domingo, 31 de dezembro de 2017

1º de janeiro: Santa Maria, Mãe de Deus (Dia oitavo da Oitava do Natal)

Textos: Nm 6, 22-27; Gal 4, 4-7: Lc 2, 16-21

Evangelho (Lc 2,16-21): Foram, pois, às pressas a Belém e encontraram Maria e José, e o recém-nascido deitado na manjedoura. Quando o viram, contaram as palavras que lhes tinham sido ditas a respeito do menino. Todos os que ouviram os pastores ficavam admirados com aquilo que contavam. Maria, porém, guardava todas estas coisas, meditando-as no seu coração. Os pastores retiraram-se, louvando e glorificando a Deus por tudo o que tinham visto e ouvido, de acordo com o que lhes tinha sido dito. No oitavo dia, quando o menino devia ser circuncidado, deram-lhe o nome de Jesus, como fora chamado pelo anjo antes de ser concebido no ventre da mãe.

«Foram, pois, às pressas a Belém e encontraram Maria e José, e o recém-nascido deitado na manjedoura»

Rev. D. Manel VALLS i Serra (Barcelona, Espanha)

Hoje, a Igreja contempla agradecida a maternidade da Mãe de Deus, modelo de sua própria maternidade para com todos nós. Lucas nos apresenta o “encontro” dos pastores “com o Menino”, o qual está acompanhado de Maria, sua Mãe, e de José. A discreta presença de José sugere a importante missão de ser custódio do grande mistério do Filho de Deus. Todos juntos, pastores, Maria e José, «Foram com grande pressa e acharam Maria e José, e o menino deitado na manjedoura» (Lc 2,16) é como uma imagem preciosa da Igreja em adoração.

“A Manjedoura”: Jesus já está na manjedoura, numa noite alusiva à Eucaristia. Foi Maria quem o colocou lá! Lucas fala de um “encontro”, de um encontro dos pastores com Jesus. Em efeito, sem a experiência de um “encontro” pessoal com o Senhor, a fé não acontece. Somente este “encontro”, o qual se entende um “ver com os próprios olhos”, e em certa maneira um “tocar”, faz com que os pastores sejam capazes de chegar a ser testemunhas da Boa Nova, verdadeiros evangelizadores que podem dar a conhecer o que lhes haviam dito sobre aquela Criança. «Vendo-o, contaram o que se lhes havia dito a respeito deste menino» (Lc 2,17).

Aqui vemos o primeiro fruto do “encontro” com Cristo: «Todos os que os ouviam admiravam-se das coisas que lhes contavam os pastores» (Lc 2,18). Devemos pedir a graça de saber suscitar este “maravilhamento”, esta admiração naqueles a quem anunciamos o Evangelho.

Ainda há um segundo fruto deste encontro: «Voltaram os pastores, glorificando e louvando a Deus por tudo o que tinham ouvido e visto, e que estava de acordo com o que lhes fora dito» (Lc 2,20). A adoração do Menino lhes enche o coração de entusiasmo por comunicar o que viram e ouviram, e a comunicação do que viram e ouviram os conduz até a pregaria de louvor e de ação de graças, à glorificação do Senhor.

Maria, mestra de contemplação —«Maria conservava todas estas palavras, meditando-as no seu coração» (Lc 2,19) — nos dá Jesus, cujo nome significa “Deus salva”. Seu nome é também nossa Paz. Acolhamos coração este sagrado e doce Nome e tenhamo-lo frequentemente nos nossos lábios!

Hoje celebramos a solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus e o dia internacional da paz.

Pe. Antonio Rivero, L.C.

Circuncisão do Senhor
Foi o Papa Paulo VI quem transladou para o dia 1 de janeiro a festa da Maternidade divina de Maria, que antes caia no dia 11 de outubro. De fato, antes da reforma litúrgica realizada depois do concilio Vaticano II, no primeiro dia do ano se celebrava a memória da circuncisão de Jesus no oitavo dia depois do seu nascimento- como sinal de submissão à lei, sua inserção oficial no povo eleito- e no domingo seguinte se celebrava a festa do nome de Jesus.

Em primeiro lugar, neste primeiro dia do ano colocamos a Santa Maria como intercessora, para que nos consiga a paz que necessitamos. É o primeiro dia do ano e dedicamos a Ela, à Mãe de Deus, à Rainha da Paz, para que abençoe também todos os nossos esforços e desejos de paz. A cena do Evangelho também nos traz sentimentos de paz. Voltamos para Belém, para o presépio, para contemplar “Maria, José, e o Menino deitado no presépio”. Unimo-nos aos pastores neste momento de adoração, contemplando esta cena, sentindo-nos parte dela, como aquele povo simples que soube ver naquele menino todo um Deus que vinha para nascer por nós. Também damos glória a Deus, como os pastores, por ter se descoberto nas nossas vidas, por ter deixado Deus nascer, um ano mais, nos nossos corações. Esse menino enche os nossos corações e as nossas vidas de paz, com a sua paz. “A paz vos deixo, a minha paz vos dou”. Uma paz verdadeira e para sempre.

Em segundo lugar, pedimos neste dia que o Senhor coloque o seu olhar sobre nós e nos conceda a paz. É esta a oração que fazia todo bom israelita, e é uma oração e um desejo que devemos fazer hoje nosso todas as pessoas de boa vontade. Queremos que o Senhor conceda a paz, a sua paz, a todos os nossos parentes e amigos, e a todas as pessoas que quiserem recebê-la, para o mundo inteiro. Hoje é a jornada mundial da paz. A paz de Deus! O salmo 84 nos diz que a justiça e a paz se abraçam, se beijam. Queremos uma paz que seja fruto da justiça, não uma paz imposta violentamente pela força das armas ou pela força do dinheiro. Não queremos a paz de pessoas que vivem esmagadas pelo poder político, ou social, ou econômico. Não queremos a paz dos cemitérios. Queremos a paz dos corpos e das almas, a paz material e a paz espiritual. Sabemos que esta paz não podemos consegui-la plenamente enquanto vivermos nesta terra, mas devemos sempre aspirar cada dia a aproximar-nos um pouco mais dela. Não vamos conseguir só com as nossas forças humanas, necessitamos a ajuda de Deus. Por isso, vamos pedir hoje a Deus que, por intercessão da sua Mãe, Santa Maria, pouse o seu olhar sobre nós e nos conceda a paz. 

Finalmente, este é um dia para dar graças a Deus. Graças por tudo o que vivemos neste ano que terminamos, graças pelo que viveremos no ano que começa, graças por tudo de novo que aparece na nossa vida. Pedimos a Deus que todos os nossos bons desejos que temos e que nós dizemos no Novo Ano saibamos realizá-los. Fazemos nosso o propósito de favorecer tudo o que possa ajudar para que exista mais felicidade para todos, amigos e desconhecidos. Este é o nosso desejo: “Paz e bem para todos”.

Para refletir: Como início o novo ano: com esperança e fé? Com alegria e otimismo? Disposto a gerar a paz na minha família e por onde eu for?

Para rezar: Porque Jesus, nasceu de uma mulher, amamos e veneramos o nome dessa mulher: Maria. Porque, Maria, é espelho da humanidade redimida, bendizemos e suspiramos, neste Ano Novo, à nova Eva, Àquela que nos dá tanto: a Jesus. Para ser Mãe de Deus e Mãe nossa, não deixou atrás a sua pobreza nem a sua simplicidade, a sua obediência e o seu ser maternal. Bendizemos a vossa docilidade, Maria! Porque, Maria, meditava todas as coisas sagradas no mais profundo do seu coração, bendizemos a sua memória, o seu espírito e a sua fé. Bendita, Vós, Maria! Porque, Maria, como o sol que amanhece, ilumina os cantinhos mais escuros da nossa casa.

