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quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

A maternidade divina de Maria (II)

São Cirilo de Alexandria, Bispo e Doutor da Igreja, século V. Epistola 1, PG 77, 14-18. 27-30.

“Muito me admiro de que haja quem duvide se efetivamente a Virgem Santíssima deve ser chamada Mãe de Deus. Na verdade, se Nosso Senhor Jesus Cristo é Deus, por que motivo é que a Virgem Santíssima, que o deu à luz, não há de ser chamada Mãe de Deus? Esta é a fé que os discípulos do Senhor nos transmitiram, embora não usassem esta mesma expressão. Assim nos ensinaram também os santos Padres. Em particular Santo Atanásio, nosso pai na fé, de ilustre memória, no livro que escreveu sobre a santa e consubstancial Trindade, na terceira dissertação a cada passo dá à Santíssima Virgem o título de Mãe de Deus.

Sinto-me obrigado a citar aqui as suas próprias palavras, que são do teor seguinte: «A Sagrada Escritura, como tantas vezes fizemos notar, tem como finalidade e característica afirmar de Cristo, nosso Salvador, estas duas coisas: que é Deus e nunca deixou de o ser, uma vez que é o Verbo do Pai, seu esplendor e sabedoria; e também que nestes últimos tempos, por causa de nós Se fez homem, assumindo um corpo da Virgem Maria, Mãe de Deus».

E continua assim pouco mais adiante: «Houve muitos que foram santos e livres de todo o pecado: Jeremias foi santificado desde o seio materno; e também João, antes de ser dado à luz, exultou de alegria, ao ouvir a voz de Maria, Mãe de Deus». Estas palavras são de um homem inteiramente digno de fé, a quem podemos seguir com toda a confiança, pois seria incapaz de pronunciar uma só palavra contrária à Escritura divina.

E de fato a Escritura, inspirada por Deus, afirma que o Verbo se fez carne, isto é, se uniu a uma carne dotada de uma alma racional. Por conseguinte, o Verbo de Deus assumiu a descendência de Abraão e, ao formar para si um corpo vindo de uma mulher, fez-se participante da carne e do sangue. Deste modo, já não é somente Deus, mas também Homem semelhante a nós, em virtude da sua união com a nossa natureza.

Portanto o Emanuel, Deus-conosco, consta de duas realidades: divindade e humanidade. Mas é um só Senhor Jesus Cristo, um só verdadeiro Filho por natureza, ainda que ao mesmo tempo Deus e homem. Não é apenas um homem divinizado, como aqueles que pela graça se tornam participantes da natureza divina; mas é verdadeiro Deus que, por causa da nossa salvação, se fez visível em forma humana, como também testemunha São Paulo com estas palavras: Ao chegar a plenitude dos tempos, Deus enviou o seu Filho, nascido de uma mulher e sujeito à Lei, para resgatar os que estavam sob o jugo da Lei e nos tornar seus filhos adotivos.”

A Divina Maternidade de Maria (I)

Do título de "Mãe de Deus" derivam depois todos os outros títulos com que a Igreja honra Nossa Senhora, mas este é o fundamental.

Bento XVI (audiência geral do dia 2 de janeiro de 2008)

Celebramos a solene festa de Maria, Mãe de Deus. "Mãe de Deus", Theotókos, é o título atribuído oficialmente a Maria no século V, exatamente no Concílio de Éfeso de 431, confirmado pela devoção do povo cristão já a partir do século III, no contexto dos intensos debates daquele período sobre a pessoa de Cristo. Com aquele título ressaltava-se que Cristo é Deus e nasceu realmente de Maria como homem: na verdade, por mais que o debate parecesse verter sobre Maria, ele dizia respeito essencialmente ao Filho. Querendo salvaguardar a plena humanidade de Jesus, alguns Padres sugeriam uma palavra menos forte: em vez do título de Theotókos, propunham o de Christotókos, "Mãe de Cristo"; mas justamente esta sugestão foi vista como uma ameaça à doutrina da plena unidade da divindade com a humanidade de Cristo. Por isso, depois do amplo debate, no Concílio de Éfeso de 431, como disse, foi solenemente confirmada, por um lado, a unidade das duas naturezas, a divina e a humana, na pessoa do Filho de Deus (cf. DS, n. 250) e, por outro, a legitimidade da atribuição à Virgem do título de Theotókos, Mãe de Deus (ibid., n.251).

Depois deste Concílio registou-se uma verdadeira explosão de devoção mariana e foram construídas numerosas igrejas dedicadas à Mãe de Deus. Entre elas sobressai a Basílica de Santa Maria Maior, aqui em Roma. A doutrina relativa a Maria, Mãe de Deus, encontrou além disso, nova confirmação no Concílio de Calcedónia (451) no qual Cristo foi declarado "verdadeiro Deus e verdadeiro homem (...) nascido de Maria Virgem e Mãe de Deus, na sua humanidade, para nós e para a nossa salvação" (DS, n. 301). Como se sabe, o Concílio Vaticano II reuniu num capítulo da Constituição dogmática sobre a Igreja Lumen gentium, o oitavo, a doutrina sobre Maria, reafirmando a sua divina maternidade. O capítulo intitula-se: "A Bem-Aventurada Virgem, Mãe de Deus, no mistério de Cristo e da Igreja".

A qualificação de Mãe de Deus, tão profundamente ligada às festividades do Natal, é portanto o apelativo fundamental com o qual a Comunidade dos crentes honra, poderíamos dizer, desde sempre a Virgem Santa. Ela exprime bem a missão de Maria na história da salvação. Todos os outros títulos atribuídos a Nossa Senhora encontram o seu fundamento na sua vocação para ser Mãe do Redentor, a criatura humana eleita por Deus para realizar o plano de salvação, centrado no grande mistério da encarnação do Verbo divino. Nestes dias de festa detemo-nos para contemplar no presépio a representação da Natividade. No centro deste cenário encontramos a Virgem Mãe que oferece o Menino Jesus à contemplação de quantos vão adorar o Salvador: os pastores, o povo pobre de Belém, os Magos que vieram do Oriente. Mais tarde, na festa da "Apresentação do Senhor", que celebraremos a 2 de fevereiro, serão o velho Simeão e a profetisa Ana que receberão das mãos da Mãe o pequeno Menino e O adorarão. A devoção do povo cristão considerou sempre o nascimento de Jesus e a maternidade divina de Maria como dois aspectos do mesmo mistério da encarnação do Verbo divino e por isso nunca considerou a Natividade como algo do passado. Nós somos "contemporâneos" dos pastores, dos magos, de Simeão e de Ana, ao irmos com eles estamos cheios de alegria, porque Deus quis ser o Deus conosco e tem uma mãe, que é a nossa mãe.

Do título de "Mãe de Deus" derivam depois todos os outros títulos com que a Igreja honra Nossa Senhora, mas este é o fundamental. Pensemos no privilégio da "Imaculada Conceição", isto é, no facto de Ela ser imune ao pecado desde a sua conceição: Maria foi preservada de qualquer mancha de pecado porque devia ser a Mãe do Redentor. O mesmo é válido para o título da "Assunção": Aquela que tinha gerado o Salvador não podia estar sujeita à corrupção derivante do pecado original. E sabemos que todos estes privilégios não são concedidos para afastar de nós Maria, mas ao contrário, para a tornar mais próxima; de facto, estando totalmente com Deus, esta Mulher está muito próxima de nós e ajuda-nos como mãe e como irmã. Também o lugar único e irrepetível que Maria ocupa na Comunidade dos crentes deriva desta sua vocação fundamental para ser a Mãe do Redentor. Precisamente como tal, Maria é também a Mãe do Corpo Místico de Cristo, que é a Igreja. Justamente por isso, durante o Concílio Vaticano II, a 21 de Novembro de 1964, Paulo VI atribuiu solenemente a Maria o título de "Mãe da Igreja".

