sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Formação Carmelita



ESPÍRITO DA ORDEM TERCEIRA DO CARMO
ROTEIRO DE FORMAÇÃO DA OTC DE FARO, PORTUGAL.

1. A Ordem Terceira do Carmo (ou Ordem Carmelita Secular) constitui um verdadeiro chamamento e uma vocação especial

No Corpo místico de Cristo, que é a Igreja, um único e mesmo Espírito foi suscitando, ao longo dos tempos, uma variedade de dons e carismas. S. Paulo, em 1Cor 12, deixou-nos uma página admirável sobre os dons carismáticos distribuídos pelo Espírito Santo entre os fiéis, que, em comunhão uns com os outros e em perfeita sintonia com a Hierarquia, formam a Igreja.

A Igreja participa da história, que percorre no decurso do tempo e no espaço. E assim como novas situações trazem consigo novas exigências na história da humanidade, assim também na história da comunidade crente.

A Igreja, portadora e mensageira da Boa Nova da salvação, não pode prescindir do Evangelho como luz que informa toda a sua vida. Ora Cristo ressaltou nos Evangelhos, em diversas ocasiões, a excelência dos conselhos evangélicos de pobreza, obediência e castidade (cf. ROTC 14)1. A fim de segui-lo de maneira mais radical, foram surgindo, através dos tempos, pessoas que, fascinadas pelo Evangelho, se constituíram em grupos, com o ideal de se estimularem no compromisso de seguir a Cristo mais de perto, adotando o seu estilo de vida por meio dos votos. A formação de tais grupos — chamados Ordens, Congregações ou Institutos Religiosos — constitui uma resposta às circunstâncias e exigências dos tempos. A Igreja não só amparou e discerniu o seu nascimento, como até os estruturou como formas estáveis de vida.

Tais Ordens e Congregações são verdadeiras famílias perfeitamente integradas na vida e na missão da Igreja, exercendo uma atração muito forte sobre a vida e a ação apostólica dos leigos, a ponto de influir na sua vida, despertando neles o desejo de se agruparem em volta delas e de se comprometerem a viver de forma mais radical a vida cristã, informados pela prática dos conselhos evangélicos nos diversos estados de vida a que pertencem (solteiros, casados, consagrados, sacerdócio, viúvos, etc.).

Foi assim que nasceram as Ordens Terceiras Seculares, contando-se, entre elas, a Ordem Terceira Carmelita. São ao todo dezessete as Ordens Terceiras Seculares. Embora difiram entre si, pois cada uma procura viver segundo o carisma e espiritualidade próprios da Ordem ou Congregação a que se filiou, no seu interior têm muito em comum, pois todas vão buscar ao seu tronco de origem os meios de graça de que necessitam para seguir os conselhos evangélicos com segurança e ardor na prática da caridade fraterna, tendo como objetivo chegar àquela santidade de vida que tanto contribui para a edificação e difusão do Reino de Deus entre os homens.

Desta forma, a Ordem Terceira do Carmo constitui, como as outras OT’s:

a) uma vocação especial e um verdadeiro chamamento à vida cristã;

b) este chamamento vincula fundamentalmente os membros da OCS através da profissão dos votos de obediência e de castidade;

c) pelo vínculo da obediência, o Carmelita Secular submete-se à jurisdição da Ordem, vivendo a vida cristã num contexto de vida fraterna;

d) este compromisso através dos votos dá-lhe estímulo e segurança na consecução do seu ideal de santidade na Igreja segundo o Evangelho.

A vocação à Ordem Carmelita Secular, embora não exclua ninguém, porque faz parte do patrimônio comum do Povo de Deus, é um chamamento especial à santidade, atingindo na realidade apenas alguns leigos, segundo os dons e a generosidade do seu próprio chamamento. Para eles, a OCS é fonte de energia, pois a simples pertença à Ordem já os faz participantes dos dons espirituais da mesma, que os predispõe e encoraja a tomar aquelas decisões firmes, tão necessárias à consecução da santidade de vida a que são chamados.

A OCS é, pois, uma verdadeira escola de vida cristã, com estilo de vida e com métodos próprios que orientam os seus membros na busca de Deus como o único Absoluto, seu primeiro e único ideal, capaz de orientá-los com segurança em tudo o que é relativo e secundário, porque não é Deus.

O Carmelita Secular, repleto do Espírito de Cristo, consegue discernir o verdadeiro valor das coisas e das pessoas que o rodeiam e abraça os valores do Reino, segundo a índole do Carmelo, a fim de chegar à união com Deus.

Ao tornar-se membro da Ordem do Carmo, fica assim muito mais habilitado a discernir e avaliar o justo valor das coisas temporais, que não são para ele um fim em si mesmo, mas apenas meios que o ajudam a crescer no amor de Cristo, unindo-o mais estreitamente a Deus e à Igreja e aos irmãos.

