sexta-feira, 7 de outubro de 2022

XXVIII Domingo do Tempo Comum


1ª Leitura (2Re 5,14-17): Naqueles dias, o general sírio Naamã desceu ao Jordão e aí mergulhou sete vezes, como lhe mandara Eliseu, o homem de Deus. A sua carne tornou-se tenra como a de uma criança e ficou purificado da lepra. Naamã foi ter novamente com o homem de Deus, acompanhado de toda a sua comitiva. Ao chegar diante dele, exclamou: «Agora reconheço que em toda a terra não há outro Deus senão o de Israel. Peço-te que aceites um presente deste teu servo». Eliseu respondeu-lhe: «Pela vida do Senhor que eu sirvo, nada aceitarei». E apesar das insistências, ele recusou. Disse então Naamã: «Se não aceitas, permite ao menos que se dê a este teu servo uma porção de terra para um altar, tanto quanto possa carregar uma parelha de mulas, porque o teu servo nunca mais há de oferecer holocausto ou sacrifício a quaisquer outros deuses, mas apenas ao Senhor, Deus de Israel».

Salmo Responsorial: 97
R. O Senhor manifestou a salvação a todos os povos.

Cantai ao Senhor um cântico novo pelas maravilhas que Ele operou. A sua mão e o seu santo braço Lhe deram a vitória.

O Senhor deu a conhecer a salvação, revelou aos olhos das nações a sua justiça. Recordou-Se da sua bondade e fidelidade em favor da casa de Israel.

Os confins da terra puderam ver a salvação do nosso Deus. Aclamai o Senhor, terra inteira, exultai de alegria e cantai.

2ª Leitura (2Tim 2,8-13): Caríssimo: Lembra-te de que Jesus Cristo, descendente de David, ressuscitou dos mortos, segundo o meu Evangelho, pelo qual eu sofro, até ao ponto de estar preso a estas cadeias como um malfeitor. Mas a palavra de Deus não está encadeada. Por isso, tudo suporto por causa dos eleitos, para que obtenham a salvação que está em Cristo Jesus, com a glória eterna. É digna de fé esta palavra: Se morremos com Cristo, também com Ele viveremos; se sofremos com Cristo, também com Ele reinaremos; se O negarmos, também Ele nos negará; se Lhe formos infiéis, Ele permanece fiel, porque não pode negar-Se a Si mesmo.

Aleluia. Em todo o tempo e lugar dai graças a Deus, porque esta é a sua vontade a vosso respeito em Cristo Jesus. Aleluia.

Evangelho (Lc 17,11-19): Caminhando para Jerusalém, Jesus passava entre a Samaria e a Galileia. Estava para entrar num povoado, quando dez leprosos vieram ao seu encontro. Pararam a certa distância e gritaram: «Jesus, Mestre, tem compaixão de nós!». Ao vê-los, Jesus disse: «Ide apresentar-vos aos sacerdotes». Enquanto estavam a caminho, aconteceu que ficaram curados. Um deles, ao perceber que estava curado, voltou glorificando a Deus em alta voz; prostrou-se aos pés de Jesus e lhe agradeceu. E este era um samaritano. Então Jesus lhe perguntou: «Não foram dez os curados? E os outros nove, onde estão? Não houve quem voltasse para dar glória a Deus, a não ser este estrangeiro?». E disse-lhe: «Levanta-te e vai! Tua fé te salvou».

«Jesus, Mestre, tem compaixão de nós!»

Rev. D. Antoni CAROL i Hostench (Sant Cugat del Vallès, Barcelona, Espanha)

Hoje, podemos comprovar, mais uma vez! como a nossa atitude de fé pode remover o coração de Jesus Cristo. O fato, é que alguns leprosos, superando a reprovação social que padeciam e com muita audácia, aproximam-se a Jesus e —poderíamos dizer entre aspas— o obrigam com sua confiada petição: «Jesus, Mestre, tem compaixão de nós!» (Lc 17,13).

