quarta-feira, 9 de novembro de 2022

Jesus Cristo, Rei do Universo


1ª Leitura (2Sam 5,1-3): Naqueles dias, todas as tribos de Israel foram ter com David a Hebron e disseram-lhe: «Nós somos dos teus ossos e da tua carne. Já antes, quando Saul era o nosso rei, eras tu quem dirigia as entradas e saídas de Israel. E o Senhor disse-te: ‘Tu apascentarás o meu povo de Israel, tu serás rei de Israel’». Todos os anciãos de Israel foram à presença do rei, a Hebron. O rei David concluiu com eles uma aliança diante do Senhor e eles ungiram David como rei de Israel.

Salmo Responsorial: 121
R. Vamos com alegria para a casa do Senhor.

Alegrei-me quando me disseram: «Vamos para a casa do Senhor». Detiveram-se os nossos passos às tuas portas, Jerusalém.

Jerusalém, cidade bem edificada, que forma tão belo conjunto! Para lá sobem as tribos, as tribos do Senhor.

Para celebrar o nome do Senhor, segundo o costume de Israel; ali estão os tribunais da justiça, os tribunais da casa de David.

2ª Leitura (Col 1,12-20): Irmãos: Damos graças a Deus Pai, que nos fez dignos de tomar parte na herança dos santos, na luz divina. Ele nos libertou do poder das trevas e nos transferiu para o reino do seu Filho muito amado, no qual temos a redenção, o perdão dos pecados. Cristo é a imagem de Deus invisível, o Primogénito de toda a criatura; Porque n’Ele foram criadas todas as coisas no céu e na terra, visíveis e invisíveis, Tronos e Dominações, Principados e Potestades: por Ele e para Ele tudo foi criado. Ele é anterior a todas as coisas e n’Ele tudo subsiste. Ele é a cabeça da Igreja, que é o seu corpo. Ele é o Princípio, o Primogénito de entre os mortos; em tudo Ele tem o primeiro lugar. Aprouve a Deus que n’Ele residisse toda a plenitude e por Ele fossem reconciliadas consigo todas as coisas, estabelecendo a paz, pelo sangue da sua cruz, com todas as criaturas na terra e nos céus.

Aleluia. Bendito O que vem em nome do Senhor! Bendito o reino do nosso pai David! Aleluia.

Evangelho (Lc 23,35-43): Naquele tempo, o povo permanecia lá, olhando. E até os chefes zombavam, dizendo: «A outros ele salvou. Salve-se a si mesmo, se, de fato, é o Cristo de Deus, o Eleito!» Os soldados também zombavam dele; aproximavam-se, ofereciam-lhe vinagre e diziam: «Se és o rei dos judeus, salva-te a ti mesmo!». Acima dele havia um letreiro: «Este é o Rei dos Judeus». Um dos malfeitores crucificados o insultava, dizendo: «Tu não és o Cristo? Salva-te a ti mesmo e a nós!». Mas o outro o repreendeu: «Nem sequer temes a Deus, tu que sofres a mesma pena? Para nós, é justo sofrermos, pois estamos recebendo o que merecemos; mas ele não fez nada de mal». E acrescentou: «Jesus, lembra-te de mim, quando começares a reinar». Ele lhe respondeu: «Em verdade te digo: hoje estarás comigo no Paraíso».

«Este é o Rei dos Judeus»

Rev. D. Joan GUITERAS i Vilanova (Barcelona, Espanha)

Hoje, o Evangelho nos faz elevar os olhos à cruz onde Cristo agoniza no Calvário. Vemos ao Bom Pastor que dá a vida pelas ovelhas. «Por cima de sua cabeça pendia esta inscrição: Este é o rei dos judeus». (Lc 23,38). Este que sofre horrorosamente e que tem o rosto tão desfigurado é o Rei? É possível? O compreende perfeitamente o bom ladrão um dos justiçados de um lado e do outro Jesus, que diz com fé suplicante: «Jesus, lembra-te de mim, quando tiveres entrado no teu Reino!» (Lc 23,42). A resposta de Jesus é consoladora e certa: «Em verdade te digo: hoje estarás comigo no paraíso». (Lc 23,43).

