PARA A LECTIO DIVINA
DO 4º DOMINGO DO TEMPO COMUM
UM PROFETA QUE INCOMODA!
Sabemos
ouvir a Palavra dos nossos profetas que nos falam, certamente, de outra
maneira, mas que nos trazem a novidade do nosso Deus?
A
reflexão é de Raymond Gravel, sacerdote de Quebec, Canadá, publicada no sítio
Culture et Foi, comentando as leituras do 4º Domingo do Tempo Comum (29 de
janeiro de 2012). A tradução é de Susana Rocca.
A
primeira leitura e o Evangelho de hoje nos falam de profetismo. Um profeta com
nome misterioso para aquele ou aquela que é profeta e que tem bonita missão
para a pessoa que a exerce. E, no entanto, todos e todas nós deveríamos ser
profetas. O Concílio Vaticano II afirmou que todos os batizados participam na
função profética de Cristo. Mas o que é exatamente? O que é um profeta?
1. O
profeta: Segundo o dicionário, profeta é aquele ou aquela que prediz o futuro.
É completamente falso, porque a pessoa que prediz o futuro, é um astrólogo ou
um cartomante ou um vidente. Isso não tem nada a ver com o profetismo.
Basicamente, o profeta não é a pessoa que adivinha o futuro, mas aquele ou
aquela que fala em nome de alguém… como cristão em nome de Cristo, em nome de
Deus. O profeta não prediz o futuro; lê o presente. E, se acontece de ele ter
que falar do futuro é porque ele utilizou o tempo para analisar o presente, ler
os sinais dos tempos e poder alertar sobre o futuro. Um profeta deve ter
discernimento e muito bom senso.
Na
primeira leitura, hoje, o livro do Deuteronômio recorda ao povo de Israel que,
doravante, Deus não falará mais diretamente; ele utilizará um intermediário, um
profeta para falar ao povo: “Javé seu Deus fará surgir, dentre seus irmãos, um
profeta como eu em seu meio, e vocês o ouvirão. Foi o que você pediu a Javé seu
Deus, no Horeb, no dia da assembléia: ‘Não quero continuar ouvindo a voz de
Javé meu Deus, nem quero ver mais este fogo terrível, para não morrer’.” (Dt
18,15-16). Além disso, foi difícil reconhecer Moisés como profeta, assim como
foi difícil reconhecer Cristo como profeta.
No
Evangelho de hoje, o evangelista Marcos faz uma bonita declaração: “As pessoas
ficavam admiradas com o seu ensinamento, porque Jesus ensinava como quem tem
autoridade e não como os doutores da Lei” (Mc 1,22), isso não impediu que
alguém contestasse às suas palavras: “Que queres de nós, Jesus Nazareno? Vieste
para nos destruir? Eu sei quem tu és: tu és o Santo de Deus!”(Mc 1,24). É
curioso, porque mesmo sabendo quem é igualmente o homem contesta e recusa a
novidade da Palavra que ele traz. Mas quem é, por conseguinte, este homem
apresentado por Marcos como um possuído, que reconhece a identidade do Cristo
do Evangelho e que se opõe ao seu ensinamento? É necessário que seja alguém com
autoridade: um líder da comunidade, um padre, um escriba, o pároco da época…
que recusa a novidade do Evangelho, como acontece tantas vezes ainda hoje. E
lá, Jesus o manda calar (Mc 1,25). E o evangelista acrescenta: “Todos ficaram
muito espantados e perguntavam uns aos outros: “O que é isso? Um ensinamento
novo, dado com autoridade... Ele manda até nos espíritos maus e eles obedecem!”
(Mc 1,27).