Qualquer sugestão ou dúvida podem se comunicar com o padre Antonio neste e-mail:  arivero@legionaries.org

sábado, 30 de dezembro de 2017

A Sagrada Família

Textos: Eclo 3, 3-7.14-17; Col 3, 12-21; Lc 2, 20-40

Evangelho (Lc 2,22-40): E quando se completaram os dias da purificação, segundo a lei de Moisés, levaram o menino a Jerusalém para apresentá-lo ao Senhor, conforme está escrito na Lei do Senhor: «Todo primogênito do sexo masculino será consagrado ao Senhor». Para tanto, deviam oferecer em sacrifício um par de rolas ou dois pombinhos, como está escrito na Lei do Senhor. Ora, em Jerusalém vivia um homem piedoso e justo, chamado Simeão, que esperava a consolação de Israel. O Espírito do Senhor estava com ele. Pelo próprio Espírito Santo, ele teve uma revelação divina de que não morreria sem ver o Ungido do Senhor. Movido pelo Espírito, foi ao templo. Quando os pais levaram o menino Jesus ao templo para cumprirem as disposições da Lei, Simeão tomou-o nos braços e louvou a Deus, dizendo: «Agora, Senhor, segundo a tua promessa, deixas teu servo ir em paz, porque meus olhos viram a tua salvação, que preparaste diante de todos os povos: luz para iluminar as nações e glória de Israel, teu povo». O pai e a mãe ficavam admirados com aquilo que diziam do menino. Simeão os abençoou e disse a Maria, a mãe: «Este menino será causa de queda e de reerguimento para muitos em Israel. Ele será um sinal de contradição — e a ti, uma espada traspassará tua alma! — e assim serão revelados os pensamentos de muitos corações».  Havia também uma profetisa, chamada Ana, filha de Fanuel, da tribo de Aser. Ela era de idade avançada. Quando jovem, tinha sido casada e vivera sete anos com o marido. Depois ficara viúva e agora já estava com oitenta e quatro anos. Não saía do templo; dia e noite servia a Deus com jejuns e orações. Naquela hora, Ana chegou e se pôs a louvar Deus e a falar do menino a todos os que esperavam a libertação de Jerusalém. Depois de cumprirem tudo conforme a Lei do Senhor, eles voltaram para Nazaré, sua cidade, na Galileia. O menino foi crescendo, ficando forte e cheio de sabedoria. A graça de Deus estava com ele.

«Levaram o menino a Jerusalém para apresentá-lo ao Senhor»

Rev. D. Joan Ant. MATEO i García (La Fuliola, Lleida, Espanha)

Hoje, celebramos a festa da Sagrada Família. O nosso olhar vira-se para o centro de Belém —Jesus— para contemplar perto Dele a Maria e a José. O filho eterno do Pai passa da família eterna, que é a Santíssima Trindade, à família terrena formada por Maria e José. Como deve ser importante a família aos olhos de Deus quando a primeira coisa que procura para o seu Filho é uma família!

João Paulo II, na sua Carta apostólica O Rosário da Virgem Maria, voltou a destacar a importância capital que tem a família como fundamento da Igreja e da sociedade humana e pediu-nos que rezássemos pela família e que rezássemos em família o Santo Rosário para revitalizarmos essa instituição. Se a família estiver bem, a sociedade e a Igreja estarão bem.

O Evangelho de hoje diz-nos que o Menino crescia e se fortalecia, enchendo-se de sabedoria. Jesus encontrou o calor de uma família que se ia construindo através das suas reciprocas relações de amor. Que bonito e proveitoso seria se nos esforçássemos mais e mais por construir a nossa família: com espírito de serviço e de oração, com amor mutuo, com uma grande capacidade de compreender e de perdoar. Gostaríamos —como na casa de Nazaré — o céu e a terra! Construir a família é hoje uma das tarefas mais urgentes. Os pais, como recordava o Concilio Vaticano II, tem aí um papel insubstituível: «É dever dos pais criar um ambiente de família animado pelo amor e pela piedade para com Deus e para com os homens, e que favoreça uma educação integra a nível pessoal e social dos seus filhos». Na família aprende-se o mais importante: a ser pessoas.

Por fim, falar de família para os cristãos é falar da Igreja. O Evangelista S. Lucas diz-nos que os pais de Jesus o levaram a Jerusalém para apresentá-lo ao Senhor. Aquela oferenda era a figura da oferenda sacrificial de Jesus ao Pai, fruto da qual nascemos cristãos. Considerar esta gozosa realidade nos abrirá a uma maior fraternidade e nos levará a amar mais a Igreja.

A Sagrada Família de Nazaré é modelo, alento e força para todas as nossas famílias.

Pe. Antonio Rivero, L.C.

Esta festa é recente e foi estabelecida faz pouco mais de um século pelo papa Leão XIII para dar às famílias cristas um modelo evangélico de vida, virtudes domesticas e de união no amor, para que depois das provas desta vida possam gozar no céu da eterna companhia de Deus e da Sagrada Família de Nazaré.

Em primeiro lugar, todos nós sabemos dos grandes perigos que hoje sofrem algumas das nossas famílias, que colocou em evidencia o sínodo extraordinário da família em outubro de 2014: famílias fragmentadas, feridas, quebradas, em necessidades de pobreza, de miséria e de angustia. Dificuldades internas e externas. Preocupações de tipo laboral e econômico; visões distintas na educação dos filhos, provenientes de diferentes modelos educativos dos pais; os reduzidos tempos para o diálogo e o descanso. A tudo isto se junta fatores disgregados como a separação e o divórcio, e o preocupante crescimento da prática abortiva. O mesmo egoísmo pode levar à falsa visão de considerar os filhos como objetos de propriedade dos pais, que podem ser fabricados segundo os seus desejos. Violência, abusos, álcool, drogas, pornografia e outras formas de dependência sexual. E também essas situações pastorais difíceis: as uniões livres ou em segundas núpcias sem ter recebido o sacramento do matrimonio. O que fazer diante destes desafios?

Em segundo lugar, hoje temos que olhar o modelo da Sagrada Família para que nos digam o segredo para formar uma família ideal e possamos lançar luz nestes desafios. Quando Paulo VI esteve em Nazaré tirou umas anotações ou lições da Sagrada Família de Nazaré, a modo de fotografia. “Primeiro, lição de silêncio. Renasça em nós a valorização do silêncio, desta estupenda e indispensável condição do espírito; em nós, atordoados por tantos ruídos, tantos estrépitos, tantas vozes da nossa ruidosa e hipersensibilizada vida moderna. Silêncio de Nazaré, ensinai-nos o recolhimento, a interioridade, a aptidão de prestar atenção às boas inspirações e palavras dos verdadeiros mestres; ensinai-nos a necessidade e o valor da preparação, do estudo, da meditação, da vida pessoal e interior, da oração que Deus só vê secretamente. Segundo, a lição da vida doméstica. Que Nazaré nos ensine o que é a família; a sua comunhão de amor, a sua simples e austera beleza, o seu caráter sagrado e inviolável; ensine quão doce insubstituível é a sua pedagogia; ensine quão fundamental e insuperável a sua sociologia. E terceiro, lição de trabalho. Ó Nazaré, ó casa do “Filho do Carpinteiro”, como queríamos compreender e celebrar aqui a lei severa, e redentora da fatiga humana; recompor aqui a consciência da dignidade do trabalho; recordar aqui como o trabalho não pode ser fim em si mesmo e como, quanto mais livre e alto for, tanto serão, ademais do valor econômico, os valores que tem como fim; saudar aqui os trabalhadores de todo o mundo e mostrar-lhes o seu grande colega, o seu irmão divino, o Profeta de toda justiça para eles, Jesus Cristo Nosso Senhor!”. (Homilia de Paulo VI, 5 de janeiro de 1964 em Nazaré).

