sexta-feira, 29 de dezembro de 2023

A Sagrada Família

S. Silvestre I, Papa
S. Catarina Labouret, virgem
 
1ª Leitura (Si 3,3-7.14-17a):
Deus quis honrar os pais nos filhos e firmou sobre eles a autoridade da mãe. Quem honra seu pai obtém o perdão dos pecados e acumula um tesouro quem honra sua mãe. Quem honra o pai encontrará alegria nos seus filhos e será atendido na sua oração. Quem honra seu pai terá longa vida, e quem lhe obedece será o conforto de sua mãe. Filho, ampara a velhice do teu pai e não o desgostes durante a sua vida. Se a sua mente enfraquece, sê indulgente para com ele e não o desprezes, tu que estás no vigor da vida, porque a tua caridade para com teu pai nunca será esquecida e converter-se-á em desconto dos teus pecados.
 
Salmo Responsorial: 127
R. Felizes os que esperam no Senhor e seguem os seus caminhos.
 
Feliz de ti, que temes o Senhor e andas nos seus caminhos. Comerás do trabalho das tuas mãos, serás feliz e tudo te correrá bem.
 
Tua esposa será como videira fecunda, no íntimo do teu lar; teus filhos serão como ramos de oliveira, ao redor da tua mesa.
 
Assim será abençoado o homem que teme o Senhor. De Sião te abençoe o Senhor: vejas a prosperidade de Jerusalém, todos os dias da tua vida.
 
2ª Leitura (Col 3,12-21): Irmãos: Como eleitos de Deus, santos e prediletos, revesti-vos de sentimentos de misericórdia, de bondade, humildade, mansidão e paciência. Suportai-vos uns aos outros e perdoai-vos mutuamente, se algum tiver razão de queixa contra outro. Tal como o Senhor vos perdoou, assim deveis fazer vós também. Acima de tudo, revesti-vos da caridade, que é o vínculo da perfeição. Reine em vossos corações a paz de Cristo, à qual fostes chamados para formar um só corpo. E vivei em ação de graças. Habite em vós com abundância a palavra de Cristo, para vos instruirdes e aconselhardes uns aos outros com toda a sabedoria; e com salmos, hinos e cânticos inspirados, cantai de todo o coração a Deus a vossa gratidão. E tudo o que fizerdes, por palavras ou por obras, seja tudo em nome do Senhor Jesus, dando graças, por Ele, a Deus Pai. Esposas, sede submissas aos vossos maridos, como convém no Senhor. Maridos, amai as vossas esposas e não as trateis com aspereza. Filhos, obedecei em tudo a vossos pais, porque isto agrada ao Senhor. Pais, não exaspereis os vossos filhos, para que não caiam em desânimo.
 
Aleluia. Reine em vossos corações a paz de Cristo, habite em vós a sua palavra. Aleluia.
 
Evangelho (Lc 2,22-40): E quando se completaram os dias da purificação, segundo a lei de Moisés, levaram o menino a Jerusalém para apresentá-lo ao Senhor, conforme está escrito na Lei do Senhor: “Todo primogênito do sexo masculino será consagrado ao Senhor». Para tanto, deviam oferecer em sacrifício um par de rolas ou dois pombinhos, como está escrito na Lei do Senhor. Ora, em Jerusalém vivia um homem piedoso e justo, chamado Simeão, que esperava a consolação de Israel. O Espírito do Senhor estava com ele. Pelo próprio Espírito Santo, ele teve uma revelação divina de que não morreria sem ver o Ungido do Senhor. Movido pelo Espírito, foi ao templo. Quando os pais levaram o menino Jesus ao templo para cumprirem as disposições da Lei, Simeão tomou-o nos braços e louvou a Deus, dizendo: «Agora, Senhor, segundo a tua promessa, deixas teu servo ir em paz, porque meus olhos viram a tua salvação, que preparaste diante de todos os povos: luz para iluminar as nações e glória de Israel, teu povo». O pai e a mãe ficavam admirados com aquilo que diziam do menino. Simeão os abençoou e disse a Maria, a mãe: «Este menino será causa de queda e de reerguimento para muitos em Israel. Ele será um sinal de contradição —e a ti, uma espada traspassará tua alma!— e assim serão revelados os pensamentos de muitos corações». Havia também uma profetisa, chamada Ana, filha de Fanuel, da tribo de Aser. Ela era de idade avançada. Quando jovem, tinha sido casada e vivera sete anos com o marido. Depois ficara viúva e agora já estava com oitenta e quatro anos. Não saía do templo; dia e noite servia a Deus com jejuns e orações. Naquela hora, Ana chegou e se pôs a louvar Deus e a falar do menino a todos os que esperavam a libertação de Jerusalém. Depois de cumprirem tudo conforme a Lei do Senhor, eles voltaram para Nazaré, sua cidade, na Galileia. O menino foi crescendo, ficando forte e cheio de sabedoria. A graça de Deus estava com ele.
 