Precisamente porque é Mãe da Igreja, a Virgem é também Mãe de cada um de nós, que somos membros do Corpo místico de Cristo. Da Cruz Jesus confiou a Mãe a cada um dos seus discípulos e, ao mesmo tempo, confiou cada discípulo ao amor da sua Mãe. O evangelista João conclui a breve e sugestiva narração com as palavras: "E, desde aquela hora, o discípulo recebeu-A em sua casa" (Lc 19, 27). É assim a tradução italiana do texto grego: "εiς tά íδια", ele recebeu-a na sua própria realidade, no seu próprio ser. Desta forma, faz parte da sua vida e as duas vidas compenetram-se; e este aceitá-la (εiς tά íδια) na própria vida é o testamento do Senhor. Portanto, no momento supremo do cumprimento da missão messiânica, Jesus deixa a cada um dos seus discípulos, como herança preciosa, a sua própria Mãe, a Virgem Maria.

Queridos irmãos e irmãs, nestes primeiros dias do ano, somos convidados a considerar atentamente a importância da presença de Maria na vida da Igreja e na nossa existência pessoal. Confiemo-nos a ela para que guie os nossos passos neste novo período de tempo que o Senhor nos concede viver, e nos ajude a ser autênticos amigos do seu Filho e desta forma também artífices corajosos do seu Reino no mundo, Reino da luz e da verdade. Que o novo ano, que inicia sob o sinal da Virgem Maria, nos faça sentir mais vivamente a sua presença materna, de forma que, amparados e confortados pela proteção da Virgem, possamos contemplar com um renovado olhar o rosto do seu Filho Jesus e caminhar mais rapidamente pelas estradas do bem.

1º de janeiro: Santa Maria, Mãe de Deus (Dia oitavo da Oitava do Natal)

Textos: Nm 6, 22-27; Gal 4, 4-7: Lc 2, 16-21

Evangelho (Lc 2,16-21): Foram, pois, às pressas a Belém e encontraram Maria e José, e o recém-nascido deitado na manjedoura. Quando o viram, contaram as palavras que lhes tinham sido ditas a respeito do menino. Todos os que ouviram os pastores ficavam admirados com aquilo que contavam. Maria, porém, guardava todas estas coisas, meditando-as no seu coração. Os pastores retiraram-se, louvando e glorificando a Deus por tudo o que tinham visto e ouvido, de acordo com o que lhes tinha sido dito. No oitavo dia, quando o menino devia ser circuncidado, deram-lhe o nome de Jesus, como fora chamado pelo anjo antes de ser concebido no ventre da mãe.

Comentário: Rev. D. Manel VALLS i Serra (Barcelona, Espanha)

Foram, pois, às pressas a Belém e encontraram Maria e José, e o recém-nascido deitado na manjedoura

Hoje, a Igreja contempla agradecida a maternidade da Mãe de Deus, modelo de sua própria maternidade para com todos nós. Lucas nos apresenta o “encontro” dos pastores “com o Menino”, o qual está acompanhado de Maria, sua Mãe, e de José. A discreta presença de José sugere a importante missão de ser custódio do grande mistério do Filho de Deus. Todos juntos, pastores, Maria e José, «Foram com grande pressa e acharam Maria e José, e o menino deitado na manjedoura» (Lc 2,16) é como uma imagem preciosa da Igreja em adoração.

“A manjedoura”: Jesus já está na manjedoura, numa noite alusiva à Eucaristia. Foi Maria quem o colocou lá! Lucas fala de um “encontro”, de um encontro dos pastores com Jesus. Em efeito, sem a experiência de um “encontro” pessoal com o Senhor, a fé não acontece. Somente este “encontro”, o qual se entende um “ver com os próprios olhos”, e em certa maneira um “tocar”, faz com que os pastores sejam capazes de chegar a ser testemunhas da Boa Nova, verdadeiros evangelizadores que podem dar a conhecer o que lhes haviam dito sobre aquela Criança. «Vendo-o, contaram o que se lhes havia dito a respeito deste menino» (Lc 2,17).

Aqui vemos o primeiro fruto do “encontro” com Cristo: «Todos os que os ouviam admiravam-se das coisas que lhes contavam os pastores» (Lc 2,18). Devemos pedir a graça de saber suscitar este “maravilhamento”, esta admiração naqueles a quem anunciamos o Evangelho.

Ainda há um segundo fruto deste encontro: «Voltaram os pastores, glorificando e louvando a Deus por tudo o que tinham ouvido e visto, e que estava de acordo com o que lhes fora dito» (Lc 2,20). A adoração do Menino lhes enche o coração de entusiasmo por comunicar o que viram e ouviram, e a comunicação do que viram e ouviram os conduz até a pregaria de louvor e de ação de graças, à glorificação do Senhor.

Maria, mestra de contemplação —«Maria conservava todas estas palavras, meditando-as no seu coração» (Lc 2,19) — nos dá Jesus, cujo nome significa “Deus salva”. Seu nome é também nossa Paz. Acolhamos coração este sagrado e doce Nome e tenhamo-lo frequentemente nos nossos lábios!

Hoje celebramos a solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus e o dia internacional da paz.

Pe. Antonio Rivero, L.C.

Foi o Papa Paulo VI quem transladou para o dia 1º de janeiro a festa da Maternidade divina de Maria, que antes caia no dia 11 de outubro. De fato, antes da reforma litúrgica realizada depois do concilio Vaticano II, no primeiro dia do ano se celebrava a memória da circuncisão de Jesus no oitavo dia depois do seu nascimento- como sinal de submissão à lei, sua inserção oficial no povo eleito- e no domingo seguinte se celebrava a festa do nome de Jesus.

Em primeiro lugar, neste primeiro dia do ano colocamos a Santa Maria como intercessora, para que nos consiga a paz que necessitamos. É o primeiro dia do ano e dedicamos a Ela, à Mãe de Deus, à Rainha da Paz, para que abençoe também todos os nossos esforços e desejos de paz. A cena do Evangelho também nos traz sentimentos de paz. Voltamos para Belém, para o presépio, para contemplar “Maria, José, e o Menino deitado no presépio”. Unimo-nos aos pastores neste momento de adoração, contemplando esta cena, sentindo-nos parte dela, como aquele povo simples que soube ver naquele menino todo um Deus que vinha para nascer por nós. Também damos glória a Deus, como os pastores, por ter se descoberto nas nossas vidas, por ter deixado Deus nascer, um ano mais, nos nossos corações. Esse menino enche os nossos corações e as nossas vidas de paz, com a sua paz. “A paz vos deixo, a minha paz vos dou”. Uma paz verdadeira e para sempre.

Em segundo lugar, pedimos neste dia que o Senhor coloque o seu olhar sobre nós e nos conceda a paz. É esta a oração que fazia todo bom israelita, e é uma oração e um desejo que devemos fazer hoje nosso todas as pessoas de boa vontade. Queremos que o Senhor conceda a paz, a sua paz, a todos os nossos parentes e amigos, e a todas as pessoas que quiserem recebê-la, para o mundo inteiro. Hoje é a jornada mundial da paz. A paz de Deus! O salmo 84 nos diz que a justiça e a paz se abraçam, se beijam. Queremos uma paz que seja fruto da justiça, não uma paz imposta violentamente pela força das armas ou pela força do dinheiro. Não queremos a paz de pessoas que vivem esmagadas pelo poder político, ou social, ou econômico. Não queremos a paz dos cemitérios. Queremos a paz dos corpos e das almas, a paz material e a paz espiritual. Sabemos que esta paz não podemos consegui-la plenamente enquanto vivermos nesta terra, mas devemos sempre aspirar cada dia a aproximar-nos um pouco mais dela. Não vamos conseguir só com as nossas forças humanas, necessitamos a ajuda de Deus. Por isso, vamos pedir hoje a Deus que, por intercessão da sua Mãe, Santa Maria, pouse o seu olhar sobre nós e nos conceda a paz. 

Finalmente, este é um dia para dar graças a Deus. Graças por tudo o que vivemos neste ano que terminamos, graças pelo que viveremos no ano que começa, graças por tudo de novo que aparece na nossa vida. Pedimos a Deus que todos os nossos bons desejos que temos e que nos dizemos no Novo Ano saibamos realizá-los. Fazemos nosso o propósito de favorecer tudo o que possa ajudar para que exista mais felicidade para todos, amigos e desconhecidos. Este é o nosso desejo: “Paz e bem para todos”.