Sim, confessamos que Jesus é Rei. Rei, com maiúscula. Ninguém estará nunca à altura de sua realeza. O Reino de Jesus não é deste mundo. É um Reino onde se entra pela conversão cristã. Um Reino de verdade e de vida, Reino de santidade e de graça, Reino de justiça, de amor e de paz. Um Reino que sai do Sangue e a água que brotaram do costado de Jesus Cristo.

O Reino de Deus foi um tema primordial na predicação do Senhor. Não parava de convidar a todos a entrar nele. Um dia, no Sermão da montanha, proclamou bem-aventurado os pobres no espírito, porque eles são os que possuirão o Reino.

Origens, comentando a sentença de Jesus «Nem se dirá: Ei-lo aqui; ou: Ei-lo ali. Pois o Reino de Deus já está no meio de vós» (Lc 17,21), explica que quem suplica para que o Reino de Deus venha, o pede honestamente daquele Reino de Deus que tem dentro dele, para que nasça, frutifique e amadureça. Complementa que «o Reino de Deus que há dentro de nós, se avançamos continuamente, chegará a sua plenitude quando tenha sido cumprido aquilo que diz o Apóstolo: que Cristo, una vez submetidos os seus inimigos, colocará o Reino em mãos de Deus o Padre, e assim Deus será todo em todos». O escritor exorta que digamos sempre «Seja santificado teu nome venha a nós teu Reino».

Vivamos agora o Reino com a santidade, e demos testemunho dele com a clareza que autêntica a fé e a esperança.

Pensamentos para o Evangelho de hoje
«Entre os homens, a confissão é seguida de castigo; perante Deus, porém, à confissão segue-se a salvação» (S. João Crisóstomo)

«A promessa de Jesus ao bom ladrão dá-nos uma grande esperança. O Senhor sempre nos dá mais, é tão generoso, dá sempre mais do que lhe pedimos: pedes-Lhe que se lembre de ti e leva-te para o seu Reino» (Francisco)

«(...) A parábola do pobre Lázaro e a palavra de Cristo crucificado ao bom ladrão (cf. Lc 23,43) (...) assim como outros textos do Novo Testamento, falam dum destino final da alma (cf. Mt 16,26), o qual pode ser diferente para umas e para outras» (Catecismo da Igreja Católica, nº 1.021)

«Senhor, lembra-te de mim quando entrares no teu Reino».

Escrito por P. Américo no site DOMUS IESU

* Hoje estarás comigo no paraíso. Jesus é apresentado como o justo sofredor, aquele que, em nosso nome, paga a nossa dívida. Só isto é suficiente para concluirmos que a forma como Ele nos quer «conquistar» não é através da força e da «vingança definitiva» dos bons sobre os maus. Já agora, entre parêntesis, quem são os  bons e quem são os maus? Segundo o texto de hoje, Jesus morre cravado numa cruz. Pois bem, é esse o trono sobre o qual o coloca o evangelista Lucas. Mais uma vez, como muito bem disse Isaías, os caminhos de Deus não são os nossos caminhos e os seus planos não são os nossos planos (cf. Is 55,8). A forma como Ele procede, por vezes, chega a escandalizar-nos, porque faz precisamente aquilo de que nós não estamos à espera. A propósito, repare-se na «facilidade» com que Ele perdoa ao ladrão arrependido. Se calhar, temos que confessar que aceitamos esta sua atitude com relutância, porque - achamos - as coisas não se fazem assim. Ora, já alguma vez se viu perdoar assim com tanta facilidade? Não será isso não se dar ao respeito? Mas, a verdade é que, embora porventura contra a nossa opinião, aquele a quem nós começámos a chamar o «bom ladrão» foi de facto o primeiro a ser «canonizado», e diretamente por Jesus. Jesus começou, logo ali, ainda pregado na cruz, a ser o rei dos corações. E é rei assim que Ele quer ser.