Finalmente, devemos voltar uma e outra vez ao plano originário de Deus para a família. É verdade que Deus começou o seu plano arrancando Abraão do seio da sua família, mas ao mesmo tempo lhe fez a promessas de um descendente, de um herdeiro, Cristo, ao redor do qual se formaria a família perfeita. E quando com braço poderoso tirou os judeus do Egito fez isso para constitui-los em povo, em família de Deus. Seguindo a mesma linha, Deus constituiu depois a Igreja- novo Israel- ao modo de uma família, com um Pai comum. Somos todos da família de Jesus. E nesta família perfeita está o pai, a mãe e os filhos. São Paulo na segunda leitura de hoje nos dá a clave para edificar esta família de Jesus com um único alicerce: o amor mútuo, feito humildade, afabilidade, paciência, perdão, paz, gratidão, oração, respeito, obediência. O pai é a cabeça, a mãe é o coração e os filhos são a coroa desses pais.

Para refletir: O que é que mais impressiona da Sagrada Família de Nazaré? O que é que com mais urgência as nossas famílias deveriam aprender da Sagrada Família de Jesus, José e Maria? Como deveria se comportar a Igreja com essas famílias que estão passando por graves dificuldades?

Para rezar: Sagrada Família de Nazaré: ensinai-nos o recolhimento, a interioridade; dai-nos a disposição para escutar as boas inspirações e as palavras dos verdadeiros mestres. Ensinai-nos a necessidade do trabalho de reparação, do estudo, da vida interior pessoal, da oração, que só Deus vê no segredo; ensinai-nos o que é a família, a sua comunhão de amor, a sua beleza simples e austera, o seu caráter sagrado e inviolável. Amém.

Qualquer sugestão ou dúvida podem se comunicar com o padre Antonio neste e-mail:  arivero@legionaries.org

sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

30 de dezembro (Sexto dia da Oitava do Natal)

Evangelho (Lc 2,36-40): Havia também uma profetisa, chamada Ana, filha de Fanuel, da tribo de Aser. Ela era de idade avançada. Quando jovem, tinha sido casada e vivera sete anos com o marido. Depois ficara viúva e agora já estava com oitenta e quatro anos. Não saía do templo; dia e noite servia a Deus com jejuns e orações. Naquela hora, Ana chegou e se pôs a louvar Deus e a falar do menino a todos os que esperavam a libertação de Jerusalém.  Depois de cumprirem tudo conforme a Lei do Senhor, eles voltaram para Nazaré, sua cidade, na Galileia. O menino foi crescendo, ficando forte e cheio de sabedoria. A graça de Deus estava com ele.

«Se pôs a louvar Deus e a falar do menino a todos »

Rev. D. Joaquim FLURIACH i Domínguez (St. Esteve de P., Barcelona, Espanha)

Hoje, José e Maria acabam de celebrar o rito da apresentação do primogênito, Jesus, no Templo de Jerusalém. Maria e José não se poupam para cumprir detalhadamente tudo o que a Lei prescreve, porque cumprir aquilo que Deus quer é sinal de fidelidade, de amor a Deus.

Desde que nasceu o seu filho — e filho de Deus — José e Maria experimentam maravilha atrás de maravilha: os pastores, os magos do Oriente, anjos… Não somente acontecimentos exteriores extraordinários, mas também interiores, no coração das pessoas que têm algum contato com este Menino.

Hoje, aparece Ana, uma senhora de idade, viúva, que num determinado momento tomou a decisão de dedicar toda a sua vida ao Senhor, com jejuns e oração. Não nos equivocamos se dissermos que esta mulher era uma das “virgens prudentes” da parábola do Senhor (cf. Mt 25,1-13): zelando sempre fielmente por tudo o que lhe parece ser a vontade de Deus. E, é claro: quando chega o momento, o Senhor encontra-a preparada. Todo o tempo que dedicou ao Senhor é recompensado com juros por aquele Menino. — Perguntai-lhe, perguntai a Ana se valeu a pena tanta oração e tanto jejum, tanta generosidade!

Diz o texto que «louvava Deus e falava do Menino a todos os que esperavam a libertação de Jerusalém» (Lc 2,38). A alegria transforma-se em apostolado determinado: ela é o motivo e a raiz. O Senhor é imensamente generoso com os que são generosos com Ele.

Jesus, Deus Encarnado, vive a vida de Família em Nazaré, como todas as famílias: crescer, trabalhar, aprender, rezar, brincar… “Santa normalidade”, bendita rotina onde crescem e se fortalecem, quase sem dar por isso, as almas dos homens de Deus! Como são importantes as coisas pequenas de cada dia!

Reflexões de Frei Carlos Mesters, O.Carm

* Nos primeiros dois capítulos de Lucas, tudo gira em torno do nascimento de duas crianças: João e Jesus. Os dois capítulos nos fazem sentir o perfume do Evangelho de Lucas. Neles, o ambiente é de ternura e de louvor. Do começo ao fim, se louva e se canta a misericórdia de Deus: os cânticos de Maria (Lc 1,46-55), de Zacarias (Lc 1,68-79), dos anjos (Lc 2,14), de Simeão (Lc 2,29-32). Finalmente, Deus chegou para cumprir suas promessas, e Ele as cumpre em favor dos pobres, dos anawim, dos que souberam perseverar e esperar pela sua vinda: Isabel, Zacarias, Maria, José, Simeão, Ana, os pastores.

* Os capítulos 1 e 2 do Evangelho de Lucas são muito conhecidos, mas pouco aprofundados. Lucas escreve imitando os escritos do AT. É como se os primeiros dois capítulos do seu evangelho fossem o último capítulo do AT que abre a porta para a chegada do Novo. Estes dois capítulos são a dobradiça entre o AT e o NT. Lucas quer mostrar como as profecias estão se realizando. João e Jesus cumprem o Antigo e iniciam o Novo.

* Lucas 2,36-37: A vida da profetisa Ana
 “Havia também uma profetisa chamada Ana, de idade muito avançada. Ela era filha de Fanuel, da tribo de Aser. Tinha-se casado bem jovem, e vivera sete anos com o marido. Depois ficou viúva, e viveu assim até os oitenta e quatro anos. Nunca deixava o Templo, servindo a Deus noite e dia, com jejuns e orações”. Como Judite (Jd 8,1-6), Ana é viúva. Como Débora (Jz 4,4), ela é profetisa. Isto é, pessoa que comunica algo de Deus e que tem uma abertura especial para as coisas da fé a ponto de poder comunicá-las aos outros. Ana casou jovem, viveu em casamento durante sete anos, ficou viúva e continuou dedicada a Deus até oitenta e quatro anos. Hoje, em quase todas as nossas comunidades, no mundo inteiro, você encontra um grupo de senhoras de idade, muitas delas viúvas, cuja vida se resume em rezar e marcar presença nas celebrações e em servir ao próximo.

* Lucas 2,38: Ana e o menino Jesus
 “Ela chegou nesse instante, louvava a Deus, e falava do menino a todos os que esperavam a libertação de Jerusalém”. Chegou ao templo no momento em que Simeão abraçava o menino e conversava com Maria sobre o futuro do menino (Lc 2,25-35). Lucas sugere que Ana participou neste gesto. O olhar de Ana é um olhar de fé. Ela vê um menino nos braços de sua mãe, e descobre nele o Salvador do mundo.

