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quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

M E D I T A Ç Õ E S    Q U A R E S M A I S:
O SERVO SOFREDOR - A história da paixão de Cristo IX

Amigo, para que vieste?

     Ora, o traidor lhes tinha dado este sinal: Aquele a quem eu beijar, é esse; prendei-o.  E logo, aproximando-se de Jesus, lhe disse: Salve, Mestre! E o beijou.  Jesus, porém, lhe disse: Amigo, para que vieste? Nisto, aproximando-se eles, deitaram as mãos em Jesus e o prenderam. (Mateus 26.48-50)

     A traição de Judas é amplamente descrito no Antigo e no Novo Testamento, para advertência a todos nós.
     Judas foi um verdadeiro apóstolo. Ele foi enviado a pregar o Evangelho e expulsou demônios (Mateus 10.5). Sem dúvida confessou com o apóstolo Pedro: Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo (Mateus 16.16). Mesmo assim, Satanás conseguiu desviá-lo da fé. Judas teve antecedentes. Profetas e pessoas que fizeram proezas em nome de Deus, que tiveram o dom do Espírito Santo, mas depois caíram da fé. Lembramos o rei Saul. A culpa de tais quedas não é de Deus, mas das próprias pessoas que caíram.
     Como foi possível a Satanás prostrar Judas em tão grave pecado, desviá-lo da fé e levá-lo à eterna condenação? O que Satanás fez com muitos outros e ainda hoje o faz com muitos cristãos. É preciso lembrar que temos nossa natureza carnal, corrupta pelo pecado, que não muda. Este “velho homem em nós, por contrição e arrependimento diários, deve ser afogado e morrer com todos os pecados e maus desejos, e, por sua vez, sair e ressurgir diariamente novo homem que viva em justiça e pureza diante de Deus eternamente” (Catecismo Menor). Quem se descuidar nessa luta e não se examinar diariamente à luz da palavra de Deus, e em arrependimento e fé buscar perdão e forças de Jesus, perecerá. Deus não abandona ninguém, a não ser quando a pessoa insistentemente resiste ao Espírito de Deus.
     Com grande amor Jesus buscou a Judas. As muitas admoestações durante os três anos de discipulado.  Quantas vezes Jesus advertiu contra a avareza e o amor ao mundo. As advertências especiais aos discípulos e a Judas na quinta-feira santa à noite. Tudo em vão.  Mesmo assim, Jesus revela amor a Judas ainda no Jardim Getsêmani: Amigo, para que vieste? Mesmo sabendo Jesus o que Judas estava fazendo, não o acusa antes da consumação do pecado, mas o convida à reflexão. Judas pensa no que você vai fazer. Mas Judas não deu importância, abraçou hipocritamente a Jesus, para lhe dar o beijo da traição. Então Jesus lhe disse claramente: Judas, com um beijo trais o Filho do homem?(Lucas 22.48) Judas recuou. Seu trabalho estava concluído. Ele traiu Jesus por 30 moedas de prata.
     O que se passou na cabeça de Judas ao trair a Jesus? A Escritura não o revela. Conhecemos, no entanto, o procedimento de Satanás. Ele apresenta o pecado como algo vantajoso e bom. Talvez Judas tivesse pensado o seguinte: Jesus é o Filho de Deus. Eles não conseguirão prendê-lo. Já tentaram várias vezes prendê-lo, e ele sempre se livrou. Talvez isso apresse, como todos pensavam, a manifestação do reino de Deus (Atos 1.6). Eu terei o dinheiro e Jesus me perdoará. Não é assim, que o diabo tenta ainda hoje muitos para o pecado? 
     Que coisa triste. Satanás arrancou Judas das mãos de Jesus, para precipitá-lo na eterna condenação. Sirva-nos isso de advertência: Com o pecado não se brinca. Satanás, como uma aranha astuta, com sua teia maldosa, prende e enrola a pessoa com pecados cada vez mais graves, até sufocar-lhes a fé. Daí as diversas admoestações da Escritura: Vigiai e orai, para que não entreis em tentação (Marcos 14.38). Desenvolvei a vossa salvação com temor e tremor (Filipenses 2.12). Isto pelo apegar-se a palavra e sacramento, pelos quais Deus Espírito Santo nos fortalece para que possamos lutar, resistir e servir.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

M E D I T A Ç Õ E S    Q U A R E S M A I S
O SERVO SOFREDOR - A história da paixão de Cristo VIII
A quem buscais?

     Tendo, pois, Judas recebido a escolta e, dos principais sacerdotes e dos fariseus, alguns guardas, chegou a este lugar com lanternas, tochas e armas.  Sabendo, pois, Jesus todas as coisas que sobre ele haviam de vir, adiantou-se e perguntou-lhes: A quem buscais?  Responderam-lhe: A Jesus, o Nazareno. Então, Jesus lhes disse: Sou eu. Ora, Judas, o traidor, estava também com eles.  Quando, pois, Jesus lhes disse: Sou eu, recuaram e caíram por terra (João 18.3-6).

