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quinta-feira, 28 de julho de 2022

XVIII Domingo do Tempo Comum

Sto. Inácio de Loyola, presbítero

1ª Leitura (Co 1,2; 2,21-23): Vaidade das vaidades – diz Coelet – vaidade das vaidades: tudo é vaidade. Quem trabalhou com sabedoria, ciência e êxito, tem de deixar tudo a outro que nada fez. Também isto é vaidade e grande desgraça. Mas então, que aproveita ao homem todo o seu trabalho e a ânsia com que se afadigou debaixo do sol? Na verdade, todos os seus dias são cheios de dores e os seus trabalhos cheios de cuidados e preocupações; e nem de noite o seu coração descansa. Também isto é vaidade.

Salmo Responsorial: 89
R. Senhor, tendes sido o nosso refúgio através das gerações.

Vós reduzis o homem ao pó da terra e dizeis: «Voltai, filhos de Adão». Mil anos a vossos olhos são como o dia de ontem que passou e como uma vigília da noite.

Vós os arrebatais como um sonho, como a erva que de manhã reverdece; de manhã floresce e viceja, de tarde ela murcha e seca.

Ensinai-nos a contar os nossos dias, para chegarmos à sabedoria do coração. Voltai, Senhor! Até quando... Tende piedade dos vossos servos.

Saciai-nos desde a manhã com a vossa bondade, para nos alegrarmos e exultarmos todos os dias. Desça sobre nós a graça do Senhor nosso Deus. Confirmai, Senhor, a obra das nossas mãos.

2ª Leitura (Col 3,1-5.9-11): Irmãos: Se ressuscitastes com Cristo, aspirai às coisas do alto, onde Cristo está sentado à direita de Deus. Afeiçoai-vos às coisas do alto e não às da terra. Porque vós morrestes e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus. Quando Cristo, que é a vossa vida, Se manifestar, também vós vos manifestareis com Ele na glória. Portanto, fazei morrer o que em vós é terreno: imoralidade, impureza, paixões, maus desejos e avareza, que é uma idolatria. Não mintais uns aos outros, vós que vos despojastes do homem velho com as suas ações e vos revestistes do homem novo, que, para alcançar a verdadeira ciência, se vai renovando à imagem do seu Criador. Aí não há grego ou judeu, circunciso ou incircunciso, bárbaro ou cita, escravo ou livre; o que há é Cristo, que é tudo e está em todos.

Aleluia. Bem-aventurados os pobres em espírito, porque deles é o reino dos Céus. Aleluia.

Evangelho (Lc 12,13-21): Alguém do meio da multidão disse a Jesus: «Mestre, dize ao meu irmão que reparta a herança comigo». Ele respondeu: “Homem, quem me encarregou de ser juiz ou árbitro entre vós?». E disse-lhes: «Atenção! Guardai-vos de todo tipo de ganância, pois mesmo que se tenham muitas coisas, a vida não consiste na abundância de bens». E contou-lhes uma parábola: «A terra de um homem rico deu uma grande colheita. Ele pensava consigo mesmo: ‘Que vou fazer? Não tenho onde guardar minha colheita’. Então resolveu: ‘Já sei o que fazer! Vou derrubar meus celeiros e construir maiores; neles vou guardar todo o meu trigo, junto com os meus bens. Então poderei dizer a mim mesmo: Meu caro, tens uma boa reserva para muitos anos. Descansa, come, bebe, goza a vida!’ Mas Deus lhe diz: «Tolo! Ainda nesta noite, tua vida te será retirada. E para quem ficará o que acumulaste? Assim acontece com quem ajunta tesouros para si mesmo, mas não se torna rico diante de Deus».

«A vida não consiste na abundância de bens»

Rev. D. Jordi PASCUAL i Bancells (Salt, Girona, Espanha)

Hoje, Jesus situa-nos face a face com aquilo que é fundamental para a nossa vida cristã, nossa vida de relação com Deus: fazer-se rico diante Dele. Ou seja, encher nossas mãos e nosso coração com os bens sobrenaturais, espirituais, de graça e não de coisas materiais.

Por isso, à luz do Evangelho de hoje, podemos nos perguntar: De que enchemos nosso coração? O homem da parábola sabia bem: «Descansa, come, bebe, goza a vida» (Lc 12,19. Mas isso não é o que Deus espera de um bom filho seu. O Senhor não colocou nossa felicidade nas heranças, boas comidas, carros último modelo, férias em lugares exóticos, casas de campo, o sofá, a cerveja ou o dinheiro. Todas essas coisas podem ser boas, mas em si mesmas não podem saciar o desejo de plenitude da nossa alma e, portanto, devemos usá-las bem, como meios que são.