«Levaram o menino a Jerusalém para apresentá-lo ao Senhor»
 
Rev. D. Joan Ant. MATEO i García (Tremp, Lleida, Espanha)
 
Hoje, celebramos a festa da Sagrada Família. O nosso olhar vira-se para o centro de Belém —Jesus— para contemplar perto Dele a Maria e a José. O filho eterno do Pai passa da família eterna, que é a Santíssima Trindade, à família terrena formada por Maria e José. Como deve ser importante a família aos olhos de Deus quando a primeira coisa que procura para o seu Filho é uma família!
 
João Paulo II, na sua Carta apostólica O Rosário da Virgem Maria, voltou a destacar a importância capital que tem a família como fundamento da Igreja e da sociedade humana e pediu-nos que rezássemos pela família e que rezássemos em família o Santo Rosário para revitalizarmos essa instituição. Se a família estiver bem, a sociedade e a Igreja estarão bem.
 
O Evangelho de hoje diz-nos que o Menino crescia e se fortalecia, enchendo-se de sabedoria. Jesus encontrou o calor de uma família que se ia construindo através das suas reciprocas relações de amor. Que bonito e proveitoso seria se nos esforçássemos mais e mais por construir a nossa família: com espírito de serviço e de oração, com amor mútuo, com uma grande capacidade de compreender e de perdoar. Gostaríamos —como na casa de Nazareth— o céu e a terra! Construir a família é hoje uma das tarefas mais urgentes. Os pais, como recordava o Concilio Vaticano II, tem aí um papel insubstituível: «É dever dos pais criarem um ambiente de família animado pelo amor e pela piedade para com Deus e para com os homens, e que favoreça uma educação integra a nível pessoal e social dos seus filhos». Na família aprende-se o mais importante: a ser pessoas.
 
Por fim, falar de família para os cristãos é falar da Igreja. O Evangelista S. Lucas diz-nos que os pais de Jesus o levaram a Jerusalém para apresentá-lo ao Senhor. Aquela oferenda era a figura da oferenda sacrificial de Jesus ao Pai, fruto da qual nascemos cristãos. Considerar esta gozosa realidade nos abrirá a uma maior fraternidade e nos levará a amar mais a Igreja.
 
Pensamentos para o Evangelho de hoje
«Nazaré é a escola onde começa o conhecimento do Evangelho. Como gostaríamos de recomeçar, junto a Maria, a nossa iniciação na verdadeira ciência da vida!» (São Paulo VI)
 
«A família de Jesus, sendo uma família como qualquer outra, é um modelo de amor conjugal, de colaboração, de sacrifício, de confiança na Divina Providência..., de todos os valores que a família preserva e promove, ajudando a formar o tecido de cada sociedade"» (Benedito XVI)
 
«A vida oculta de Nazaré permite a todos os homens entrar em comunhão com Jesus, pelos diversos caminhos da vida quotidiana» (Catecismo da Igreja Católica, nº 533)
 
“Os meus olhos viram a tua salvação, que preparaste diante de todos os povos: luz para se revelar às nações e glória do teu povo, Israel”
 
Fr. Pedro Bravo, ocarm
 
*
O texto de hoje, exclusivo de Lucas, é o penúltimo episódio das “narrativas da infância de Jesus”, onde o evangelista apresenta Jesus a percorrer as diversas etapas da sua infância à luz da Lei judaica.
 
v. 22. “Ao cumprirem-se os dias”. “A lei de Moisés” (Lv 12,1-8) prescrevia que uma mãe (não o filho) se devia “apresentar” (ou seja, subir ao Templo, à presença de Deus: cf. 1,19; Nm 16,9; Dt 21,5 Jdt 11,13), no 40º dia do nascimento do seu filho, para se “purificar” do contacto com o sangue no parto, oferecendo um sacrifício (v. 24). É o que agora acontece. Entretanto, Lucas vê neste gesto o cumprimento das 70 semanas (70x7=490 dias) da profecia de Daniel (9,24-27): seis meses (6x30=180 dias) da gravidez de Isabel (1,36); nove meses (9x30=270 dias) da gravidez de Maria (2,6) e 40 dias da purificação dela (180+270+40) dão 490 dias.
 