* Lucas 2,39-40: A vida de Jesus em Nazaré
”Quando acabaram de cumprir todas as coisas, conforme a Lei do Senhor, voltaram para Nazaré, sua cidade, que ficava na Galileia. O menino crescia e ficava forte, cheio de sabedoria. E a graça de Deus estava com ele”. Nestas poucas palavras, Lucas comunica algo do mistério da encarnação. “A Palavra de fez carne e veio morar entre nós” (Jo 1,14). O Filho de Deus tornou-se igual a nós em tudo e assumiu a condição de servo (Filp 2,7). Foi obediente até a morte e morte de cruz (Filp 2,8). Dos trinta e três anos que viveu entre nós, trinta foram vividos em Nazaré. Se você quiser saber como foi a vida do Filho de Deus durante os anos que ele viveu em Nazaré, procure conhecer a vida de qualquer nazareno daquela época, mude o nome, coloque Jesus e você terá a vida do Filho de Deus durante trinta dos trinta e três anos da sua vida, igual a nós em tudo, menos no pecado (Hb 4,15). Nestes trinta anos da sua vida, “o menino crescia e ficava forte, cheio de sabedoria. E a graça de Deus estava com ele”. Em outro lugar Lucas afirma a mesma coisa com outras palavras. Ele diz que o menino “crescia em sabedoria, idade e tamanho diante de Deus e dos homens” (Lc 2,52). Crescer em Sabedoria significa assimilar os conhecimentos, a experiência humana acumulada ao longo dos séculos: os tempos, as festas, os remédios, as plantas, as orações, os costumes, etc. Isto se aprende vivendo e convivendo na comunidade natural do povoado. Crescer em Tamanho significa nascer pequeno, crescer aos poucos e ficar adulto. É o processo de cada ser humano com suas alegrias e tristezas, descobertas e frustrações, raivas e amores. Isto se aprende vivendo e convivendo na família com os pais, os irmãos e irmãs, os tios, os parentes. Crescer em Graça significa: descobrir a presença de Deus na vida, a sua ação em tudo que acontece, a vocação, o chamado dele. A carta aos hebreus diz que: “Embora fosse filho de Deus, Jesus teve que aprender a ser obediente através dos seus sofrimentos” (Hb 4,8).

Para um confronto pessoal
1. Conhece pessoas como Ana, que tem um olhar de fé sobre as coisas da vida?
2. Crescer em sabedoria, tamanho e graça: como isto acontece em minha vida?

quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

29 de dezembro (Quinto dia da Oitava do Natal)

Evangelho (Lc 2,22-35): E quando se completaram os dias da purificação, segundo a lei de Moisés, levaram o menino a Jerusalém para apresentá-lo ao Senhor, conforme está escrito na Lei do Senhor: «Todo primogênito do sexo masculino será consagrado ao Senhor”. Para tanto, deviam oferecer em sacrifício um par de rolas ou dois pombinhos, como está escrito na Lei do Senhor. Ora, em Jerusalém vivia um homem piedoso e justo, chamado Simeão, que esperava a consolação de Israel. O Espírito do Senhor estava com ele. Pelo próprio Espírito Santo, ele teve uma revelação divina de que não morreria sem ver o Ungido do Senhor. Movido pelo Espírito, foi ao templo. Quando os pais levaram o menino Jesus ao templo para cumprirem as disposições da Lei, Simeão tomou-o nos braços e louvou a Deus, dizendo: «Agora, Senhor, segundo a tua promessa, deixas teu servo ir em paz, porque meus olhos viram a tua salvação, que preparaste diante de todos os povos: luz para iluminar as nações e glória de Israel, teu povo». O pai e a mãe ficavam admirados com aquilo que diziam do menino. Simeão os abençoou e disse a Maria, a mãe: «Este menino será causa de queda e de reerguimento para muitos em Israel. Ele será um sinal de contradição — e a ti, uma espada traspassará tua alma! — e assim serão revelados os pensamentos de muitos corações».

«Agora, Senhor, deixas (...) teu servo ir em paz, porque meus olhos viram a tua salvação»

Chanoine Dr. Daniel MEYNEN (Saint Aubain, Namur, Bélgica)

Hoje, 29 de dezembro, celebramos o santo Rei Davi. Mas, é a toda a família de Davi que a Igreja quer honrar e especialmente ao mais ilustre de todos eles: a Jesus, o Filho de Deus, Filho de Davi! Hoje, nesse eterno “hoje” do Filho de Deus, a Antiga Aliança do tempo do Rei Davi realiza-se e cumpre-se em toda sua plenitude. Pois, como relata o Evangelho de hoje, o Menino Jesus é apresentado ao Templo por seus pais para cumprir com a Antiga Lei: «E quando se completaram os dias da purificação, segundo a lei de Moisés, levaram o menino a Jerusalém para apresentá-lo ao Senhor, conforme está escrito na Lei do Senhor: Todo primogênito do sexo masculino será consagrado ao Senhor (Lc 2,22-23).

Hoje, eclipsa-se a velha profecia para dar passo à nova: Aquele, a quem o Rei Davi tinha anunciado ao entonar seus salmos messiânicos, entrou por fim no Templo de Deus! Hoje é o grande dia em que aquele que São Lucas chama Simeão logo abandonará este mundo de obscuridade para entrar na visão da Luz eterna: «Agora, Senhor, segundo a tua promessa, deixas teu servo ir em paz, porque meus olhos viram a tua salvação, que preparaste diante de todos os povos: luz para iluminar as nações e glória de Israel, teu povo» (Lc 2,29-32).

Também nós, que somos o Santuário de Deus em que seu Espírito habita (cf. 1Cor 3,16), devemos ficar atentos para receber a Jesus no nosso interior. Se hoje temos a fortuna de comungar, peçamos a Maria, a Mãe de Deus que interceda por nós ante seu Filho: que morra o homem velho e que novo homem (cf. Col 3,10) nasça em todo nosso ser, a fim de converter-nos nos novos profetas, os que anunciem ao mundo inteiro a presença de Deus três vezes, Pai, Filho e Espírito Santo!

Como Simão, sejamos profetas pela morte do “homem velho”! Como disse o Papa João Paulo II «a plenitude do Espírito de Deus vem acompanhada (...) antes que nada pela disponibilidade interior que provém da fé. Disso, o ancião Simeão “homem justo e piedoso”, teve a intuição no momento da apresentação de Jesus no Templo».

«Meus olhos viram a tua salvação»

Rev. D. Joaquim MONRÓS i Guitart (Tarragona, Espanha)

Hoje, contemplamos a Apresentação do Menino Jesus no Templo, cumprindo a prescrição da Lei de Moisés: purificação da mãe e apresentação e resgate do primogénito.

São Josemaria descreve esta situação no quarto mistério gozoso do seu livro O Santo Rosário, convidando-nos a fazer parte da cena: «E desta vez, meu amigo, hás de ser tu a levar a gaiola das rolas. – Estás a ver? Ela, a Imaculada, submete-se à Lei como se estivesse imunda. Aprenderás com este exemplo, menino tonto, a cumprir a Santa Lei de Deus, apesar de todos os sacrifícios pessoais?

«Purificação! Tu e eu, sim, que realmente precisamos de purificação! – Expiação e, além da expiação, o Amor. – Um amor que seja cautério: que abrase a sujidade da nossa alma, que incendeie, com chamas divinas, a miséria do nosso coração».

Vale a pena aproveitar o exemplo de Maria para “limpar” a nossa alma neste tempo do Natal, fazendo uma confissão sacramental sincera, para poder receber o Senhor com as melhores disposições. Assim, José apresenta a oferenda de um par de rolas, mas oferece principalmente a sua capacidade de realizar, com o seu trabalho e com o seu amor castíssimo, o plano de Deus para a Sagrada Família, modelo de todas as famílias.

Simeão recebeu do Espírito Santo a revelação de que não morreria sem ver Cristo. Vai ao Templo e, ao receber o Messias nos seus braços, cheio de alegria, diz-lhe: «Agora, Senhor, segundo a tua promessa, deixas teu servo ir em paz, porque meus olhos viram a tua salvação» (Lc 2,29-30). Neste Natal, contemplemos, com olhos de fé, Jesus que vem salvar-nos com o seu nascimento. Assim como Simeão entoou um cântico de ação de graças, alegremo-nos cantando diante do presépio, em família, e no nosso coração, pois sabemo-nos salvos pelo Menino Jesus.

