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domingo, 4 de agosto de 2024

6 de agosto: Transfiguração do Senhor


1ª Leitura (Dan 7,9-10.13-14): Estava eu a olhar, quando foram colocados tronos e um Ancião sentou-se. As suas vestes eram brancas como a neve e os cabelos como a lã pura. O seu trono eram chamas de fogo, com rodas de lume vivo. Um rio de fogo corria, irrompendo diante dele. Milhares de milhares o serviam e miríades de miríades o assistiam. O tribunal abriu a sessão e os livros foram abertos. Contemplava eu as visões da noite, quando, sobre as nuvens do céu, veio alguém semelhante a um filho do homem. Dirigiu-Se para o Ancião venerável e conduziram-no à sua presença. Foi-lhe entregue o poder, a honra e a realeza, e todos os povos e nações O serviram. O seu poder é eterno, que nunca passará, e o seu reino jamais será destruído.
 
Salmo Responsorial: 96
R. O Senhor é rei, o Altíssimo sobre toda a terra.
 
O Senhor é rei: exulte a terra, rejubile a multidão das ilhas. Ao seu redor, nuvens e trevas; a justiça e o direito são a base do seu trono.
 
Derretem-se os montes como cera diante do senhor de toda a terra. Os céus proclamam a sua justiça e todos os povos contemplam a sua glória.
 
Vós, Senhor, sois o Altíssimo sobre toda a terra, estais acima de todos os deuses. Alegrai-vos, ó justos, no Senhor e louvai o seu nome santo.
 
2ª Leitura (2Pe 1,16-19): Caríssimos: Não foi seguindo fábulas ilusórias que vos fizemos conhecer o poder e a vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo, mas por termos sido testemunhas oculares da sua majestade. Porque Ele recebeu de Deus Pai honra e glória, quando da sublime glória de Deus veio esta voz: «Este é o meu Filho muito amado, em quem pus toda a minha complacência». Nós ouvimos esta voz vinda do céu, quando estávamos com Ele no monte santo. Assim temos bem confirmada a palavra dos Profetas, à qual fazeis bem em prestar atenção, como a uma lâmpada que brilha em lugar escuro, até que desponte o dia e nasça em vossos corações a estrela da manhã.
 
Aleluia. Este é o meu Filho muito amado, no qual pus toda a minha complacência. Escutai-O. Aleluia.
 
Evangelho (Mc 9,2-10): Naquele tempo, seis dias depois, Jesus levou consigo Pedro, Tiago e João e os fez subir a um lugar retirado, no alto de uma montanha, a sós. Lá, ele foi transfigurado diante deles. Sua roupa ficou muito brilhante, tão branca como nenhuma lavadeira na terra conseguiria torná-la assim. Apareceram-lhes Elias e Moisés, conversando com Jesus. Pedro então tomou a palavra e disse a Jesus: «Rabi, é bom ficarmos aqui. Vamos fazer três tendas: uma para ti, outra para Moisés e outra para Elias». Na realidade, não sabia o que devia falar, pois eles estavam tomados de medo. Desceu, então, uma nuvem, cobrindo-os com sua sombra. E da nuvem saiu uma voz: «Este é o meu Filho amado. Escutai-o!». E, de repente, olhando em volta, não viram mais ninguém: só Jesus estava com eles. Ao descerem da montanha, Jesus ordenou-lhes que não contassem a ninguém o que tinham visto, até que o Filho do Homem ressuscitasse dos mortos. Eles ficaram pensando nesta palavra e discutiam entre si o que significaria esse «ressuscitar dos mortos».
 
«Rabi, é bom ficarmos aqui»
 
Rev. D. Ignasi NAVARRI i Benet (La Seu d'Urgell, Lleida, Espanha)
 
Hoje, celebramos a solenidade da Transfiguração do Senhor. O monte Tabor, como o Sinai, é o lugar da proximidade com Deus. É o espaço elevado, em relação à existência diária, onde se respira o ar puro da Criação. É o lugar da oração, onde se está na presença do Senhor, como Moisés e Elias que aparecem com Jesus transfigurado falando com Ele sobre o Êxodo que O esperava em Jerusalém (ou seja, a sua Páscoa).
 
