1ª
Leitura (1Rs 19,1-9.11-14): Acab contou a Jezebel tudo que Elias tinha
feito e como tinha passado ao fio da espada todos os profetas de Baal. Então
Jezabel mandou um mensageiro a Elias para lhe dizer: “Os deuses me cumulem de
castigos, se amanhã, a esta hora, eu não tiver feito contigo o mesmo que fizeste
com a vida desses profetas”. Elias ficou com medo e, para salvar sua vida,
partiu. Chegou a Bersabéia de Judá e ali deixou o seu servo. Depois, adentrou o
deserto e caminhou o dia todo. Sentou-se, finalmente, debaixo de um junípero e
pediu para si a morte, dizendo: “Agora basta, Senhor! Tira a minha vida, pois
não sou melhor que meus pais”. E, deitando-se no chão, adormeceu à sombra do
junípero. De repente, um anjo tocou-o e disse: “Levanta-te e come!” Ele abriu
os olhos e viu junto à sua cabeça um pão assado na pedra e um jarro de água.
Comeu, bebeu e tornou a dormir. Mas o anjo do SENHOR veio pela segunda vez,
tocou-o e disse: “Levanta-te e come! Ainda tens um caminho longo a percorrer”.
Elias levantou-se, comeu e bebeu, e, com a força desse alimento, andou quarenta
dias e quarenta noites, até chegar ao Horeb, o monte de Deus. Chegando ali,
entrou numa gruta, onde passou a noite. Então a palavra do SENHOR veio a ele,
dizendo: “Que fazes aqui, Elias?” Ele respondeu: “Estou ardendo de zelo pelo
SENHOR, Deus dos exércitos, porque os israelitas abandonaram tua aliança,
demoliram teus altares, mataram à espada teus profetas. Só eu escapei; mas
agora querem matar-me também”. O SENHOR disse-lhe: “Sai e permanece sobre o
monte diante do SENHOR”. Então o SENHOR passou. Antes do SENHOR, porém, veio um
vento impetuoso e forte, que desfazia as montanhas e quebrava os rochedos, mas
o SENHOR não estava no vento. Depois do vento houve um terremoto, mas o SENHOR
não estava no terremoto. Passado o terremoto, veio um fogo, mas o SENHOR não
estava no fogo. E depois do fogo ouviu-se o murmúrio de uma leve brisa. Ouvindo
isto, Elias cobriu o rosto com o manto, saiu e pôs-se à entrada da gruta.
Ouviu, então, uma voz que dizia: “Que fazes aqui, Elias?” Ele respondeu: “Estou ardendo de zelo pelo
SENHOR, Deus dos exércitos, porque os israelitas abandonaram tua aliança,
demoliram teus altares e mataram à espada teus profetas. Só eu escapei. Mas,
agora, querem matar-me também”.
Salmo
de Meditação
R. Diante dos meus olhos tenho
presente o Senhor.
Protege-me, ó Deus: em ti me
refugio.* Eu digo ao SENHOR: “És tu o meu Senhor, fora de ti não tenho bem
algum”.
O SENHOR é a minha parte da
herança e meu cálice. Nas tuas mãos, a minha porção. * Para mim a sorte caiu em
lugares deliciosos, maravilhosa é minha herança.
Sempre coloco à minha frente o
SENHOR, Ele está à minha direita, não vacilo.* Disso se alegra meu coração,
exulta a minha alma; também meu corpo repousa seguro,
Pois não vais abandonar minha
vida no sepulcro,* Nem vais deixar que teu santo experimente a corrupção, O
caminho da vida me indicarás, alegria plena à tua direita, para sempre.
2ª Leitura (1Pd 1,8-12): Sem terdes visto o Senhor, vós o amais. Sem
que agora o estejais vendo, credes nele. Isto será para vós fonte de alegria
inefável e gloriosa, pois obtereis aquilo em que acreditais: a vossa
salvação. Esta salvação tem sido objeto
das investigações e meditações dos profetas. Eles profetizaram a respeito da
graça que estava destinada para vós. Procuraram saber a que época e a que
circunstâncias se referia o Espírito de Cristo, que estava neles, ao anunciar
com antecedência os sofrimentos de Cristo e a glória que viria depois. Foi-lhes revelado que não para si mesmos, mas
para vós é que estavam ministrando esses ensinamentos, que agora são anunciados
a vós. Agora vo-los anunciam aqueles que vos pregam a Boa Nova em virtude do
Espírito Santo, enviado do céu; são revelações que até os anjos desejam
contemplar!