Reflexões de Frei Carlos Mesters, O.Carm

* Os primeiros dois capítulos do Evangelho de Lucas, escrito na metade dos anos 80, não são história no sentido em que nós hoje entendemos a história. Funcionam muito mais como espelho, onde os cristãos convertidos do paganismo descobriam que Jesus tinha vindo realizar as profecias do Antigo Testamento e atender às mais profundas aspirações do coração humano. São também símbolo e espelho do que estava acontecendo entre os cristãos do tempo de Lucas. As comunidades vindas do paganismo tinham nascido das comunidades dos judeus convertidos, mas eram diferentes. O Novo não correspondia ao que o Antigo imaginava e esperava. Era "sinal de contradição" (Lc 2,34), causava tensões e era fonte de muita dor. Na atitude de Maria, imagem do Povo de Deus, Lucas apresenta um modelo de como perseverar no Novo, sem ser infiel ao Antigo.

* Nestes dois primeiros capítulos do evangelho de Lucas tudo gira em torno do nascimento de duas crianças: João e Jesus. Os dois capítulos nos fazem sentir o perfume do Evangelho de Lucas. Neles, o ambiente é de ternura e de louvor. Do começo ao fim, se louva e se canta, pois, finalmente, a misericórdia de Deus se revelou e, em Jesus, ele cumpriu as promessas feitas aos pais. E Deus as cumpriu em favor dos pobres, dos anawim, como Isabel e Zacarias, Maria e José, Ana e Simeão, os pastores. Estes souberam esperar pela sua vinda.

* A insistência de Lucas em dizer que Maria e José cumpriram tudo aquilo que a Lei prescreve evoca o que Paulo escreveu na carta aos Gálatas: “Quando chegou a plenitude do tempo, Deus enviou o seu Filho. Ele nasceu de uma mulher, submetido à Lei para resgatar aqueles que estavam submetidos à Lei, a fim de que fôssemos adotados como filhos” (Gal 4,4-5).

* A história do velho Simeão ensina que a esperança, mesmo demorada, um dia se realiza. Ela não se frustra nem se desfaz. Mas a forma de ela realizar-se nem sempre corresponde à maneira como a imaginamos. Simeão esperava o Messias glorioso de Israel. Chegando ao templo, no meio de tantos casais que trazem seus meninos ao templo, ele vê um casal pobre lá de Nazaré. É neste casal pobre com seu menino ele vê a realização da sua esperança e da esperança do povo: “Meus olhos viram a tua salvação, que preparaste diante de todos os povos: luz para iluminar as nações e glória do teu povo, Israel."

* No texto do evangelho deste dia, aparecem os temas preferidos de Lucas, a saber, uma grande insistência na ação do Espírito Santo, na oração e no ambiente orante, uma atenção contínua à ação e à participação das mulheres, e uma preocupação constante com os pobres e com a mensagem a ser dada aos pobres.

Para um confronto pessoal
1. Você seria capaz de perceber numa criança pobre a luz para iluminar as nações?
2. Você seria capaz de aguentar uma vida inteira esperando a realização da sua esperança?

quarta-feira, 27 de dezembro de 2017

28 de dezembro: Os Santos Inocentes, mártires

Evangelho (Mt 2,13-18): Depois que os magos se retiraram, o anjo do Senhor apareceu em sonho a José e lhe disse: «Levanta-te, toma o menino e sua mãe e foge para o Egito! Fica lá até que eu te avise, porque Herodes vai procurar o menino para matá-lo». José levantou-se, de noite, com o menino e a mãe, e retirou-se para o Egito; e lá ficou até à morte de Herodes. Assim se cumpriu o que o Senhor tinha dito pelo profeta: «Do Egito chamei o meu filho».  Quando Herodes percebeu que os magos o tinham enganado, ficou furioso. Mandou matar todos os meninos de Belém e de todo o território vizinho, de dois anos para baixo, de acordo com o tempo indicado pelos magos. Assim se cumpriu o que foi dito pelo profeta Jeremias: «Ouviu-se um grito em Ramá, choro e grande lamento: é Raquel que chora seus filhos e não quer ser consolada, pois não existem mais».

«José levantou-se, de noite, com o menino e a mãe, e retirou-se para o Egito »

Rev. D. Joan Pere PULIDO i Gutiérrez (Sant Feliu de Llobregat, Espanha)

Hoje celebramos a festa dos Santos Inocentes, mártires. Introduzidos nas celebrações de Natal, não podemos ignorar a mensagem que a liturgia quer nos transmitir para definir, ainda mais, a Boa Nova do nascimento de Jesus, com dois acentos bem claros. Em primeiro lugar, a predisposição de São José no desígnio salvador de Deus, aceitando sua vontade. E, por sua vez, o mal, a injustiça que frequentemente encontramos em nossa vida, concretizada na morte martirial das crianças Inocentes. Tudo isso pede-nos uma atitude e uma resposta pessoal e social.

São José nos oferece um testemunho bem claro de resposta decidida perante o chamado de Deus. Nele nos sentimos identificados quando devemos tomar decisões nos momentos difíceis de nossa vida e de nossa fé: «Levantou-se de noite, com o menino e a mãe, e retirou-se para Egito» (Mt 2,14).

Nossa fé em Deus implica a nossa vida. Faz que nos levantemos, quer dizer faz nos estar atentos às coisas que acontecem em nosso redor, porque —frequentemente— é o lugar onde Deus fala. Faz nos tomar ao Menino com sua mãe, quer dizer, Deus faz-se nos próximo, companheiro de caminho, reforçando a nossa fé, esperança e caridade. E faz nos sair de noite para Egito, isto é, convida-nos a não ter medo perante nossa própria vida, que com frequência enche-se de noites difíceis de iluminar.

Estas crianças mártires, também hoje, têm nomes concretos em crianças, jovens, casais, pessoas idosas, imigrantes, doentes...que pedem a resposta de nossa caridade. Assim nos diz João Paulo II: «Em efeito, são muitas, em nosso tempo, as necessidades que interpelam à sensibilidade cristã. É hora de uma nova imaginação da caridade, que se desdobre não só na eficácia da ajuda emprestada, mas também na capacidade de nos fazer próximos e solidários com o que sofre».

Que a nova luz, clara e forte de Deus feito Menino encha nossas vidas e consolide nossa fé, nossa esperança e nossa caridade.

Reflexões de Frei Carlos Mesters, O.Carm

* O Evangelho de Mateus, redigido em torno dos anos 80 e 90, tem a preocupação de mostrar que em Jesus se realizam as profecias. Muitas vezes se diz: “Isto aconteceu para que se realizasse o que diz a escritura...” (cf. Mt 1,22; 2,17.23; 4,14; 5,17; etc.). É porque os destinatários do Evangelho de Mateus são as comunidades de judeus convertidos que viviam uma crise profunda de fé e de identidade. Depois da destruição de Jerusalém no ano 70, os fariseus eram o único grupo sobrevivente do judaísmo. Nos anos 80, quando eles começaram a se reorganizar, crescia a oposição entre judeus fariseus e judeus cristãos. Estes últimos acabaram sendo excomungados da sinagoga e separados do povo das promessas. A excomunhão tornou agudo o problema da identidade. Já não podiam mais frequentar suas sinagogas. E vinha a dúvida: Será que erramos? Quem é o verdadeiro povo de Deus? Jesus é realmente o Messias?

* É para este grupo sofrido que Mateus escreve o seu evangelho como Evangelho da consolação para ajudá-los a superar o trauma da ruptura; como Evangelho da revelação para mostrar que Jesus é o verdadeiro Messias, o novo Moisés, no qual se realizam as promessas; como Evangelho da nova prática para ensinar o caminho de como alcançar a nova justiça, maior do que a justiça dos fariseus (Mt 5,20).