*  “Jerusalém”: o evangelista usa a forma grega Hierosolyma (13,22; 19,28; 23,7; At, 25x), provavelmente para ligar a etimologia de “Hierosalem” (hieros, “santa ”+ Salem “paz”: vv. 25.38.41.43.45; Hb 7,2), a hieros, “santa”, (kat)alyma, “sala de hóspedes” (2,7; o cenáculo: 22,11).
 
v. 23: Além da purificação da mãe, a Lei prescrevia que todo o primogénito do sexo masculino “que rasga o ventre materno” (nascendo de parto natural) devia ser consagrado ao Senhor (lit. “será chamado santo para o Senhor”: 1,35; Ex 13,2.12.15). Segundo a Lei, as primícias de tudo quanto se tem são do Senhor. Isto aplica-se em especial aos primogénitos do sexo masculino, tanto dos homens, como dos animais. Estes pertencem a Deus e devem ser “resgatados”, ou seja, libertados por meio de um pagamento, em agradecimento por Deus ter poupado os primogénitos de Israel, no Êxodo, na noite de Páscoa, quando feriu de morte os primogénitos dos egípcios, tanto dos homens, como dos animais (Ex 13,15s; 22,28; 34,19).
 
* Desta obrigação está isenta a tribo de Levi (Nm 3,12-13.40ss.45), porque, segundo a tradição judaica, todos os primogénitos de Israel tinham sido escolhidos pelo Criador para o sacerdócio por terem sido poupados na última das dez pragas do Egito. No entanto, quando os israelitas pecaram junto ao Sinai, oferecendo sacrifícios ao bezerro de ouro, só os filhos de Levi se juntaram a Moisés para executar a sentença divina (Ex 32,26-29), passando a ser apenas eles a assumir o sacerdócio. Desde então foi instituído “o resgate do primogénito” (he. pidyon ha-ben: Nm 18,16; gr. lytrôsis, “redenção”: v. 38; 1,68), como forma de resgatar o primogénito da obrigação do sacerdócio. Isto deve-se fazer a partir do 30º dia do nascimento dele (um mês), antes de se completar o segundo mês (Nm 18,16), o mais tardar até aos cinco anos de idade (Lv 27,6). O filho deve ser resgatado pelo seu pai, que se pode dirigir a qualquer sacerdote em qualquer lugar da nação, lhe entrega o filho, diz “Este meu primogénito é o primogénito da sua mãe e o Santificado, bendito seja Ele, ordenou-nos que o resgatássemos”, e lhe paga 5 siclos de prata pura (“segundo o ciclo do Santuário”, 5 x 11,4 g: Nm 3,47; 18,16; Mek Ex 13,2, 22b; Mek Ex 22,29, 103a; SNu 18,15 §118, 38a).
 
* Lucas, avesso ao dinheiro, que gosta de sublinhar a pobreza (6,20; 9,3; 14,13.21; 18,22; At 3,6; 8,20; 20,33), não menciona o pagamento, mas refere aqui o rito e dá-o como realizado (v. 39). Fá-lo, porém, coincidir com a purificação de Maria (cf. v. 22: “a purificação deles”), por razões de ordem prática. Destaca assim a piedade de Maria e de José, que apresentam Jesus a Deus numa cena que evoca 1Sm 1,24-26 (a apresentação de Samuel a Deus, por Ana, no templo de Silo).
 
v. 24. “A Lei do Senhor” prescrevia, no caso de a família ser pobre, que a mulher oferecia em sacrifício pela sua purificação apenas “um par de rolas ou duas pombinhas” (Lv 12,6.8). É o caso da família de Jesus, que faz parte dos “pobres de Israel”, o resto fiel a Deus que obedece de coração, com amor, à sua “Lei” (5x, aqui). Ao mesmo tempo, Lucas mostra que Jesus, desde o princípio, é “o Santo” de Deus (v. 23: “consagrado”; 4,34), como o Anjo anunciara a Maria (1,35), decorrendo toda a sua vida segundo a Palavra de Deus, que nele se realiza.
 