      A humilhação de Jesus começou com sua concepção na virgem Maria. O santo Filho de Deus aceitou ser concebido e nascer da virgem da Maria que, mesmo sendo muito temente a Deus, era de natureza pecadora como todos nós. Que humilhação para o santo, unigênito Filho de Deus, nascer duma criatura corrompida pelo pecado, como todos nós. Esta humilhação aumentou gradativamente até sua morte na cruz e sepultamento. Ele se esvaziou, assumindo a forma de servo, tornando-se em semelhança de homens; e, reconhecido em figura humana (Filipenses 2.7). Agora, sabendo tudo o que lhe iria acontecer, levantou-se do seu lugar de oração e se entregou voluntariamente às mãos de seus inimigos. Para isso disse a seus discípulos: Levantai-vos, vamos! Eis que o traidor se aproxima (Mateus 26.46).
     Jesus dirigiu-se à entrada do jardim, onde estavam os outros discípulos. Ele foi para se enfrentar aos inimigos e proteger seus discípulos. Os dois grupos se encontram. O pequeno grupo, com Jesus à frente; e o grupo maior, com Judas à frente. O nome Judas significa: objeto de louvor. Para isso Deus o havia criado, bem como toda a humanidade. Para isso Jesus tinha escolhido Judas para ser apóstolo. Mas eis que Satanás, que seduziu a humanidade e também a Judas, os reduziu a um objeto de horror. Atrás de Judas uma grande turba (Mateus 26.47), os principais sacerdotes, os anciãos do povo, guardas do templo e um capitão com alguns soldados. Na ponta desta turba estava Judas. E todos eles dirigidos por Satanás.
     O quadro não se alterou em nossos dias. A igreja é um grupo pequeno, indefeso. Mas Jesus lhes diz: Não temais, ó pequenino rebanho (Lc 12.32). O grupo dos inimigos de Cristo é grande, mesmo assim, temem a igreja e a combate com violência.
    Jesus vai ao encontro deles. Se o primeiro Adão, quando Deus o chamou se escondeu, o segundo Adão, Jesus, voluntariamente se apresenta para a luta e o sofrimento. Jesus perguntou: A quem buscais? Responderam-lhe: A Jesus, o Nazareno. A resposta visava humilhar Jesus e ao mesmo tempo acalmar suas próprias consciências, dizendo para si mesmos: Jesus é somente um homem, o homem de Nazaré, nada mais. Jesus respondeu: Sou eu! Quando Jesus lhes disse: Sou eu! Recuaram apavorados e caíram para trás. Não esperavam encontrar Jesus de maneira tão fácil e que ele se apresentasse voluntariamente. Por outro, foi mais uma demonstração do poder de Jesus. Mas Jesus ainda não os derrubou em definitivo. Era somente uma séria advertência. Jesus ainda não veio para julgar, mas para salvar (Jo 3.17), para tanto lhes revelou um pouco de seu poder, para induzi-los ao arrependimento, permitindo que se levantassem novamente. Mas chegará a hora em que os inimigos de Cristo cairão para não mais se levantarem, para serem julgados e condenados ao fogo eterno. Isto será no dia do juízo final.
     A quem buscais? O que nós estamos buscando? Buscamos sinceramente a Cristo ou as coisas do mundo. A quem buscais? Nós queremos responder esta pergunta em humilde arrependimento e apego a Cristo: Buscamos a Jesus, o Nazareno! Nosso querido Salvador.


A confissão é um ato de grande amor 
 Beata Teresa de Calcutá
     A confissão é um ato magnífico, um ato de grande amor. Só aí podemos entregar-nos enquanto pecadores, portadores de pecado, e só da confissão podemos sair como pecadores perdoados, sem pecado.
       A confissão nunca é mais do que humildade em ação. Dantes chamávamos-lhe penitência mas trata-se na verdade de um sacramento de amor, do sacramento do perdão. Quando se abre uma brecha entre mim e Cristo, quando o meu amor faz uma fissura, qualquer coisa pode vir preencher essa falha. A confissão é esse momento em que eu permito a Cristo suprimir de mim tudo o que divide, tudo o que destrói. A realidade dos meus pecados deve vir primeiro. Quase todos nós corremos o perigo de nos esquecermos de que somos pecadores e de que nos devemos apresentar à confissão como tais. Devemos dirigir-nos a Deus para Lhe dizer quão pesarosos estamos de tudo o que possamos ter feito que O tenha magoado.
      O confessionário não é um local para conversas banais ou para tagarelices. Aí preside um único tema – os meus pecados, o meu arrependimento, como vencer as minhas tentações, como praticar a virtude, como crescer no amor a Deus.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012


M E D I T A Ç Õ E S     Q U A R E S M A I S
 O  SERVO  SOFREDOR -  A história da paixão de Cristo VII
Vigiai e orai

      Vigiai e orai, para que não entreis em tentação; o espírito, na verdade, está pronto, mas a carne é fraca (Mateus 26.41).


     A agonia do mestre é grande. Grande também sua preocupação com seus discípulos. Jesus interrompe seu momento de oração e volta aos discípulos. Talvez buscasse neles um pouco de amparo, mas ele os encontrou dormindo. Envolvidos pela tristeza e a não compreensão do que estava acontecendo, dormiram. A tristeza enche muitas vezes a alma de sono. Como somos iguais aos discípulos. Jesus os adverte: Vigiai e orai, para que não entreis em tentação; o espírito, na verdade, está pronto, mas a carne é fraca. O espírito é o “novo homem”, a nova vida, a fé, criada pelo Espírito Santo. Conforme esta fé, estamos dispostos a abandonar a própria vida para seguir a Cristo. Mas ainda estamos na carne. Temos nossa natureza carnal, nosso “velho homem”, que sempre de novo nos puxam de volta ao pecado, para amarmos o mundo e as coisas que há no mundo, e dessa fonte procedem os maus pensamentos, o medo, o pavor (Mateus 15.19). Assim existe dentro dos cristãos uma luta constante entre a nova vida e a natureza carnal, ou como costumamos dizer: entre o novo e o velho homem. Daí a advertência: Vigiai e orai. Devemos examinar nossos pensamentos e desejos à luz da palavra de Deus e combater as investidas de Satanás. Orai! Buscai forças, pela oração, junto a Deus. Ele tem todo o poder e ordenou: Pedi, e dar-se-vos-á; buscai, e achareis; batei, e abrir-se-vos-á (Lucas 11.9).

      O que fazem os discípulos nesta hora tão difícil e perigosa? Eles dormem. Vencidos pela tristeza, dormem. Um quadro da Igreja? Um quadro de nossa própria vida? Diante de dificuldades desanimamos e nos tornamos sonolentos, quando deveríamos vigiar e orar. O que fazem os inimigos? Eles não têm sono. Eles trabalham, correm, planejam e lutam. Judas não teve sono. Parece que no caminho do mal não se sofre desânimo. Vede quantos sacrifícios, quantas lutas os inimigos realizam. Lembramos quantos sacrifícios, por exemplo, em tempo, esforços e dinheiro os homens de mundo levantam em prol do carnaval? Será que os membros da igreja estariam dispostos a fazer também tão grandes sacrifícios em prol da causa de Cristo? O que fazem os membros da Igreja durante estes dias tão perigosos, em que muitos cristãos jovens são tentados e caem nas garras de Satanás? Vigiai e orai!


