terça-feira, 11 de setembro de 2012

Lectio divina para a quarta-feira da 23ª semana do tempo comum

Evangelho (Lc 6,20-26): Naquele tempo, Jesus levantou o olhar para os seus discípulos e disse-lhes: «Felizes vós, os pobres, porque vosso é o Reino de Deus! Felizes vós que agora passais fome, porque sereis saciados! Felizes vós que agora estais chorando, porque haveis de rir! Felizes sereis quando os homens vos odiarem, expulsarem, insultarem e amaldiçoarem o vosso nome por causa do Filho do Homem. Alegrai-vos, nesse dia, e exultai, porque será grande a vossa recompensa no céu, pois era assim que os seus antepassados tratavam os profetas. Mas, ai de vós, ricos, porque já tendes vossa consolação! Ai de vós que agora estais fartos, porque passareis fome! Ai de vós que agora estais rindo, porque ficareis de luto e chorareis! Ai de vós quando todos falarem bem de vós, pois era assim que seus antepassados tratavam os falsos profetas».
 
Comentário: Rev. D. Joaquim MESEGUER García (Sant Quirze del Vallès, Barcelona, Espanha)

Felizes vós, os pobres (...). Ai de vós, ricos!
 
     Hoje, Jesus mostra-nos onde está a verdadeira felicidade. Na versão de São Lucas, as bem-aventuranças são acompanhadas de dolorosas imprecações por aqueles que não aceitam a mensagem de salvação, fechando-se numa vida auto-suficiente e egoísta. Com as bem-aventuranças e as imprecações, Jesus faz uma aplicação da doutrina dos dois caminhos: o caminho da vida e o caminho da morte. Não há uma terceira possibilidade, neutra: quem não segue o caminho da vida encaminha-se para a morte; quem não segue a luz, vive nas trevas.
      «Felizes vós, os pobres, porque vosso é o Reino de Deus» (Lc 6,20). Esta bem-aventurança é a base de todas as outras, pois quem é pobre será capaz de receber o Reino de Deus como um dom. Quem é pobre sabe de que coisas deve ter fome e sede: não de bens materiais, mas da Palavra de Deus; não de poder, mas de justiça e de amor. Quem é pobre sabe chorar perante o sofrimento do mundo. Quem é pobre sabe que Deus é toda a sua riqueza e que, por isso, sofrerá incompreensões e perseguições.
     «Mas, ai de vós, ricos, porque já tendes vossa consolação» (Lc 6,24). Esta imprecação é também o fundamento de todas as que se seguem, pois quem é rico e auto-suficiente, quem não sabe pôr as suas riquezas ao serviço dos outros, encerra-se no seu egoísmo e constrói a sua própria desgraça. Que Deus nos livre do afã de riquezas, de correr atrás das promessas do mundo e de pôr o nosso coração nos bens materiais; que Deus não permita que fiquemos satisfeitos com os louvores e adulações humanas, já que isso significaria ter posto o coração na glória do mundo e não na de Jesus Cristo. Será de grande proveito lembrar o que diz São Basilio: «Quem ama o próximo como a si mesmo não acumula coisas desnecessárias que possam ser indispensáveis para os outros».
Reflexões de Frei Carlos Mesters, O.Carm
 