Desta forma, o Carmelita Secular contrasta com o relativismo e o secularismo reinantes, que, paradoxalmente, dão um valor quase absoluto ao subjetivo, ao instantâneo e ao material. A maioria das pessoas vive e age como se Deus não existisse, numa espécie de ateísmo prático; hoje, a grande responsabilidade do Carmelita Secular consiste em viver e anunciar que a vocação do homem só se realiza na perfeita união com Deus e com os irmãos no amor de Cristo.

2. Vinculação dos membros do sodalício à Ordem do Carmo através dos votos de obediência e de castidade segundo o próprio estado

O que vincula o Carmelita Secular à Ordem do Carmo é a profissão no sodalício (cf. ROTC 12), profissão esta que emite depois de a ela ser admitido após um tempo de preparação e formação de, pelo menos, um ano (noviciado).

Quando um candidato ou candidata ingressa no Sodalício é confiado a um formador que o introduz num cuidadoso processo formativo, onde é informado sobre todas as riquezas e vantagens espirituais de se filiar à Ordem do Carmo: conhecimento da Ordem, vinculação a ela pelos votos; meios para concretizar na sua vida os compromissos assumidos em fidelidade aos mesmos; ajuda fraterna; comunhão eclesial; testemunho do Evangelho; serviço ao homem.

Os votos de obediência e de castidade segundo o próprio estado que o Carmelita Secular faz no dia da sua profissão são os elementos mais fortes e eficazes nesta consagração profunda a Deus, a Quem, pelos mesmos votos, presta um culto maior, digno do próprio Deus, o seu único Absoluto.

3. Os votos, meios que nos ajudam a não ter dois senhores, mas um só: Deus

Para o Carmelita Secular, Deus é o único Senhor, não havendo no seu coração lugar para dois senhores; todo o espaço é ocupado pelo Absoluto de Deus. Pelos votos, ele vive a sua vocação cristã como Carmelita Secular, renovando, de forma esclarecida e consciente, as promessas do Batismo e Confirmação. Compromete-se assim na prática do amor a Deus e aos irmãos segundo a índole própria do Carmelo, assumindo livre e responsavelmente o primado do amor de Deus sobre tudo, de forma que o amor ao próximo e a si mesmo só tem sentido enquanto e na medida em que o ajuda a intensificar o seu amor e união a Deus, libertando-o de toda a divisão e ambiguidade.

Pelos votos de obediência e de castidade, o Carmelita Secular consegue um domínio sobre todos os impulsos desordenados do pecado, enraizado nele, impulsos que obstaculizam sempre a fonte de energia que existe dentro de nós, pois dividem e fragmentam interiormente o coração.

Pelo voto de obediência o Carmelita Secular despoja-se de si mesmo, reconhecendo Deus como o único Senhor a Quem deve obedecer. Para ele, a vontade de Deus prevalece sobre tudo, sabendo quando ela se manifesta, reconhecendo a sua soberania e aceitando-a livremente. Vontade de Deus que encontra nos Evangelhos, na Regra e nos Superiores do sodalício!

Pelo voto de castidade, o Carmelita Secular subjuga e domina os impulsos das suas paixões e afetividade. Se está casado, vive casto e puro, comportando-se, no próprio uso dos direitos que lhe são concedidos pelo matrimonio, como pessoa espiritual, servindo-lhe o sacramento do matrimonio para a santificação própria e do cônjuge. Se solteiro, comporta-se perante si mesmo e os demais como pessoa espiritual, casta e pura, tornando-se até mais livre para se dedicar a Deus; e, se chegar à renúncia total e livre do matrimônio, é porque vislumbrou o valor, excelência e fecundidade do celibato pelo Reino de Deus.

Com a prática destes votos, o Carmelita Secular atinge também no seu sentido mais profundo o conselho evangélico da pobreza, pois não sentirá nenhuma dificuldade em se despojar dos seus impulsos de ambição e ganância. Satisfeito com aquilo que tem, é desprendido e está sumamente grato a Deus pelo que dele recebeu, sabendo que só Deus basta!

Se isto fizer, o Carmelita Secular não corre o risco de servir a dois senhores, pois tem um só Amor: Deus, e, em Deus, como consequência lógica e natural, o amor ao próximo, como dupla vertente de um só e mesmo amor: o de Cristo.

Antes de concluir, uma explicação sobre a obediência aos superiores da Ordem do Carmo. Todas as Ordens Seculares estão sujeitas aos Superiores Maiores da Ordem a que pertencem, sendo este vínculo da obediência imprescindível para que os sodalícios possam caminhar com fidelidade e segurança.