Do Ofício de Leituras:
Do Tratado sobre a Oração do Senhor, de São Cipriano, bispo e mártir
(Séc.III)
Quem nos deu a vida também nos ensinou a orar
     Os preceitos evangélicos, irmãos caríssimos, não são outra coisa que ensinamentos divinos, fundamentos para edificar a esperança, bases para consolidar a fé, alimento para revigorar o coração, guias para mostrar o caminho, garantias para obter a salvação. Enquanto instruem na terra os espíritos dóceis dos que crêem, eles os conduzem para o Reino dos céus.
     Outrora quis Deus falar e fazer-nos ouvir de muitas maneiras pelos profetas, seus servos. Mas muito mais sublime é o que nos diz o Filho, a Palavra de Deus, que já estava presente nos profetas e agora dá testemunho pela sua própria voz. Ele não manda mais preparar o caminho
para aquele que há de vir, mas vem, ele próprio, mostrar-nos e abrir-nos o caminho para que nós, outrora cegos e imprevidentes,errantes nas trevas da morte, iluminados agora pela luz da graça, sigamos o caminho da vida, sob a proteção e guia do Senhor.
     Entre as exortações salutares e os preceitos divinos com que orienta seu povo para a salvação, o Senhor ensinou o modo de orar e nos instruiu e aconselhou sobre o que havemos de pedir. Quem nos deu a vida, também nos ensinou a orar com a mesma bondade com que se dignou conceder-nos tantos outros benefícios, a fim de que, dirigindo-nos ao Pai com a súplica e oração que o Filho nos ensinou, sejamos mais facilmente ouvidos.
     Jesus havia predito que chegaria a hora em que os verdadeiros adoradores adorariam o Pai em espírito e em verdade. E cumpriu o que prometera. De fato, tendo nós recebido por sua graça santificadora o Espírito e a verdade, podemos adorar a Deus verdadeira e espiritualmente
segundo os seus ensinamentos.
     Pode haver, com efeito, oração mais espiritual do que aquela que nos foi ensinada por Cristo, que também nos enviou o Espírito Santo? Pode haver prece mais verdadeira aos olhos do Pai do que aquela que saiu dos lábios do próprio Filho que é a Verdade? Assim, orar de maneira
diferente da que o Senhor nos ensinou não é só ignorância, mas também culpa, pois ele mesmo disse: Anulais o mandamento de Deus a fim de guardar as vossas tradições (cf. Mc 7,9).
     Oremos, portanto, irmãos caríssimos, como Deus, nosso Mestre, nos ensinou. A oração agradável e querida por Deus é a que rezamos com as suas próprias palavras, fazendo subir aos seus ouvidos a oração de Cristo.
     Reconheça o Pai as palavras de seu Filho, quando oramos. Aquele que habita interiormente em nosso coração, esteja também em nossa voz; e já que o temos junto ao Pai como advogado por causa de nossos pecados, digamos as palavras deste nosso advogado quando, como pecadores,
suplicarmos por nossas faltas. Se ele disse que tudo o que pedirmos ao Pai em seu nome nos será dado (cf. Jo 14,13), quanto mais eficaz não será a nossa súplica para obtermos o que pedimos em nome de Cristo, se pedirmos com sua própria oração!

domingo, 26 de fevereiro de 2012


M E D I T A Ç Õ E S    Q U A R E S M A I S
O SERVO SOFREDOR - A história da paixão de Cristo VI

Passa de mim este cálice
     Pai, se queres, passa de mim este cálice; contudo, não se faça a minha vontade, e sim a tua.  Então, lhe apareceu um anjo do céu que o confortava.  E, estando em agonia, orava mais intensamente. E aconteceu que o seu suor se tornou como gotas de sangue caindo sobre a terra (Lucas 22.42-44).

     Horrível coisa é cair nas mãos do Deus vivo, (Hb 10.31) afirma o escritor de Hebreus. Basta acompanhar Jesus passo a passo em sua paixão para ver o quanto isso é verdade.
     Jesus está sozinho. Nesta obra da redenção da humanidade, ninguém pôde lhe ajudar. Ele mesmo afirma pelo profeta: O lagar, eu o pisei sozinho (Isaías 63.3). Com o rosto prostrado em terra, Jesus orou a seu Pai: Pai, se queres, passa de mim este cálice; contudo, não se faça a minha vontade, e sim a tua. Se possível, mas não era possível. Este era o único caminho para salvar a humanidade. Jesus era o único que poderia levar ao fim este duro empreendimento do amor divino. Pai se possível passa de mim este cálice. Mas o Pai, em profundo amor para com a humanidade, para contigo e comigo, não passou o cálice. Jesus orou três vezes. Sua agonia aumentou a ponto de suor gotas de sangue. Se há pouco estava triste até a morte por ter sido feito pecado por nós, agora está em agonia por a ira de Deus estar sendo derramado sobre ele, nosso irmão na carne, por causa de nossos pecados. Agora estava sentindo o abandono de Deus, as agonias da morte, os horrores infernais. Tudo isto arde em sua alma santa, a ponto de suar sangue. São nossos pecados que o fazem penar assim. Quão horrível é o pecado. Quão grande a ira de Deus sobre o pecado. Eis ali o nosso substituto. Sofre! Sofre por ti e por mim. Seu sofrimento foi tão grande que foi necessário vir um anjo do céu, para o animar e fortalecer. O que estava acontecendo a Jesus para que uma criatura viesse consolar o Criador? A Escritura não nos revela os detalhes. Provavelmente o sofrimento de Jesus foi tão grande, sua humilhação tão profunda que em sua natureza humana perdeu de vista o porquê desse seu sofrer. Foi necessário vir um anjo para o consolar. Para lhe mostrar a razão do seu sofrer que é a salvação da humanidade. Após esta luta com a morte, na qual experimentou o profundo abandono de Deus e os terrores infernais, Jesus se levantou e foi a seus discípulos.
     Os apóstolos não se cansam de falar sobre o sofrimento de Jesus. Paulo escreveu: Aquele que não poupou o seu próprio Filho, antes, por todos nós o entregou, porventura, não nos dará graciosamente com ele todas as coisas? (Romanos 8.32) O apóstolo Pedro declarou: Sabendo que não foi mediante coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que fostes resgatados do vosso fútil procedimento que vossos pais vos legaram, mas pelo precioso sangue, como de cordeiro sem defeito e sem mácula, o sangue de Cristo (1Pedro 1.18-19). Tudo isso Jesus suportou para que todo aquele que nele crê não precisa temer mais a morte. Nesta fé, Estevão ao ser apedrejado exclamou: Eis que vejo os céus abertos e o Filho do Homem, em pé à destra de Deus (Atos 7.6). E o apóstolo Paulo afirma: Porquanto, para mim, o viver é Cristo, e o morrer é lucro (Filipenses 1.21).
      A história nos mostra muitas pessoas que enfrentaram a morte corajosamente. Mas enfrentar a morte considerá-la lucro, enfrentá-la com confiança e esperança só aquele que está em Cristo.
      Tememos a morte por causa do pecado, porque não fomos criados para a morte e sim para a vida. A morte é castigo sobre o pecado, é uma intromissão em nossa vida. Mas Jesus venceu a morte, e nos diz: Não temais: Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, ainda que morra, viverá; e todo o que vive e crê em mim não morrerá, eternamente (João 11.25-26). E ao malfeitor na cruz, Jesus disse: Em verdade te digo que hoje estarás comigo no paraíso (Lucas 23.43).

sábado, 25 de fevereiro de 2012


I DOMINGO DA QUARESMA

Pe. David Teixeira, sdb
«Era tentado…»

                O início deste novo tempo propõe-nos as tentações de Jesus no deserto como primeira etapa de preparação para a Páscoa. A proximidade do Reino de Deus é certeza de caminho novo a ser percorrido. O tempo oportuno é este. Por isso, “arrependei-vos e acreditai no Evangelho”. Esta semana queremos fazer-nos ajudar da Mensagem de Sua Santidade Bento XVI para este tempo da Quaresma.

