devemos
considerar se esse estado convém à sua santidade e as prerrogativas desta casa
de Deus. Sabemos que foi dito ao nosso primeiro pai: "Você é pó e ao pó
voltará". A carne de Cristo escapou dessa condição pois não foi submetida
``a corrupção, foi poupada da sentença geral que foi tomada da Virgem. O Senhor
disse também à mulher: "Multiplicarei suas misérias e você dará à luz com
dor". Maria teve sofrimentos, uma espada transpassou sua alma, contudo deu
à luz sem dor.
Assim, partilhando as tribulações
de Eva, Maria não partilhou as do parto com dor. Ela foi uma exceção da regra
geral, gozou de grande prerrogativa, sofreu da morte sem ser aprisionada pôr
ela.. Não seria uma impiedade dizer que Deus não tenha querido poupar o corpo
de sua mãe da podridão, da mesma forma que quis conservar intacto o pudor de
sua virgindade? Não cabia à bondade do Senhor conservar a honra de sua mãe,
pois ele viera não para destruir a lei, mas para cumpri-la? Se Ele a honrou
durante sua vida mais que a qualquer outra pessoa, pela graça que lhe fez de o
conceber, é ato piedoso crer que a honrou também em sua morte com a preservação
particular e uma graça especial.
A podridão e os vermes são a
vergonha da condição humana, e se Jesus esteve isente deste opróbio, Maria
também, já que Jesus nasceu dela. A carne de Jesus é carne de Maria, que Ele
elevou acima dos astros, honrando com isso toda a natureza humana, mas
sobretudo a de sua mãe. Se o filho tem a natureza da mãe, é conveniente que a
mãe possua a natureza do filho, não quanto unidade da pessoa, mas quanto à
natureza corporal. Se a graça pode fazer que haja unidade sem que haja
comunidade de natureza, com mais razão quando há unidade na graça e no
nascimento corporal. Há unidade de graça, como as dos discípulos com Cristo.
Ele mesmo diz: "Afim de que eles sejam um como nós somos um", ou, em
outro lugar: "Meu Pai, quero que eles estejam comigo em todo o lugar que
eu estiver".
Se Ele quer Ter consigo aqueles
que, reunidos pela fé, formam com Ele uma mesma pessoa, que dizer em ralação à
sua mãe, cujo lugar digno para estar só pode ser em presença de seu filho?
Tanto quanto posso crer, a alma de Maria é honrada pôr seu filho com uma
prerrogativa ainda superior, já que ela possui um Cristo o corpo desse filho
que ela gerou com os caracteres da glória. E pôr que esse corpo não seria o
seu, já que ela o concebeu? Se uma autoridade maior não o negar. Creio que foi
pôr Ele que ela gerou, pois tão grande santidade é mais digna do Céu do que da
Terra. O trono de Deus, o leito do esposo , a casa do Senhor, o tabernáculo de
Cristo, tem o direito de estar onde ele próprio está.
O Céu é mais digno de conservar
tão precioso tesouro. Como a incorruptibilidade, a dissolução causada pela
podridão é conseqüência direta de tanta integridade, não imagino que esse
santíssimo corpo poderia ser abandonado com alimento dos vermes. Mas as graças
incomparáveis que lhe foram concedidas permitem-me rejeitar esse pensamento,
baseado em várias passagens da Escritura. A Verdade disse a seus ministros:
"Onde estou, ali estará também o meu ministro".
Se essa sentença geral referem-se
a todos os que servem a Cristo pôr sua crença ou pôr suas obras, aplica-se
especialmente, sem a menor dúvida, a Maria, que o ajudou pôr todas as suas
obras: carregou-O , deitou-O na manjedoura, oculto-O na fuga para o Egito,
guiou seus passos na infância , seguio-O até a cruz. Ela não podia duvidar de
que ele fosse Deus, pois sabia tê-lO concebido não por sêmen viril, mas pela
aspiração divina. Ela não duvida que seu filho tem poder de Deus, daí ter-Lhe
dito: "Eles não tem vinho", sabendo que Ele poderia, com um milagre, produzi-lo.
Portanto, Maria foi, por sua fé e suas obras, servidora de Cristo. Mas se ela
não está onde Cristo quer que estejam seus ministros, onde então estaria?
E se está ali, é com a mesma
graça dos outros? E se é com a mesma graça, como fica a igualdade diante de
Deus que dá a cada um conforme seus méritos? Se foi por mérito que Maria
recebeu em vida tanta graça, esta poderia ser menor quando morta? Certamente
não! Se a morte de todos os santos é preciosa, a de Maria é preciosíssima.
Assim, penso que Maria, elevada as alegrias da eternidade pela bondade de
Cristo, foi ali recebida com mais honras que os outros, e ela não teve de
sofrer depois da morte o mesmo que os outros homens, podridão, vermes e pó,
pois ela gerou o Salvador de si mesma e de todos os homens.
Se a divina vontade escolheu
manter intactas na meio das chamas as vestes das crianças, por que não
preservaria as de sua própria Mãe? A misericórdia que quis manter Jonas vivo no
ventre da baleia não concederia a Maria a graça da incorrupção? Daniel foi
preservado apesar da grande fome dos leões, e Maria não teria sido conservada
pelos méritos que a dignificavam?
Portanto, reconhecendo que tudo o
que dissemos ocorreu contra as leis da natureza, não podemos duvidar de que a
integridade de Maria, deveu-se mais à graça que à natureza. Cristo, como filho
de Maria, fez com que a alegria dela decorresse da alma e do corpo de seu
próprio filho, que não a submeteu ao suplício da corrupção para dar à luz
íntegra, sempre incorrupta, cheia de graça, e vivendo integralmente porque
gerou aquele que é a vida íntegra de todos.
BEATO ÂNGELO MAZZINGHI,
presbítero
Memória facultativa: O. Carm.
Nasceu em Florença ou perto
desta, em data desconhecida, mas certamente antes de 1386. Foi o primeiro filho
da Reforma de Santa Maria das Selvas, da Ordem Carmelita. Foi várias vezes prior em conventos da sua Ordem e distinguiu-se na pregação da palavra de Deus.
Morreu em Florença em 1438. O seu culto foi confirmado por Clemente XIII a 7 de
Março de 1761.
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