Aleluia. “Senhor é vossa face que eu procuro, não me
escondais a vossa face!” Aleluia
Evangelho
(Lc 9,28b-36): Naquele tempo, Jesus levou consigo Pedro, João e Tiago, e
subiu à montanha para orar. Enquanto orava, seu rosto mudou de aparência e sua
roupa ficou branca e brilhante. Dois homens conversavam com ele: eram Moisés e
Elias. Apareceram revestidos de glória e conversavam sobre a saída deste mundo
que Jesus iria consumar em Jerusalém. Pedro e os companheiros estavam com muito
sono. Quando acordaram, viram a glória de Jesus e os dois homens que estavam
com ele. E enquanto esses homens iam se afastando, Pedro disse a Jesus:
“Mestre, é bom ficarmos aqui. Vamos fazer três tendas: uma para ti, outra para
Moisés e outra para Elias”. Nem sabia o que estava dizendo. Estava ainda
falando, quando desceu uma nuvem que os cobriu com sua sombra. Ao entrarem na
nuvem, os discípulos ficaram cheios de temor. E da nuvem saiu uma voz que
dizia: “Este é o meu Filho, o Eleito. Escutai-o!” Enquanto a voz ressoava,
Jesus ficou sozinho. Os discípulos ficaram calados e, naqueles dias, a ninguém
contaram nada do que tinham visto.
Para nos transfigurarmos,
devemos nos revestirmos de Cristo para sermos como Ele é.
Homilia por: Ide por todo o mundo
e pregai o Evangelho a toda criatura.
* Jesus manda os seus
discípulos rezar. Hoje, toma à parte os seus prediletos, Pedro, Tiago e João,
para os fazer rezar mais longa e intimamente. Estes três representam
particularmente os pontífices, os religiosos, as almas chamadas à perfeição.
* Todos sabemos que quando
Jesus quer rezar o Senhor gosta da solidão, a montanha onde reina a paz, a
calma, onde pode ver-se a grandeza da obra divina sob o céu estrelado durante
as belas noites do Oriente.
* A transfiguração é uma
visão do céu. É uma graça extraordinária para os três apóstolos Pedro, Tiago e
João. Não nos devemos agarrar às graças extraordinárias que são por vezes o
fruto da contemplação. Pedro agarra-se a isso. Engana-se. Queria ficar lá: “Façamos
três tendas”(Cf. Lc 9,33), diz. Não sabia o que dizia. A visão desaparece numa
nuvem. Há aqui uma lição para nós. Entreguemo-nos à oração habitual, à
contemplação. Não desejemos as graças extraordinárias. Se vierem, não nos
agarremos a elas. Os frutos desta festa são, em primeiro lugar, o crescimento
da fé. Os apóstolos testemunham-nos que viram a glória do Salvador. “Não são
fábulas que vos contamos, diz S. Pedro (2Pd 1, 16), fomos testemunhas do poder
e da glória do Redentor. Ouvimos a voz do céu sobre a montanha gritando-nos no
meio dos esplendores da transfiguração: É o meu Filho bem-amado, escutai-o”.
* São Paulo encoraja a
nossa esperança recordando a lembrança da glória do salvador manifestada na
transfiguração e na ascensão: “Veremos a glória face a face, diz, e seremos
transfigurados à sua semelhança” (2Cor 3, 18). – Esperamos o Salvador, Nosso
Senhor Jesus Cristo, que transformará o nosso corpo terrestre e o tornará
semelhante ao seu corpo glorioso” (Fil 3, 21). Mas este mistério é sobretudo
próprio para aumentar o nosso amor por Jesus. Nosso Senhor manifestou-nos
naquele dia toda a sua beleza. O seu rosto era resplandecente como o sol. Os
apóstolos, testemunhas da transfiguração, estavam totalmente inebriados de amor
e de alegria. “Que bom é estar aqui”, dizia São Pedro. “Façamos aqui a nossa
tenda”. A beleza de Cristo transfigurado, contemplada pelo pintor Rafael,
inspirou-lhe a obra-prima da arte cristã. Nosso Senhor falava então da sua
Paixão com Moisés e Elias: nova lição de amor por nós. O Coração de Jesus,
mesmo na sua glória, não pensa senão em nós e nos sacrifícios que quer fazer
por nós. Lições também de penitência, de reparação, de compaixão pelo Salvador.
Porque teve de sofrer tanto para nos resgatar, choremos os nossos pecados,
amemos o nosso Redentor, consolemo-lo.
* Este é o meu Filho muito
amado: Escutai-o. – A voz do Pai celeste diz-nos: “Escutai-o”, palavra cheia de
sentido, como todas as palavras divinas. Deus dá-nos o seu divino Filho por
guia, por chefe, por mestre. Escutai-o, fala-nos nas leis santas do Evangelho e
nos conselhos de perfeição. A palavra de Deus nunca vos falta, é a vossa
docilidade que falta habitualmente. Esta palavra divina – “Escutai-o” – espera
de vós uma resposta. Não basta apenas uma promessa vaga: “hei-de escutar”. É
preciso uma disposição habitual: “escuto, escuto sempre; falai, Senhor, o vosso
servo escuta”. Escutarei no começo de cada ação, para saber o que devo fazer e
como devo fazê-lo.
* A Transfiguração tem um
significado muito singular: revelar aos apóstolos que a passagem pela morte era
temporária e a ela sucederia o fato impensável da ressurreição. Isso porque
Jesus de Nazaré era o Filho de Deus e tinha o “poder de dar e retomar a vida”
(Jo 10,18).