 EVANGELHO Mc 1, 12-15
Naquele tempo, o Espírito Santo impeliu Jesus para o deserto. Jesus esteve no deserto quarenta dias e era tentado por Satanás. Vivia com os animais selvagens e os Anjos serviam-n’O. Depois de João ter sido preso, Jesus partiu para a Galileia e começou a pregar o Evangelho, dizendo: «Cumpriu-se o tempo e está próximo o reino de Deus. “Arrependei-vos e acreditai no Evangelho».

 “Naquele tempo, o Espírito Santo impeliu Jesus para o deserto.” - Depois do batismo de Jesus onde Deus opta por ele e o dá a conhecer como seu filho amado, é, agora, a vez de Jesus fazer a sua opção por Deus. Para isso, é conduzido para o deserto, pelo Espírito Santo.

“Jesus esteve no deserto quarenta dias…”  - Jesus permanece no deserto quarenta dias. É um número simbólico que nos recorda a estadia do povo de Israel no deserto após o êxodo do Egito, mas procura dar a entender também que a opção de Jesus não foi fácil nem tomada de ânimo leve: demorou o seu tempo.

“… e era tentado por Satanás.”  - O que aconteceu com Jesus nesse tempo de tomada de opção? Foi tentado pelo espírito da mentira e da discórdia. Assim, muito breve e simplesmente, Marcos faz-nos entrever a humanidade de Jesus e como também ele sofreu tentações.

“Depois de João ter sido preso, Jesus partiu para a Galileia e começou a pregar o Evangelho…” - Superada a tentação e tomada a opção por Deus, não se deixando demover nem pelo fato de João ter sido preso, Jesus começou a divulgar a notícia de Deus às pessoas da Galileia, zona em contacto com pagãos que não conheciam a Deus.

 “Cumpriu-se o tempo e está próximo o reino de Deus...” - Continuando a mensagem escatológica de João, Jesus diz que o tempo de Deus tinha finalmente chegado e que o seu reino estava próximo. Não havia, portanto, razões para adiar. E tal como ele fizera a sua opção, também eles deveriam fazer a sua opção por Deus.

  “Arrependei-vos e acreditai no Evangelho”. - Respondendo às inquietações formuladas nos corações das pessoas da Galileia - como tomar a opção por Deus que se fazia tão próximo? -, Jesus aconselha o arrependimento e o acolhimento e vivência do Evangelho, a Palavra de Deus.

Meditação (do Papa Bento XVI)
Jejuar, sem dúvida, é bom para o bem-estar, mas para nós é em primeiro lugar uma «terapia» para curar tudo o que nos impede de nos conformarmos com a vontade de Deus.
O jejum ajuda-nos a mortificar o nosso egoísmo e a abrir o coração ao amor de Deus e do próximo, primeiro e máximo mandamento da nova Lei e síntese do Evangelho.
São Pedro Crisólogo disse: «O jejum é a alma da oração e a misericórdia é a vida do jejum. Quem reza jejue. Quem jejua tenha misericórdia».
Com o jejum e com a oração permitimos que Ele sacie a fome mais profunda que vivemos no íntimo: a fome e a sede de Deus.
A prática fiel do jejum contribui para conferir unidade à pessoa, corpo e alma, ajudando-a a evitar o pecado e a crescer na amizade e intimidade com o Senhor.
«Usemos de modo mais sóbrio palavras, alimentos, bebidas, sono e jogos, e permaneçamos mais vigilantes».

 Oração
                Concede-me aproveitar esta Quaresma para aprofundar na minha opção por ti. Para tal, dá-me forças para me arrepender e converter nalguns aspectos da minha vida e dá-me também coragem e perseverança para acolher e praticar a tua Palavra.


M E D I T A Ç Õ E S    Q U A R E S M A I S
O SERVO SOFREDOR - A história da paixão de Cristo V


Vigiai comigo
  Então, lhes disse: A minha alma está profundamente triste até à morte; ficai aqui e vigiai comigo. (Mateus 26.38)

