sábado, 27 de dezembro de 2014

A família de Nazaré

Evangelho (Lc 2,22-40)
Celso Loraschi

O texto de Lucas faz parte do conhecido “evangelho da infância” de Jesus (Lc 1-2). Os personagens citados nesse evangelho da infância são retratados como escolhidos de Deus, por meio dos quais ele realiza o seu plano de amor e de salvação universal. A própria etimologia dos nomes, na língua hebraica, revela traços do rosto divino: Gabriel (Deus é forte), Zacarias (Deus se lembra), Isabel (Deus é plenitude), João (Deus é favorável), Maria (amada de Deus), José (Deus acrescente), Ana (misericórdia), Simeão (Deus ouviu) e Jesus (Deus salva).

O texto deste domingo apresenta alguns desses personagens, Maria e José, Simeão e Ana, como fiéis seguidores da tradição religiosa de Israel. Cumprindo o que está escrito na Lei, Maria e José levam o menino Jesus ao templo para ser apresentado diante do Senhor e para oferecer sacrifícios (Lv 12,2-8). Se a mãe “não dispuser de recursos suficientes para oferecer um cordeiro, tomará duas rolas ou dois pombinhos” (Lv 12,8).

Lucas, em seu evangelho, faz questão de ressaltar que Deus se revela na história humana não por meio do poder, do dinheiro ou do prestígio social. É por intermédio dos simples e pequeninos que ele se dá a conhecer, e conta com eles para realizar o seu plano no mundo. Maria e José não faziam parte dos personagens importantes. Faziam parte dos “pobres de Javé”, isto é, punham sua total confiança em Deus e esperavam a vinda do Salvador; eram abertos à vontade de Deus e dispostos a assumir a missão que ele lhes indicava.

Também Simeão e Ana são apresentados por Lucas como pessoas afinadas com o plano de Deus. Não estão aí por acaso: representam o povo de Israel, que se manteve fiel na certeza da vinda do Salvador, conforme a promessa feita por meio dos profetas. O texto diz que Simeão “era justo e piedoso e esperava a consolação de Israel”; Ana era profetisa e “servia a Deus dia e noite com jejuns e orações”. São pessoas conduzidas pelo Espírito Santo que sabem discernir e acolher os sinais de Deus na história humana. Por isso, ambos se alegram, louvam a Deus e anunciam suas maravilhas.

Jesus, portanto, cresceu sob o cuidado de Maria e José, na simplicidade de um lar comum, participando de sua comunidade de fé e respeitando a tradição religiosa de seu povo. Conheceu a Deus com base no testemunho de seus pais e foi tomando consciência de sua identidade e de sua missão salvadora. “O menino foi crescendo, ficando forte e cheio de sabedoria. A graça de Deus estava com ele” (Lc 2,40). A sagrada família de Nazaré inspira as famílias cristãs de nossos dias: quando Deus é levado a sério e seu amor é vivido entre todos os que estão na casa, essa família torna-se portadora da bênção divina, “sujeito e objeto de evangelização, centro evangelizador de comunhão e participação”. É uma família “sagrada”.

Pistas para reflexão

- A família é bênção de Deus que precisa ser cultivada. Nas entrelinhas dos textos do Eclesiástico e da carta aos Colossenses, podemos captar o alerta diante do que pode ameaçar a vida familiar. É necessário cultivar os valores que a tradição de fé nos deixou como herança. São valores que atraem a bênção divina, como o comportamento de honra e de respeito dos filhos para com os pais, bem como os sentimentos de compaixão, bondade, humildade, mansidão, paciência e perdão mútuo. A família de Nazaré inspira a família de hoje a ser “sagrada”, tendo em vista a plena realização de cada um dos seus membros e a sua missão evangelizadora no mundo, como esclarece o Documento de Aparecida:

O casal santificado pelo sacramento do matrimônio é um testemunho da presença pascal do Senhor. A família cristã cultiva o espírito de amor e serviço. Quatro relações fundamentais da pessoa encontram seu pleno desenvolvimento na vida da família: paternidade, filiação, irmandade, nupcialidade. Essas mesmas relações compõem a vida da Igreja: experiência de Deus como Pai, experiência de Cristo como irmão, experiências de filhos em, com e pelo Filho, experiência de Cristo como esposo da Igreja. A vida em família reproduz essas quatro experiências fundamentais e as compartilha em miniatura: são quatro facetas do amor humano (DAp 583).

Outras reflexões sobre a família no Documento de Aparecida, números 567 a 616.

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