É a experiência de São Inácio de Loyola, cuja celebração temos próxima. Assim, o reconhecia em sua autobiografia: «Quando se voltava para as coisas mundanas, sentia grandíssimo prazer; mas, ao deixá-las por cansaço, via-se descontente e árido. Ao contrário, quando pensava na vida rigorosa que notava nos santos, não só no momento em que as resolvia no pensamento, se enchia de gozo, mas quando o abandonava, encontrava-se alegre». Também pode ser a experiência de cada um de nós.

E acontece que as coisas materiais, terreais, caducam e passam; por contraste, as coisas espirituais são eternas, imortais, duram para sempre e, são as únicas que podem encher nosso coração e dar sentido pleno à nossa vida humana e cristã.

Jesus o diz bem claro: «Tolo!» (Lc 12,20), assim qualifica quem tem apenas objetivos materiais, terreais, egoístas. Que em qualquer momento da nossa existência podamo-nos apresentar diante Deus com as mãos e o coração cheios de esforço por ter buscado ao Senhor e, aquilo que a Ele gosta, que é o único que nos levará ao céu.

Pensamentos para o Evangelho de hoje
«O homem tem um dever honroso e uma obrigação: orar e amar. Quem ora e ama, tem encontrado a felicidade neste mundo» (S. João Mª Vianney)

«Tu és importante! E Deus conta contigo pelo que és, não pelo que tens: perante ele, nada vale a roupa que vestes nem o celular que utilizas; não lhe importa se estás na moda, importas-lhe, tal qual és. Aos olhos de Deus, vales, e aquilo que vales não tem preço» (Francisco)

«O décimo mandamento condena a avidez e o desejo duma apropriação desmesurada dos bens terrenos; e proíbe a cupidez desregrada, nascida da paixão imoderada das riquezas e do seu poder (…)» (Catecismo da Igreja Católica, nº 2.536)

Atenção a toda a espécie de ganância

Escrito por P. Américo – o site Domus Iesu

* Mais que as riquezas terrenas, o que é preciso é ser rico aos olhos de Deus. Acho importante a última frase do trecho evangélico, que diz que Jesus, depois de ter contado uma história/parábola, tira uma conclusão. A conclusão que Jesus tira não se refere necessariamente à condenação daqueles que acumulam bens, mas sim daqueles que não acumulam aos olhos de Deus. Esta passagem de S. Lucas faz parte duma seção que recolhe vários ensinamentos de Jesus sobre os bens deste mundo, após um pedido que Lhe é feito de que seja o juiz entre dois irmãos. Ora bem, a insensatez do rico da parábola consiste essencialmente em duas coisas: por um lado, atribui uma confiança absoluta aos bens destes mundo que são efémeros; por outro, descura servir-se dos bens terrenos para adquirir os bens eternos. Por outras palavras, a solução por ele encontrada não é senão o falhanço total de toda a sua existência. E a conclusão para todos nós é esta: a suma insensatez é julgar que as coisas deste mundo possam garantir uma felicidade plena e duradoura.

* Vaidade! Tudo é vaidade! Uma das necessidades fundamentais do homem é a segurança e a certeza de que pode satisfazer as suas perspectivas de realização pessoal. Por outras palavras, o homem procura apaixonadamente uma base estável para apoiar a própria existência. E não será preciso ser um grande perito em história da humanidade para chegar à conclusão que essa base tem sido o dinheiro ou, se quisermos, a possessão de bens e riquezas. Ora bem, não obstante se trate de um texto antigo, já o autor do livro do Qohélet ou Eclesiastes (século II a.C.) faz essa descoberta. Ele descobre, por exemplo, que a ideia de que a riqueza seja um meio para atingir o objetivo duma vida tranquila e feliz é uma constante de todos os tempos. Só que a sua perspectiva é, se assim se pode dizer, desconcertante, na medida em que a confiança nos bens põe em questão a lista de valores que torna o homem feliz. E, de facto, para o autor, a prioridade de valores é diferente e, por isso, naturalmente não está de acordo com essa constatação, porque lhe parece que pôr a segurança pessoal nos bens e no dinheiro é uma ilusão perigosa e, além disso, contrária à vontade de Deus.

O trabalho e a fadiga do homem, embora com todos os seus frutos e todos os sinais de progresso, ao fim e ao cabo, demonstram-se inconsistentes como o fumo (parece que é este um dos significados do texto original da palavra que vemos traduzida por «vaidade», mas que hoje já vai sendo substituída por outra: «ilusão»). Pelos vistos, já no tempo desse autor, guardadas as devidas proporções, havia uma espécie de «sociedade de consumo» que privilegiava o ter sobre o ser. Então - e bem a propósito - o mesmo autor acerta completamente no alvo quando diz que «não há nada de novo debaixo do sol» (cf. Ecl 1,9b; expressão que será repetida ao longo do texto).