v. 25. Duas personagens acolhem Jesus no Templo: ambas são idosas, representando o antigo povo de Deus que esperava ansiosamente a restauração do reino de Deus e a libertação (“redenção”) do seu Povo. Bem ao estilo de Lucas, são um par: um homem e uma mulher (4,25-28.31-39; 7,1-17.36-50; 23,55-24,35). Ambos “profetizam”, ou seja, agem e falam em nome de Deus, sob moção do Espírito Santo. Lucas expressa deste modo três temas fundamentais da sua obra: a) ambos, homem e mulher, estão juntos na presença de Deus, sendo iguais em honra e graça, tendo os mesmos dons e responsabilidades (Gn 1,27; Gl 3,28); b) em Jesus inauguram-se os tempos messiânicos, marcados pela efusão do Espírito Santo e a irrupção do dom de profecia (Nm 11,27; Jl 2,28), extinto há mais de 400 anos; 3) só é possível encontrar Jesus e (re)conhecê-lo por ação do Espírito Santo.
 
* A primeira a entrar em cena é Simeão (he. “Deus ouviu”). “Era um homem justo” (1,6.17; 23,50; At 10,22), que fazia de coração a vontade de Deus (Is 51,7); “e piedoso”, que humilde e reverentemente cumpria os preceitos de Deus (At 2,5; 8,2; 22,12); “que esperava” (há longo tempo: Rt 1,13) a “consolação de Israel” (v. 38; Is 40,1; 49,13; 51,12; 52,9; 61,2; 66,13; Jr 31,9; Zc 1,17), vivendo animado pela esperança no cumprimento das promessas de salvação. “E o Espírito Santo estava com ele” (lit. “sobre ele”: 3,22; Nm 11,25.29).
 
v. 26. “Fora-lhe avisado” (cf. Jr 36,2.4; At 10,20) “pelo Espírito Santo”. “Espírito Santo” aparece aqui pela primeira vez em Lucas com o artigo (10,21; 12,10. 12), o que só ocorre três vezes no AT (Sl 51,13; Is 63,10s). “Que não veria a morte”, ou seja, que não morreria (Sl 89,49; Hb 11,5; Jo 8,51), “sem antes ter visto (9,27) “o Cristo do Senhor” (só em 2,11; 1Sm 24,11).
 
v. 27. E vai ao Templo “no Espírito”, ou seja, impelido por Ele (1,17; 4,1; 10,21; Mq 3,8; Zc 4,6; 7,12), quando “os pais trouxeram o Menino Jesus para fazerem com Ele segundo o costume da Lei no que lhe dizia respeito”. Cumprem assim não só o que a Lei prescrevia, mas também Ml 3,1: «De repente, virá ao seu Templo o Senhor, a quem buscais, o Anjo da Aliança, a quem desejais». Lucas chama aqui pela primeira vez “pais” a José e Maria porque foi só na circuncisão que José assumiu a paternidade legal sobre Jesus (vv. 21.33; 3,23).
 
v. 28. Impelido pelo Espírito (cf. At 8,29; 10,19; 11,12; 13,2), Simeão reconhece Jesus e intervém com atos e palavras expressivos. Num gesto de amor, ternura e gratidão, “recebe” o Menino nos braços (cf. Mc 9,36; 10,16) como um dom (gr. dékomai: 9,48; 18,17; 22,17; Gn 33,10; Dt 32,11) e bendiz a Deus (1,42.64; 24,53; Sl 16,7; 34,2; 63,5; 96,2; 103,2; 134,2).
 
