3º DOMINGO DO ADVENTO:
MARIA DE NAZARÉ: A MULHER DO SIM A DEUS
Maria de Nazaré não é uma personagem com grande visibilidade nos textos neo-testamentários. É fácil perceber porquê: aos primeiros cristãos não interessaria tanto a reportagem histórica sobre Jesus, a definição do seu bilhete de identidade (com filiação incluída), a sua história de família; mas interessava, sobretudo, tentar entrar no mistério de Jesus, descobrir o núcleo fundamental da sua proposta, apreender as coordenadas fundamentais do “Reino”.
O mensageiro de Deus apresenta a Maria um desafio. Diante da proposta de Deus, Ela não pensa nos seus projetos pessoais ou nas complicações em que Deus a ia meter. Nem sequer pede tempo para pensar. Também não impõe condições de qualquer espécie, nem “negocia” com Deus exigindo algo em troca…
Joaquim Manuel Garrido Mendes, scj

Apesar disso, há algumas referências significativas a Maria, sobretudo na versão lucana do Evangelho da Infância. São textos que impõem Maria de Nazaré como um modelo de espera atenta do Senhor. É por isso que, com João Baptista, ela é uma das figuras que a liturgia propõe à nossa consideração e que pode ajudar-nos a viver de forma mais empenhada e coerente o nosso “caminho de advento”.
Há, sobretudo, dois textos lucanos que merecem a nossa atenção, pois definem as duas grandes coordenadas à volta das quais a vida de Maria se edificou. Um (cf. Lc 1,26-38), propõe-nos a mulher do “sim” a Deus; outro (cf. Lc 1,39-56), apresenta-nos a mulher do “sim” aos irmãos.
Detenhamo-nos um pouco na história do anúncio do anjo a Maria (cf. Lc 1,26-38). Trata-se de um texto bem conhecido, abundantemente representado na liturgia e na arte cristã. O objetivo óbvio do relato de Lucas é apresentar Maria como o protótipo do crente ideal.
Para percebermos o que está em jogo, vamos entrar um pouco no ambiente em que a narração nos situa.
Maria vive em Nazaré – uma aldeia humilde da Galileia, nunca referenciada no Antigo Testamento e sem qualquer significado no contexto das vilas ou cidades ligadas às grandes instituições religiosas de Israel. A jovem Maria está matrimonialmente comprometida com um homem chamado José, que descende da família de David; no entanto, ainda não vivem em comum (o costume palestino previa que o compromisso dos noivos começasse com os esponsais; mas, só depois de o noivo receber a noiva em sua casa, o casamento era consumado).
De acordo com o relato de Lucas, é nesse contexto que um mensageiro de Deus – o anjo Gabriel – vem ao encontro de Maria e lhe propõe ser a mãe do Messias.
Não interessa se o texto é um relato fiel de acontecimentos concretos, ou se é apenas uma reflexão carregada de significado teológico, feita bem ao jeito dos relatos de vocação do Antigo Testamento, sobre o chamamento de Deus e a resposta de Maria…
Seja como for, este texto assume um significado paradigmático: ele apresenta a “atitude de vida” que Maria de Nazaré assumiu diante de Deus; e é essa atitude que nos interpela e nos questiona.
Na mensagem que o “anjo” dirige a Maria, fica claro que Deus tem um projeto de salvação para oferecer aos homens e conta com Maria para que esse projeto possa tornar-se uma realidade viva e concreta. Esse projeto, no entanto, comporta riscos e, inevitavelmente, abalará os esquemas sobre os quais Maria está a construir a sua vida e o seu futuro.
Maria aceitará “correr riscos”, pôr em causa tudo o que está a construir com José para aceitar o desafio de Deus?
Maria escolherá o caminho fácil do comodismo, ou preferirá entregar-se confiadamente nas mãos de Deus?
O que é que terá mais peso na vida desta jovem: os seus projetos pessoais, ou o projeto libertador que Deus quer oferecer aos homens?