Sem
querer fazer um paralelo com a atualidade, parece-me que se Marcos precisa
tratar de um ensinamento novo, diferente daquele dos padres e dos escribas do
tempo, esse ensinamento deve ter chocado, mobilizado, agitado mesmo aos
responsáveis religiosos da época. Mas o Cristo do Evangelho não aponta ao homem
mesmo, mas ao seu encerramento, à sua recusa de acolher a novidade de Deus que
se manifesta através dele, das suas leis, dos seus preceitos e dos seus
regulamentos que asfixiam e que trancam as pessoas numa culpabilidade que é
contrária ao Espírito de Liberdade do Cristo do Evangelho. Um exegeta francês
anônimo escreve: “E exatamente o sentido da ordem de Jesus ao espírito do mau:
Silêncio! Sai deste homem! Jesus veio para que os seres humanos tenham vida e a
tenham em abundância. A sua autoridade é unicamente um poder de vida e não de
morte. Os escribas acabavam esterilizando a Lei. Jesus a libera de qualquer
constrangimento para oferecer uma Palavra criadora de vida. E nós, em Igreja,
que fazemos desta Palavra? Bastante freqüentemente transformamos as palavras do
Evangelho em demasiados preceitos morais, jurídicos, que encerram na
consciência na culpa, em vez de fazer chamadas do Espírito de Liberdade que
quer nos colocar de pé, fazer de nós pessoas acordadas, vivas”.
2. O
profeta hoje: Quem são os profetas de hoje? O cardeal belga Godfried Danneels
escreve: “O nome de Deus é Jesus de Nazareth. Porque é pelo Filho que eu
conheço o Pai. É a via de acesso. Posso, evidentemente, falar do Pai mas sempre
está escondido, por trás, o nome do seu Filho. É um homem concreto que viveu
conosco e entre nós, que deixa vestígios na história. É um Deus histórico”. Se
eu acompanho a reflexão do Cardeal Danneels, devo dizer que esse Deus histórico
encarnado em Jesus de Nazaré continua sempre vivo, hoje, através de nós, a sua
Igreja. O que significa que o nome de Deus, hoje, é Cristo Ressuscitado e o
Cristo Ressuscitado somos nós. É por isso que, todas e todos nós somos profetas
pelo nosso batismo e pelo nosso compromisso como discípulos do Ressuscitado,
visto que somos o seu Corpo. Então a pergunta que nos fazemos é a seguinte: Que
rostos de Deus, de Cristo, nós damos a conhecer ao mundo no qual vivemos? O
rosto de um Deus vingativo? Guerreiro? Juiz? Mesquinho? Hipócrita? Ou um rosto
de um Deus de Amor? De tolerância? De perdão? De divisão? De paz? De esperança?
Diz-se,
com freqüência, que atualmente os homens e as mulheres não querem mais ouvir
falar de Deus. Será que é realmente de Deus que as pessoas não querem mais
ouvir falar? Não será exatamente de determinados rostos de Deus que são
apresentados a elas? Ouvir certos líderes de hoje, que encarnam um Deus
perverso: que julga, que condena e que exclui, posso compreender que há crentes
que não querem mais ouvir falar. Mas, se lhes apresentam um Deus de Amor que
acolhe o outro, qualquer outro, no respeito e na dignidade, parece-me que os
cristãos de hoje como os de ontem, seriam menos reticentes a esse Deus da
história, que é um Deus de Liberdade e de Amor.
Concluindo,
podemos pedir a Deus, nas nossas orações, que nos envie profetas para falar em
seu nome. Ousaria dizer: Parem de lhe pedir e comecem a reconhecer aqueles que
já estão aqui e que nos falam dele, porque como bem fala um exegeta do Quebec,
Jean-Pierre Prévost: “O problema não está do lado de Deus que nos envia sempre
os profetas que necessitamos, mas sim da nossa parte e da acolhida que lhes
damos”. Sabemos ouvir a Palavra dos nossos profetas que nos falam de outra
maneira, certamente, mas que nos trazem a novidade do nosso Deus?
Leia abaixo o
terceiro texto de preparação para a Festa da Apresentação.
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