v. 29. E diz: “Agora” (gr. nûn). É o “agora” do tempo da graça, do dia da salvação (22,18.69; 2Cor 6,2). “Senhor” (gr. despótes, “mestre”, “soberano”: At 4,24; Gn 15,2.8; Js 5,14; Dn 9,15-19): é Deus quem dirige tudo. “Podes deixar partir em paz”, ou seja, deixar morrer (Gn 15,15; 46,30; Tb 11,9), livre do medo da morte (Hb 2,14s). “O teu servo” (gr. doulós, “escravo/servo”: 1,38.48; Rm 1,1; 2Co 4,5; Gl 1,10; Fl 1,1; 2,7; Tt 1,1; Tg 1,1; 2Pd 1,1; Jd 1,1; Ap 1,1), ou seja, a mim, sobre quem podes dispor, com direito de vida e de morte. “Segundo a tua Palavra” que me prometeste pelo Espírito Santo (v. 26), e de acordo com o meu desejo (cf. Gn 47,30; Nm 14,20; 1Rs 3,12). O encontro com Jesus ilumina projeta uma nova luz sobre a existência do homem e a sua morte, fazendo dela uma passagem para a eternidade.
 
v. 30. Depois, declara no Templo de Jerusalém declara que os seus olhos “viram a salvação” (3,6; Sl 98,3; cf. Jb 42,5; Sl 67,3). O nome “Jesus” em aramaico é Ieshuah (“Deus salva”), a palavra hebraica para “salvação”.
 
v. 31.”Que preparaste diante de todos os povos” (gr. laós: Is 52,10), ou seja, destinada a toda a humanidade (Is 40,5 LXX).
 
v. 32. A seguir, Simeão anuncia o objetivo da obra de Jesus: levar a todos os homens a “luz” (Is 9,2; At 26,18) do Evangelho que se deve “revelar às nações”, isto é, aos gentios (Is 42,6; 49,9.6; 51,4; At 13,47) e ser a “glória de Israel”, o povo de Deus (Is 4,2; 46,13; 45,25; 60,1s.19). “Glória” alude à glória divina da ressurreição de Jesus (9,26.31s; 21,27; 24,26), da qual participará o novo Povo de Deus, o novo Israel (Rm 9,6ss; Gl 6,6; Fl 3,3). Jesus é o Servo de Iavé e a salvação que será levada pelos seus discípulos a todos os povos da terra, que nele serão irmanados, sem qualquer distinção, no único povo de Deus, que participará da Sua glória. Emerge aqui de forma explícita, pela primeira vez, o tema da universalidade da salvação (2,14; 24,47; At 1,8), tão caro a Lucas.
 
v. 33. “Seu pai e sua Mãe” (v. 27) ficam “admirados” com o que “se diz” (particípio presente) de Jesus (1,63; 2,18.48). De facto, antes só tinha sido anunciada a missão de Jesus em relação a Israel; agora é-lhes dito que Ele será glorificado e ela se estenderá a todos os povos.
 
v. 34.
“Simeão abençoou-os”: a Jesus, Maria e José (cf. Dt 18,5 LXX; Nm 6,23-26). Depois anuncia profeticamente a Maria a divisão que Jesus irá provocar em Israel e no mundo (cf. 4,16-30; 12,51), desvelando-lhe o seu destino: o anúncio e a obra da salvação da humanidade passarão pelo sofrimento (“a cruz”: 24,7.44.46), de modo que Jesus será “um sinal de contradição” para todos (7,23; At 28,22; Is 8,14; 28,16): para os que não acreditarem nele e o rejeitarem, será causa de queda e de ruína (como acontecerá a Jerusalém no ano 70 d.C.: Dn 11,41 LXX; Mt 21,42; Rm 9,32; 1Pd 2,7); para os que nele crerem, será fonte de “ressurreição” (gr. anástasis), de vida nova, luz e salvação (At 26,23; Rm 6,5; 1Cor 1,23). É uma alusão aos pontos fundamentais do querigma: a morte e ressurreição de Cristo e o seu anúncio a todos os povos (9,20.22; 24,26.46s; At 2,36; 4,10ss; 10,36-42; 17,3).
 
v. 35. Tal como o discípulo é associado à cruz (9,23; 14,27), também Maria será intimamente associada à obra do seu Filho de modo singular, único, para a vida e para morte, obra esta que “traspassará” como espada a sua alma (v. 48; Jo 19,25s.37; Hb 4,12; Sl 124,5) de dor (cf. Am 5,17) “para que se revelem os pensamentos de muitos corações” (cf. 5,22; 9,47; 16,15; 24,38; Sb 7,20; Jr 17,9s; Dn 2,22.30; 1Cor 3,13).
 