     Era noite quando saíram da cidade de Jerusalém. Fora da cidade estavam as muitas tendas dos visitantes que vieram para a grande festa da Páscoa. Jesus atravessou o riacho Cedron, que significa turvo. Nele desembocava o esgoto do templo. O riacho separava Jerusalém do monte das Oliveiras. Entraram no jardim do Getsêmani. Logo na entrada, Jesus deixou oito dos seus discípulos. A eles não foi dado ver a profunda humilhação de Jesus. Ele levou consigo somente a Pedro, João e Tiago, os que haviam presenciado a transfiguração. Com estes três, Jesus continuou caminhando para o interior do Jardim. De repente os discípulos notaram que Jesus suspirava. Apreensivos olharam para ele. E receberam de Jesus a surpreendente resposta: A minha alma está profundamente triste até à morte.
     Aquele que é a fonte da vida e de toda a alegria está triste. Jesus que consolou a muitos está desconsolado. Por quê? Os discípulos estão desnorteados. Nossa razão também não o compreende. A Escritura afirma: Aquele que não conheceu pecado, ele (Deus Pai) o fez pecado por nós; para que, nele, fôssemos feitos justiça de Deus (2 Coríntios 5.21). O profeta Isaías afirmou: Certamente, ele tomou sobre si as nossas enfermidades e as nossas dores levou sobre si; e nós o reputávamos por aflito, ferido de Deus e oprimido (Isaías 53.4). Ele tomou sobre si os pecados de toda a humanidade. Os pecados pelos quais eram sacrificados os cordeiros no tempo, até que viesse o Cordeiro de Deus para tirar o pecado do mundo (Jo 1.29). Jesus, como verdadeiro Deus e verdadeiro homem, tomou os pecados da humanidade voluntariamente sobre si. Sentiu estes pecados em sua alma santa como se fossem seus próprios.
    Sabemos quanto sofrimento, quanta dor de consciência causa o pecado. De início o pecado parece proporcionar alegria, mas uma vez provado, é amargo. A consciência desperta, acusa e leva ao desespero. Conta-se que o filósofo francês Voltair passou a vida zombando de Cristo. No leito da morte sua consciência despertou. Ele desesperou. Sentiu os horrores do inferno. Gritou tão desesperadamente que seu enfermeiro particular não o suportou e fugiu da casa dele. O historiador judaico Josefo conta que o rei Aristóbulo da palestina, que mandou matar injustamente seu próprio irmão, dias depois, quando sua consciência despertou e passou a acusá-lo com tanta força que ele veio a falecer sob o peso do desespero. Sem dúvida você também conhece, em parte ou muito, o que significa o despertar da consciência.
   Tal angústia Jesus sofreu ao tomar sobre si os pecados da humanidade. Pelo salmista Jesus diz: Não têm conta os males que me cercam; as minhas iniqüidades me alcançaram, tantas, que me impedem a vista; são mais numerosas que os cabelos de minha cabeça, e o coração me desfalece (Salmos 40.12). A compreensão desta profunda humilhação de Jesus nossa mente corrupta não é capaz de captar no seu todo.
Só podemos contemplar em profunda adoração esta verdade: Aquele que não conheceu pecado, ele o fez pecado por nós; para que, nele, fôssemos feitos justiça de Deusexclamamos em oração: “Grato sou por tanto amor, meu bendito Salvador”. E quando nossa consciência nos acusar, podemos refugiar-nos em Cristo. Nele temos perdão dos pecados, vida e eterna salvação. Jubilosos triunfamos com o apóstolo Paulo: Quem intentará acusação contra os eleitos de Deus? É Deus quem os justifica (Romanos 8.33).

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012


M E D I T A Ç Õ E S     Q U A R E S M A I S
O SERVO SOFREDOR - A história da paixão de Cristo IV

Satanás te reclamou

     Simão, Simão, eis que Satanás vos reclamou para vos peneirar como trigo!  Eu, porém, roguei por ti, para que a tua fé não desfaleça; tu, pois, quando te converteres, fortalece os teus irmãos (Lucas 22.31-32).

     Jesus advertiu os discípulos, dizendo lhes que nesta noite todos eles se escandalizariam nele. Pedro retrucou que nunca faria isto. Com amor e firmeza, Jesus passou a mostrar-lhes o poder da tentação. Satanás vos reclamou.     
     Quem é Satanás? Ele é um inimigo poderoso. A antiga serpente, a quem pertencemos por nascimento. Seu reino é vasto. No carnaval que passou, vimos seu tremendo poder. Milhares de pessoas lhe pertencem. São seus escravos. Retorcem-se quais vermes no fogo, mas não têm poder para se libertarem dele. O apóstolo afirma: Éramos, por natureza, filhos da ira, como também os demais (Efésios 2.3). Cristo, o Senhor mais forte, veio para destruir as obras do diabo (1 Jo 3.8) e libertar a humanidade do poder e da escravidão de Satanás. E todo daquele que arrependido de seus pecados confia na graça de Cristo é perdoado, liberto da escravidão de Satanás e volta à comunhão com Deus. Mas o fato de ser, agora, filho de Deus pela fé, não significa que não será mais agredido e tentado por Satanás. Pelo contrário, Satanás dobra sua astúcia em relação aos filhos de Deus, para reconquistá-los. Assim ele tentou a Jesus, que teve que lhe dizer: Arreda Satanás (Mateus 16.23). Conseguiu dominar Judas, agora quer especialmente a Pedro e aos demais apóstolos. Jesus adverte a Pedro, mas este, cegado por sua nefasta autoconfiança, mesmo advertido por Jesus, não reconhece o perigo. Eis as características do orgulho: Confiamos em nossas próprias forças, rejeitamos a admoestação de Jesus, menos prezamos o próximo, e então segue a queda. Cada dia este quadro se repete com muitos cristãos.
    Como Jesus deve ter ficado triste ao ver como Pedro e os demais discípulos rejeitavam sua admoestação, quando deveriam ter suplicado: Senhor! Ampara-nos, não nos deixes cair. Fortalece-nos. Não permitas que Satanás nos prostre ao chão. Mesmo sem ser pedido, Jesus orou por eles. Especialmente por Pedro: Roguei por ti, para que tua fé não desfalecesse. Jesus, o bom pastor, ora também por nós. E quando nós nos desviamos, ele nos procura também como procurou a ovelha perdida. Jesus disse ainda a Pedro: Quando te converteres, fortalece os irmãos. Basta ler as cartas pastorais de Pedro, e ver como Pedro consola os irmãos. Ele escreve em sua carta: Lançando sobre ele toda a vossa ansiedade, porque ele tem cuidado de vós. Sede sóbrios e vigilantes. O diabo, vosso adversário, anda em derredor, como leão que ruge procurando alguém para devorar (1 Pedro 5.7-8).

DO OFÍCIO DE LEITURAS:
Do Tratado contra as heresias, de Santo Irineu, bispo
(Séc. II)
A amizade de Deus
     
Nosso Senhor, o Verbo de Deus, que primeiro atraiu os homens para serem servos de Deus, libertou em seguida os que lhe estavam submissos, como ele próprio disse a seus discípulos: Já não vos chamo servos, pois o servo não sabe o que faz o seu senhor. Eu vos chamo amigos, porque vos dei a conhecer tudo o que ouvi de meu Pai (Jo 15,15). A amizade de Deus concede a imortalidade aos que a obtém.
      No princípio, Deus formou Adão, não porque tivesse necessidade do homem, mas para ter alguém que pudesse receber os seus benefícios. De fato, não só antes de Adão, mas antes da criação, o Verbo glorificava seu Pai, permanecendo nele, e era também glorificado pelo Pai, como ele mesmo declara: Pai, glorifica-me com a glória que eu tinha junto de ti antes que o mundo existisse (Jo 17,5).
      Não foi também por necessitar do nosso serviço que Deus nos mandou segui-lo, mas para dar-nos a salvação. Pois seguir o Salvador é participar da salvação, e seguir a luz é receber a luz.
Quando os homens estão na luz, não sã o eles que a iluminam, mas são iluminados e tornam-se resplandecentes por ela. Nada lhe proporcionam, mas dela recebem o benefício e a iluminação.
      Do mesmo modo, o serviço que prestamos a Deus nada acrescenta a Deus, porque ele não precisa do serviço dos homens. Mas aos que o seguem e servem, Deus concede a vida, a incorruptibilidade e a glória eterna. Ele dá seus benefícios aos que o servem precisamente porque o servem e aos que o seguem precisamente porque o seguem; mas não recebe deles nenhum benefício, porque é rico, perfeito e de nada precisa.
      Se Deus requer o serviço dos homens é porque, sendo bom e misericordioso, deseja conceder os seus dons aos que perseveram no seu serviço. Com efeito, Deus de nada precisa, pias o homem é que precisa da comunhão com Deus.
      É esta, pois, a glória do homem: perseverar e permanecer no serviço de Deus. Por esse motivo dizia o Senhor a seus discípulos: Não fostes vós que me escolhestes, mas fui e u que vos escolhi (Jo 15,16), dando assim a entender que não eram eles que o glorificavam seguindo-o, mas, por terem seguido o Filho de Deus, eram por ele glorificados. E disse ainda: Quero que estejam comigo onde eu estiver, para que eles contemplem a minha glória (Jo 17,24).

