Salmo Responsorial: 45
R. Os braços dum rio
alegram a cidade de Deus, a morada santa do Altíssimo.
Deus é o nosso refúgio e a nossa força, auxílio sempre
pronto na adversidade. Por isso nada receamos ainda que a terra vacile e os
montes se precipitem no fundo do mar.
Os braços dum rio alegram a cidade de Deus, a mais santa das
moradas do Altíssimo. Deus está no meio dela e a torna inabalável, Deus a
protege desde o romper da aurora.
O Senhor dos Exércitos está conosco, o Deus de Jacob é a
nossa fortaleza. Vinde e contemplai as obras do Senhor, as maravilhas que
realizou na terra.
2ª Leitura (1Cor 3,9c-11.16-17): Irmãos: Vós sois
edifício de Deus. Segundo a graça de Deus que me foi dada, eu, como sábio arquiteto,
coloquei o alicerce e outro levanta o edifício. Veja cada um como constrói:
ninguém pode colocar outro alicerce além do que está posto, que é Jesus Cristo.
Não sabeis que sois templo de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós? Se
alguém destrói o templo de Deus, Deus o destruirá. Porque o templo de Deus é
santo e vós sois esse templo.
Aleluia. Escolhi e consagrei esta casa, diz o Senhor, para que o meu
nome esteja neste lugar para sempre. Aleluia.
Evangelho (Jo 2,13-22): Estava próxima a Páscoa
dos judeus; Jesus, então, subiu a Jerusalém. No templo, encontrou os que
vendiam bois, ovelhas e pombas, e os cambistas nas suas bancas. Então fez um
chicote com cordas e a todos expulsou do templo, juntamente com os bois e as
ovelhas; jogou no chão o dinheiro dos cambistas e derrubou suas bancas, e aos
vendedores de pombas disse: «Tirai daqui essas coisas. Não façais da casa de
meu Pai um mercado!» Os discípulos se recordaram do que está na Escritura: «O
zelo por tua casa me há de devorar». Então os judeus perguntaram a Jesus: «Que
sinal nos mostras para agires assim?» Jesus respondeu: «Destruí este templo, e
em três dias eu o reerguerei». Os judeus, então, disseram: «Trabalharam durante
quarenta e seis anos erguer este templo, e tu serias capaz de erguê-lo em três
dias?» Ora, ele falava isso a respeito do templo que é seu corpo. Depois que
Jesus fora reerguido dos mortos, os discípulos se recordaram de que ele tinha
dito isso, e creram na Escritura e na palavra que Jesus falou.
«Destruí este templo, e em três dias eu o reerguerei»
Rev. D. Joaquim
MESEGUER García (Rubí, Barcelona, Espanha)
São João de Latrão é o símbolo da unidade de todas as
Igrejas do mundo com a Igreja de Roma e, por isso esta basílica ostenta o
título de Igreja principal e mãe de todas as Igrejas. Sua importância é
superior à da mesma Basílica de São Pedro do Vaticano, pois na realidade esta
não é uma catedral, senão um santuário sobre o túmulo de São Pedro e o local de
residência atual do Papa que, como Bispo de Roma, tem na Basílica Lateranense
sua catedral.
Mas não podemos perder de vista que o verdadeiro local de
encontro do homem com Deus, o autêntico templo, é Jesus Cristo. Por isso, Ele
tem plena autoridade para purificar a casa do seu Pai e pronunciar estas
palavras: «Destruí este templo, e em três dias eu o reerguerei» (Jo 2,19).
Graças à entrega da sua vida por nós, Jesus Cristo fez dos crentes um templo
vivo de Deus. Por esse motivo, a mensagem cristã lembra-nos que toda pessoa
humana é sagrada, está habitada por Deus e, não podemos profana-la usando-a
como um meio.
“Mas Ele falava do templo do seu corpo”
COMENTÁRIO: A
Basílica de São João Lateranense, a catedral da Igreja de Roma, é considerada a
mãe de todas as Igrejas Católicas do mundo. Foi construída por Constantino nas
primeiras décadas do século quatro.
No contexto do Quarto Evangelho, esse texto se situa durante
a visita de Jesus a Jerusalém para a primeira das três Páscoas mencionadas
neste Evangelho (nos Sinóticos só é mencionado uma Páscoa). No Templo, que
deveria ser o lugar do culto ao Deus verdadeiro de Israel, o Deus de
libertação, o Deus dos pobres e sofridos, ele encontra um verdadeiro mercado,
onde, no pátio externo, era possível comprar os animais para os sacrifícios, e
trocar a moeda, uma vez que a moeda corrente do país não era aceita no Templo.
