quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Trado do Purgatório - 1ª parte


1. APRESENTAÇÃO


Catariana Fieschi, chamada ”a santa do puro amor”, nasceu em 1447. Desejava, ainda adolescente, ingressar na vida religiosa consagrada, mas as imposições sociais e familiares prevaleceram e ela casou-se com Juliano Adorno.
Foram cinco anos de abandono, decepções e sofrimento. Por estranha reação decidiu lançar-se nas frivolidades da vida. Diz seu biógrafo: "Para compensar as tribulações que lhe causava o marido e para diminuir tantos afãs, Catarina entregou-se aos prazeres e às vaidades do mundo e neles se comprazia". Assim, viveu cinco anos.
Aos vinte e seis anos, triste e abatida, não sabia o que fazer. Foi então que Deus irrompeu em sua alma com torrentes de graças que a fizeram exclamar: "Não mais o mundo! Não mais pecados! Ó Amor, não mais pecados". O fogo do amor transformou rapidamente aquele coração generoso. Arrebatada por atração divina, disse: Oh! amor, eu não posso compreender que tenha de amar outra coisa fora de Ti...- Este amor causa tanta alegria que qualquer outra alegria, em comparação, é tristeza.
Catarina viveu o amor e ensinou o amor. Dela afirma São Francisco de Salles: "Santa Catarina é mestra na ciência do Amor" e São Luiz Gonzaga: "As chamas que reverberaram do incêndio de amor de Santa Catarina abrasaram minha alma". Consumida pelo amor Catarina foi ao encontro definitivo com Deus aos 15 de setembro de 1510. Tinha 63 anos.

O TRATADO DO PURGATÓRIO é fruto de suas experiências místicas de 1501. Tais experiências são o paradigma do Purgatório. O leitor não estranhe se no TRATADO encontre colocações que pareçam discordar do que há lido sobre o Purgatório, pois, como dissemos o TRATADO resulta de experiências da Santa. Isto não exclui outros modos de ver aquela realidade.
A doutrina de Santa Catarina a respeito do Purgatório pode ser resumida em alguns pontos-chave que apresentamos para facilitar a compreensão do TRATADO:
Amor-egoismo - O amor é Deus e o egoísmo é o pecado. O amor é felicidade e merece prêmio. O pecado é infelicidade e merece castigo eterno no inferno ou provisório no Purgatório.
Vida-Morte - O homem é protagonista de sua história, define seu destino tanto para o bem como para o mal. A morte fixa-o definitivamente conforme sua escolha.
Dinâmica da graça e do pecado: A graça tende a assemelhar-nos a Deus. O pecado tende a separar-nos de Deus levando à auto destruição.
Fim da graça: O Paraíso. Fim do pecado: O inferno
A santidade de Deus: Ela não admite manchas. A alma com a menor imperfeição, afasta-se da presença de Deus por uma intrínseca repugnância entre o pecado e a graça, a fealdade e a beleza.
Purgatório: É uma mescla de sofrimento e gozo. São as duas faces do amor: amor purificador e amor unitivo.
Inferno: É a privação do Amor. Tortura total.
O TRATADO insiste na expiação, no sofrimento: Porem, é sobretudo, um ato ao Amor e à felicidade.

2. PERFEITA CONFORMIDADE DAS ALMAS SOFREDORAS COM A VONTADE DE DEUS

As almas que estão no purgatório, segundo me parece compreender, não podem ter nenhuma outra escolha a não ser de estar nesse lugar. Isto acontece pela disposição de Deus. Não podem essas almas voltar-se sobre si mesmas, nem dizer: "Eu cometi esses pecados, pelos quais mereço estar aqui". Nem pode dizer: "Quisera não tê-los cometido, porque agora estaria no paraíso". Nem sequer exclamar: "Esta alma sairá daqui antes de mim?, ou, “sairei antes dela?".
Não podem ter lembrança de si mesmas nem dos outros (de bem ou de mal) que possam causar-lhe maior aflição da que já têm. Ao contrário, tem tal contentamento de se encontrarem na disposição e do que Deus nelas realiza quanto quer e como quer que não podem pensar em ter pena maior para si mesmas.
Vêm somente as operações da divina bondade que, com tanta misericórdia, conduzem o homem para Deus: Por isso, não podem ver nem os sofrimentos, nem os bens que possam acontecer ao homem como coisa dele. Se pudessem ver isto, não estariam em caridade pura. Não podem ver que estão nestas penas por seus pecados nem podem ter esta ideia na mente, porque isso seria uma imperfeição ativa, a qual não pode existir nesse lugar, porque atualmente não se pode ali pecar.
A causa de estarem no purgatório, essas almas a vêm uma só vez, quando passam desta vida. Já não podem vê-la mais, pois, caso contrário, haveria uma posse. Portanto, estando essas almas em caridade e, não podendo desviar-se dela com nenhum defeito atual, não podem querer nem desejar senão o puro querer da pura caridade. Estando no fogo do purgatório, estão dentro da disposição divina, a qual é caridade pura, e não podem desviar-se o mínimo em nenhuma outra coisa, porque estão também igualmente impossibilitadas de pecar como de merecer.