 DECÁLOGO SOBRE O QUE É A QUARESMA

     
O tempo litúrgico e espiritual da Quaresma consiste em quarenta dias de caminhada para a Páscoa. A Quaresma é sempre tempo e dom de Deus para a conversão, para a renovada e permanente consciencialização da obra de salvação em Jesus Cristo e por Jesus Cristo. O jejum, a esmola e a oração são os três meios tradicionais e fecundos para viver este tempo de graça, este dia – quarenta dias – de salvação.

Assim, a Quaresma é:

1 – A Quaresma nasceu como uma reflexão pedagógica de um aspecto central do mistério cristão celebrado no tríduo pascal. O centro é Jesus Cristo. 

2 – A Quaresma foi sempre um tempo litúrgico forte do Cristianismo. É um conjunto de quarenta dias, cuja razão de ser originária foi a de imitar o jejum do Senhor antes do início do seu ministério apostólico.

3 – A Quaresma é um tempo propício para viver na e da Palavra de Deus. Viver na e da Palavra de Deus significa ler, rezar, meditar, abrir o coração a ela, rever a nossa vida através dela. Temos de nos encher da Palavra de Deus para que ela seja a música e a letra da nossa alma e a partitura do nosso coração.

4 – Toda a liturgia da Quaresma, quer nos seus ritos como na Liturgia da Palavra, contém muitos símbolos que auxiliam no caminho cristão da conversão. Estes símbolos são o deserto, a luz, a saúde, a água, o perdão, a libertação, a cruz e a ressurreição.

5 – Os personagens bíblicos que ilustram o caminho quaresmal são José, filho de Jacó, Ester, a casta Susana, Jeremias, o cego de nascença, o filho pródigo, o pai do filho pródigo, a samaritana, a mulher adúltera e arrependida, Zaqueu, o bom ladrão e, sobretudo, Jesus de Nazaré.

6 – A Quaresma encontra na oração o ambiente mais apropriado. A oração quaresmal deve ser mais frequente, feita em clima de humildade, de perseverança e de confiança. É oração de súplica e de petição. A oração na Quaresma deve realçar ainda mais as suas dimensões bíblica e litúrgica, de grande riqueza e de grande variedade durante os quarenta dias deste tempo. Assim, a oração litúrgica deve ser mais pausada, cordial, humilde, pobre e profunda.

7 – O jejum é o segundo caminho quaresmal, como afirma o Papa São Leão Magno. Trata-se do jejum do homem velho, do jejum do pecado, da renúncia aos caminhos pessoais para abraçar os caminhos de Jesus Cristo. Trata-se da privação de algo em favor de alguém necessitado. O jejum não é um exercício meramente voluntarista ou até masoquista. É uma opção de purificação e de intercessão.

8 – A normativa eclesiástica da abstinência da carne durante as sextas feiras da quaresma e do jejum e da abstinência na quarta-feira de cinzas e na sexta-feira santa podem ajudar a viver esta segunda via quaresmal e penitencial acima citada.

9 – A esmola, a caridade, a solidariedade é o terceiro dos caminhos tradicionais da Quaresma. Tantos casos de injustiça para viver a esmola, a caridade quaresmal!

10 – A Quaresma é um tempo para viver a esmola, não como um fim em si mesmo, mas como um meio, um caminho para a Páscoa. Ajudará muito recorrer a algumas práticas devocionais. Por exemplo, a Via-Sacra nas sextas feiras deve ser potenciada e recuperada no meio de uma sociedade onde a realidade e o mistério da cruz continuam actuais e presentes. Outras formas esplêndidas e sempre fecundas a ter em conta neste caminho quaresmal da oração será, por exemplo, fazer um dia de retiro ou de exercícios espirituais que nos cumularão de força, de graça e de vida, ou participar em conferências quaresmais, lectio divina, etc.  

LEIA ABAIXO A NOSSA 3ª MEDITAÇÃO QUARESMAL

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

M E D I T A Ç Õ E S     Q U A R E S M A I S

O SERVO SOFREDOR - A história da paixão de Cristo III

Todos vós vos escandalizareis

      E, tendo cantado um hino, saíram para o monte das Oliveiras.  Então, Jesus lhes disse: Esta noite, todos vós vos escandalizareis comigo; porque está escrito: Ferirei o pastor, e as ovelhas do rebanho ficarão dispersas. Mas, depois da minha ressurreição, irei adiante de vós para a Galiléia. Disse-lhe Pedro: Ainda que venhas a ser um tropeço para todos, nunca o serás para mim. Replicou-lhe Jesus: Em verdade te digo que, nesta mesma noite, antes que o galo cante, tu me negarás três vezes. Disse-lhe Pedro: Ainda que me seja necessário morrer contigo, de nenhum modo te negarei. E todos os discípulos disseram o mesmo (Mateus 26.30-35).

     Tendo cantado um hino, saíram. Com este hino Jesus encerrou a cerimônia do comer o cordeiro pascal, conforme a lei de Moisés. Neste momento também havia instituiu o jantar do Novo Testamento, a Santa Ceia. Então orou fervorosamente por seus discípulos, conforme o lemos na oração sumo-sacerdotal, no evangelho de João capítulo 17. Os hinos cantados nesta ocasião eram, provavelmente, os Salmos 115 a 118. Leia-os com atenção. Então saíram. Era noite. Noite iluminada pela lua cheia.