A resposta é imediata e fulminante: «Ide apresentar-vos aos sacerdotes» (Lc 17,14). Ele, que é o Senhor, demonstra o seu poder, já que «enquanto estavam a caminho, aconteceu que ficaram curados» (Lc 17,14).

Isso nos mostra que o tamanho dos milagres de Cristo é, justamente, o tamanho da nossa fé e confiança em Deus. E nós, o que podemos fazer —pobres criaturas— ante Deus? Devemos confiar nele. Mas com fé operativa que nos leva a obedecer às indicações de Deus. Um mínimo de sentido comum é suficiente para compreender que «nada é difícil de crer tocando Àquele para quem nada é difícil de fazer» (Beato J. H. Newman). Se não vemos milagres é porque "obrigamos" pouco ao Senhor com nossa falta de confiança e obediência a sua vontade. Como disse São João Crisóstomo: «um pouco de fé pode fazer muito».

E, como coroação da confiança em Deus, chega o desbordamento da alegria e do agradecimento: por isso: «um deles, ao perceber que estava curado, voltou glorificando a Deus em alta voz; prostrou-se aos pés de Jesus e lhe agradeceu» (Lc 17, 15-16).

Mas… que pena! De dez homens que receberam esse milagre, apenas um voltou para agradecer-lhe. Que ingratos somos quando esquecemos que tudo vem de Deus e a Ele devemos-lhe tudo! Façamos o propósito de obrigar-lhe mostrando-nos confiados em Deus e agradecidos a Ele.

Pensamentos para o Evangelho de hoje
«Sigamos a Cristo e supliquemos ao Pai com Ele. Não imitemos a conduta de Judas, abandonando Cristo depois de ter participado dos seus favores e ter ceado esplendidamente com Ele» (São Tomás More)

«O nosso Deus é um Deus que se faz próximo. Um Deus que começou a andar com o seu povo e depois se tornou um do seu povo, em Jesus Cristo. Com essa proximidade que encorajou aqueles dez leprosos a pedir-lhe que os purificasse... Ninguém queria perder essa proximidade» (Francisco)

«Toda a alegria e todo o sofrimento, todo o acontecimento e toda a necessidade podem ser matéria da ação de graças, a qual, participando na de Cristo, deve encher a vida toda: ‘Dai graças em todas as circunstâncias’ (1 Ts 5, 18)» (Catecismo da Igreja Católica, nº 2648)

Ninguém mais voltou a agradecer a Deus senão este estrangeiro?

Vai, que a tua fé te salvou. O acento tónico deste breve texto evangélico vai, segundo me parece, para o facto de ser só um «estrangeiro» (um samaritano) a agradecer o favor recebido, ao passo que de entre os outros nove (supostamente todos judeus e, por isso, mais «obrigados» a agradecer) não se sabe o que fizeram. A este propósito, é interessante notar nas páginas evangélicas - e particularmente no Evangelho de S. Lucas - a ideia sempre clara de que os favores de Deus se destinam a todos. E, como é evidente, ao propor como modelo de agradecimento alguém que não é lá muito «católico» (precisamente um samaritano), S. Lucas tem a intenção de dar uma alfinetada - passe a expressão - a todos os que, sendo ou julgando-se «cumpridores», pensam que tudo lhes é devido e que, por isso, não têm obrigação nenhuma de agradecer seja o que for. Essa crítica, no caso específico de Lucas, dirige-se dum modo particular contra escribas e fariseus, mas também contra todos aqueles que, na comunidade cristã, procedem como eles, nomeadamente quando pensam que a salvação depende sobretudo ou exclusivamente das suas «práticas devocionais». Mas, há mais: esta crítica é também um aviso para todos nós, não só quando nos esquecemos que temos sempre motivos para agradecer a Deus o que nos acontece, mas também quando alimentamos a pretensão de nos podermos salvar por nós próprios. Por mais méritos que julguemos ter, nunca nos esqueçamos que tudo devemos a Deus, que só Ele é Salvador, e que é essa fé que nos salva.

