José Antonio Dominguez
No Sábado
Santo, enquanto o corpo de Nosso Senhor repousava no sepulcro, operavam-se na
alma de Maria maravilhas de confiança e de fé. No Coração de Maria, a Igreja
vivia em todo o seu esplendor.
Para nós,
católicos do terceiro milênio, é tão natural crer na Ressurreição de Jesus que
a dúvida nem nos passa pela mente.
Mas no
primeiro dia de existência da Igreja Católica não foi assim... Os próprios
Apóstolos e discípulos foram os primeiros a duvidar. Para ser mais exato, não
acreditaram na Ressurreição nem mesmo quando as Santas Mulheres chegaram do
sepulcro com a notícia de que Jesus tinha ressuscitado: "Também as outras
mulheres que estavam com elas diziam isto aos Apóstolos, mas as suas palavras
pareceram-lhes um desvario e eles não acreditaram nelas" (Lc 24, 10-11).
Então, nos
primeiros dias de existência da Igreja, os mais próximos seguidores de Cristo
não acreditavam numa das principais verdades de nossa Fé? Nenhum Apóstolo
acreditava? Nem mesmo São Pedro?
Sucinto relato dos
Evangelhos
Muitas vezes,
ao ler os Evangelhos, gostaríamos de ter narrações mais ricas em detalhes sobre
tantos pontos que ficaram envoltos nas sombras da História. Um deles, por
exemplo, é o ocorrido no período entre o sepultamento de Jesus e a
Ressurreição. Os discípulos tentaram algum tipo de ação, traçaram planos ou
pelo menos se reuniram em algum local para comentar entre si os trágicos
acontecimentos? Sobretudo, interessaria saber o que lhes terá dito Nossa
Senhora. Nada! São Lucas limita-se a dizer: "Ao regressar, prepararam aromas
e perfumes. E, no sábado, observaram o descanso, conforme o preceito" (Lc
23, 56). O evangelista não poderia ser mais lacônico...
As urdiduras
dos fariseus e dos príncipes dos sacerdotes interessaram mais o Autor Sagrado.
Talvez por conter esse fato uma lição que continua atual, e o será até o fim do
mundo. Os inimigos de Jesus não descansam! Não se contentam em vê-Lo morto.
Querem apagar até sua memória. Foi assim logo após a morte de Jesus. E assim
será sempre, no confronto entre a luz e as trevas.
Tinham eles
presenciado numerosos milagres, o mais espetacular dos quais fora a
ressurreição de Lázaro, poucos dias antes; e estava bem presente na sua mente a
profecia de que ao terceiro dia ressuscitaria dos mortos. Por isso, no sábado
"os príncipes dos sacerdotes e os fariseus foram ter com Pilatos e
disseram-lhe: Senhor, lembramo-nos de que aquele impostor disse, ainda em vida:
‘Ressuscitarei depois de três dias.’ (...) E seria a última impostura pior do
que a primeira" (Mt 27, 62-64).
Embora não
tivessem fé na Ressurreição, tinham certo pressentimento ou receio de que algo
de extraordinário talvez acontecesse... Quem fizera tantos milagres em vida,
não teria também poder para os realizar após a morte? A dureza de coração dos
fariseus, face à Ressurreição de Jesus, nos mostra como devemos ser gratos a
Deus pelo dom da Fé. Pois quem não abre a alma para a luz da Fé, por mais que a
evidência lhe fure os olhos, e a lógica imponha suas razões... continuará a não
crer!
Os apóstolos duvidaram
Mas às vezes
— por um paradoxo admirável — os incrédulos discernem certas realidades mais
facilmente que os católicos. Estes, por estarem acostumados a lidar com o
sobrenatural, são tendentes a tomar como normais alguns acontecimentos
sublimes.
Talvez esse
fenômeno psicológico tenha levado os Apóstolos, após tão longo convívio com a
grandeza de Jesus, a tomarem por natural o que era divino... Talvez, assim, não
tenham dado o devido valor aos milagres que presenciaram, e acabaram por não
compreender a principal profecia de Nosso Senhor: sua Ressurreição.
E ao vê-Lo
morto caíram na incredulidade, como se deduz das palavras dos discípulos de
Emaús: "Nós esperávamos que fosse Ele Quem libertasse Israel, mas, com
tudo isto, já lá vai o terceiro dia desde que se deram estas coisas..."
(Lc 24, 21).
Em Maria
reluziu a plenitude da Fé
Ninguém,
então, conservou a fé plena na Ressurreição, depois da morte de Jesus, na
Sexta-Feira Santa?
Sobre este
ponto, os Evangelhos não entram em detalhes. Mas, não podemos fazer algumas
conjecturas?
Sepultado
Nosso Senhor, São João levou Maria, Mãe de Jesus, com ele: "E, desde
aquela hora, o discípulo recebeu-a em sua casa" (Jo 19, 27).
É de se supor
que naquela primeira noite e ao longo do dia de sábado alguns dos discípulos e
as Santas Mulheres tenham procurado Nossa Senhora, quiçá com o intuito de A
consolar. Muito provavelmente reuniram-se no Cenáculo, onde tinham celebrado a
Páscoa da Antiga Lei, e onde Jesus havia instituído o sacrifício do Novo
Testamento, a Eucaristia.
Enquanto
conversavam com Maria, os discípulos devem ter procurado no semblante majestoso
d’Ela o alento e a resposta para a grande perplexidade pela qual passavam.
