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quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

Domingo VI do Tempo Comum

1ª Leitura (Jer 17,5-8): Eis o que diz o Senhor: «Maldito quem confia no homem e põe na carne toda a sua esperança, afastando o seu coração do Senhor. Será como o cardo na estepe, que nem percebe quando chega a felicidade: habitará na aridez do deserto, terra salobre, onde ninguém habita. Bendito quem confia no Senhor e põe no Senhor a sua esperança. É como a árvore plantada à beira da água, que estende as suas raízes para a corrente: nada tem a temer quando vem o calor e a sua folhagem mantém-se sempre verde; em ano de estiagem não se inquieta e não deixa de produzir os seus frutos».

Salmo Responsorial: 1

R. Feliz o homem que pôs a sua esperança no Senhor.

Feliz o homem que não segue o conselho dos ímpios, nem se detém no caminho dos pecadores, mas antes se compraz na lei do Senhor, e nela medita dia e noite.

É como árvore plantada à beira das águas: dá fruto a seu tempo e sua folhagem não murcha. Tudo quanto fizer será bem-sucedido.

Bem diferente é a sorte dos ímpios: são como palha que o vento leva. O Senhor vela pelo caminho dos justos, mas o caminho dos pecadores leva à perdição.

2ª Leitura (1Cor 15,12.16-20): Irmãos: Se pregamos que Cristo ressuscitou dos mortos, porque dizem alguns no meio de vós que não há ressurreição dos mortos? Se os mortos não ressuscitam, também Cristo não ressuscitou. E se Cristo não ressuscitou, é vã a vossa fé, ainda estais nos vossos pecados; e assim, os que morreram em Cristo pereceram também. Se é só para a vida presente que temos posta em Cristo a nossa esperança, somos os mais miseráveis de todos os homens. Mas não. Cristo ressuscitou dos mortos, como primícias dos que morreram.

Alegrai-vos e exultai, diz o Senhor, porque é grande no Céu a vossa recompensa.

Evangelho (Lc 6,17.20-26): E, descendo com eles, parou num lugar plano, e também um grande número de seus discípulos, e grande multidão de povo de toda a Judéia, e de Jerusalém, e da costa marítima de Tiro e de Sidon; os quais tinham vindo para o ouvir, e serem curados das suas enfermidades. E, levantando ele os olhos para os seus discípulos, dizia: «Bem-aventurados vós, os pobres, porque vosso é o reino de Deus. Bem-aventurados vós, que agora tendes fome, porque sereis fartos. Bem-aventurados vós, que agora chorais, porque haveis de rir. Bem-aventurados sereis quando os homens vos odiarem e quando vos separarem, e vos injuriarem, e rejeitarem o vosso nome como mau, por causa do Filho do homem. Folgai nesse dia, exultai; porque eis que é grande o vosso galardão no céu, pois assim faziam os seus pais aos profetas. Mas ai de vós, ricos! porque já tendes a vossa consolação. - Ai de vós, os que estais fartos, porque tereis fome. Ai de vós, os que agora rides, porque vos lamentareis e chorareis. Ai de vós quando todos os homens de vós disserem bem, porque assim faziam seus pais aos falsos profetas».

«Alegrai-vos nesse dia, exultai»

Rev. D. Enric RIBAS i Baciana (Barcelona, Espanha)

Hoje voltamos a viver as bem-aventuranças e as “mal-aventuranças”: «Bem-aventurados sóis vós...», sim agora sofres em meu nome; «Ai de vós...», se agora ris. A fidelidade a Cristo e ao seu Evangelho faz com que sejamos rejeitados, escarnecidos nos medos de comunicação, odiados, como Cristo foi odiado e crucificado. Há quem pensa que isso se deve à falta de fé de alguns, mas talvez—bem-visto— é devido à falta de razão. O mundo não quer pensar nem ser livre; vive imerso desejando a riqueza, do consumo, do doutrinamento libertário que se enche de palavras vãs, vazias onde se escurece o valor da pessoa e se burla dos ensinamentos de Cristo e da Igreja, uma vez que —hoje, por hoje— é o único pensamento que certamente vai contra a correnteza. Apesar de tudo, o Senhor Jesus nos infunde coragem: «Felizes de vocês se os homens os odeiam, se os expulsam, os insultam e amaldiçoam o nome de vocês, por causa do Filho do Homem. ( )... Alegrem-se nesse dia, pulem de alegria, pois será grande a recompensa de vocês no céu, porque era assim que os antepassados deles tratavam os profetas» (Lc 6, 22.23).