«As suas vestes tornaram-se resplandecentes, de tal brancura que nenhuma lavadeira na terra as poderia branquear assim» (Mc 9,3). Este facto simboliza a purificação da Igreja. E Pedro disse a Jesus: «Vamos fazer três tendas, uma para ti, outra para Moisés e outra para Elias» (Mc 9,5). Santo Agostinho comenta belamente que Pedro procurava três tendas porque ainda não conhecia a unidade entre a Lei, a Profecia e o Evangelho.
 
«Nisto veio uma nuvem que os cobriu, e dela saiu uma voz que dizia: Este é o meu Filho amado; escutai-o» (Mc 9,7). A Transfiguração não é uma mudança em Jesus, mas sim a Revelação da sua Divindade. Pedro, Tiago e João, contemplando a Divindade do Senhor, preparam-se para enfrentar o escândalo da Cruz. A Transfiguração é uma antecipação da Ressurreição!
 
«Rabi, é bom ficarmos aqui» (Mc 9,5). A Transfiguração recorda-nos que as alegrias, semeadas por Deus na vida, não são pontos de chegada, e sim luzes que Ele nos dá na peregrinação terrena para que “só Jesus” seja a nossa Lei, e a sua Palavra seja o critério, o gozo e a bem-aventurança da nossa existência.
 
Que a Virgem Maria nos ajude a viver intensamente os nossos momentos de encontro com o Senhor para que O possamos seguir cada dia com alegria, e nos ajude a escutar e seguir sempre o Senhor Jesus, até à paixão e à Cruz, para podermos participar também da sua Glória.
 
Pensamentos para o Evangelho de hoje
«Só Jesus é a luz verdadeira e eterna» (Santo Ambrósio de Milão)
 
«No rosto transfigurado de Jesus brilha um raio da luz divina que Ele conservava no seu íntimo. Esta mesma luz resplandecerá no rosto de Cristo no dia da Ressurreição. Neste sentido, a Transfiguração manifesta-se como uma antecipação do mistério pascal» (Bento XVI)
 
«E o Pai, na montanha da Transfiguração, ordena: «Escutai-o» (Mc 9, 7). De facto, Ele é o modelo das bem-aventuranças e a norma da Lei nova: «Amai-vos uns aos outros como Eu vos amei» (Jo 15, 12). Este amor implica a oferta efetiva de nós mesmos, no seu seguimento» (Catecismo da Igreja Católica, n. 459)
 
E foi transfigurado diante deles.
 
Revista Arautos do Evangelho, Agosto/2002, n. 8, p. 10
 
*
Ao se transfigurar diante dos três Apóstolos, Jesus fortaleceu nossa esperança sobre a vida eterna, animando-nos a suportar bem os sofrimentos e provações nesta terra. Sabendo nós a glória que nos aguarda, temos mais paciência em meio às atribulações. Será com esse mesmo fulgor nossa ressurreição no dia do Juízo.
 