3- O MAIOR SOFRIMENTO DAS ALMAS NO PURGATÓRIO É A SEPARAÇÃO DE DEUS.

Por outro lado, aquelas almas sofrem um pena tão extrema que não há língua que a possa expressar, nem inteligência que possa compreender sequer a mínima parte dela, se Deus, por uma graça especial, não a mostrar. O mínimo desta pena, Deus, por esta graça especial, a mostrou à minha alma; porém, não posso expressá-la com minhas palavras. E esta visão que me mostrou o Senhor nunca mais se apagou da minha mente. Eu lhes direi, da melhor forma possível, porém, o compreenderão só aqueles a quem o Senhor se digne abrir-lhes o entendimento.
O fundamento de todas as penas é o pecado original e o atual. Deus criou a alma pura, simples e limpa de toda a mancha de pecado, e com certo impulso feliz para Ele. O pecado original, na pessoa em quem ele se encontra, afasta a alma deste impulso; ao acrescentar-se o pecado atual, a alma afasta-se ainda mais. E quanto mais a alma se separa de Deus, tanto mais se torna má, porque menos se assemelha a Deus.
Todas as bondades que possam existir, existem por participação de Deus, o que acontece às criaturas irracionais como Deus quer e ordenou. A alma racional assemelha-se a Ele, mais ou menos, à medida que a encontre purificada do impedimento do pecado.
Por isso, quando uma alma se aproxima da sua primeira criação, pura e limpa, esse impulso feliz se lhe vai descobrindo e crescendo tanto, com tal ímpeto e com tal veemente fogo da caridade - o que o atrai ao seu último fim basta um que lhe pareça uma coisa insuportável ser impedida; e quanto mais claramente a alma vê isto, mais padece um sofrimento extremo.

4. DIFERENÇA ENTRE OS CONDENADOS E AS ALMAS DO PURGATÓRIO

Como as almas que estão no purgatório, já não têm culpa de pecado, não há outro impedimento, entre Deus e elas a não ser essa pena que as retêm. Assim, o impulso não consegue ainda sua perfeição.
Ao ver claramente quanto lhes custa o menor impedimento e que este impulso é lento por necessidade de justiça, nasce, então, nelas aquele extremo fogo, parecido ao do inferno, diferente, porém, por não existir a culpa nas almas sofredoras, que é a culpa que perverte a vontade dos condenados ao inferno, aos quais Deus não corresponde com Sua bondade. Por isso, os condenados permanecem naquela desesperada e maligna vontade contrária à vontade de Deus.
Disto se vê, claramente, que é a perversa vontade, contrária à vontade de Deus que faz a culpa e que, perseverando na má vontade, persevera a culpa.
Por haver passado desta vida com aquela má vontade, a culpa dos que estão no inferno não está perdoada nem pode ser perdoada. Já não podem mudar a vontade com a qual saiam desta vida.
Naquela passagem se estabiliza a alma, no bem ou no mal, com a deliberação da vontade em que então se encontra, conforme está escrito: “Onde te encontrarei na hora da morte e com que vontade - de pecar ou de pesar e arrependimento dos pecados - ali te julgarei”.
Para este julgamento não há possibilidade de remissão, porque, após a morte, a liberdade do livre arbítrio não sofre mudanças porque está determinada naquilo em que se encontra no momento da hora da morte.
Os do inferno, por terem se encontrado, no momento da morte, com a vontade de pecar, levam consigo a culpa infinita e com ela a pena. Esta pena não é tanta como mereciam, embora a que têm seja infinita.
Os do purgatório têm somente a pena, já que a culpa foi apagada na hora da morte, por terem elas se arrependido de seus pecados.
Oh! Que miséria das misérias a nossa e tanto maior quanto a cegueira humana nem sequer a vê.

... Continua amanhã

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