Para refletir: Como início o novo ano: com esperança e fé? Com alegria e otimismo? Disposto a gerar a paz na minha família e por onde eu for?

Para rezar: Porque Jesus, nasceu de uma mulher, amamos e veneramos o nome dessa mulher: Maria. Porque, Maria, é espelho da humanidade redimida, bendizemos e suspiramos, neste Ano Novo, à nova Eva, Àquela que nos dá tanto: a Jesus. Para ser Mãe de Deus e Mãe nossa, não deixou atrás a sua pobreza nem a sua simplicidade, a sua obediência e o seu ser maternal. Bendizemos a vossa docilidade, Maria! Porque, Maria, meditava todas as coisas sagradas no mais profundo do seu coração, bendizemos a sua memória, o seu espírito e a sua fé. Bendita, Vós, Maria! Porque, Maria, como o sol que amanhece, ilumina os cantinhos mais escuros da nossa casa.

Qualquer sugestão ou dúvida podem se comunicar com o padre Antonio neste e-mail:  arivero@legionaries.org

terça-feira, 30 de dezembro de 2014

CIRCUNCISÃO DO SENHOR

No oitavo dia após seu nascimento, nosso Senhor Jesus Cristo foi circuncidado de acordo com a Lei do Antigo Testamento. Todos os bebês do sexo masculino foram submetidos a circuncisão como um sinal da aliança de Deus com o santo Antepassado Abraão e seus descendentes (Gênesis 17:10-14, Lev. 12:3).

Após este ritual do Divino Infante foi dado o nome de Jesus, como o Arcanjo Gabriel declarou no dia da Anunciação para a Santíssima Theotokos (Lucas 1:31-33, 2:21). Os Padres da Igreja explicam que o Senhor, o Criador da Lei, passou pela circuncisão a fim de dar às pessoas um exemplo de como fielmente os preceitos Divinos devem ser cumpridos. O Senhor foi circuncidado para que mais tarde ninguém tivesse dúvida de que Ele realmente havia assumido a carne humana, e que a Sua encarnação não foi meramente uma ilusão, como certos hereges (Docetistas) ensinavam.

No Novo Testamento, o ritual da circuncisão deu lugar ao mistério do batismo, do qual era prefiguração (Col 2:11-12). Ao cumprir a Lei da circuncisão, Nosso Senhor queria significar que Ele é a plenitude e a conclusão da Antiga Aliança. São Paulo diz, na epístola Lição lida na festa:

“Pois [Jesus] toda a plenitude da divindade habita corporalmente, e você veio para a plenitude da vida nele, que é a cabeça de todo poder e autoridade. Nele também fostes circuncidados com a circuncisão não feita por mãos, colocando fora do corpo de carne na circuncisão de Cristo” (Cl 2:9-11).

Os primeiros relatos da Festa da Circuncisão do Senhor se dão a partir dos meados do século IV. Um Canon da Festa foi escrito por Santo Estêvão do Mosteiro de São Sava (28 de outubro e 13 de Julho).

Além da circuncisão, que o Senhor aceitou como um sinal da aliança de Deus com a humanidade, Ele também recebeu o Nome de Jesus (Salvador), no oitavo dia após seu nascimento como uma indicação de seu serviço e obra da salvação do mundo (Mt.1:21, Marcos 9:38-39, 16:17, Lucas 10:17, Atos 3:06,16; Fil 2:9-10). Estes dois eventos, a circuncisão do Senhor e Sua Nomeação, recordam aos cristãos que eles têm entrado em uma nova aliança com Deus e "são circuncidados com a circuncisão não feita por mãos, no despojo do corpo dos pecados da carne, a circuncisão de Cristo" (Col 2:11). O próprio nome "cristão" é um sinal de entrada da humanidade para uma Nova Aliança com Deus.

Pôs-se-Lhe o nome de Jesus

Homilia de Santo Ambrósio, Bispo (Livro II sobre o capítulo 2 de Lucas, perto da metade).

Então o Menino foi circuncidado. Quem é Este Menino, senão Aquele de Quem foi dito: “Um Menino nos nasceu, um Filho nos foi dado” (1)? “Submeteu-Se à lei para ganhar aqueles que estavam submetidos à lei” (2). Para apresentá-lo ao Senhor. O que significa ser apresentado ao Senhor em Jerusalém, já o disse no comentário a Isaías. Aquele que circuncidou seus vícios, será achado digno de contemplar o Senhor, porque “Os olhos do Senhor estão sobre os justos” (3). Vês que toda lei antiga era um símbolo da futura: a circuncisão simboliza a purgação dos delitos. Mas, porque a fragilidade do corpo e da mente humanos, envolvidos em invencíveis vícios, conservam a tendência ao pecado, a circuncisão do oitavo dia prefigura a futura purgação de toda culpa, no tempo da ressurreição. Isso deve-se entender do seguinte: “Todo varão, saindo à luz, será chamado santo para o Senhor” (4). Essas palavras só são literalmente verdadeiras para o nascido da Virgem. E Ele era verdadeiramente santo, porque imaculado. E podemos dizer, ainda, que esse era o sentido da lei, porque as palavras são repetidas do mesmo modo pelo Anjo, que diz: “O Santo que nascer de Vós será chamado Filho de Deus”(5). O único, portanto, santo, entre os nascidos de mulher, é o Senhor Jesus, Que, isento do contágio da terrena corrupção, que não atingiu o parto imaculado, nem a majestade celeste. Se, pelo contrário, entendermos literalmente, como chamar santo todo varão, se não é segredo que muitos sejam maculadíssimos? Acaso é santo Acab? Acaso são santos os falsos profetas, sobre quem Elias justamente fez cair fogo do céu(6)? Mas é santo Aquele Que os piedosos mandatos da divina lei figuravam futuramente, Aquele único que, com imaculada fecundidade, da sua santa Igreja, gera povos para Deus.

(1) Is 9: 5.
(2) Gl 4: 4-5.
(3) Sl 32: 18.
(4) Nm 18: 15.
(5) Lc 1: 35.
(6) 2Rs 1: 10.

31 de dezembro (Dia sétimo da Oitava de Natal)

Evangelho (Jo 1,1-18): No princípio era a Palavra, e a Palavra estava junto de Deus, e a Palavra era Deus. Ela existia, no princípio, junto de Deus. Tudo foi feito por meio dela, e sem ela nada foi feito de tudo o que existe. Nela estava a vida, e a vida era a luz dos homens. E a luz brilha nas trevas, e as trevas não conseguiram dominá-la. Veio um homem, enviado por Deus; seu nome era João. Ele veio como testemunha, a fim de dar testemunho da luz, para que todos pudessem crer, por meio dele. Não era ele a luz, mas veio para dar testemunho da luz. Esta era a luz verdadeira, que vindo ao mundo a todos ilumina. Ela estava no mundo, e o mundo foi feito por meio dela, mas o mundo não a reconheceu. Ela veio para o que era seu, mas os seus não a acolheram. A quantos, porém, a acolheram, deu-lhes poder de se tornarem filhos de Deus: são os que creem no seu nome. Estes foram gerados não do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus. E a Palavra se fez carne e veio morar entre nós. Nós vimos a sua glória, glória que recebe do seu Pai como filho único, cheio de graça e de verdade. João dá testemunho dele e proclama: «Foi dele que eu disse: ‘Aquele que vem depois de mim passou à minha frente, porque antes de mim ele já existia». De sua plenitude todos nós recebemos, graça por graça. Pois a Lei foi dada por meio de Moisés, a graça e a verdade vieram por meio de Jesus Cristo. Ninguém jamais viu a Deus; o Filho único, que é Deus e está na intimidade do Pai, foi quem o deu a conhecer».

Comentário: Rev. D. David COMPTE i Verdaguer (Manlleu, Barcelona, Espanha)

E a Palavra se fez carne

Hoje é o último dia do ano. Frequentemente, uma mistura de sentimentos —incluso contraditórios— sussurram nos nossos corações nesta data. É como se uma amostra dos diferentes momentos vividos, e dos que gostaríamos de ter vivido, se tornassem presentes na nossa memória. O Evangelho de hoje pode ajudar-nos a decantá-los para podermos começar o novo ano com um empurrão.