* Quando o dinheiro se torna deus.  Sempre houve - continua e continuará a haver - pessoas para quem o dinheiro (ou o seu equivalente) é tudo na vida. Talvez seja mesmo a maioria, quem sabe! Assim é convicção generalizada de que o dinheiro é poder, ou melhor dizendo, é o poder. É um dado de facto a convicção de que sem dinheiro não se pode fazer nada. O dinheiro parece dar às pessoas a sensação de segurança, a esperança e a certeza de poder fazer tudo. Mas, nesta matéria, dispara logo um mecanismo que deita tudo a perder; o mecanismo que dá pelo nome de política da acumulação. Ou seja, o dinheiro nunca é demais (antes pelo contrário, é sempre pouco) e não se descansa enquanto não se tem cada vez mais. Por outras palavras, faz-se do dinheiro um fim e não um meio. Dito de outra maneira, vive-se para o dinheiro e assim este torna-se um objeto de idolatria, um deus a quem se presta culto. É por estas e por outras que Jesus Cristo, nos Evangelhos, nos diz claramente que não se pode servir ao mesmo tempo a Deus e ao dinheiro.

Ora, quando o dinheiro se torna um deus, as pessoas estão dispostas a sacrificar-lhe tudo, até o que de mais sagrado há, como a vida humana e todos os valores que estão relacionados com a vida. Esta é uma constatação válida em todos os tempos. O culto do dinheiro coloca homens contra homens, porque todos querem ter acesso mais rápido e direto ao trono desse deus; mesmo que para isso seja preciso eliminar os outros (aliás, até dá a impressão de que a vida humana tem cada vez menos valor e, por isso, não se dúvida sacrificá-la por ninharias). Não é por nada que a divisão da herança ou as partilhas por morte dos pais foi sempre um momento difícil para os seus familiares; e também não é por nada que, tantas vezes, é a partir desse momento que têm início inimizades que nunca mais têm fim. Ou seja, nesses casos, a partilha dos bens - que deveria ser oportunidade de encontro - é o momento que assinala a divisão da família.

* O culto da superficialidade e do consumo. Posso parecer antiquado e «retrógrado», mas a verdade é que os textos litúrgicos de hoje me levam a pensar um pouco no assunto. A sociedade de hoje, talvez ainda de forma mais acentuada que as de ontem e dos tempos primitivos, é uma sociedade em que se é como que bombardeado constantemente pela propaganda do bem-estar, do bem-parecer, do ter mais do que o ser, é uma sociedade em que a felicidade é identificada com a opulência, a produção, a fama e com a vida que o dinheiro proporciona, enfim, com a economia e com a produção.

Não sou tão ingénuo que me sinta na obrigação de defender que as preocupações de ordem material e económica não são importantes. Claro que têm importância, mas, na ótica cristã e religiosa em geral, não podem estar no topo da lista. De resto, acho que é isso que, no fundo, nos dizem as leituras da liturgia de hoje. Agora, o que se pode afirmar é que a sociedade de consumo continua a ser apresentada como uma fábrica de sonhos para «ricos insensatos» (texto evangélico) que acham que, por terem acumulado uma série de bens, ficam com todos os seus problemas resolvidos. Se não serviço para mais nada, a parábola evangélica diz-nos que a riqueza como a solução de todos os problemas não é verdade; nem sequer a nível simplesmente humano. Por mais bens que acumulemos, nunca achamos que são suficientes e por mais que tenhamos para cobrir as despesas do consumismo, haverá sempre alguém que, por motivos de ganância, inventará outras necessidades mais ou menos fictícias, sem as quais julgamos que não atingimos os mínimos patamares de felicidade. Satisfazer necessidades fictícias é, no fundo, a finalidade da publicidade; e talvez seja por isso que alguém - desconheço o nome do autor - terá dito que a publicidade é a mentira institucionalizada...

Ora, é precisamente esta lógica que a liturgia de hoje pretende combater. E a verdade é que, mesmo só no plano do raciocínio humano, o dinheiro é a maior fonte de todas as divisões sociais, de todas as discriminações: quem tem mais, julga-se mais em cima, mais importante, Enfim, nessa lógica, os homens já não são iguais, pois a sua importância é medida não tanto pelo que são quanto pelo que possuem. Contestar estes princípios poderá parecer, nos dias de hoje, uma utopia, mas é isso mesmo que somos convidados a fazer pela liturgia de hoje. Ao menos, demos a mão à palmatória, admitindo que, quando estamos obcecados pelo dinheiro, não estamos certamente a construir a humanidade.