* No evangelho de hoje transparece esta preocupação de Mateus. Ele consola as comunidades perseguidas mostrando que Jesus também foi perseguido. Ele revela que Jesus é o Messias, pois por duas vezes insiste em dizer que as profecias nele se realizaram; e sugere ainda que Jesus seja o novo Moisés, pois como Moisés foi perseguido e teve que fugir. Ele aponta um novo caminho, sugerindo que devem fazer como os magos que souberam driblar a vigilância da Herodes e voltaram por um ouro caminho para casa.

Para um confronto pessoal
1. Herodes mandou matar as crianças de Belém. O Herodes de hoje continua matando milhões de crianças. Elas morrem de fome, de doença, de desnutrição, de aborto. Quem é hoje Herodes?
2. Mateus ajuda a superar a crise de fé e de identidade. Hoje, muitos vivem uma crise profunda de fé e de identidade. Como o Evangelho pode ajudar a superar esta crise?

terça-feira, 26 de dezembro de 2017

27 de dezembro: São João, apóstolo e evangelista

Evangelho (Jo 20,2-8): Maria Madalena saiu correndo e foi se encontrar com Simão Pedro e com o outro discípulo, aquele que Jesus mais amava. Disse-lhes: «Tiraram o Senhor do túmulo e não sabemos onde o colocaram». Pedro e o outro discípulo saíram e foram ao túmulo. Os dois corriam juntos, e o outro discípulo correu mais depressa, chegando primeiro ao túmulo. Inclinando-se, viu as faixas de linho no chão, mas não entrou. Simão Pedro, que vinha seguindo, chegou também e entrou no túmulo. Ele observou as faixas de linho no chão, e o pano que tinha coberto a cabeça de Jesus: este pano não estava com as faixas, mas enrolado num lugar à parte. O outro discípulo, que tinha chegado primeiro ao túmulo, entrou também, viu e creu.

«Viu e creu»

Rev. D. Manel VALLS i Serra (Barcelona, Espanha)

Hoje, a liturgia celebra a solenidade de são João, apóstolo e evangelista. Ao dia seguinte de Natal, a Igreja celebra a festa do primeiro mártir da fé cristã: são Estevão. E ao dia seguinte, a festa de são João, aquele que melhor e mais profundamente penetra no mistério do Verbo encarnado, o primeiro "teólogo" e modelo de tudo verdadeiro “teólogo”. A passagem do seu Evangelho que hoje se propõe ajuda-nos a contemplar o Natal desde a perspectiva da Ressurreição do Senhor. Por isso, João, ao chegar até o túmulo vazio, «viu e creu» (Jo 20,8). Confiados na testemunha dos Apóstolos, nos vemos movidos em cada Natal a "ver" e "crer".

Cada um pode reviver esses "ver" e "crer" a propósito do nascimento de Jesus, o Verbo encarnado. João movido pela intuição do seu coração —e, deveríamos acrescentar pela "graça"— "vê mais além do que seus olhos naquele momento podem contemplar. Na realidade, se ele crê, vê sem "ter visto" ainda a Cristo, com o qual já tem implícita a louvação para aqueles que «não viram, e creram!» (Jo 20,29), com o qual acaba o capítulo do seu Evangelho.

Pedro e João "correm" juntos até o túmulo, mais o texto nos diz que João «o outro discípulo correu mais depressa, chegando primeiro ao túmulo» (Jo 20,4). Parece como se João desejasse mais estar ao lado de Aquele que amava —Cristo— do que estar fisicamente ao lado de Pedro, ante o qual, porém —com um gesto de esperá-lo e que seja ele quem entre primeiro ao túmulo— demonstra que é Pedro quem tem a primazia no Colégio Apostólico. Com tudo, o coração ardente, cheio de zelo, fervoroso de amor por João, é o que o leva a "correr" e "avançar", convidando-nos a viver igualmente a nossa fé com este desejo ardente de encontrar ao Ressuscitado.

Reflexões de Frei Carlos Mesters, O.Carm

* O evangelho de hoje traz o trecho do Evangelho de João, que fala do Discípulo Amado. Provavelmente, escolheram este texto para ser lido e meditado no dia de hoje, festa de São João Evangelista, por causa da identificação espontânea que todos fazemos do discípulo amado com o apóstolo João. O curioso é que, em canto algum do evangelho de João, se diz que o discípulo amado é João. Mas desde o mais remoto início da Igreja sempre se insistiu na identificação dos dois. Porém, insistindo demais na semelhança entre os dois corremos o risco de perder um aspecto muito importante da mensagem do Evangelho a respeito do discípulo amado.

* No evangelho de João o discípulo amado representa a nova comunidade que nasce ao redor de Jesus. O Discípulo Amado está ao pé da Cruz junto com Maria, a mãe de Jesus (Jo 19,26). Maria representa o Povo da antiga aliança. No fim do primeiro século, época em que foi feita a redação final do Evangelho de João, havia o conflito crescente entre a sinagoga e a igreja. Alguns cristãos queriam abandonar o Antigo Testamento e ficar só com o Novo Testamento. Ao pé da Cruz Jesus diz: “Mulher, eis aí teu filho!” E ao discípulo amado: “Filho, eis aí tua mãe!” Os dois devem permanecer unidos, como mãe e filho. Separar o Antigo Testamento do Novo Testamento era naquele tempo o mesmo que hoje chamamos de separação entre fé (NT) e vida (AT).

* No evangelho de hoje, Pedro e o Discípulo Amado, alertados pelo testemunho de Maria Madalena, correm juntos para o Santo Sepulcro. O jovem é mais veloz que o velho e chega primeiro. Ele olha para dentro do sepulcro, observa tudo, mas não entra. Ele deixa Pedro entrar primeiro. Pedro entrou. É sugestiva a maneira como o evangelho descreve a reação dos dois homens diante do que ambos viram: “Então Pedro, que vinha correndo atrás, chegou também e entrou no túmulo. Viu os panos de linho estendidos no chão e o sudário que tinha sido usado para cobrir a cabeça de Jesus. Mas o sudário não estava com os panos de linho no chão; estava enrolado num lugar à parte. Então o outro discípulo, que tinha chegado primeiro ao túmulo, entrou também. Ele viu e acreditou”. Ambos viram a mesma coisa, mas só se diz do Discípulo Amado que ele acreditou: “Depois entrou o discípulo: olhou e acreditou!” Por quê? Será que Pedro não acreditou?

* O discípulo amado tem um olhar diferente que percebe mais que os outros. Tem um olhar amoroso que percebe a presença da novidade de Deus. Na madrugada depois daquela noite de pescaria e depois da pesca milagrosa, é ele, o discípulo amado, que percebe a presença de Jesus e diz: “É o Senhor!” (Jo 21,7). Naquela ocasião, Pedro, alertado pela afirmação do discípulo amado também reconheceu e começou a enxergar. Pedro aprendeu do discípulo amado. Em seguida, Jesus perguntou três vezes; “Pedro, você me ama?” (Jo 21,15.16.17). Por três vezes, Pedro respondeu: “Tu sabes que eu te amo!” Depois da terceira vez, Jesus confiou as ovelhas aos cuidados de Pedro, pois neste momento também Pedro se tornou “Discípulo Amado”.

Para um confronto pessoal
1. Todos que acreditamos em Jesus somos hoje o Discípulo Amado. Será que tenho o mesmo olhar amoroso para perceber a presença de Deus e crer na sua ressurreição?
2. Separar o Antigo do Novo Testamento é o mesmo que separar Vida e Fé. Como faço e vivo isto?

segunda-feira, 25 de dezembro de 2017

26 de dezembro: São Estevão, promártir

Evangelho (Mt 10,17-22): Naquele tempo, Jesus disse aos Apóstolos: «Cuidado com as pessoas, pois vos entregarão aos tribunais e vos açoitarão nas suas sinagogas. Por minha causa, sereis levados diante de governadores e reis, de modo que dareis testemunho diante deles e diante dos pagãos. Quando vos entregarem, não vos preocupeis em como ou o que falar. Naquele momento vos será dado o que falar, pois não sereis vós que falareis, mas o Espírito do vosso Pai falará em vós. O irmão entregará à morte o próprio irmão; o pai entregará o filho; os filhos se levantarão contra seus pais e os matarão. Sereis odiados por todos, por causa do meu nome. Mas quem perseverar até o fim, esse será salvo».