S. João Paulo II, na encíclica Fides et Ratio, disse: «A fé move a razão ao sair de seu isolamento e ao apostar, de bom agrado, por aquilo que é belo, bom e verdadeiro». A experiência cristã em seus santos nos mostra a verdade do Evangelho e destas palavras do Santo Padre. Ante um mundo que se satisfaz no vicio e no egoísmo como fonte de felicidade, Jesus mostra outro caminho: a felicidade do Reino do Deus, que o mundo não pode entender, e que odeia e rejeita. O cristão, entre as tentações que lhe oferece a “vida fácil”, sabe que o caminho é o do amor que Cristo nos mostrou na cruz, o caminho da fidelidade ao Pai. Sabemos que entre as dificuldades não podemos desanimar-nos. Se procuramos de verdade o Senhor, alegrem-se nesse dia, pulem de alegria, pois será grande a recompensa de vocês no céu, porque era assim que os antepassados deles tratavam os profetas (cf. Lc 6,23).

Pensamentos para o Evangelho de hoje

«A Misericórdia quer que sejas misericordioso, a Justiça deseja que sejas justo, pois o Criador quer verse refletido na sua criação, e Deus quer ver reproduzida à sua imagem no espelho do coração humano» (São Leão Magno)

«O Sermão da montanha está dirigido a todo o mundo, no presente e no futuro, e só se pode entender e viver seguindo Jesus, caminhando com Ele» (Bento XVI)

«A bem-aventurança prometida coloca-nos perante as opções morais decisivas. Convida-nos a purificar o nosso coração dos seus maus instintos e a procurar o amor de Deus acima de tudo (…)» (Catecismo da Igreja Católica, nº 1.723)

Felizes quando, por causa de mim, vos tratarem mal.

No domingo anterior, o evangelista Lucas contava-nos a sua versão do chamamento dos primeiros «discípulos». Pois bem, é a partir daí altura que se estabelece uma «distinção» clara entre os discípulos e a multidão. Mas não me parece que seja esse o principal tema do texto deste domingo. De resto, só o facto de ter escolhido alguns para desempenhar um papel especial (apóstolos e discípulos) isso não quer dizer que a atenção de Jesus se concentre toda só nesse grupo de «escolhidos». O texto de hoje concentra-se naquilo que leva o nome de Bem-aventuranças, se bem que seja de esclarecer, desde já que, ao contrário, de S. Mateus (onde elas são 8), em Lucas elas são apenas 4. O que quer dizer que, mais que o número, o que mais interessa é o conteúdo. Este trecho é, pois, como um exemplo duma espécie de «Constituição» do facto de ser cristão. Sim, não obstante as diferenças entre as «Bem-aventuranças» de S. Mateus e de S. Lucas, parece-me claro que a «proposta» que Jesus faz é de tal maneira radical que houve (e há), em todos os tempos, uma enorme dificuldade em assumi-la e em pô-la em prática. Ainda hoje - como sempre - os «ideais» que atraem as pessoas, incluindo os cristãos, são a carreira, o sucesso, a fama, a saúde, o dinheiro, a procura do prazer... Quantas vezes - quase sempre - se ouve dizer, por exemplo, que o mais importante é a saúde. Pensar o contrário equivale a não ter os pés bem assentes na terra, é ser idealista. Ora bem, sejam as Bem-aventuranças oito, sejam 4 (não é o número o que mais interessa), parece que não é bem essa a «opinião» de Jesus. Então a pergunta a fazer por quem se diz cristão é simples: quem tem razão: Ele ou nós?

A «Lei De Base» dos Cristãos.

*   Deus é imprevisível - Com o texto evangélico deste domingo, tem início a leitura do "plano prático" que Lucas apresenta para propor a nova lei, a vida moral do cristão. Há momentos na vida em que infalivelmente nos vemos confrontados com uma pergunta concreta que diz respeito ao que devemos fazer: o que é essencial no Evangelho de Jesus? E a resposta parece-me mais simples do que se pode julgar. E, no fundo, toda a moral natural se pode resumir a esta norma: age segundo aquilo que és. Ou seja, a ação moral parece estar como que confinada aos horizontes da natureza.

 Mas, na Bíblia (AT e NT), as coisas são diferentes.  A fórmula clássica da lei moral no Antigo Testamento começa por propor um modelo que é externo ao próprio homem. Com efeito, essa fórmula começa assim: «Eu sou o Senhor, teu Deus, que te fez sair da terra do Egito, da condição de escravidão. Não terás outros deuses além de Mim» (cf. Ex 20,2-3). Ponto de referência absoluto é, pois, Deus. Só depois são fixados os preceitos ou regras morais a pôr em prática: não matar, não roubar, não cometer adultério... E isso traduz-se numa realidade de fundo que admite as próprias limitações perante o Absoluto. Daí se falar dos pobres, dos   que têm fome, dos que choram, dos que sofrem; enfim, daqueles que, levados pelas circunstâncias, não têm outra alternativa senão confiar n'Aquele que é o autor de todas as coisas.