* Cristo não escolhe a via do poder. «O problema da divisão da riqueza é um dos mais graves a todos os níveis. Como intervém Jesus nesta situação? Por que é que Ele recusa o papel de juiz entre dois irmãos? Porque a sua missão não é fazer justiça mediante a via do poder. O poder só se justifica moralmente quando se põe ao serviço da justiça. Jesus não a condena enquanto poder; só que o poder não é a via que Ele escolheu para fazer justiça» (Missal da Assembleia Cristã).

Jesus não quer ser como um intérprete qualquer da Lei, como os escribas, que, pelos vistos e ainda por cima, cobravam por esse parecer. Não é isso que Lhe interessa. É esse o motivo por que Ele, neste caso - e não só - procura ir sempre mais além. Então reconduz, passe a palavra, a questão ao interior da pessoa, recorrendo para isso, mais do que à «esperteza» dos legisladores, à «sabedoria» dos homens que compreendem o sentido da vida. No caso presente, Jesus nem sequer deve recorrer à autoridade que Lhe vem de ser o enviado de Deus. Limita-se a recorrer à sabedoria humana, contida de resto no Antigo Testamento, e que Ele traduz na Parábola do «rico insensato»: «E o que preparaste de quem será?».

Nessa perspectiva, de facto, as coisas e a sua pura acumulação representam uma falsa segurança. A possessão, afinal de contas, como diz o autor do Qohélet, não é senão uma ilusão. Mais do que possuir uma série de coisas, no caso da parábola evangélica, o rico não é propriamente aquele que possui muitas coisas, mas sim aquele que é possuído por muitas coisas. É que, na realidade, a incerteza da morte vem embaralhar-lhe as coisas por completo. É a conclusão prática - e não diretamente moralista - a que chega também o autor da primeira leitura quando diz que é uma ilusão depositar a confiança em coisas que acabam por ir parar às mãos de quem nada fez para as obter.

* A vida não é nenhuma brincadeira. O questionamento que encontramos na Parábola do Rico Insensato - «o que acumulaste de quem será?» - não tem por finalidade atemorizar os ouvintes com a perspectiva da morte. Mas, o objetivo é fazer refletir sobre qual é o autêntico valor das coisas. Também no caso de Jesus, Ele não quer fazer passar uma visão de tipo moralístico. Longe dele inculcar o temor duma morte imprevista que deitaria por água abaixo» as esperanças - de resto, legítimas - duma vida melhor...

Não é isso que está em causa. Nem se pode inferir da história evangélica que as pessoas não devem fazer o possível para não dependerem totalmente dos outros. Na mente de Jesus, a morte nunca é apenas um episódio que acontece e que não tem repercussões para além do episódio em si mesmo. Não, quando Jesus fala do assunto, tem sempre em mente uma visão escatológica, relativa às coisas definitivas, que têm a ver com Deus. Por outras palavras, para Jesus, a vida não se pode reduzir apenas à possessão e eventualmente ao usufruto de bens. Isso, embora sem o classificar e sem o declarar mau moralmente, seria muito pouco e é essa a mensagem que Ele nos quer transmitir.

* Pobreza e riqueza o que são? Utilizando outros termos, a falta de bens ou a abundância deles não podem qualificar a existência humana, embora habitualmente se associe a «qualidade de vida» à quantidade de bens. E isso até não me custa nada a admitir. O problema - é isso que eu tenho vindo a tentar dizer - é que, na perspectiva cristã, nada disso se pode propor como fundamento da existência humana. Ou seja, nessa perspectiva, só Deus, o Absoluto, pode ser fundamento dessa existência. É nele que adquire significado o uso das coisas, que em si são boas (doutra forma, não lhes chamaríamos «bens»). Quando os bens forem vistos com os olhos de Deus, então já não serão instrumento de divisão, mas de comunhão.

Terminemos as reflexões de hoje com uma citação do documento do II Concílio do Vaticano sobre as realidades terrenas: «Deus destinou a terra com tudo o que ela contém para uso de todos os homens e povos; de modo que os bens criados devem chegar equitativamente às mãos de todos, segundo a justiça, secundada pela caridade. Sejam quais forem as formas de propriedade, conforme as legítimas instituições dos povos e segundo as diferentes e mutáveis circunstâncias, deve-se sempre atender a este destino universal dos bens. Por esta razão, quem usa desses bens, não deve considerar as coisas exteriores que legitimamente possui só como próprias, mas também como comuns, no sentido de que possam beneficiar não só a si, mas também aos outros» (GS = Gaudium et Spes, 69).

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