Quando atacava esse comércio, Jesus estava indo além da mera condenação de um
abuso. Pois, os animais e o câmbio eram necessários para o funcionamento do
Templo. Como nos versículos precedentes do Capítulo 2, onde Jesus substituiu a
purificação dos judeus no sinal das bodas de Caná, aqui ele demonstra que o
centro do culto judaico perdeu o seu sentido. Pois, a presença de Deus, antes
achada no Templo, agora deturpado pela elite religiosa e política, doravante
reside em Jesus, o Filho de Deus encarnado. Ele cumpre as profecias de Jeremias
e Zacarias que predisseram uma religião sem templo nacionalista, explorador
econômico do povo (Jr 7, 11-14; Zc 14, 20-21).
João entende que o verdadeiro e duradouro templo é o corpo
de Jesus, que será ressuscitado em três dias - ele usa de propósito o verbo
“reerguer” em lugar do “reconstruir” dos Sinóticos (Mt 26, 61). As autoridades
judaicas (não “os judeus,” no sentido de raça ou religião) destruíram o sentido
do Templo, abusando do povo economicamente, como vão destruir o corpo de Jesus,
matando-o; mas Jesus tem o poder de reerguer o verdadeiro Templo onde habita
Deus, na Ressurreição, depois de três dias.
É bom lembrar que a “toca” ou “covil” de ladrões não é o
lugar onde eles assaltam e roubam, mas onde eles se sentem seguros. Assim, Jesus está dizendo que o verdadeiro
assalto contra a vida do povo se dá no dia-a-dia do sistema
econômico-político-social, e que os assaltantes – a elite de Jerusalém, aliada
ao poder romano – se sente segura, encobrindo a realidade exploradora com ritos
e rituais bonitos no Templo, como se Deus aprovasse o sistema vigente.
Mais uma vez Jesus, através de uma ação profética,
desmascara a deturpação da religião, por parte das autoridades de Jerusalém.
Embora o templo fosse muito bonito e imponente, com liturgias pomposas bem frequentadas,
a sua religião era vazia, pois escondia o rosto verdadeiro de Deus. As Igrejas
correm este mesmo risco nos dias de hoje. Além da descarada exploração
financeira dos seus fiéis por parte de alguns grupos religiosos (cuidemos para
não generalizarmos aqui e que a mesma coisa não aconteça na nossa Igreja!), aos
poucos muitas comunidades cristãs perderam a sua dimensão profética de denúncia
e anúncio, configurando-se ao mundo neoliberal de consumismo e gratificação
emocional imediata, tornando o Evangelho uma mercadoria a ser vendida através
de um marketing, que jamais pode questionar os valores da sociedade vigente.
Como escreveu uma vez o Frei Beto, a religião assim “brilha sob as luzes da
ribalta, trocando o silêncio pela histeria pública, a meditação pela emoção, a
liturgia pela dança aeróbica. Na esfera católica, torna o produto mais
palatável, destituindo-o de três fatores fundamentais na constituição da
igreja, mas inadequados ao mercado: a inserção dos fiéis em comunidades, a
reflexão bíblico-teológica e o compromisso pastoral no serviço à justiça. As
homilias se reduzem a breves exortações que não incomodam as consciências”.
Assim, o texto de hoje nos traz um alerta - Jesus não veio
compactuar com uma religião exploradora, alienadora, aliada ao poder, mas para
encarnar as opções do Deus da Bíblia, libertador dos males e de toda
exploração; ele veio “para que todos tenham a vida e a vida em abundância” (Jo
10, 10). Uma religião que abandonasse a sua função profética seria tão traidora
como a religião decadente das elites do Templo. Diante da arrogância despótica
dos que se consideram “donos” do mundo e dos seus recursos, por causa do seu
poderio militar e econômico, as vozes do Papa Francisco, do Dalai Lama e de
outros líderes religiosos soam profeticamente ao redor do mundo, lembrando-nos
que a religião não se confina à sacristia, mas tem que levar à prática dos
princípios do Reino, que recusa legitimar o derramamento de sangue e a
destruição do meio-ambiente em troca de petróleo e do lucro.
Neste dia em que a Igreja celebra a dedicação da
“Igreja-Mãe” – a Basílica de São João de Latrão, em Roma - verifiquemos o
estado de reparo da nossa Igreja Viva - feita não de pedras talhadas e
construções imponentes, por tão bonitas e até necessárias que possam ser, mas
de discípulos/as-missionários/as, inspirados pela pessoa e projeto de Jesus.
Aproveitemos do ensejo para reavaliar a nossa prática religiosa, para que não
caiamos na desgraça do Templo - bonito, atraente e emocionante, mas vazio de
sentido.
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