«Eles vos levarão aos seus tribunais e açoitar-vos-ão»

Fray Josep Mª MASSANA i Mola OFM (Barcelona, Espanha)

Hoje, mal acabámos de saborear a profunda experiência do Nascimento do Menino Jesus, muda o panorama litúrgico. Podíamos pensar que celebrar um mártir não combina com o encanto do Natal… O martírio de Sto. Estevão, que veneramos como protomártir do cristianismo, entra plenamente na teologia da Encarnação do Filho de Deus. Jesus veio ao mundo para derramar o seu Sangue por nós. Estevão foi o primeiro a derramar o seu sangue por Jesus. Lemos neste Evangelho como o próprio Jesus o anuncia: «Eles vos levarão aos seus tribunais e (…) sereis levados diante dos governadores e dos reis: servireis de testemunha» (Mt 10,17.18). Precisamente, “mártir” significa exatamente isto: testemunha.

Este testemunho de palavras e de obras dá-se graças à força do Espírito Santo: «O Espírito do vosso Pai (…) falará em vós» (Mt 10,19). Tal como lemos nos “Atos dos Apóstolos”, capítulo 7, Estevão, levado aos tribunais, deu uma lição magistral, percorrendo o Antigo Testamento, demonstrando que todo ele converge no Novo, na Pessoa de Jesus. N’Ele se cumpre tudo o que tinha sido anunciado pelos profetas e ensinado pelos patriarcas.

Na narrativa do seu martírio encontramos uma belíssima alusão trinitária: «Estevão, cheio do Espírito Santo, fitou o céu e viu a glória de Deus e Jesus de pé à direita de Deus» (At 7,55). A sua experiência foi como uma antecipação da Glória do Céu. E Estevão morreu como Jesus, perdoando aos que o imolavam: «Senhor, não lhes leves em conta este pecado» (At 7,60); rezou as palavras do Mestre: «Pai, perdoa-lhes; porque não sabem o que fazem» (Lc 23, 34).

Peçamos a este mártir que saibamos viver como ele, cheios do Espírito Santo, a fim de que, fixando o olhar no céu, vejamos Jesus à direita de Deus. Esta experiência fará que gozemos já do céu, enquanto estamos na terra.

«Vos entregarão aos tribunais e vos açoitarão »

+ Pe. Joan BUSQUETS i Masana (Sabadell, Barcelona, Espanha)

Hoje, a Igreja celebra a festa do seu primeiro mártir, o diácono São Estevão. O Evangelho, às vezes, parece desconcertante. Ontem transmitia-nos sentimentos de gozo e de alegria pelo Nascimento do Menino Jesus: «Os pastores retiraram-se, louvando e glorificando a Deus por tudo o que tinham visto e ouvido, de acordo com o que lhes tinha sido dito» (Lc 2,20). Hoje parece como se quisera-nos pôr sob aviso perante os perigos: «Cuidado com as pessoas, pois vos entregarão aos tribunais e vos açoitarão nas suas sinagogas» (Mt 10, 17). É que aqueles que queiram ser testemunhos, como os pastores na alegria do Nascimento, devem ser valentes como Estevão no momento de proclamar a Morte e Ressurreição de aquele Menino que tinha nele a Vida.

O mesmo Espirito que cobriu com sua sombra a Maria, a Mãe virgem, para que fosse possível a realização do plano de Deus de salvar aos homens; o mesmo Espirito que posou sob os Apóstolos para que saíssem do seu esconderijo e difundiram a Boa Nova —o Evangelho— pelo mundo todo, é o que dá forças àquele menino que discutia com os da sinagoga e perante o que «não podiam resistir à sabedoria e ao Espirito com que falava» (Fts 6,10).

Era um mártir na vida. Mártir significa “testemunho”. E foi também mártir por sua morte. Em vida teve em consideração as palavras do Mestre: «Quando vos entregarem, não vos preocupeis em como ou o que falar. Naquele momento vos será dado o que falar» (Mt 10,19). «Cheio do Espírito Santo, Estêvão olhou para o céu e viu a glória de Deus; e viu também Jesus, de pé, à direita de Deus». (At.7,55). Estevão o viu e disse. Se o cristão hoje é um testemunho de Jesus Cristo, o que viu com os olhos da fé o vai dizer sem medo com as palavras mais compreensíveis, quer dizer, com fatos, com obras.

Reflexões de Frei Carlos Mesters, O.Carm

* O contraste é grande. Ontem, dia de Natal, foi o presépio do recém-nascido com o canto dos anjos e a visita dos pastores. Hoje é o sangue derramado de Estevão, apedrejado até a morte, porque teve a coragem de crer na promessa expressa na simplicidade do presépio. Estevão criticou a interpretação fundamentalista da Lei de Deus e o monopólio do Templo. Por isso foi morto por eles (At 6,13-14).

* Hoje, na festa de Estevão, primeiro mártir, a liturgia traz um trecho do evangelho de Mateus (Mt 10,17-22), tirado do assim chamado Sermão da Missão (Mt 10,5-42). Nele Jesus adverte os seus discípulos dizendo que a fidelidade ao evangelho traz dificuldades e perseguição: “eles entregarão vocês aos tribunais e açoitarão vocês nas sinagogas deles”. Mas para Jesus o que importa na perseguição não é o lado doloroso do sofrimento, mas sim o lado positivo do testemunho: “Vocês vão ser levados diante de governadores e reis, por minha causa, a fim de serem testemunhas para eles e para as nações”. A perseguição é uma oportunidade para dar testemunho da Boa Nova de Deus que Jesus nos trouxe.

* Foi o que aconteceu com Estevão. Ele deu testemunho da sua fé em Jesus até o último momento da sua vida. Na hora de morrer ele disse: “Vejo os céus abertos, e o Filho do Homem em pé à direita de Deus” (At 7,56). E ao cair morto debaixo das pedradas imitou Jesus gritando: “Senhor, não lhes leve em conta este pecado!” (At 7,60; Lc 23,34).

* Jesus tinha dito: “Quando entregarem vocês, não fiquem preocupados como ou com aquilo que vocês vão falar, porque, nessa hora, será sugerido a vocês o que vocês devem dizer. Com efeito, não serão vocês que irão falar, e sim o Espírito do Pai de vocês é quem falará através de vocês”. Esta profecia de Jesus também se realizou em Estevão. Os seus adversários “não podiam resistir à sabedoria e ao Espírito com o qual ele falava” (At 6,10). “Os membros do sinédrio tiveram a impressão de ver em seu rosto o rosto de um anjo” (At 6,15). Estevão falava “repleto do Espírito Santo” (At 7,55). Por isso, a raiva dos outros era maior e o lincharam na hora.

* Até hoje acontece o mesmo. Em muitos lugares muita gente é arrastada diante dos tribunais e sabe dar respostas que superam em sabedoria aos sábios e entendidos (Lc 10,21).