v. 36. A segunda figura, Ana, é toda ela simbólica. O seu nome, “Ana”, significa “graça”; e o apelido, “Fanuel”, “rosto de Deus” (Gn 32,31). em Jesus Deus mostra o seu rosto e dá a sua graça. Ela é “profetiza” (Ex 15,20; Jz 4,4; 2Rs 22,14; 2Cr 34,22; Is 8,3), ou seja, alguém que se abriu ao dom do Espírito (preanunciado para os tempos messiânicos: Jl 3,1; At 2,17s), que escuta e recebe a Palavra de Deus e a dá a conhecer aos homens. Ana é do norte Galileia, da tribo de Aser (“feliz”), a menor e insignificante tribo de Israel (Dt 33,24).
 
v. 37. A idade de Ana também é simbólica: 7x12=84 anos, indicando 7 a perfeição e 12 o Povo de Deus. Ela é “viúva”, figura daquele Israel pobre e sofredor que se manteve sempre fiel a Iavé. Manteve-se viúva após a morte do marido (cf. Is 60,20; 61,3), ansiando, suplicando e esperando o cumprimento das promessas de Deus, “Sem se afastar do Templo” (cf. Sl 26,8; 27,4; 84,11), não porque nele pernoitasse (uma vez que as portas deste se fechavam durante a noite: cf. 21,37; Sl 134,1), mas porque vivia perto dele. “Prestando culto” a Deus (cf. Ex 3,12; 20,5; 23,25; Dt 6,13; 10,20; Js 24,14); ininterruptamente, “noite e dia” (Jt 11,37; At 20,31; 26,7; 1Ts 2,9; 3,10; 2Ts 3,8; 1Tm 5,5; 2Tm 1,3); “com jejuns e orações” (cf. 5,33; At 13,3; 14,23; Ne 1,4; Dn 9,3), uma prática regular dos judeus piedosos (Jt 8,6!), para implorar a vinda do Messias (cf. 5,33; Dn 10,3).
 
v. 38. Ao ver Jesus, Ana não só reconhece nele o Messias, mas põe-se a louvar a Deus (Sl 79,13; Dn 4,37) e a falar profeticamente dele “a todos os que esperavam a redenção de Jerusalém” (cf. v. 25; Sl 111,19; 130,7; Is 43,1; 59,20; 63,4). A palavra “redenção” (gr. lytrosis, “resgate”: cf. v. 23) é a mesma que é usada para falar da libertação de Israel da escravidão do Egito (cf. Ex 6,6; 15,13; Dt 7,8; 2Sm 7,23) e para designar o novo êxodo, da salvação futura do povo de Deus (1,68; 24,21; Is 41,14; 43,1; 44,6.22ss; 52,3; 62,12; 63,9; Jr 31,11; Os 13,14; Zc 10,8), levado a cabo pelo Messias (Jesus: 9,31). Ana é figura do Israel fiel e pobre que, tendo posto a sua esperança em Deus, se deixa guiar pelo seu Espírito e reconhece em Jesus o Messias prometido, que depois anuncia.
 
v. 39. O texto conclui com um sumário da infância de Jesus. Cumpridos todos as prescrições da Lei a respeito do Menino, “voltaram à sua cidade, Nazaré” (1,26; 2,4; Mt 2,23), donde tinham partido.
 
v. 40: v. 52; cf. At 7,10. “Entretanto, o Menino crescia” (1Sm 2,21.26) “e fortalecia-se” (cf. 1,80; Sl 80,18; Ef 3,16; 6,10). “Enchendo-se de sabedoria” (cf. 11,31; Is 11,2; 1Cor 1,24.30; Cl 1,9; 2,3; Tg 3,17), “e a graça de Deus estava com Ele” (cf. 4,22; Sl 45,2; Sb 3,9; Jo 1,14.17), dons que vêm de Deus (cf. Tg 1,17; 3,15) e Ele possui como próprios, atestando a sua divindade.
 
Para uma reflexão pessoal:
1. Deus ocupa o primeiro lugar, é o centro da minha vida? Como o conheci?
2. Deixo-me guiar pelo Espírito de Deus e iluminar pela Sua Palavra? Procuro crescer na sua graça?
3. Reconheço Jesus nos pobres e nos humildes? Anuncio-o a todos, cumprindo a missão que me foi confiada no meu batismo?

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