     Jesus dirigiu-se com seus discípulos, como de costume, para o Monte das Oliveiras. Lugar onde, já durante toda a semana, orou antes de seguir para a casa de Lázaro, onde pousavam.

     Caminharam pensativos. Jesus estava preocupado com seus discípulos, que ainda nada compreenderam o que estava por acontecer. Será também essa nossa principal preocupação nestes dias da quaresma: a salvação da humanidade?

     Jesus lhes disse: Esta noite, todos vós vos escandalizareis comigo; porque está escrito: Ferirei o pastor, e as ovelhas do rebanho ficarão dispersas (Zc 13.7). Uma severa advertência. Os discípulos estavam há três anos em companhia de Jesus, mesmo assim, iriam fraquejar. Seria possível? O mestre o disse. Eles sabiam que a palavra do Mestre não falha. Mesmo assim, não a aceitam.

     O que fazem os discípulos? Fazem o que nós muitas vezes também fazemos. Revidaram a advertência. Os que há pouco se assustaram com a palavra de Jesus: Um de vós me trairá, cônscios de suas fraquezas, perguntando: Mestre sou eu? Agora não aceitam a advertência. Pedro olha para seus colegas e conclui: Estes são fracos, deles de fato nada se pode esperar, e diz a Jesus: Ainda que venhas a ser um tropeço para todos, nunca o serás para mim. Pobre Pedro! Jesus olhou para ele e lhe disse sob juramento: Em verdade te digo que, nesta mesma noite, antes que o galo cante, tu me negarás três vezes. Em sua autoconfiança Pedro respondeu resoluto: Ainda que me seja necessário morrer contigo, de nenhum modo te negarei. E todos os discípulos disseram o mesmo (Mateus 26.32-35). Eles o disseram na sinceridade de seus corações, pois amavam o Salvador. Pobres discípulos.

     Como é necessário vigiar, para que nosso próprio coração não nos engane. Pensamentos e sentimentos são preza fácil de nossa natureza carnal, de onde procede a autoconfiança, o egoísta e a não aceitação da palavra de Deus, quer seja a advertência ou o consolo. Precisamos estar atentos à palavra de Deus escrita e pedir ao Espírito Santo que nos guie.

     Satanás por sua astúcia conseguiu enganar os discípulos. Firmaram-se em seus próprios pensamentos e suas próprias forças. A queda era inevitável. Por vezes o entusiasmo nos afasta de Jesus, outras vezes é o desânimo. Importa sempre examinar a razão de nosso proceder. Jesus orou por eles ao Pai, para que não permitisse que Satanás tivesse domínio sobre eles. Nesta oração também nós estamos incluídos.


DO OFÍCIO DE LEITURAS:
Das Homílias do Pseudo-Crisóstomo
(Séc. IV)

A oração é a luz da alma     A oração, o diálogo com Deus, é um bem incomparável, porque nos põe em comunhão íntima com Deus. Assim como os olhos do corpo são iluminados quando recebem a luz, a alma que se eleva para Deus é iluminada por sua luz inefável. Falo da oração que não é só uma atitude exterior, mas que provém do coração e não se limita a ocasiões ou horas determinadas, prolongando-se dia e noite, sem interrupção.
     Com efeito, não devemos orientar o pensamento para Deus apenas quando nos aplicamos à oração; também no meio das mais variadas tarefas - como o cuidado dos pobres, as obras úteis de misericórdia ou quaisquer outros serviços do próximo - é preciso conservar sempre vivos o desejo e a lembrança de Deus. E assim, todas as nossas obras, temperadas com o sal do amor de Deus, se tornarão um alimento dulcíssimo para o Senhor do universo. Podemos, entretanto, gozar continuamente em nossa vida do bem que resulta da oração, se lhe dedicarmos todo o tempo que nos for possível.
     A oração é a luz da alma, o verdadeiro conhecimento de Deus, a mediadora entre Deus e os homens. Pela oração a alma se eleva até aos céus e une-se ao Senhor num abraço inefável; como uma criança que, chorando, chama sua mãe, a alma deseja o leite divino, exprime seus próprios desejos e recebe dons superiores a tudo que é natural e visível.
     A oração é venerável mensageira que nos leva à presença de Deus, alegra a alma e tranquiliza o coração. Não penses que essa oração se reduza a palavras. Ela é desejo de Deus, amor inexprimível que não provém dos homens, mas é efeito da graça divina, como diz o Apóstolo: Nós não sabemos o que devemos pedir, nem como pedir; é o próprio Espírito que intercede em nosso favor, com gemidos inefáveis (Rm 8,26).
     Semelhante oração, quando o Senhor a concede a alguém, é uma riqueza que não lhe pode ser tirada e um alimento celeste que sacia a alma. Quem a experimentou inflama-se do desejo eterno de Deus, como que de um fogo devorador quê abrasa o coração.
     Praticando-a em sua pureza original, adorna tua casa de modéstia e humildade, torna-a resplandecente com a luz da justiça. Enfeita-se com boas obras, quais plaquetas de ouro, ornamenta-se de fé e de magnanimidade em vez de paredes e mosaicos. Como cúpula e coroamento de todo o edifício, coloca a oração. Assim prepararás para o Senhor uma digna morada, assim terás um esplêndido palácio real para o receber, e poderás tê-lo contigo na tua alma, transformada, pela graça, em imagem e templo da sua presença.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012


M E D I T A Ç Õ E S     Q U A R E S M A I S

O SERVO SOFREDOR - A história da paixão de Cristo II


Glorifica o teu Filho

     "Tendo Jesus falado estas coisas, levantou os olhos ao céu e disse: Pai, é chegada a hora; glorifica a teu Filho, para que o Filho te glorifique a ti, assim como lhe conferiste autoridade sobre toda a carne, a fim de que ele conceda a vida eterna a todos os que lhe deste.  E a vida eterna é esta: que te conheçam a ti, o único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste. Eu te glorifiquei na terra, consumando a obra que me confiaste para fazer; e, agora, glorifica-me, ó Pai, contigo mesmo, com a glória que eu tive junto de ti, antes que houvesse mundo" (Jo 17.1-5).