«A palavra era Deus (…). Tudo foi feito por meio dela» (Jo 1, 1.3). No momento de fazer o balanço do ano, devemos ter presente que cada dia vivido é um dom recebido. Por isso, seja qual for o aproveitamento realizado, hoje devemos agradecer cada minuto do ano.

Mas o dom da vida não é completo. Estamos necessitados. Por isso o Evangelho de hoje aporta-nos uma palavra-chave: “acolher”. «E a Palavra se fez carne» (Jo 1,14). Acolher o próprio Deus! Deus, feito homem, fica ao nosso alcance. “Acolher” significa abrir-lhe as nossas portas, deixar que entre nas nossas vidas, nos nossos projetos, nos atos que enchem as nossas jornadas. Até que ponto acolhemos a Deus e lhe permitimos que entre em nós?

«Esta era a luz verdadeira, que vindo ao mundo a todos ilumina» (Jo 1,9). Acolher a Jesus quer dizer deixar-se guiar por Ele. Deixar que os seus critérios deem luz tanto aos nossos pensamentos mais íntimos como a nossa atuação social e de trabalho. Que as nossas ações se relacionem com as suas!

«A vida era a luz» (Jo 1,4). Mas a fé é algo mais que uns critérios. É a nossa vida enxertada na Vida. Não é apenas esforço —que também—. É, sobretudo, dom e graça. Vida recebida no seio da Igreja, sobretudo mediante os sacramentos. Que lugar têm eles na minha vida cristã?

«A quantos, porém, a acolheram, deu-lhes poder de se tornarem filhos de Deus» (Jo 1,12). Todo um projeto apaixonante para o ano que vamos estrear!

Reflexões de Frei Carlos Mesters, O.Carm

31 de dezembro - Sta Catarina Labouré
* O Prólogo é a primeira coisa que se vê ao abrir o evangelho de João. Mas foi a última a ser escrita. É o resumo final, colocado no início. Nele João descreve a caminhada da Palavra de Deus. Ela estava junto de Deus desde antes da criação e por meio dela tudo foi criado. Tudo que existe é expressão da Palavra de Deus. Como a Sabedoria de Deus (Prov 8,22-31), a Palavra quis chegar mais perto de nós e se fez carne em Jesus. Viveu no meio de nós, realizou a sua missão e voltou para Deus. Jesus é esta Palavra de Deus. Tudo que ele diz e faz é comunicação que nos revela o Pai.

* Dizendo "No princípio era a Palavra", João evoca primeira frase da Bíblia que diz: "No princípio Deus criou o céu e a terra" (Gn 1,1). Deus criou tudo por meio da sua Palavra. "Ele falou e as coisas começaram a existir" (Sl 33,9; 148,5). Todas as criaturas são uma expressão da Palavra de Deus. Esta Palavra viva de Deus, presente em todas as coisas, brilha nas trevas. As trevas tentam apagá-la, mas não conseguem. A busca de Deus, sempre de novo, renasce no coração humano. Ninguém consegue abafá-la. Não conseguimos viver sem Deus por muito tempo!

* João Batista veio para ajudar o povo a descobrir e saborear esta presença luminosa e consoladora da Palavra de Deus na vida. O testemunho de João Batista foi tão importante, que muita gente pensava que ele fosse o Cristo (Messias). (At 19,3; Jo 1,20) Por isso, o Prólogo esclarece dizendo: "João não era a luz! Veio apenas para dar testemunho da luz!"

* Assim como a Palavra de Deus se manifesta na natureza, na criação, da mesma maneira ela se manifesta no "mundo", isto é, na história da humani­dade e, de modo particular, na história do povo de Deus. Mas o "mundo" não reconheceu nem recebeu a Palavra. Ela "veio para o que era seu, mas os seus não a receberam". Aqui, quando fala mundo, João quer indicar o sistema tanto do império como da religião da época, ambos fechados sobre si e, por isso mesmo, incapazes de reco­nhecer e de receber a Boa Nova (Evangelho) da presença luminosa da Palavra de Deus.

* Mas as pessoas que se abrem aceitando a Palavra, tornam-se filhos e filhas de Deus. A pessoa se torna filho ou filha de Deus não por mérito próprio, nem por ser da raça de Israel, mas pelo simples fato de confiar e crer que Deus, na sua bondade, nos aceita e nos acolhe. A Palavra entra na pessoa e faz com que ela se sinta acolhida por Deus como filha, como filho. É o poder da graça de Deus.

* Deus não quer ficar longe de nós. Por isso, a sua Palavra chegou mais perto ainda e se fez presente no meio de nós na pessoa de Jesus. O Prólogo diz literalmente: "A Palavra se fez carne e montou sua tenda no meio de nós!" Antigamente, no tempo do êxodo, lá no deserto, Deus vivia numa tenda no meio do povo (Ex 25,8). Agora, a tenda onde Deus mora conosco é Jesus, "cheio de graça e de verdade!" Jesus veio revelar quem é este nosso Deus que está presente em tudo, desde o começo da criação.

Para um confronto pessoal
1. Tudo que existe é uma expressão da Palavra de Deus, uma revelação da sua presença. Será que sou suficientemente contemplativo para poder perceber e experimentar esta presença universal da Palavra de Deus?
2. O que significa para mim poder ser chamado filho de Deus?

segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

A Virgindade Perpétua de Maria

Em síntese: Aos 24/05/1992 o Papa João Paulo II proferiu importante alocução em Cápua (Itália), encerrando um Encontro de Estudos, por ocasião do 16.° Centenário do Concílio regional de Cápua (391-392). S. Santidade quis dissipar dúvidas atinentes à virgindade perpétua de Maria SS., frisando principalmente a virgindade no parto, que é um dos pontos mais discutidos do tema: João Paulo II retoma o testemunho de Concílios e da Tradição anterior, reafirmando que Maria ‘’deu à luz verdadeira e original­mente o seu Filho'’, conservando sempre a integridade da carne.

Tal fato não pode ser provado apoditicamente, mas pertence aos arti­gos fundamentais da fé. De certo modo é ilustrado por passagens bíblicas do Antigo Testamento, entre as quais a da sarça que ardia, mas não se consumia (ver Ex 3,2s), as narrativas da natividade extraordinária de Isaque, Sansão, Samuel, João Batista... (cf. Gn 17,17-22; Jz 13,2-7; ISm 1,1-23; Lc 1,5-25). Ademais a valorização da virgindade de Maria não deprecia a vocação ma­trimonial, santificada por um sacramento próprio. A virgindade hoje pouco estimada e vivenciada será sempre dom de Deus, que implica liberdade inte­rior para servir radicalmente ao Reino de Deus e lançar olhar muito perspi­caz sobre os bens transcendentais.

A virgindade de Maria SS., Mãe de Deus feito homem, é ponto nevrálgico no depósito da fé, para muitos cristãos. De modo geral, aceitam que Maria tenha sido virgem antes do parto e haja concebido virginalmente. Todavia mais dificilmente acreditam que tenha permanecido virgem após o parto.[1] Quanto à virgindade no parto, há quem a rejeite como algo de im­possível. Todavia a fé católica afirma a virgindade perpétua de Maria antes do parto, no parto e após o parto. Retomando o testemunho da Tradição anterior, o Papa Paulo IV em 7/8/1555 apresentou a perpétua virgindade de Maria entre os temas fundamentais da fé: "permaneceu Maria sempre virgem antes do parto, no parto e depois do parto" (Denzinger-Schdnmetzer, Enchi­ridion nº 1880 [993]).

Tal verdade tradicional tem sido amplamente debatida na bibliografia teológica. Principalmente a virgindade de Maria no parto vem questionada. - Ora a fim de esclarecer os fiéis católicos, o Papa João Paulo II quis pronunciar-se sobre o assunto, com a autoridade de quem deve confirmar seus irmãos na fé (cf. Lc 22, 31s). S. Santidade o fez aos 24/5/92 por ocasião de uma visita pastoral à arquidiocese de Cápua (Itália). Encerrava-se então um Encontro Internacional de Estudos, organizado pela Pontifícia Faculda­de Teológica Marianum de Roma, em colaboração com o Instituto Supe­rior de Ciências Religiosas de Cápua, por ocasião do 16º Centenário do Con­cílio regional de Cápua (391-392).