Teria, então, acabado tudo? O que iria acontecer com eles? Talvez os príncipes
dos sacerdotes quisessem prendê-los também. E pode-se supor ter sido a
segurança pessoal a grande preocupação de muitos dos discípulos, pois o próprio
São João afirma que as portas da casa onde eles se encontravam, no domingo da
Ressurreição, estavam fechadas, "por medo dos judeus" (Jo 20, 19).
Mas o olhar
sereno e maternal de Maria os tranquilizava. E à medida que Ela lhes recordava
as profecias sobre o Messias, como Ele seria perseguido e morto, uma sensação
de paz ia invadindo suas almas. Os mistérios de Deus são insondáveis, mas não
havia motivo para perturbar-se, pois tudo acontecera como estava previsto.
Nesses momentos, Maria deve ter-lhes lembrado a promessa do Arcanjo na
Anunciação: "O Senhor Deus dar-Lhe-á o trono de Seu pai David, (...) e o
seu reinado não terá fim" (Lc 1, 32). E explicado que, em consequência,
eles deveriam esperar uma intervenção miraculosa de Deus. Muito provavelmente
Nossa Senhora deve também ter alcançado para eles a graça de uma grande
confiança na Providência. O simples fato de estarem ali reunidos, em torno de
Maria, era já um primeiro passo para restaurarem a fé perdida.
Soledade no Sábado Santo
Quantas
vezes, ao longo daquele dia de sábado, terá passado pela mente virginal de
Maria a lembrança dos momentos-auge da vida de Jesus?
"Maria
vive com os olhos fixos em Cristo — comenta o Papa João Paulo II — e guarda
cada palavra sua: ‘Conservava todas estas coisas, ponderando-as no seu coração’
(Lc 2, 19; cf. 2, 51). As recordações de Jesus, estampadas na sua alma, acompanharam-na
em cada circunstância, levando-A a percorrer novamente com o pensamento os
vários momentos da sua vida junto com o Filho. Foram estas recordações que
constituíram, de certo modo, o ‘rosário’ que Ela mesma recitou constantemente
nos dias da sua vida terrena."
E,
certamente, este primeiro "rosário" de Maria, meditado com os
discípulos naquele Sábado Santo, fortaleceu a fé de todos, preparando-os para o
grande acontecimento do dia seguinte.
Mas a ideia
da Ressurreição de Jesus, apesar de ter sido com clareza profetizada por Ele,
estava tão longe das cogitações dos Apóstolos, que parece mais provável Nossa
Senhora não lhes ter falado a este respeito, esperando que seu próprio Filho
lhes abrisse os olhos.
Muito
apropriadamente, a piedade católica representa Maria, neste dia de sábado, sob
a invocação de Nossa Senhora da Soledade. Ela está só, sem Jesus, chorando a
sua morte. E por isto de sua fisionomia transparece profunda tristeza.
Antegozando o momento da
Ressurreição
Mas, se é
verdade que a dor pela morte de Jesus transpassava seu coração virginal, não é
menos verdade que a certeza inabalável na Ressurreição de seu Filho o fazia
palpitar de consolação e de júbilo.
No meio da
incredulidade dos Apóstolos e demais discípulos, Maria era a única a ter uma Fé
plena. Só ela creu na Ressurreição. E por isso a Igreja vivia em todo o seu
esplendor na alma de Maria. Ela era a Arca da Esperança do Novo Testamento, na
qual estavam contidos todos os tesouros de graça da Igreja. E embora Nosso
Senhor estivesse morto, vivia plenamente no coração de sua Mãe.
À medida que
o tempo passava, Nossa Senhora já ia antegozando o momento jubiloso da
Ressurreição. A tristeza cedia lugar a uma intensa alegria. Por isso — além de
representar Maria de semblante triste e lacrimoso, no Sábado Santo, sob a
invocação de Nossa Senhora da Soledade — não seria também legítimo representá-la
de fisionomia jubilosa, antevendo já o triunfo próximo de seu Filho? E quase se
poderia afirmar, metaforicamente, que, antes de ressuscitar no Sepulcro, Jesus
já havia ressuscitado no Coração Imaculado de Maria. Por isso também se poderia
dar-Lhe, nesse dia, a invocação de Nossa Senhora da Ressurreição.
Pode-se
comparar este período de sábado com o tempo em que Nossa Senhora gerava o
Salvador do mundo, e levantar a pergunta se é mais glorioso ter em si o Filho
de Deus, ou ser a única alma inteiramente fiel no mundo, contendo em si, de
certa forma, a Igreja. Se a primeira situação é mais gloriosa, sem dúvida a
segunda é mais meritória, pois ela creu sem ver: "Bem-aventurados os que,
sem terem visto, acreditam!" (Jo 21, 29), disse Jesus a Tomé.
Durante a noite,
acreditou na Luz
"É
durante a noite que é belo acreditar na luz". Esta expressiva afirmação do
poeta francês Edmond Rostand aplica-se com exatidão à Fé da Virgem Santíssima
no Sábado Santo. Por este motivo, desde tempos muito remotos, a piedade
católica tornou o sábado um dia especialmente consagrado a Nossa Senhora, para
enaltecer sua Fé inabalável e recordar um dos mais belos e gloriosos momentos
de sua vida, em que só ela sustentou toda a Igreja.
Devemos pedir
a Maria, em nossas dificuldades e perplexidades, essa Fé demonstrada por ela
naquele momento tão trágico, e por isso tão belo. Segundo paternais
advertências do próprio Papa João Paulo II, vão baixando sobre o mundo as
trevas da descristianização. É nessa noite do neo-paganismo de nossos dias que
é glorioso, para cada um de nós, acreditar na Ressurreição, ou seja, no
"triunfo do Imaculado Coração de Maria".
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