     Na noite de quinta-feira santa, quando Jesus havia acabado de instituir a Santa Ceia, ele começou a orar em voz alta. Ele disse: Pai, é chegada a hora; glorifica o teu Filho, para que o Filho te glorifique a ti. Era chegada a hora marcada, cuidadosamente preparada pelo Pai desde a eternidade, como o aposto Paulo o atesta: (Ele) nos escolheu nele antes da fundação do mundo (Efésios 1.4). Esta hora foi anunciada em minúcias por muitos profetas, durante quatro mil anos. Esta hora foi ansiosamente esperada por tantos fiéis, por reis e profetas (Lc 10.24). Chegara a hora do sofrimento, da paixão e da morte de Jesus. A hora em que a serpente feriria o descendente da mulher (Gn 3.15), pensando, em sua ilusão, que venceria. Este atrevimento trouxe a derrota a Satanás. Jesus lhe esmagou a cabeça, libertando desta forma os que andavam pelo vale da sombra da morte (Sl 23.3). Jesus veio para destruir as obras do diabo (1 Jo 3.8). A hora da luta final chegara. Jesus se prepara com oração para este momento. Orou ao Pai: Glorifica o teu Filho, para que o Filho te glorifique a ti. Que glória é essa? Vejamos exemplos. A glória de um atleta são suas lutas e vitórias. A glória de um carpinteiro é sua obra, uma mesa, um armário, etc. A glória de Jesus é seu sofrimento, sua morte, sua ressurreição, sua obra salvífica, a salvação da humanidade. Sim, Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna (Jo 3.16).

     O mundo, desde a queda de Adão e Eva, está deitado em pecado, escravizado por Satanás, condenado à eterna condenação. Por mais que se elogie a sabedoria e honra do ser humano, ele está perdido. Ninguém o pode salvar. A justiça de Deus é fulminante: A alma que pecar, essa morrerá (Ezequiel 18.20). Maldito todo aquele que não permanece em todas as coisas escritas no Livro da lei, para praticá-las (Gálatas 3.10). Deus, por ser um Deus justo, não pode voltar atrás. Anjos não podiam ajudar. O homem não pode se ajudar a si mesmo, ele estava eternamente perdido. Mas eis que o Filho de Deus se prontificou a sofrer pela humanidade e libertá-la. Por seu sofrimento a libertou. Possibilitou a volta do pecador a Deus. O restabelecimento da comunhão com Deus, pela fé na graça de Cristo.

     É isto o que agora mais apreciamos, louvamos e glorificamos em Deus, sua obra salvífica por Cristo. Que Deus nos amou e salvou por seu Filho unigênito, Jesus Cristo. Esta é a glória de Jesus: Sua obra salvífica. Todos os feitos de Deus, a criação, a manutenção, os milagres são gloriosos, mas nenhuma obra divina é tão gloriosa e glorifica e o Pai e o Filho como este feito da salvação da humanidade, a salvação pela cruz.

     Esta glória o mundo não vê. Os fariseus, Pilatos, Herodes não a viram, apesar de terem Cristo diante de seus olhos. Até os discípulos ficaram perturbados diante da humilhação de Cristo. Somente no dia de Pentecostes, quando o Espírito encheu seus corações e os iluminou, compreenderam as Escrituras e a magnitude da obra de Cristo. Ainda hoje muitíssimos não vêem a glória de Cristo. O malfeitor na cruz, no entanto, viu a glória de Cristo. Em adoração suplicou: Jesus, lembra-te de mim quando entrares no teu reino (Lc 23.42). Ele viu, mesmo no momento da maior humilhação, que este a seu lado, era seu Salvador, no qual encontrou perdão, vida e eterna salvação. Isto não lhe foi revelado por carne e sangue, por sua inteligência, seu raciocínio, mas o Espírito Santo o lembrou do que aprendera na infância, comparando isto com o que ouviu de Jesus e viu nele, o Espírito Santo o conduziu ao arrependimento e a fé na graça de Cristo.

     É chegada a hora, glorifica o teu Filho. Os discípulos confessaram mais tarde: Vimos a sua glória, glória como a do unigênito do Pai (Jo 1.14). E Jesus lhes havia dito: E a vida eterna é esta: que te conheçam a ti, o único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste (João 17.3).

Do Ofício de Leituras:
Dos sermões de São Leão Magno, papa (Sermo 6 de Quadragesima, 1-2: PL 54,285-287) (Séc. V)
A purificação espiritual por meio do jejum e da misericórdia

     Em todo tempo, amados filhos, a terra está repleta da misericórdia do Senhor (Sl 32,5). A própria natureza é para todo fiel uma lição que o ensina a louvar a Deus, pois o céu e a terra, o mar e tudo o que neles existe proclamam a bondade e a onipotência de seu Criador; e a admirável beleza dos elementos postos a nosso serviço requer da criatura racional uma justa ação de graças.
     O retorno, porém, desses dias que os mistérios da salvação humana marcaram de modo mais especial e que precedem imediatamente a festa da Páscoa, exige que nos preparemos com maior cuidado por meio de uma purificação espiritual.
     Na verdade, é próprio da solenidade pascal que a Igreja inteira se alegre com o perdão dos pecados. Não é apenas nos que renascem pelo santo batismo que ele se realiza, mas também naqueles que desde há muito são contados entre os filhos adotivos.
     É, sem dúvida, o banho da regeneração que nos torna criaturas novas; mas todos têm necessidades de se renovar a cada dia para evitarmos a ferrugem inerente à nossa condição mortal, e não há ninguém que não deva se esforçar para progredir no caminho da perfeição; por isso, todos sem exceção, devemos empenhar-nos para que, no dia da redenção, pessoa alguma seja encontrada nos vícios do passado.
     Por conseguinte, amados filhos, aquilo que cada cristão deve praticar em todo tempo, deve praticá-lo agora com maior zelo e piedade, para cumprir a prescrição, que remonta aos apóstolos, de jejuar quarenta dias, não somente reduzindo os alimentos, mas sobretudo abstendo-se do pecado.
     A estes santos e razoáveis jejuns, nada virá juntar-se com maior proveito do que as esmolas. Sob o nome de obras de bondade; graças a elas, todos os fiéis podem manifestar igualmente os seus sentimentos, por mais diversos que sejam os recursos de cada um.
     Se verdadeiramente amamos a Deus e ao próximo, nenhum obstáculo impedirá nossa boa vontade. Quando os anjos cantaram: Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens de boa vontade (Lc 2,14), proclamavam bem-aventurado, não só pela virtude da benevolência mas também pelo dom da paz, todo aquele que, por amor, se compadece do sofrimento alheio.
     São inúmeras as obras de misericórdia, o que permite aos verdadeiros cristãos tomar parte na distribuição de esmolas, sejam eles ricos, possuidores de grandes bens, ou pobres, sem muitos recursos. Apesar de nem todos poderem ser iguais na possibilidade de dar, todos podem sê-lo na boa vontade que manifestam.