João Paulo II proferiu então uma alocução muito significativa, abor­dando as questões suscitadas em torno da temática. De tal pronunciamento destacamos os tópicos mais salientes.

I. A Palavra do Papa

"Um Concílio Importante

2. Era o ano de 392. Em Roma, a cátedra de Pedro era ocupada pelo Papa Sirício. Em Cápua celebrou-se um importante Concílio, que as fontes históricas qualificam como plenarium (cf. I. D. MANSI, Sacrorum Concilio rum nova et amplissima Collectio, III. Canones Conciliorum Ecclesiae Africanae, cân. 48, col. 738), pela participação dos Bispos provenientes de várias. regiões do Ocidente, e pela gravidade das questões que teve de enfrentar, en­tre as quais a composição do cisma de Antioquia e o exame da doutrina de Bonoso, que negava a perpétua virgindade da Santa Mãe do Senhor. Sabe­mos que o Papa Sirício acompanhou com vigilante atenção os trabalhos do Concílio, e que Santo Ambrósio de Milão deixou neles a marca da sua per­sonalidade forte e prudente (Ep. 71, De Bonoso episcopo: CSEL 82/3, pp. 7-10).

O tema então enfrentado oferece-nos o motivo para juntos refletir­mos sobre algumas condições prévias, que parecem indispensáveis para que o teólogo possa aprofundar, com a razão iluminada pela fé, o fato e o sig­nificado da virgindade da humilde e gloriosa Mãe de Cristo.

Na luz da encarnação do Verbo

3. Já os Padres da Igreja perceberam com clareza que a virgindade de Maria, antes de constituir uma questão mariológica, é um tema cristo­lógico. Eles faziam notar que a virgindade da Mãe é uma exigência derivante da natureza divina do Filho; é a condição concreta em que, segundo um livre e sapiente desígnio divino se efetuou a encarnação do Filho eterno, d'Aquele que é Deus de Deus (CONC. ECUM. CONSTANTINOP. I, Expo­sitio fidei CL Patrum seu Symbolum Nicaenum-Constantinopolitanum), só Ele é Santo, só Ele é o Senhor, só Ele é o Altíssimo (cf. Missale Romanum, Haymnus Glória in excelsis Deo). E consequentemente, para a tradição cristã, o seio virginal de Maria, fecundado pelo Pneuma divino sem inter­venção de homem (cf. Lc 1, 34-35), tornou-se, como o madeiro da cruz (cf. Mc 15, 39) ou as ligaduras do sepulcro (cf, Jo 20, 5-8), motivo e sinal para reconhecer em Jesus de Nazaré o Filho de Deus.

Com profundo sentido de veneração

5. Na reflexão adorante sobre o mistério da encarnação do Verbo, foi detectada uma relação particularmente importante entre o início e o fim da vida terrena de Cristo, ou seja, entre a concepção virginal e a ressurreição de entre os mortos, duas verdades que se ligam intimamente à fé na divindade de Jesus.

Elas pertencem ao depósito da fé, são professadas pela Igreja inteira e enunciadas expressamente nos Símbolos da fé. A história demonstra que dúvidas ou incertezas sobre uma repercutem inevitavelmente sobre a outra, como, ao contrário, a humilde e forte adesão a uma delas favorece o acolhi­mento cordial da outra.

No paralelismo, relativamente à geração de Cristo, alguns Padres res­saltam a concepção virginal, outros o nascimento virginal, outros a subseqüente virgindade perpétua da Mãe, mas todos testemunham a convicção de que entre os dois eventos salvíficos - a geração-nascimento de Cristo e a sua ressurreição de entre os mortos - existe um nexo intrínseco que responde a um preciso plano de Deus: um nexo que a Igreja, guiada pelo Espírito, descobriu, não criou.

Os fatos

6. Na confissão de fé na virgindade da Mãe de Deus, a Igreja proclama como fatos reais que Maria de Nazaré:

- concebeu verdadeiramente Jesus, por obra do Espírito Santo, sem intervenção do homem;

- deu à luz, verdadeira e virginalmente', o seu Filho, razão pela qual depois do parto permaneceu virgem; virgem - segundo os Santos Padres e os Concílios que trataram expressamente a questão (cf. CONC. ROMAN. LATERAN., cân. 3: I.D. MANSI. Sacrorum Conciliorum nova et amplíssi­ma Collectio, X, col. 1151; CONC. TOLET. XVI, Symbolum, art. 22) - também no que se refere à integridade da carne;

- viveu, depois do nascimento de Jesus, em total e perpétua virgin­dade; e, juntamente com São José, também ele chamado a desempenhar um papel primário nos eventos iniciais da nossa salvação, se dedicou ao ser viço da pessoa e da obra do Filho (cf. CONC. ECUM. VATICANO II, Const. dogmática Lumen gentium, 56).

7. No nosso tempo a Igreja sentiu a necessidade de evocar a realidade da concepção virginal de Cristo, fazendo notar que as páginas de Lucas 1, 26-38 e de Mateus 1, 18-25 não podem ser reduzidas a simples narrações etiológicas, para facilitar a fé dos fiéis na divindade de Cristo. Elas são antes, para além do gênero literário adotado por Mateus e por Lucas, expressão duma tradição bíblica de origem apostólica.

Afirmar a realidade da concepção virginal de Cristo não significa que, em referência a ela, se possa fornecer uma prova apolítica de tipo racional. Com efeito, a concepção virginal de Cristo é uma verdade revelada por Deus, que o homem acolhe em virtude da obediência da fé (cf. FIM. 16, 26). Só quem está disposto a crer que Deus age na realidade intramundana e que a Ele "nada é impossível" (Lc. 1, 37), pode acolher com devota gratidão as verdades da "kenosis" do Filho eterno de Deus e da sua concepção-nasci­mento virginal, do valor salvífico universal da sua morte na cruz e da ressur­reição verdadeira, no próprio corpo, d'Aquele que foi suspenso e morreu no madeiro da Cruz.

O Significado dos Fatos

9. Ora, na pesquisa do sentido oculto no fato, abre-se ao teólogo um campo de trabalho vasto, fecundo e exaltante. Se ele, com método rigoroso, com fidelidade à Palavra normativa, à Tradição universal, às diretrizes do Magistério, com atenção à experiência litúrgica investigar o evento salvífico da concepção e do nascimento de Cristo, bem como a virgindade perpétua de Maria, virá a encontrar-se, por assim dizer, em contato com a Escritura inteira: com a página em que Deus plasma o homem com a "terra virgem" (cf. Gn. 2, 4b-7); com os textos que narram as antigas Alianças, as profecias messiânicas, as promessas feitas a David, cujos ecos se ouvem distintamente na Aliança da Encarnação; com a narração dos gestos de Abraão, cuja fé obediente revive, intensificam, no fiat de Maria; com os relatos da materni­dade prodigiosa de algumas mulheres estéreis - Sara, a mulher de Manoach, Ana, Isabel - que se tornaram fecundas com o favor de Deus; com os tre­chos que descrevem o nascimento dos discípulos "do Alto", "da água e do Espírito" (cf. Jo 3, 3-8), isto é, modelado no nascimento de Jesus no seio de Maria, por obra do Espírito Santo; com o episódio da maternidade pascal de Maria (cf. Jo 19, 25-27), ocorrida também ela na fé à palavra e na qual os Padres divisaram também uma dimensão virginal: o Filho, virgem, confia a Mãe virgem ao Discípulo virgem (cf. S. JERÔNIMO, Ep. 127, 5; CSEL 56, pp. 149-150; S. SOFRÔNIO, In lohannis Evangelium, 69-76; PG 78, 3, 3788); com a mesma literatura intertestamentária, na qual se sente, em pá­ginas de intenso lirismo, o pungente desejo de Israel de se tornar esposa pura e fiel, comunidade escatológica em que já não se ouça o lamento da dor do parto nem os cantos fúnebres da morte. São exemplos. Eles indicam que ex­pressões, tais como Theotokos ou Virgo Mater, se lidas em profundidade e com atenção às múltiplas vozes convergentes, são como que síntese da eco­nomia salvífica. . .