Reflexão   Lucas 6, 20-26
     *  O evangelho de hoje traz as quatro bem-aventuranças e as quatro maldições do Evangelho de Lucas. Há uma revelação progressiva na maneira de Lucas apresentar o ensinamento de Jesus. Até 6,16, ele disse muitas vezes que Jesus ensinava o povo, mas não chegou a relatar o conteúdo do ensinamento (Lc 4,15.31-32.44; 5,1.3.15.17; 6,6). Agora, depois de informar que Jesus viu a multidão desejosa de ouvir a palavra de Deus, Lucas traz o primeiro grande discurso que começa com as exclamações: "Felizes vocês pobres!" e "Ai de vocês, ricos!", e ocupa todo o resto do capítulo (Lc 6,12-49). Alguns chamam este discurso de "Sermão da Planície", pois, segundo Lucas, Jesus desceu da montanha e parou num lugar plano onde fez o discurso. No evangelho de Mateus, este mesmo discurso é feito na montanha (Mt 5,1) e é chamado "Sermão da Montanha". Em Mateus, o sermão traz oito bem-aventuranças, que traçam um programa de vida para as comunidades cristãs de origem judaica. Em Lucas, o sermão é mais breve e mais radical. Ele traz quatro bem-aventuranças e quatro maldições, dirigidas para as comunidades helenistas, constituídas de ricos e pobres. Este discurso de Jesus vai ser meditado no evangelho diário dos próximos dias até 13 de setembro.
*  Lucas 6,20: Felizes vocês, pobres!
     Olhando para os discípulos, Jesus declara: "Felizes vocês pobres, porque o Reino de Deus é de vocês!" Esta declaração identifica a categoria social dos discípulos. Eles são pobres!  E a eles Jesus promete: “O Reino é de vocês!” Não é uma promessa para o futuro. O verbo está no presente. O Reino já é deles. Eles são felizes desde já. No evangelho de Mateus, Jesus explicita o sentido e diz: "Felizes os pobres em Espírito!" (Mt 5,3). São os pobres que têm o Espírito de Jesus. Pois há pobres com cabeça ou espírito de rico. Os discípulos de Jesus são pobres com cabeça de pobre. Como Jesus, não querem acumular, mas assumem a sua pobreza e, com ele, lutam por uma convivência mais justa, onde haja fraternidade e partilha de bens, sem discriminação.
*  Lucas 6,21-22: Felizes vocês, que agora têm fome e choram!
     Na 2ª e 3ª bem-aventurança Jesus diz: "Felizes vocês que agora estão com fome, porque serão saciados! Felizes vocês que agora choram, porque vão dar risada!" Uma parte das frases está no presente e outra no futuro. Aquilo que agora vivemos e sofremos não é o definitivo. O definitivo é o Reino que estamos construindo hoje na força do Espírito de Jesus. Construir o Reino traz sofrimento e perseguição, mas uma coisa é certa: o Reino vai chegar e “vocês serão saciados e vão dar risada!”.
*  Lucas 6,23: Felizes serão, quando os homens os odiarem....!
     A 4ª bem-aventurança se refere ao futuro: "Felizes serão vocês, quando os homens os odiarem e rejeitarem por causa do Filho do Homem! Fiquem alegres naquele dia, porque grande será a sua recompensa, porque assim também foram tratados os profetas!" Com estas palavras de Jesus, Lucas anima as comunidades do seu tempo, que estavam sendo perseguidas. O sofrimento não é estertor de morte, mas sim dor de parto. Fonte de esperança! A perseguição era um sinal de que o futuro anunciado por Jesus estava chegando para elas. Elas estavam no caminho certo.
*  Lucas 6,24-25:  Ai de vocês, ricos!  Ai de vocês que agora têm fartura e riem!
     Após as quatro bem-aventuranças a favor dos pobres e excluídos, seguem quatro ameaças ou maldições contra os ricos e os que passam bem e são elogiados por todos. As quatro ameaças têm a mesma forma literária que as quatro bem-aventuranças. A 1ª está no presente. A 2ª e a 3ª têm uma parte no presente e outra no futuro. E a 4ª se refere inteiramente ao futuro. Estas ameaças só se encontram no evangelho de Lucas e não no de Mateus. Lucas é mais radical na denúncia da injustiça.
     Diante de Jesus, naquela planície não havia ricos. Só havia gente pobre e doente, vinda de todos os lados (Lc 6,17-19). Mesmo assim, Jesus diz: "Ai de vocês, ricos!" É que Lucas, ao transmitir estas palavras de Jesus, estava pensando mais nas comunidades do seu tempo. Nelas havia ricos e pobres, e havia discriminação dos pobres pelos ricos, a mesma que marcava a estrutura do Império Romano (cf. Tg 5,1-6; Apc 3,17-19). Jesus faz uma crítica dura e direta aos ricos: Vocês, ricos, já têm sua consolação! Vocês têm fartura, mas vão passar fome! Vocês estão rindo, mas vão ficar aflitos e vão chorar! Sinal de que para Jesus, a pobreza não é uma fatalidade, nem é fruto de preguiça, mas é fruto de enriquecimento injusto dos outros.
*   Lucas 6,26:  Ai de vocês quando todos os elogiarem!
     “Ai de vocês quando todos os elogiarem, porque assim seus pais tratavam os falsos profetas!” Esta quarta ameaça se refere aos filhos dos que no passado elogiavam os falsos profetas. É que algumas autoridades dos judeus usavam o seu prestígio e a sua autoridade para criticar Jesus.
 Para um confronto pessoal
     1. Será que nós olhamos a vida e as pessoas com o mesmo olhar de Jesus? Dentro do seu coração, o que você acha: uma pessoa pobre e faminta é realmente feliz? As novelas da Televisão e a propaganda do comércio, qual o ideal de felicidade que elas nos apresentam?
     2. Dizendo “Felizes os pobres”, será que Jesus estava querendo dizer que os pobres devem continuar na pobreza?
 