A resposta de Maria não deixa qualquer dúvida: “eis a serva do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra”.
Afirmar-se como “serva” significa, mais do que humildade, reconhecer que se é um eleito de Deus e aceitar essa eleição, com tudo o que ela implica – pois, no Antigo Testamento, ser “servo do Senhor” é um título de glória, reservado àqueles que Deus escolheu, que Ele reservou para o seu serviço e que Ele enviou ao mundo com uma missão (essa designação aparece, por exemplo, no Deutero-Isaías – cf. Is 42,1; 49,3; 50,10; 52,13; 53,2.11 – em referência à figura enigmática do “servo de Jahwéh”).
Desta forma, Maria reconhece que Deus a escolheu, aceita com disponibilidade essa escolha e manifesta a sua disposição de cumprir, com fidelidade, o projeto de Deus.
O EXEMPLO DE MARIA
Maria tem de ser, antes de mais, um modelo de vida, alguém que nos ensina uma “atitude”. Neste caso, é o seu “sim” incondicional a Deus que tem de nos marcar e de nos interpelar.

O seu “sim” é incondicional, total, radical: “eu sou a serva, estou disposta a entregar a minha vida nas mãos de Deus e a confiar n’Ele de forma total e plena. Que Ele faça o que é melhor para o seu plano e eu colaboro com Ele” – diz ela.
É possível a alguém entregar-se tão cegamente a Deus, sem reservas, sem medir os prós e os contras? Como é que se chega a esta confiança incondicional em Deus e nos seus projetos?
Não se chega a esta confiança cega em Deus e nos seus planos, sem uma vida de diálogo, de comunhão, de intimidade com Deus. Estamos, portanto, a falar de uma mulher para quem Deus ocupa o primeiro lugar e é a prioridade. Estamos a falar de uma pessoa de oração e de fé, que faz a experiência do encontro com Deus e aprende a confiar totalmente n’Ele. Estamos a falar de uma pessoa que, antes de qualquer coisa, considera os planos de Deus.
Maria está na linha dos “profetas”: ela vive numa atitude de relação, de proximidade, de diálogo, de comunhão com Deus e Deus, na sua vida, ocupa um lugar primordial. Nesse diálogo, Maria apercebe-se dos projetos de Deus e do lugar que Deus lhe reserva na concretização desses projetos; e, como Deus é a sua prioridade, ela só pensa em cumprir a missão que Deus tem para ela.
O “sim” incondicional e total de Maria permite que Deus venha ao encontro dos homens e comece a instaurar esse mundo novo de felicidade e de paz com que todos sonhamos… É que Deus age no mundo através dos homens e das mulheres; e dizer “sim” a Deus (quer dizer, aceitar cumprir o meu papel para que Deus, através de mim, “nasça” no mundo), é acolhê-lo e torná-lo uma realidade viva no mundo.
Maria propõe-nos uma vida em que Deus seja o ponto de referência à volta do qual construímos tudo. Isso implica - como implicou para ela - uma experiência de encontro, de relação, de diálogo, de proximidade, de comunhão com Deus…
Nessa experiência, crescemos na fé e na confiança; e, quando discernimos o projeto que Deus nos quer confiar, é preciso ter a coragem de dizer “sim” e de concretizá-lo, sem dramas, sem inquietações, sem angústias, sem medos. Ora, quando isso acontece, também nós – como ela – fazemos com que Deus venha a este mundo e o transforme.
PARA UM QUESTIONAMENTO PESSOAL OU EM GRUPO:
A Maria do “sim” a Deus, interpela-me…
• Vivo com Deus uma relação tão próxima que confio totalmente n’Ele?
• Estou tão em comunhão com Deus que percebo os seus planos para o mundo e consigo detectar e entender os “sinais” com que Ele me interpela?
• Aceito com total disponibilidade os projetos de Deus para mim, mesmo quando Ele me pede algo que parece pôr em causa os meus projetos muito pessoais?
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