De modo íntegro e correto

11. A exatidão na exposição da doutrina exige que sejam evitadas po­sições unilaterais, exagerações ou distorções. Por exemplo, a afirmação da virgindade de Maria deve ser feita de modo que em nada, direta ou indiretamente, apareçam diminuídos o valor e a dignidade do matrimônio, querido por Deus, por Ele abençoado, sacramento que configura o cristão a Cristo, via de perfeição e de santidade,. . . nem se banalize a mensagem que dela de­riva, relegando-a a um aspecto marginal do cristianismo.

De modo atento à cultura contemporânea

12. Certamente o clima cultural do nosso tempo nem sempre é sensí­vel aos valores da virgindade cristã. Não seria difícil enumerar as causas. Mas isto não deve desencorajar o teólogo no seu empenho. No tempo de Paulo, a cultura dominante não estava pronta a acolher o mistério da Cruz, mas ele, por fidelidade a Cristo, fez dele o fulcro da sua mensagem (cf. 1 Cor 2, 2; GI 3, 1;6, 14).

O teólogo deve ser animado pela confiança serena em que os valores, autenticamente evangélicos, são válidos para o homem e para a mulher con­temporâneos, mesmo quando estes os ignoram ou os transcuram.

A virgindade é dom e graça. Ela é um bem da Igreja, do qual partici­pam também aqueles - sem dúvida a maior parte -, que não são chamados a vivê-la na própria carne, mas embora sempre no próprio coração.

Compete ao teólogo indicar as razões que podem ajudar o homem e a mulher do nosso tempo a redescobrirem os valores da virgindade; ele deve determinar a linguagem mais apta para transmitir os valores evangélicos, dos quais ela é portadora, mostrar como em muitos casos a virgindade é sinal de liberdade interior, de respeito pelo outro, de atenção aos valores do Espíri­to, de capacidade de lançar o olhar para além dos confins do mundo temporal (cf. Mt 22, 30), de viver radicalmente ao serviço do Reino".

II. REFLETINDO­...

Em suma, a alocução do S. Padre, que certamente visava a pôr termo às hesitações dos fiéis, afirma as seguintes proposições:

1) A virgindade de Maria vem a ser, antes do mais, um tema cristológico, no sentido de que é toda relativa a Cristo. Contribui para identificar o Senhor Jesus, indicando que não era mero homem (embora fosse verdadeiro homem); por ser também Deus Filho, Maria recebeu do próprio Deus o Fi­lho ao qual ela havia de dar a natureza humana.

2) A virgindade de Maria no parto tem seu paralelo no final da vida terrestre de Jesus: Este, ressuscitado, atravessava as paredes do Cenáculo sem as rasgar, como o fizera em relação a Maria SS. quando nasceu.

O principal objetivo da alocução de João Paulo II em Cápua foi preci­samente incutir o ponto mais delicado da temática, ou seja, a virgindade de Maria no parto. A recomendação deste traço ocupa notável porção do pronunciamento. O S. Padre renunciou a expor teorias biológicas que nos últi­mos tempos foram apresentadas para elucidar a partenogênese, como se se pudesse enquadrar o caso de Maria em alguma ocorrência conhecida pelas ci­ências médicas.

3) A Escritura do Antigo Testamento prepara o conceito do parto vir­ginal de Maria, conforme a interpretação dos Padres antigos e da Tradição. Com efeito; apontam-se textos bíblicos, em que a graça de Deus aparece a suprir as deficiências da natureza ou age ultrapassando as possibilidades da natureza. Assim é recomendada ao leitor a noção de que Deus pode fazer o que Ele quer com os elementos que Ele escolhe, por mais ineptos que pare­çam. É Deus quem toma a iniciativa de salvar o homem gratuitamente, e não é o homem que provoca Deus para realizar atos salvíficos.

4) A profissão da maternidade virginal de Maria em nada deprecia o es­tado conjugal consagrado pelo sacramento do matrimônio. Todo cristão é chamado a santificar-se nas condições de vida que Deus lhe assinala (virgin­dade ou matrimônio).

5) A virgindade ou a vida una e indivisa, hoje em dia pouco estimada e praticada, vem a ser penhor de liberdade interior, de olhar perspicaz sobre os valores transcendentais e de radical vivência a serviço do Reino de Deus. Por isto fica sendo, em nossos dias mesmos, um ideal ao qual podem e de­vem aspirar aqueles(as) a quem Deus concede tal graça.

NOTA:
[1] A questão da virgindade de Maria após o parto coincide com a dos "irmãos de Jesus". Na verdade, a boa exegese dos Evangelhos mostra que, segundo a linguagem semita, estes eram primos de Jesus, isto é, filhos de Cleofas ou Alfeu, irmão de São José, casado com uma certa mulher, de no­me Maria, cf. Mt 27,56,- Jo 19,25. A propósito ver: E. Bettencourt, Diálogo Ecumênico, Ed. Lumen Christí, Caixa postal 20001-970 Rio (RJ).


30 de dezembro (Sexto dia da Oitava do Natal)

Evangelho (Lc 2,36-40): Havia também uma profetisa, chamada Ana, filha de Fanuel, da tribo de Aser. Ela era de idade avançada. Quando jovem, tinha sido casada e vivera sete anos com o marido. Depois ficara viúva e agora já estava com oitenta e quatro anos. Não saía do templo; dia e noite servia a Deus com jejuns e orações. Naquela hora, Ana chegou e se pôs a louvar Deus e a falar do menino a todos os que esperavam a libertação de Jerusalém. Depois de cumprirem tudo conforme a Lei do Senhor, eles voltaram para Nazaré, sua cidade, na Galileia. O menino foi crescendo, ficando forte e cheio de sabedoria. A graça de Deus estava com ele.

Comentário: Rev. D. Joaquim FLURIACH i Domínguez (St. Esteve de P., Barcelona, Espanha)

Se pôs a louvar Deus e a falar do Menino a todos

Hoje, José e Maria acabam de celebrar o rito da apresentação do primogênito, Jesus, no Templo de Jerusalém. Maria e José não se poupam para cumprir detalhadamente tudo o que a Lei prescreve, porque cumprir aquilo que Deus quer é sinal de fidelidade, de amor a Deus.

Desde que nasceu o seu filho — e filho de Deus — José e Maria experimentam maravilha atrás de maravilha: os pastores, os magos do Oriente, anjos… Não somente acontecimentos exteriores extraordinários, mas também interiores, no coração das pessoas que têm algum contato com este Menino.

Hoje, aparece Ana, uma senhora de idade, viúva, que num determinado momento tomou a decisão de dedicar toda a sua vida ao Senhor, com jejuns e oração. Não nos equivocamos se dissermos que esta mulher era uma das “virgens prudentes” da parábola do Senhor (cf. Mt 25,1-13): zelando sempre fielmente por tudo o que lhe parece ser a vontade de Deus. E, é claro: quando chega o momento, o Senhor encontra-a preparada. Todo o tempo que dedicou ao Senhor é recompensado com juros por aquele Menino. Perguntai-lhe, perguntai a Ana se valeu a pena tanta oração e tanto jejum, tanta generosidade!

Diz o texto que «louvava Deus e falava do Menino a todos os que esperavam a libertação de Jerusalém» (Lc 2,38). A alegria transforma-se em apostolado determinado: ela é o motivo e a raiz. O Senhor é imensamente generoso com os que são generosos com Ele.

Jesus, Deus Encarnado, vive a vida de Família em Nazaré, como todas as famílias: crescer, trabalhar, aprender, rezar, brincar… “Santa normalidade”, bendita rotina onde crescem e se fortalecem, quase sem dar por isso, as almas dos homens de Deus! Como são importantes as coisas pequenas de cada dia!