Como nos dão a entender as leituras de hoje, a experiência religiosa autêntica não está principal e necessariamente acorrentada a quaisquer regras e condições humanas. Ela extrapola, digamos assim, do plano da lei, do mérito e do prémio, e entra no contexto do amor e da confiança. Por amor, faz-se o possível e quase o impossível. E então é sobretudo verdade que Deus, por amor, faz certamente o que é impossível aos homens.

Não se está, portanto, propriamente no campo do merecimento, mas no da confiança e do amor, quando a bondade e a misericórdia de Deus se manifestam em sinais extraordinários, porque Ele concede sempre mais de quanto nós possamos imaginar. É o que acontece também com os casos narrados pela liturgia da palavra deste domingo.

O ponto de partida, a mola que puxa a cura (dos leprosos), é a súplica. E, na verdade, por si sós, os doentes podem apenas gritar por auxílio. O seu gesto simboliza e condensa o grito de todos os homens que batem às portas do mistério à procura de ajuda. E o milagre - quando existe realmente uma súplica - acaba por acontecer: duma forma ou doutra; imediatamente ou depois de algum tempo; no plano corporal ou no plano espiritual; quase sempre quando a gente menos o espera; às vezes, talvez quando se atingiu uma tal disponibilidade que já nem sequer se espera...

Milagre, dom de Deus e não mérito. O ensinamento do trecho evangélico de hoje transparece diretamente da atitude dos leprosos curados. Eles observam a Lei, obedecem às palavras de Jesus. Mas, de alguma forma, consideram-se curados precisamente graças ao facto de serem observantes da Lei; pelo menos no caso de nove deles. Por isso, acham que «mereceram a cura» e não se lembram sequer de agradecer, com exceção do samaritano que, por sinal, era o paradigma dos que, segundo a mentalidade corrente, não eram observantes da Lei, sendo equiparados a pagãos. Os primeiros são assim a imagem de tantos cristãos (ou outros) que se atêm a um rígido legalismo, que é causticado por Paulo (cf. Rm 9,30-32); 10,3). Um só reconhece que tudo é sempre e exclusivamente dom da bondade de Deus que (neste caso contado pelo texto evangélico) se revela em Jesus Cristo. E, por sinal, como disse, quem é o faz é precisamente o leproso curado que não tinha, digamos assim, conhecimento da Lei.

Às vezes, é difícil apreciar os dons que se recebem e aceitá-los plenamente reconhecido como um dom de Deus. Em nenhuma circunstância, nos podemos achar com «direito» seja ao que for; pelo menos neste campo do relacionamento com Deus. No entanto, quando se aceita esse dom como tal, chega-se ao plano da salvação total: os nove leprosos judeus receberam a cura externa - que não lhes foi retirada - mas, interiormente, ficaram ligados à mesma vida. O samaritano, ao contrário, deixou-se introduzir e moldar pela odisseia da salvação definitiva e, para além da cura corporal, ficou curado também espiritualmente.

Agradecer, mas também dar testemunho. A mensagem das leituras não é, porém, apenas um ensinamento sobre o dever moral da gratidão humana. O sírio Naaman passa da cura corporal à fé. No caso do samaritano, diz-se ainda mais: ele volta «agradecendo e louvando a Deus em altos brados». O milagre abre-lhe os olhos sobre a pessoa e a missão de Jesus. Ele reconhece que Jesus é o Salvador no qual Deus está presente e vai dizê-lo em público.

Portanto, não é só curado no corpo. Converte-se, digamos assim, a Cristo e é salvo no sentido cristão do termo: alcança a salvação total. Pela cura corporal, ele chega à conclusão de que quem o pode curar assim é digno de total confiança. A ação de graças, o agradecimento, do leproso curado nasce assim, antes de mais, da fé e não da utilidade. É contemplação alegre e gratuita do amor salvífico de Deus antes que alegria pela saúde readquirida.