* Tragédia igual a salvação. Paulo, na sua pregação, partia sempre, em termos de evangelização, do acontecimento por excelência do cristianismo, que é a ressurreição de Cristo: «Cristo é o princípio, o primogénito daqueles que ressuscitam de entre os mortos».

Com Cristo, começa a nova etapa que atingirá a sua plenitude decisiva e definitiva na hora escatológica. Ora, este acontecimento salvífico não é algo de improvisado que Deus tenha «imposto» ao curso da história, mas faz parte do projeto divino da criação. A pessoa de Jesus Cristo como que está «implicada» substancialmente em todo o contexto cósmico, sendo a absoluta razão de ser de todas as coisas.

Todavia, este «ato salvífico» não foi posto em prática a partir duma plataforma puramente espiritualística, digamos assim, quase angélica (à falta de melhor, estou a expressar-me por palavras humanas). O Salvador assumiu misteriosamente a miséria e limitações humanas, submetendo-se, por assim dizer, a todas as suas consequências... Mas, mais do que as palavras de quem quer que seja, leiam-se devagar as palavras do «hino cristológico» da Carta aos Colossenses, que é proposta para hoje.

* Cristo: rei da reconciliação.  «À semelhança do que acontecia com todas as coisas importantes na Lei mosaica, também era necessário que a entronização fosse reconhecida pelo menos por duas testemunhas. Pois bem, enquanto as testemunhas da investidura real da Transfiguração são duas das principais figuras do Antigo Testamento (Moisés e Elias), ao contrário, as duas testemunhas da entronização do Gólgota são só dois vulgares ladrões e assassinos... o que fica a demonstrar que, para Jesus, o modo de exercer a sua realeza sobre os homens, incluindo os seus inimigos, é o de lhes oferecer o perdão». Naturalmente, para que se torne efetivo, ocorre que a humanidade aceite este perdão de Deus. Como diria o papa Francisco, Deus está sempre pronto a perdoar, mas nós nem sempre estamos prontos para pedir perdão.

* A realeza de Jesus hoje.  A celebração solene da realeza de Jesus Cristo fecha o ciclo litúrgico ordinário, sendo que o próximo domingo (I do Advento) assinala o início dum novo ano litúrgico. No coração da assembleia cristã, ergue-se a figura soberana do Salvador, que parece chamar todos os seus «súbditos».

Como acontece com todos os soberanos da terra, também Ele é talvez imaginado num trono e rodeado de toda a sua corte. Qualquer um de nós pode cair nessa tentação de o contemplar como o Rei dos Reis, em «toda a honra e glória», mas, pelos vistos, não foi essa imagem que Ele pessoalmente quis deixar. Na sua experiência terrena, Ele preferiu não ser rei nesse estilo. E o evangelista S. Lucas não deixa dúvidas a esse respeito. O texto de hoje dá um valor especial à vertente do perdão, dando a entender que o verdadeiro reino de Jesus é o coração do homem. Disso é exemplo o malfeitor arrependido e a frase que Jesus pronuncia em relação aos seus inimigos mais terríveis, como eram, por exemplo, os que O tinham crucificado: «Pai, perdoai-lhes, porque não sabem o que fazem».

Os reis e os grandes da terra fazem-se servir, mesmo quando afirmam solenemente que o seu objetivo é servir o povo. E nem sequer lhes passa pela cabeça, nem por sombras, ver diminuído o seu poder e os benefícios que advêm desse poder. Para eles, não faz sentido nenhum dizer que vence quem sabe perder. Nesse aspecto, Jesus Cristo é um rei que não faz concorrência a nenhum dos reis terrenos. Por isso, não se percebe porque é que há ainda tanta gente - sobretudo entre os grandes da terra e os que se julgam grandes e influentes - que tem tanto «medo» de Jesus.