Reflexões de Frei Carlos Mesters, O.Carm

* Nos primeiros dois capítulos de Lucas, tudo gira em torno do nascimento de duas crianças: João e Jesus. Os dois capítulos nos fazem sentir o perfume do Evangelho de Lucas. Neles, o ambiente é de ternura e de louvor. Do começo ao fim, se louva e se canta a misericórdia de Deus: os cânticos de Maria (Lc 1,46-55), de Zacarias (Lc 1,68-79), dos anjos (Lc 2,14), de Simeão (Lc 2,29-32). Finalmente, Deus chegou para cumprir suas promessas, e Ele as cumpre em favor dos pobres, dos anawim, dos que souberam perseverar e esperar pela sua vinda: Isabel, Zacarias, Maria, José, Simeão, Ana, os pastores.

* Os capítulos 1 e 2 do Evangelho de Lucas são muito conhecidos, mas pouco aprofundados. Lucas escreve imitando os escritos do AT. É como se os primeiros dois capítulos do seu evangelho fossem o último capítulo do AT que abre a porta para a chegada do Novo. Estes dois capítulos são a dobradiça entre o AT e o NT. Lucas quer mostrar como as profecias estão se realizando. João e Jesus cumprem o Antigo e iniciam o Novo.

* Lucas 2,36-37: A vida da profetisa Ana
“Havia também uma profetisa chamada Ana, de idade muito avançada. Ela era filha de Fanuel, da tribo de Aser. Tinha-se casado bem jovem, e vivera sete anos com o marido. Depois ficou viúva, e viveu assim até os oitenta e quatro anos. Nunca deixava o Templo, servindo a Deus noite e dia, com jejuns e orações”. Como Judite (Jd 8,1-6), Ana é viúva. Como Débora (Jz 4,4), ela é profetisa. Isto é, pessoa que comunica algo de Deus e que tem uma abertura especial para as coisas da fé a ponto de poder comunicá-las aos outros. Ana casou jovem, viveu em casamento durante sete anos, ficou viúva e continuou dedicada a Deus até oitenta e quatro anos. Hoje, em quase todas as nossas comunidades, no mundo inteiro, você encontra um grupo de senhoras de idade, muitas delas viúvas, cuja vida se resume em rezar e marcar presença nas celebrações e em servir ao próximo.

* Lucas 2,38: Ana e o menino Jesus
“Ela chegou nesse instante, louvava a Deus, e falava do menino a todos os que esperavam a libertação de Jerusalém”. Chegou ao templo no momento em que Simeão abraçava o menino e conversava com Maria sobre o futuro do menino (Lc 2,25-35). Lucas sugere que Ana participou neste gesto. O olhar de Ana é um olhar de fé. Ela vê um menino nos braços de sua mãe, e descobre nele o Salvador do mundo.

* Lucas 2,39-40: A vida de Jesus em Nazaré
” Quando acabaram de cumprir todas as coisas, conforme a Lei do Senhor, voltaram para Nazaré, sua cidade, que ficava na Galileia. O menino crescia e ficava forte, cheio de sabedoria. E a graça de Deus estava com ele”. Nestas poucas palavras, Lucas comunica algo do mistério da encarnação. “A Palavra de fez carne e veio morar entre nós” (Jo 1,14). O Filho de Deus tornou-se igual a nós em tudo e assumiu a condição de servo (Filp 2,7). Foi obediente até a morte e morte de cruz (Filp 2,8). Dos trinta e três anos que viveu entre nós, trinta foram vividos em Nazaré. Se você quiser saber como foi a vida do Filho de Deus durante os anos que ele viveu em Nazaré, procure conhecer a vida de qualquer nazareno daquela época, mude o nome, coloque Jesus e você terá a vida do Filho de Deus durante trinta dos trinta e três anos da sua vida, igual a nós em tudo, menos no pecado (Hb 4,15). Nestes trinta anos da sua vida, “o menino crescia e ficava forte, cheio de sabedoria. E a graça de Deus estava com ele”. Em outro lugar Lucas afirma a mesma coisa com outras palavras. Ele diz que o menino “crescia em sabedoria, idade e tamanho diante de Deus e dos homens” (Lc 2,52). Crescer em Sabedoria significa assimilar os conhecimentos, a experiência humana acumulada ao longo dos séculos: os tempos, as festas, os remédios, as plantas, as orações, os costumes, etc. Isto se aprende vivendo e convivendo na comunidade natural do povoado. Crescer em Tamanho significa nascer pequeno, crescer aos poucos e ficar adulto. É o processo de cada ser humano com suas alegrias e tristezas, descobertas e frustrações, raivas e amores. Isto se aprende vivendo e convivendo na família com os pais, os irmãos e irmãs, os tios, os parentes. Crescer em Graça significa: descobrir a presença de Deus na vida, a sua ação em tudo que acontece, a vocação, o chamado dele. A carta aos hebreus diz que: “Embora fosse filho de Deus, Jesus teve que aprender a ser obediente através dos seus sofrimentos” (Hb 4,8).

Para um confronto pessoal
1. Conhece pessoas como Ana, que tem um olhar de fé sobre as coisas da vida
2. Crescer em sabedoria, tamanho e graça: como isto acontece em minha vida?

domingo, 28 de dezembro de 2014

Para rezar diante do Presépio

Seleção de fragmentos das homilias natalinas do Papa Bento XVI desde que ocupou a cátedra de São Pedro em 2005 até hoje.

PREPARAÇÃO
– «O Menino, que os pastores adoraram numa gruta na noite de Belém há cerca de dois mil anos, não se cansa de visitar-nos na vida quotidiana, enquanto caminhamos como peregrinos para o Reino. Invocar o dom do nascimento do Salvador prometido significa, contudo, comprometer-se com plainar-lhe o caminho, com preparar-lhe uma habitação digna não só no ambiente à nossa volta, mas sobretudo no nosso coração» (19.12.2007).

– «Chegou o momento que o Anjo tinha anunciado em Nazaré: «Darás à luz um filho, ao qual porás o nome de Jesus. Ele será grande e será chamado Filho do Altíssimo» (cf. Lc 1, 31-32). Chegou o momento que Israel aguardava há muitos séculos, durante tantas horas sombrias – o momento de algum modo esperado por toda a humanidade, ainda que sob figuras confusas: que Deus viesse cuidar de nós, que saísse do seu esconderijo, que o mundo fosse salvo e tudo se renovasse. Podemos imaginar com quanto cuidado interior, com quanto amor Se preparou Maria para aquela hora. A breve anotação «envolveu-O em panos» deixa-nos intuir algo da santa alegria e do zelo silencioso de tal preparação. Estavam prontos os panos, para que o Menino pudesse ser bem acolhido. Na hospedaria, porém, não havia lugar. De algum modo a humanidade espera Deus, a sua proximidade. Mas quando chega o momento, não tem lugar para Ele.

Temos nós tempo para o próximo que necessita da nossa, da minha palavra, do meu afeto? Para o doente que precisa de ajuda? Para o prófugo ou o refugiado que procura asilo? Temos nós tempo e espaço para Deus? Pode Ele entrar na nossa vida? Encontra um espaço em nós, ou temos todos os espaços do nosso pensamento, da nossa ação, da nossa vida, ocupados para nós mesmos? (Missa da meia noite, 24.12.2007).

– O mundo torna-se cada vez mais caótico e também violento: vemo-lo todos os dias. E a luz de Deus, a luz da Verdade, apaga-se. A vida fica escura e desorientada. Como é então importante que sejamos realmente crentes e como crentes reafirmemos com vigor, com a nossa vida, o mistério de salvação que a celebração do Natal de Cristo traz consigo! (19.12.2007).

– «Ó homem moderno, adulto e ainda às vezes débil de pensamento e de vontade, deixa o Menino de Belém conduzir-te pela mão; não temas, confia nele! » (Mensagem Urbi et Orbi, de Roma ao mundo; 25.12.2005).

TESTEMUNHO
– «Se não reconhecermos que Deus se fez homem, que sentido tem festejar o Natal? A celebração torna-se vazia. Antes de tudo, nós cristãos devemos reafirmar com profunda e sentida convicção a verdade do Natal de Cristo, para testemunhar diante de todos a consciência de um dom inaudito que é riqueza não só para nós, mas para todos. Disto brota o dever da evangelização» (19.12.2007).