* A transfiguração do Senhor não foi somente para fortalecer na fé os apóstolos, mas todos os fiéis  – incluindo  cada um de nós -, até o fim do mundo. A transfiguração do Senhor nos leva a refletir sobre um dos principais mistérios de nossa Fé: a encarnação do Verbo. Com efeito, quem poderia excogitar a possibilidade de uma das Pessoas da Santíssima Trindade unir sua natureza divina à humana, e – sem deixar de ser verdadeiro Deus – se tornar também verdadeiro Homem? Nunca, pelo simples raciocínio, nenhum homem – e nem mesmo algum Anjo – conceberia tal conúbio entre Criador e criatura. Para conhecermos esse belo e atraente mistério, era necessário que o próprio Deus no-lo revelasse. Ademais, são inúmeros os episódios do Evangelho nos quais transparece a natureza humana de Jesus: o ter de fugir para o Egito, levado por Maria e José, a fim de poupar-se da espada de Herodes; o trabalhar como humilde carpinteiro, até os 30 anos de idade, evitando chamar a atenção do povo; o fazer penitência durante 40 dias no deserto, suportando as agruras de um terrível jejum; o verter sangue no Jardim das Oliveiras, em meio ao temor e à angústia ante a Paixão; o externar fraqueza física durante sua flagelação e enquanto carregava a cruz ao alto do Calvário. Por fim, a sua morte, como a de qualquer ser humano, e no pior dos suplícios. Sem uma especial assistência da graça, seria inevitável para qualquer um, ao ouvir a narração desses fatos, concluir que Jesus não passava de uma mera criatura humana.
 
* Verdadeiro Deus. Por isso, o Unigênito Filho de Deus, para sustentar nossa fé, tornou patente sua origem eterna e incriada em muitos outros fatos e circunstâncias: a anunciação à Santíssima Virgem por meio de um Arcanjo; o aviso a São José, em sonhos, da concepção virginal de Maria; a aparição de uma multidão de anjos aos pastores, perto da gruta de Belém, para lhes anunciar o nascimento de Jesus; a moção sobrenatural no interior dos Santos Reis Magos, sobre a providencialidade daquele Menino. Sobretudo foi categórica sua glorificação, efetuada pelo Pai e pelo Espírito Santo, no momento do batismo no Jordão.
O próprio Salvador, ao afirmar “quem crê em Mim tem a vida eterna” (Jo 6, 47), não fazia referência à sua natureza humana, mas sim à sua divindade. A multiplicação dos milagres, cujo auge foi a ressurreição de Lázaro, tornou a todos evidente o pleno poder de Jesus sobre a natureza.  Apesar dessas – e de tantas outras – manifestações serem mais que suficientes para levar os homens ao ato de fé na divindade de Nosso Senhor, apareceram heresiarcas a negá-la, já no começo do cristianismo. Aliás, uma das razões pelas quais São João, o discípulo amado, escreveu seu Evangelho, entre os anos 80 e 100 de nossa era, foi para reafirmar ser Jesus verdadeiro Deus. E o conjunto dos Evangelhos, procurando sublinhar a mesma verdade, por mais de cinquenta vezes dá-Lhe o título de Filho de Deus.
É necessário ter essas considerações em vista, para melhor analisarmos e compreendermos a Transfiguração do Senhor.
 
* Conveniência da Transfiguração do Senhor. Jesus poderia ter descido à Terra acompanhado de legiões de anjos, e manifestado em todo o esplendor sua infinita grandeza divina. Contudo não agiu assim. Revelou-nos sua natureza incriada de forma progressiva, e aos poucos foi se tornando mais categórico.
Um ensino puramente doutrinário não é capaz de, por si só, mover o homem a transformar sua vida. Um antigo adágio ilustra esta verdade de modo lapidar: “As palavras comovem, os exemplos arrastam”. Sobretudo quando o exemplo é íntegro e esplendoroso na verdade e no bem, tem ele uma força tal que age sobre as tendências da alma, convidando a um certo caminho – e às vezes impondo-o.
Ao tratar da Transfiguração de Jesus, assim se exprime São Tomás de Aquino sobre essa necessidade muito própria à criatura humana: “Para trilharmos bem um caminho, é necessário termos um conhecimento prévio do fim. Assim, o arqueiro não lança com acerto a seta, senão mirando primeiro o alvo que deve alcançar. (…) E isso sobretudo é necessário, quando o caminho é difícil e áspero, a jornada laboriosa, mas belo o fim” (3, q.45, a.1, c).
Fulgor transfiguração do Senhor para suportar as agruras do Calvário
No mesmo tópico acima citado, São Tomás de Aquino continua a esclarecer, com sua genialidade habitual e sapiencial clareza:
“O Senhor, depois de haver anunciado a sua Paixão aos discípulos, con­vidou-os a lhe imitarem o exemplo. (…) Ora, o fim de Cristo, na sua Paixão, era alcançar não somente a glória da alma, que tinha desde o princípio da sua concepção, mas também a do corpo (…). E a essa glória também conduz os que imitam seu exemplo da Paixão, segundo diz a Escritura: Por muitas tribulações nos é necessário entrar no reino de Deus. Por isso era conveniente que manifestasse aos seus discípulos a sua claridade luminosa; e tal é a Transfiguração, que também concederá aos seus, segundo diz o Apóstolo (São Paulo): Reformará o nosso corpo abatido para o fazer conforme o seu corpo glorioso. Donde dizer (São) Beda: foi consequência de uma pia providência que, tendo gozado por breve tempo da contemplação da felicidade eterna, tolerassem mais fortemente as adversidades” (3, q. 45, a. 1, c).
A Transfiguração do Senhor foi uma excepcional graça mística concedida aos três apóstolos escolhidos, no alto do Tabor. Sua recordação ficou como uma fonte de sólida confiança, que lhes permitiu suportar os maiores sofrimentos, pois, assistindo a ela, tiveram um vislumbre da luz plena e refulgente da eternidade.
 