 
 O AMOR À CRUZ
Frei Gabriel de Sta. Maria Madalena, OCD
 
1 - A cruz é o sofrimento visto à luz sobrenatural como instrumento de salvação e santificação, portanto como instrumento de amor. Vista a esta luz, a cruz torna-se amável: é o grande meio da nossa santificação.
A nossa união com Deus não é realizável senão através do sofrimento. S. João da Cruz demonstrou como a alma deve ser purificada, limada até ao fundo para chegar já nesta vida à união com Deus. É necessária uma obra de mortificação total, para arrancar todos os nossos apegos, porque há em nós numerosas resistências que impedem que sejamos totalmente movidas por Deus; não é possível que tudo isto se faça sem sofrimento.
     Mas não basta o sofrimento ativo, quer dizer, não bastam as mortificações e penitências que nos impomos por nossa própria iniciativa; é necessário sobretudo o sofrimento passivo, ou seja, é necessário que o próprio Senhor nos faça sofrer, não só no corpo, mas também no espírito; precisamente porque estamos tão cheios de ferrugem e de misérias, a nossa total purificação não é possível se Deus não intervém com a sua ação. Introduzir-nos no sofrimento passivo é, portanto, uma das maiores obras da sua misericórdia, uma das maiores provas do seu amor; quando Deus age assim numa alma, é sinal que quer eleva-Ia a uma alta perfeição.
     É nestes sofrimentos passivos, purificadores que se realiza, de modo particular, o conceito da cruz. Na Chama Viva de Amor (II estrofe), S. João da Cruz pergunta porque são tão poucas as almas que chegam à plenitude da vida espiritual. E responde: “não é porque Deus queira reservar este estado a alguma alma privilegiada, mas porque encontra poucas almas dispostas a aceitar um profundo trabalho de purificação; por conseguinte, deixa de as purificar, e as almas condenam-se à mediocridade, não caminham nem avançam. É impossível unir-se a Deus sem estes sofrimentos espirituais, sem suportar este peso de Deus. Só através do sofrimento e da desolação interior as potências da alma se dilatam e esta se torna capaz de abraçar o próprio Deus”.
         2 - «Ó almas que quereis andar seguras e consoladas nas coisas do espírito se soubésseis quanto vos convém padecer, sofrendo, para chegar a essa segurança e consolo!» (J.C. CV. 2, 28). Todavia o sofrimento é necessário não só para o bem espiritual da alma, mas também para que esta possa glorificar a Deus e de monstrar-lhe o seu amor;  com efeito, não se trata de chegar à perfeição para gozar dela - porque a alma perfeita nunca pensa em si - mas para se dedicar totalmente à glória de Deus. É neste sentido que está escrito no cimo do Monte da Perfeição: «só mora neste monte a honra e a glória de Deus». Como a cruz de Jesus foi o grande meio pelo qual Ele deu ao Pai a glória que o homem pecador Lhe negara, assim deve acontecer com a nossa cruz: por meio do sofrimento reparar as nossas culpas e as dos outros, para dar a Deus toda a glória que lhe é devida. Além disso, assim como a cruz de Jesus foi a prova suprema do seu amor por nós do mesmo modo a nossa cruz é a mais bela prova do nosso amor para com ele.
         O fato de Jesus, Filho de Deus, ter vindo à terra para morrer na cruz por nós, manifesta-nos o seu infinito amor e assim, ao abraçarmos o sofrimento por ele, demonstraremos a realidade do nosso amor para com Deus.  Por isso, a cruz é instrumento e obra de amor. Quanto mais Deus nos santifica, mais nos demonstra o seu amor e nos dá meios de o glorificarmos. Deus santifica-nos por meio da cruz, da grande cruz de Jesus à qual devemos juntar a nossa pequena cruz. Quanto mais o Senhor, através do sofrimento, nos faz participar da Paixão de Cristo, tanto mais nos santifica e nos ama. Também neste sentido os sofrimentos são uma prova do seu amor para conosco. Se compreendêssemos tudo isto, como amaríamos a cruz!

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