ESPERANÇA
– «O homem da era tecnológica corre o risco de ser vítima dos próprios êxitos da sua inteligência e dos resultados das suas capacidades inventivas, caminha para uma atrofia espiritual, um vazio do coração. Por isso, é importante abrir a sua mente e o seu coração ao Natal de Cristo, acontecimento de salvação capaz de imprimir uma renovada esperança à existência de todo o ser humano.

No Natal, o nosso espírito abre-se à esperança, ao contemplar a glória divina escondida na pobreza de um Menino envolto em panos e reclinado numa manjedoura: é o Criador do universo, reduzido à impotência de um recém-nascido! Aceitar esse paradoxo, o paradoxo do Natal, é descobrir a Verdade que liberta, o Amor que transforma a existência. Na Noite de Belém, o Redentor faz-Se um de nós, para ser nosso companheiro nas estradas insidiosas da história. Acolhamos a mão que Ele nos estende: é uma mão que não nos quer tirar nada, mas apenas dar». (Mensagem Urbi et Orb:, de Roma ao mundo; 25.12.2005).

AMOR
– «Deus é tão grande que Se pode fazer pequeno. Deus é tão poderoso que Se pode fazer inerme e vir ter conosco como menino indefeso, para que O possamos amar. Deus é tão bom que renuncia ao seu esplendor divino e desce ao estábulo para que O possamos encontrar e, assim, a sua bondade chegue também a nós, se nos comunique e continue a agir por nosso intermédio. Isto é o Natal. » (Missa da meia noite, 24.12.2005).

– «Tu és meu Filho, Eu hoje Te gerei». Deus tornou-Se um de nós, para que nós pudéssemos viver com Ele, tornarmo-nos semelhantes a Ele. Como próprio sinal, escolheu o Menino no presépio: Deus é assim» (Missa da meia noite, 24.12.2005).

– «Naquele Menino deitado na manjedoura, Deus mostra a sua glória – a glória do amor, em que Ele mesmo Se entrega em dom e Se despoja de toda a grandeza para nos conduzir pelo caminho do amor. A luz de Belém nunca mais se apagou. Ao longo de todos os séculos, envolveu homens e mulheres, «cercou-os de luz». “Onde despontou a fé naquele Menino, aí desabrochou também a caridade – a bondade para com todos, a carinhosa atenção pelos débeis e os doentes, a graça do perdão” (Missa da meia noite, 24.12.2005).

APOSTOLADO
– «Nada é mais belo, urgente e importante que doar gratuitamente aos homens o que gratuitamente recebemos de Deus». Nada pode nos eximir ou nos tirar deste oneroso e fascinante dever. A alegria do Natal que já experimentamos, enquanto nos enche de esperança, alenta-nos, ao mesmo tempo, a anunciar a todos a presença de Deus no meio de nós» (23.12.2007).

– «Só redescobrindo o dom recebido a Igreja pode testemunhar a todos o Cristo Salvador; fá-lo-á com entusiasmo e ardor, no pleno respeito de toda tradição cultural e religiosa; fá-lo-á com alegria sabendo que Aquele que anuncia nada priva daquilo que é autenticamente humano, mas leva-o à sua plenitude. Na verdade, Cristo vem somente para destruir o mal: o pecado. O resto, todo o resto Ele eleva e aperfeiçoa. » (Missa da meia noite, 24.12.2006).

– «O verdadeiro mistério do Natal é o resplendor interior que vem deste Menino». Deixemos que se comunique a nós esse esplendor interior, que acenda no nosso coração a chama da bondade de Deus; todos nós levemos, com o nosso amor, a luz ao mundo! Não deixemos que esta chama luminosa se apague por causa das correntes frias do nosso tempo! Guardemo-la fielmente e demo-la aos outros! » (Missa da meia noite, 25.12.2005).

CONVERSÃO
– «Glória a Deus nas alturas, e paz na terra aos homens que Ele ama», ou seja, homens que põem a sua vontade na dele, tornando-se assim homens de Deus, homens novos, mundo novo». (25.12.2007).

– «Este é o grande mistério do amor que nunca termina de nos surpreender. Deus fez-se homem para que nos convertêssemos em filhos de Deus». (23.12.2007).

– «Ele ama a todos, porque todos são criaturas suas. Mas, algumas pessoas têm a sua alma fechada; o seu amor não encontra qualquer acesso a eles. Pensam que não têm necessidade de Deus; não O querem. Outros, que moralmente talvez sejam igualmente miseráveis e pecadores, pelo menos sofrem com isso. Estes esperam Deus. Sabem que têm necessidade da sua bondade, embora não tenham uma ideia precisa dela. No seu íntimo, aberto à expectativa, a luz de Deus pode entrar, e com ela a sua paz» (25.12.2005).

HUMILDADE
– «No estábulo de Belém, tocam-se o céu e a terra. O céu veio à terra. (...). «O céu não pertence à geografia do espaço, mas à geografia do coração. E o coração de Deus, na Noite santa, inclinou-Se até ao curral: a humildade de Deus é o céu. E se formos ao encontro desta humildade, então tocamos o céu. Então a própria terra se torna nova. Com a humildade dos pastores, ponhamo-nos a caminho, nesta Noite santa, até junto do Menino no curral! Toquemos a humildade de Deus, o coração de Deus! “Então a sua alegria tocar-nos-á a nós e tornará o mundo mais luminoso». (25.12.2007).

– «O Natal é o dia santo em que brilha a “grande luz” de Cristo portadora de paz! Certamente, para reconhecê-la, para acolhê-la, é preciso fé, é preciso humildade. A humildade de Maria, que acreditou na palavra do Senhor e foi a primeira que, inclinada sobre a manjedoura, adorou o Fruto do seu ventre; a humildade de José, homem justo, que teve a coragem da fé e preferiu obedecer a Deus mais que preservar a própria reputação; a humildade dos pastores, dos pobres e anônimos pastores, que acolheram o anúncio do mensageiro celeste e à pressa foram à gruta onde encontraram o Menino recém-nascido e, cheios de maravilha, O adoraram louvando a Deus (cf. Lc 2,15-20) ». (Mensagem Urbi et Orbi: de Roma ao mundo; 25.12.2007).

TEMPO
– «Quem está preparado para abrir-Lhe a porta do coração? Homens e mulheres deste nosso tempo, Cristo vem trazer a luz também a nós, vem dar-nos a paz também a nós! Mas quem vigia, na noite da dúvida e da incerteza, com o coração desperto e em oração? Quem espera a aurora do novo dia, mantendo acesa a chamazinha da fé? Quem tem tempo para escutar a sua palavra e deixar-se envolver pelo fascínio do seu amor? » (25.12.2007).

FELICIDADE
– « “À sede de sentido e de valores que hoje se percebe no mundo; à busca de bem-estar e de paz que marca a vida de toda a humanidade; às expectativas dos pobres, responde Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro Homem, com a sua Natividade. Que as pessoas e as nações não temam reconhecê-Lo e acolhê-Lo” ». (Mensagem Urbi et Orbi: de Roma ao mundo; 25.12.2007).

«Tem ainda valor e sentido um “Salvador” para o homem do terceiro milênio? Como não perceber que, precisamente do fundo desta humanidade prazenteira e desesperada, surge um dilacerador pedido de ajuda? (...) É precisamente em sua intimidade, no que a Bíblia chama o “coração”, em que sempre precisa ser salvado. E, na época atual pós-moderna, necessita possivelmente ainda mais de um Salvador, porque a sociedade em que vive se tornou mais complexa e se tornaram mais insidiosas as ameaças para sua integridade pessoal e moral. Quem pode defendê-lo a não ser Aquele que o ama até sacrificar na cruz a seu Filho unigênito como Salvador do mundo? » (25.12.2006).

«Desperta, ó homem! Por ti, Deus Se fez homem» (Santo Agostinho, Sermões, 185). Desperta, ó homem do terceiro milênio! No Natal, o Onipotente faz-Se menino e pede ajuda e proteção; o seu modo de ser Deus põe em crise o nosso modo de ser homens; o seu bater às nossas portas interpela-nos, interpela a nossa liberdade e pede-nos para rever a nossa relação com a vida e o nosso modo de a conceber. » (Mensagem Urbi et Orbi: a Roma e ao mundo; 25.12.2005).


Fonte: Site do Opus Dei