* Um reino totalmente diverso. Apesar de a monarquia não ser hoje em dia uma instituição muito da moda (pelo menos é essa a propaganda que se faz nos chamados regimes republicanos) há, todavia, exemplos de monarcas que não têm nada a invejar, em matéria de governo, a outros que se reclamam republicanos e democratas. De resto, pensando bem, a ideia que se tem de rei ou monarca numa monarquia supostamente reveste-se duma cor simpática.

Como é evidente, não é minha intenção meter-me agora em política. Aquilo que quero realçar é apenas o facto de que, mesmo para quem não tenha fé, a realeza de Cristo hoje não deveria colocar dificuldades intransponíveis, desde que seja apresentada segundo as coordenadas evangélicas. Acho que, hoje em dia, não há ninguém que não esteja disposto a aceitar um rei que é um rei de paz, de justiça, de amor, completamente alheio a qualquer aspiração de tipo político.

Bom, mas não basta aos cristãos ter um rei semelhante. É necessário que eles sejam realmente «súbditos» dum rei assim. Mas o que acontece infelizmente é que muitos cristãos, com frequência, pretendem (como pretendiam os contemporâneos de Jesus e até os seus próprios apóstolos e amigos) um rei que «dê cabo» de tudo e de todos com a força e com o poder da sua omnipotência. Por outras palavras, os cristãos, na prática, muito facilmente se esquecem que Jesus Cristo é o Rei dos Reis por ser o único mediador da salvação: que nele todas as coisas têm a sua verdadeira consistência. Cristo é aquele por quem tudo foi feito. Ele é o primogénito de toda a criação. Só Ele é a imagem perfeita do Deus invisível. Só Ele, biblicamente e por excelência, é o «rei da criação».

* Realeza da liberdade e responsabilidade. A «realeza» de Jesus Cristo é universal, exercendo um «poder efetivo» sobre todos e tudo. Mas situa-se numa outra esfera de atuação que não pura e simplesmente a humana. É nessa esfera que nenhuma realidade escapa ao seu juízo supremo. Sendo Ele, como de facto é, o Filho de Deus, com a sua morte, livrou todo o género humano do pecado. Ora, quem resgata alguém duma escravidão, de alguma forma é seu «patrão».

A realeza de Cristo é um tema cristológico abundantemente tratado em teologia. Em todo o caso, só que as naturais consequências aplicadas ao papel que a Igreja deve exercer no mundo é que nem sempre foram as mais lógicas. A pretexto de implantar em todo o mundo o que era (e é) designado por Reino de Deus, cometeram-se muitas «barbaridades», que a história tem imensa dificuldade em esquecer, apesar dos esforços que têm sido envidados no sentido de enquadrar o momento histórico em que se deram e apesar do facto de, várias vezes, já ter sido pedido publicamente perdão pelos erros do passado. Na prática, deu-se o que o próprio Jesus se esforçou por evitar a todo o custo: que a sua realeza se apresentasse sob a capa do poder e da instituição política.

Não há nenhum argumento escriturístico válido para justificar uma situação de privilégio para a Igreja neste campo. Isso todos nós o sabemos perfeitamente em teoria. Mas, infelizmente, ainda há certas correntes que, de bom grado, voltariam a algumas práticas e processos que não se compadecem nem com a verdade bíblica nem com as circunstâncias do mundo atual. Ou seja, não podemos, como cristãos, apelar para a realeza de Cristo no sentido de defender a todo o custo certas instituições, que de cristãs nada têm, e para combater os «inimigos» da Igreja com um espírito que não é o espírito do mandamento de Jesus: amar os próprios inimigos; ou, melhor ainda, tudo fazer para não ter inimigos.

Por um lado, vivemos numa sociedade que põe cada vez mais dificuldades à atividade dos cristãos. Por outro lado, talvez por linhas tortas, a concepção da realeza de Cristo aos poucos é assim purificada dos elementos algo espúrios, que nada contribuem para que a real mensagem de Cristo penetre na sociedade.
 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

DEIXE AQUI SEU SUA SUGESTÃO