Na Ordem do Carmo temos também o nosso Superior Geral com sede em Roma. O Prior Geral exerce a sua autoridade suprema através dos Provinciais ou Comissários. Como o Provincial ou o Comissário não podem dar uma assistência espiritual diuturna aos sodalícios, nomeiam um Delegado para o Laicado Carmelita, a quem delegam os seus poderes, associando-lhe eventualmente assistentes espirituais que, em união com o Delegado e o Superior Maior, agem mais de perto junto dos membros do sodalício (cf. ROTC 53.57). É a este assistente espiritual que compete mais diretamente a formação e orientação ordinária dos membros do sodalício, sendo a ele que os carmelitas Seculares devem obedecer com respeito, humildade, afeto fraterno e simplicidade de coração — numa palavra, com fraternidade — sabendo que daqui que dependem o crescimento e a vida do sodalício.

4. Conclusão

Esforcem-se os Carmelitas Seculares por conhecer bem a nossa Ordem do Carmo. Tenham muito apreço pelos votos que professam, porque neles está a segurança de uma firme e estreita vinculação à Ordem. A observância dos votos é o compromisso mais certo, seguro e sério com os conselhos evangélicos que nos une mais de perto a Cristo, fonte, modelo e exemplo da união entre Deus — nós — e os Irmãos! É nesta íntima e plena união que reside a grandeza de nossa vocação especial de Carmelitas Seculares: ser, a exemplo da Virgem Maria, um só em Cristo Jesus no Pai por meio do Espírito Santo, segundo o modelo da comunidade primitiva de Jerusalém, dando testemunho do Senhor, morto e ressuscitado por nós para a salvação do mundo inteiro, como instrumentos de reconciliação, com o mesmo zelo e ardor do profeta Elias, vivendo a nossa dimensão profética e contemplativa em comunhão fraterna ao serviço do povo de Deus, cooperando na edificação da Igreja e na instauração do Reino de Deus entre os homens, informando todas as realidades seculares onde se inserem com a luz do Evangelho.

1 No NT aparecem os três conselhos evangélicos fundamentais: obediência (de Cristo: Lc 2,49-52; Jo 4,34; 5,30; Mt 26,42; Fil 2, 1-15; Heb 10,7-10; do cristão: Mt 12,20; 6,38; Rm 15,14; 2 Cor 8,5; Ef 6,7); pobreza (Mt 19,21; Lc 14,26-33; 2 Cor 6,10; At 2,42-45; 4,32-37; Fil 4,12); e castidade (consagrada: Mt 19,12; Lc 18,29; 20,35-36; segundo o próprio estado: Mt 5,27-30; Rm 6,19-23; 1 Ts 4,2-8; ambas: 1 Cor 7,1-20). Os três conselhos são uma defesa contra a tríplice concupiscência do homem, deixada pelo pecado (1 Jo 2,16; cf. Lc 4,1-13; Col 3,5; Tt 3,3; Tg 1,15-16). O Catecismo da Igreja Católica (CIC) explica no n. 1973 o porquê desta designação: «Além dos preceitos, a Nova Lei comporta também os conselhos evangélicos. A distinção tradicional entre os mandamentos de Deus e os conselhos evangélicos estabelece-se em relação à caridade, que é a perfeição da vida cristã. Os preceitos destinam-se a afastar tudo o que é incompatível com a caridade; os conselhos têm como meta afastar o que, mesmo sem lhe ser contrário, pode constituir um obstáculo para o desenvolvimento da caridade». E continua no n. 1974: «Os conselhos evangélicos manifestam a plenitude viva da caridade que jamais se julga satisfeita por não poder dar mais. Atestam o seu dinamismo e solicitam a nossa prontidão espiritual. A perfeição da Nova Lei consiste essencialmente nos preceitos do amor a Deus e ao próximo. Os conselhos indicam caminhos mais diretos, meios mais fáceis e devem ser praticados conforme a vocação de cada um». Cf. ainda a LG 43: «Os conselhos evangélicos de castidade consagrada a Deus, de pobreza e de obediência, visto que fundados sobre a palavra e o exemplo de Cristo e recomendados pelos Apóstolos, pelos Padres, Doutores e Pastores da Igreja, são um dom divino, que a mesma Igreja recebeu do seu Senhor e com a Sua graça sempre conserva. A autoridade da Igreja, sob a direção do Espírito Santo, cuidou de regular a sua prática e também de constituir, à base deles, formas estáveis de vida. E assim sucedeu que, como em árvore plantada por Deus e maravilhosa e variamente ramificada no campo do Senhor, surgiram diversas formas de vida, quer solitária quer comum, e várias famílias religiosas, que vêm aumentar as riquezas espirituais, tanto em proveito dos seus próprios membros como no de todo o Corpo de Cristo. Com efeito, essas famílias dão aos seus membros os auxílios duma estabilidade mais firme no modo de vida, duma doutrina segura em ordem a alcançar a perfeição, duma comunhão fraterna na milícia de Cristo, duma liberdade robustecida pela obediência, para assim poderem cumprir com segurança e guardar fielmente a profissão religiosa e avançar jubilosos no caminho da caridade».

Leia, abaixo a lectio divina do Sábado da II Semana do Tempo Comum.

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