Em primeiro lugar, e dada a doença incurável (naquele tempo) de que padece, ele dá-se conta de que ali anda alguém diferente de todos os outros e, por isso, não pode deixar de reconhecer isso mesmo. Só, num segundo tempo, inclui a gratidão; o que não é, porém, o simples reconhecimento cortês por um benefício recebido, mas a confissão de fé no fato de estar ali alguém que pode fazer o que é impossível.

De resto, o Evangelho não é um manual que nos quer dar uma lição de boas maneiras, mas, no caso concreto, uma das suas intenções é transmitir-nos que o agradecer é uma atitude fundamental do homem, que na fé descobre que a sua salvação provém só da ação de Deus em Cristo.

Milagre é o Reino em ação. O anúncio do Reino de Deus (e é isso precisamente o objetivo do Evangelho) não é apenas um anúncio de salvação só feito de palavras e discursos, mas é também um anúncio feito de ações ordinárias e extraordinárias.

«Os milagres inscrevem-se, pois, na perspectiva da inauguração do reino messiânico» - escrevia, já lá vão largos anos, Christian Duquoc. «Pelo seu conteúdo, o milagre é uma antecipação do reino escatológico. Este não será definitivamente implantado e revelado enquanto o último inimigo, a morte, não for vencido. Os milagres são, aparte algumas exceções e por razões que é fácil compreender, verificações, profetizam a vivificação definitiva: a vida eterna. Por meio do milagre, o poder vivificador de Deus irrompe no tempo, inserindo-se num mundo que declina para a morte. O milagre é uma ruptura na orientação normal das coisas. Esta ruptura toca-nos como sinal duma transcendência. Os milagres, no "tempo intermédio", são o penhor da realidade futura; sublinham concretamente a eficácia invisível da Palavra de Salvação».

Por outras palavras - e voltamos sempre ao mesmo ponto - os milagres contados pelos evangelistas não têm por finalidade senão proclamar de forma evidente que a salvação não é uma conquista humana, mas um dom de Deus.

Milagres - janelas da fé. Há uma corrente teológica segundo a qual os milagres são a prova da divindade de Jesus. Acho que não é caso para discutir aqui esse assunto. Só gostaria de afirmar que certamente não era essa a intenção primordial dos evangelistas, pois o problema no tempo em que eles escreveram não se punha nestes termos. Eles supõem, com efeito, que os seus leitores não têm problema de qualquer espécie em aceitar a divindade de Jesus e, por conseguinte, não sentem a necessidade de a provar.

Para os evangelistas, tanto as palavras como os feitos de Jesus são parte dum mesmo processo, que é o anúncio do Reino. Todavia, não quer dizer que os milagres não sejam sinais de qualquer coisa de completamente diferente do que é a normalidade da vida humana. E é assim que eles os apresentam. Inclusivamente, podem, sem dúvida nenhuma, contribuir para dissipar as dúvidas e os temores que eventualmente possam subsistir. Através deles pode-se vislumbrar uma luz que dá à realidade uma outra cor e um outro significado.

Quando João Baptista chegou a duvidar da messianidade de Jesus ou, por outra, quando quis confirmar através dos seus discípulos acerca dessa messianidade, Jesus manda-lhe dizer, por meio dos seus enviados: «Ide dizer-lhe o que vistes e ouvistes: os coxos andam, os surdos ouvem, os cegos recobram a vista e a todos é anunciado o Reino de Deus» (cf. Mt 11,4ss). É como que um convite a saber ver - e não mais do que isso - os sinais dos tempos.

Jesus não hesita em fazer milagres, primordialmente para ensinar ao povo que tinha chegado a hora anunciada pelos profetas, o início da salvação do mundo. Mas, deve ainda chegar o post meridiem da história - da qual não podemos nem sequer imaginar o crepúsculo escatológico. Não nos resta senão estar atentos para, através dos sinais dos tempos, tentarmos absorver os ensinamentos que contêm.
 

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