* Graças místicas.
A Transfiguração de Jesus fortificou as virtudes da fé e da caridade nos Apóstolos. Enquanto a fé nos faz crer na divindade de Cristo e em suas promessas, a caridade nos conduz a uma entranhada união com Deus. São duas virtudes extremamente interdependentes. Sem a fé na esplendorosa vida eterna que nos espera, a caridade tende a desaparecer.
Mas, se a fé e a caridade dos apóstolos tanto lucraram com a Transfiguração do Senhor, não haverá algo, nessa mesma linha, que poderá auxiliar a vida espiritual de cada um de nós?
A resposta é inteiramente positiva. Deus derrama graças místicas sobre todos os que trilham as vias da salvação, em intensidade maior ou menor, segundo o caso. Mas ninguém está excluído de recebê-las. É claro que tais graças místicas não isentam ninguém de realizar os esforços próprios à prática das virtudes.
 
* Um transfiguração do Senhor em nossos corações. É fora de dúvida, pois, que Deus concede “Tabores”, ou seja, graças místicas, a cada um de nós.
Quem não terá sentido, alguma vez, uma alegria interior, um palpitar do coração, uma emoção calma mas profunda, ao assistir a uma bela cerimônia? Ao apreciar o canto gregoriano, por exemplo? Ou ao contemplar alguma imagem? Quiçá ao ver um lindo vitral banhado de luz, dentro de uma igreja silenciosa, que deixa lá fora os ruídos do mundo? São mil ocasiões em que a graça sensível nos visita, e nos concede contemplações interiores, pré-degustações da felicidade perfeita que nos espera no Céu.
Dois Doutores da Igreja, Santa Teresa de Jesus e São João da Cruz, mestres da vida espiritual, dizem que a Providência costuma conceder aos principiantes graças místicas que depois irão experimentar novamente só no fim de suas vidas. Tal proceder divino visa for­talecer essas almas para atravessarem os períodos de aridez. É um modo comum de Deus agir: dá-nos consolações – o Tabor – para, quando vier a hora do Getsêmani, termos forças, sabendo que o fim será mais cheio de alegria e esperança.
São graças que nos animam a enfrentar os sacrifícios desta vida. Trata-se de experiências místicas que nos tornam patente quanto Jesus nos ama e quer nossa eterna glória.
Assim, ao longo de nossa existência terrena, já iremos experimentando um pouco das delícias eternas, e as tendas tão desejadas por São Pedro sobre o monte da transfiguração, Jesus as irá levantando no “Tabor” de nossos corações. Para tal, Ele exige de nós apenas uma condição: que não Lhe coloquemos obstáculos. 

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