O texto supõe a situação concreta das pessoas e também o acumular de factos históricos. Só que, na ótica bíblica, são vistos à luz da fé. Os factos referem-se à libertação do povo da escravidão e ao seu constituir-se como nação livre. Mas, para isso, ao contrário de todas as vezes que as pessoas pensam que podem determinar o bem e o mal por si mesmos, é necessário admitir que o único que pode determinar a distinção entre o bem e o mal é Deus. Nessa linha, os mandamentos são senão o corolário dessas premissas.

*  O número ou o conteúdo das Bem-aventuranças - O comportamento, o agir concreto, das pessoas - tanto no AT como no NT - não pode ser senão a consequência da relação que elas têm com a divindade. E, por isso, a «abordagem» tem que seguir essa premissa: o ensino e o comportamento moral estão relacionados com o anúncio dos princípios contidos nos chamados Dez Mandamentos e no Evangelho. É desse evento histórico, digamos assim, é desse relacionamento pessoal com Deus (no AT) e por Jesus Cristo (NT) que deriva o empenho moral. Quanto a isso, não há dúvida que o comportamento daquele que se rege pela fé é diferente do daquele que não parte desse princípio.

No caso dos evangelistas, há uma tentativa a pôr por escrito aquilo que lhes parece como que a «constituição do cristão». É nesse contexto que se insere uma espécie de lista de princípios que fundamentam o comportamento das pessoas. São as chamadas Bem-aventuranças, que, em S. Mateus, são oito, e que, em S. Lucas, são apenas quatro. Mas não é tanto o número que conta, mas sim os valores que elas veiculam. Por isso, no que nos toca, não basta nós sabermos bem o catecismo e ficarmos todos contentes quando respondemos que são oito quando os perguntam quantas são as Bem-aventuranças. Repito: não é isso o que mais importa; senão, se calhar, algo estaria mal com a versão de Lucas.

 «O quadro dos valores, na sua globalidade, é revolucionado. Cria uma situação nova que não é possível desconhecer. Exige uma resposta: o sim ou o não; a fé ou a incredulidade. A aceitação comporta uma vida nova. O evento-Jesus é a grande ocasião oferecida aos homens para instaurar uma nova espécie de relacionamento com Deus, em que não é possível desconhecer os grandes empenhos morais, ao mesmo tempo que as possibilidades da vida são alargadas de maneira ilimitada» (cf. Messale dell'Assamblea Cristiana).

*  As bem-aventuranças como reviravolta de valores - «As Bem-aventuranças (Evangelho) exprimem a reviravolta radical dos valores que o evento- Jesus realizou. São o "sinal" do evento. Com elas, Lucas proclama a realização das promessas messiânicas (bem-aventurados os pobres: cf. Is 61,1ss; Lc 4,18,19.21; 7.22; 10,21ss; bem-aventurados os que agora tendes fome: cf. Is 25,6; Lc 22,16,30; bem-aventurados os que agora chorais: cf. Is 35,10; Lc 2,25)».

«Nestes pobres e nos perseguidos Lucas vê a Igreja em que vive. Quem diz sim ao evento-Jesus experimenta a alegria de se sentir amado por Deus e inserido na história da salvação, participando na sorte dos profetas e de Jesus. Os quatro "ais" apresentam a sorte oposta de quem diz não, de quem não acredita no Evangelho e, portanto, não se insere na história salvífica».

«As Bem-aventuranças não são separáveis da pessoa que as pronunciou. Jesus é o "homem das Bem-aventuranças". Porque Ele ressuscitou (2ª leitura), é verdade que são bem-aventurados os pobres e a nossa fé não é vã» (cf. Messale dell'Assamblea Cristiana).

* Bem-aventuranças: lei ou evangelho? - «As Bem-aventuranças não são lei, mas evangelho. A lei "atrela" o homem às próprias forças e incita-o a adequar-se a ela até ao extremo. O evangelho, ao contrário, põe o homem frente a Deus e incita-o desse dom inexprimível o fundamento da vida. Numa sociedade de proveito, em que o dinheiro é o ídolo perante o qual a pessoa humana é sacrificada a todo e qualquer outro valor, num mundo superindustrializado e superseguro, em que não há espaço para a autêntica liberdade. Só o "o homem das bem-aventuranças", o homem livre em relação às coisas, pode fazer com que seja redescoberto o verdadeiro rosto do homem».

«Jesus louva os pobres que vivem contemporaneamente em dois mundos, por assim dizer: o mundo presente e o mundo escatológico. Ao mesmo tempo, ameaça os ricos que se contentam com viver só num mundo; o mundo que inclui quase exclusiva e inevitavelmente aqueles que levam uma vida desafogada... O pobre, ao contrário, "possuindo" talvez só a solidão, vive-a, todavia com a coragem que leva à profundidade do seu ser, lá onde um novo mundo é intuído e percebido...» (cf. Messale dell'Assamblea Cristiana).

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