Para um confronto pessoal
1. Colocando-se na posição de Estevão: você já sofreu alguma vez por causa da sua fidelidade ao Evangelho?
2. A simplicidade do presépio e a dureza do martírio vão de par em par na vida dos Santos e Santas e na vida de tantas pessoas que hoje são perseguidas até a morte por causa da sua fidelidade ao evangelho. Você conheceu de perto pessoas assim?

sábado, 23 de dezembro de 2017

A Natividade do Senhor (Missa da Meia Noite)

Textos: Is 9, 1-3, 5-6; Tit 2, 11-14; Lc 2, 1-14

Evangelho (Lc 2,1-14): Naqueles dias, saiu um decreto do imperador Augusto mandando fazer o recenseamento de toda a terra — o primeiro recenseamento, feito quando Quirino era governador da Síria. Todos iam registrar-se, cada um na sua cidade. Também José, que era da família e da descendência de Davi, subiu da cidade de Nazaré, na Galileia, à cidade de Davi, chamada Belém, na Judéia, para registrar-se com Maria, sua esposa, que estava grávida. Quando estavam ali, chegou o tempo do parto. Ela deu à luz o seu filho primogênito, envolveu-o em faixas e deitou-o numa manjedoura, porque não havia lugar para eles na hospedaria.  Havia naquela região pastores que passavam a noite nos campos, tomando conta do rebanho. Um anjo do Senhor lhes apareceu, e a glória do Senhor os envolveu de luz. Os pastores ficaram com muito medo. O anjo então lhes disse: «Não tenhais medo! Eu vos anuncio uma grande alegria, que será também a de todo o povo: hoje, na cidade de Davi, nasceu para vós o Salvador, que é o Cristo Senhor! E isto vos servirá de sinal: encontrareis um recém-nascido, envolto em faixas e deitado numa manjedoura» De repente, juntou-se ao anjo uma multidão do exército celeste cantando a Deus: «Glória a Deus no mais alto dos céus, e na terra, paz aos que são do seu agrado!».

«E a Palavra se fez carne e veio morar entre nós (Jo 1,14)»

Mons. Jaume PUJOL i Balcells Arcebispo de Tarragona e Primaz de Catalunha (Tarragona, Espanha)

Hoje, com a simplicidade das crianças, consideramos o grande mistério de nossa fé. O nascimento de Jesus marca a chegada da “plenitude dos tempos”. Desde o pecado de nossos primeiros pais, a linhagem humana se havia afastado do Criador. Mas Deus, compadecido de nossa triste situação, enviou o seu Filho eterno, nascido da Virgem Maria, para resgatar-nos da escravidão do pecado.

O apóstolo João o explica usando expressões de grande profundidade teológica: «No princípio era o Verbo, e o Verbo estava junto de Deus e o Verbo era Deus.» (Jo 1,1). João chama “Palavra” ao Filho de Deus, a segunda pessoa da Santíssima Trindade. E complementa: «E o verbo se fez carne e habitou entre nós, e vimos sua glória, a glória que o filho único recebe do seu pai, cheio de graça e de verdade» (Jo 1,14).

Isto é o que celebramos hoje, por isso fazemos festa. Maravilhados, contemplamos Jesus acabado de nascer. É um recém-nascido… E, ao mesmo tempo, Deus onipotente; sem deixar de ser Deus, agora é também um de nós.

Veio à terra para devolver-nos a condição de filhos de Deus. Mas é necessário que cada um acolha em seu interior a salvação que Ele nos oferece. Tal como explica São João, «Mas a todos aqueles que o receberam, aos que creem no seu nome, deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus» (Jo 1,12). Filhos de Deus! Ficamos admirados ante este mistério inefável: «O Filho de Deus se fez filho do homem para fazer aos homens filhos de Deus» (São João Crisóstomo).

Acolhamos Jesus, busquemos: somente Nele encontraremos a salvação, a verdadeira solução para nossos problemas; só Ele dá o último sentido da vida e das contrariedades e da dor. Por isto, hoje lhes proponho: vamos ler mais o Evangelho, vamos meditá-lo; vamos procurar viver verdadeiramente de acordo com os ensinamentos de Jesus, ele Filho de Deus que veio a nós. E então veremos como será verdade que, entre todos, faremos um mundo melhor.

Os paradoxos de Deus na noite de Natal.

Pe. Antonio Rivero, L.C

Deus feito homem. O Eterno desceu no tempo. O não abarcável e Infinito cabe nos braços de Maria. A Palavra do Pai no silêncio. O Imensamente Rico deitado num presépio e envolvido em faixas. O Alimentador do gênero humano necessitado do peito de Maria para não morrer. O Fogo ardente da caridade tremendo de frio nessa noite gelada de inverno. O Desejado das nações rejeitado; e como não tinha lugar para Ele nas hospedagens deste mundo humano, teve que nascer num curral de animais.

Em primeiro lugar, por que e para que destes paradoxos? Porque se cumpriu o tempo, o “Kairòs” pensado por Deus desde toda a eternidade para reconquistar o homem caído e fazê-lo entrar na luz (primeira leitura). E tudo por pura benignidade de Deus, para nos converter em povo seu (segunda leitura), para devolver-lhe a sua glória e trazer a paz tão desejada para toda a humanidade (evangelho). Paz com essa densidade bíblica: bem-estar, prosperidade, desenvolvimento, alegria, justiça. Paz que é harmonia entre homem e homem; entre homem e cosmos; entre homem e Deus. A paz é a definição mesma de Cristo, “Príncipe da paz”. Paz que é vida, amor, salvação, doação. “Não apaguemos a chama ardente desta paz acesa por Cristo” (François Mauriac).

Em segundo lugar, como aconteceram estes paradoxos? Na simplicidade dos personagens: uma donzela humilde e pura, um casto varão, justo e sem dinheiro, e um menino indefeso que é puro candor e ternura; uns pastores pobres sem poder, sem influencias nem títulos, que viviam na intempérie e na vida seminômade. Na simplicidade do lugar: não na Jerusalém prestigiosa e religiosa, mas na pequena cidade de Belém, lugar do pão; esse pão terno de Jesus que necessitará ser cozinhado durante esses anos de vida oculta e pública, até chegar no forno do Cenáculo e do Calvário; e chegará a nós misteriosamente em cada missa. Na simplicidade da cova miserável de animais porque os humanos não lhe deram hospedagem. Na simplicidade da noite, sem barulhos de foguetes, bengalas e fogos artificiais.

Finalmente, em troca de que estes paradoxos? De que nossos olhos olhem para Ele com ternura e lhe deem um sorriso, e assim dos nossos olhos caiam as escamas das nossas miopias. De que nossos lábios o beijem e ficam assim purificados, livres já de mentiras e de palavras indignas. De que nossos braços o acolham, e fiquem bem fortalecidos para ajudar ao irmão que está prostrado no chão da depressão ou da tristeza. De que nossas mãos o acariciem e se abram à generosidade com os que sofrem e estão necessitados. De que nossos joelhos se dobrem e o adorem na oração como Deus e Senhor. De que nosso coração seja uma doce hospedagem onde convidar Jesus.

Para refletir: Com são Leão Magno refletimos: “Não pode existir lugar para a tristeza, quando nasce aquela vida que vem para destruir o temor da morte e para dar-nos a esperança de uma eternidade gozosa. Que ninguém se considere excluído desta alegria, pois o motivo deste gozo é comum para todos; nosso Senhor, de fato, vencedor do pecado e da morte, assim como não encontrou ninguém livre de culpabilidade, assim veio para salvar todos. Alegre-se, pois, o justo, porque se aproxima à recompensa; regozija-se o pecador, porque será condecorado com o perdão; anime-se o pagão, porque está chamado à vida” (Sermão I sobre o Natal, 1-3).

Para rezar: Terminemos com esta oração: “Menino do presépio, pequeno Deus Menino, irmão dos homens. A minha alma se enche de ternura e o coração de alegria, quando vos vejo assim, pequeno, pobre e humilde, débil e indefeso, deitado nas palhas do presépio. Ensinai-me, Jesus, a apreciar o que vale vossa doce Encarnação. Ajudai-me a compreender o profundo sentido da vossa presença entre nós. Fazei que o meu coração sinta a grandeza da vossa generosidade, a profundidade da vossa humildade, a maravilha da vossa bondade e do vosso amor salvador. Não vos peço entender os paradoxos de Belém, porém peço-vos saborear esses paradoxos com o coração extasiado na fé e na gratidão”.

Qualquer sugestão ou dúvida podem se comunicar com o padre Antonio neste e-mail:  arivero@legionaries.org.