* Mas, o que é a
Transfiguração? Não é uma aparição, podemos dizer inicialmente. Podemos,
contudo, afirmar tratar-se de um parecer sob outra forma, senão a forma
costumeira que Jesus aparecia aos seus discípulos. Ele não apareceu no Tabor,
mas tomou outra figura. Como o fenômeno é inteiramente desconhecido no Antigo
Testamento, não há uma palavra própria para descrevê-lo ao entendimento humano.
Assim, os Evangelistas foram buscar uma nova terminologia usada na linguagem
pagã, quando falavam de deuses que não assumiam a forma humana. E usam um termo
que a língua nossa, a língua de Camões, também guardou do grego: metamorfose,
isto é, assunção de outra forma. Desta maneira, temos uma outra forma quando a
água assume a forma de gelo, ou quando a lagarta se transforma em borboleta.
* No Monte Tabor, não
temos um outro Jesus; é o mesmo Jesus de Nazaré que assume uma forma divina.
Embora não possamos dizer que Deus tenha uma outra forma, o Evangelista teve de
ater-se ao linguajar e à compreensão humana. Ainda que o Antigo Testamento não
conte com transfigurações em sua linguagem, os termos com que se descreve a de
Jesus são todos desconhecidos ao descrever a divindade: luz resplandecente,
vestes brancas, alto de um monte, nuvem da qual sai uma voz.
* A Transfiguração ocorreu
em um monte, local para os judeus de contato com a Divindade. As vestes brancas
simbolizam a eternidade, o pertencer ao céu e ser santo como Deus é santo. Por
isso, o anjo da ressurreição estará vestido de vestes brancas. A Santa Igreja
conservou a figura da veste branca e a impõe ao recém-batizado, para simbolizar
a pertença à família de Deus e expressar que o sagrado Batismo devolveu à
criatura a santidade que a coloca em comunhão com Deus, conforme nos ensinou
São Paulo: “Passais por uma transformação espiritual de vossa mentalidade e vos
revestis do homem novo, criado segundo Deus na justiça e verdadeira santidade”
(Ef 4,24). Tudo isso levando-se para a santidade e para a comunhão íntima com
Deus e com a comunidade.
* Outro símbolo da
Transfiguração é a luz. Deus mora na luz inacessível, conforme nos ensina a IV
Oração Eucarística, tão rica de significados teológicos. São João nos ensina:
“Deus é Luz” (1Jo 1,5). Jesus de Nazaré definiu-se como sendo a encarnação da
luz (Jo 1,7s; 3,19; 12,46).
* A nuvem, simboliza a
presença de Deus, como a manifestação no Monte Sinai (Ex 19,16) e a aliança
entre Deus e o povo. Isaías cantava que a nuvem é o carro de Deus (Is 19,1; Sl
104, 3). Quando Jesus subir ao céu, em certo momento, será envolto por uma nuvem
(At 1,9). Ora, o Tabor tem muito do significado do Sinai. Cristo estava para
dar à luz um novo povo, uma nova e definitiva aliança, um novo Testamento por
meio do sangue derramado na cruz. Como vimos, a Transfiguração tem todo um
sentido pascal. E a Páscoa tem um sentido de recriação.
* Para o angélico Santo
Tomás de Aquino, o Tabor tem a presença do Espírito Santo: “A Trindade inteira
apareceu: o Pai, na voz; o Filho, no homem; o Espírito, na nuvem luminosa”. A
voz do Pai, saída da nuvem, é o centro do episódio: “Este é meu filho bem-amado.
Escutai o que Ele diz!” (Mc 9, 8). Aqui está uma clara afirmação da filiação
divina de Jesus, de sua autoridade de Filho de Deus, de sua natureza divina.
Por isso Ele tem palavras de vida eterna.
Para nos transfigurarmos, devemos
nos revestirmos de Cristo para sermos como Ele é.
* É muito importante
termos presente que o evangelho de hoje nos sinaliza que, pelo caminho do
sofrimento e da cruz, chegaremos à ressurreição. São Pedro nos representa a
todos, quando pretendemos viver e anunciar a alegria da ressurreição, sem
passar pela generosa entrega e pela morte. Também nós preferimos montar a nossa
tenda na montanha. Mas é preciso ter a experiência mística e coletiva da
missão, do anúncio do Evangelho. Não podemos ficar na “fresca” da contemplação
da Montanha, mas descer para o dia a dia da vida missionária.
* Nesta reflexão sobre a
Transfiguração, torna-se oportuno atermo-nos a alguns aspectos. Primeiro, o
discípulo reza unindo a oração à realidade do dia a dia, principalmente pedindo
a força de Deus para vencer os obstáculos, pedindo as forças que vêm de Deus.
Depois, somos convidados a dar espaço e oportunidade a novas experiências. Para
isso é preciso rezar e amar, conforme nos ensina São João Maria Vianney no
silêncio do confessionário e na acolhida da partilha de seu ministério.
* A experiência do Monte
Tabor, a Transfiguração do Senhor, deu força aos apóstolos para aguentarem a
experiência amarga do Monte Calvário. São Marcos relatou a história para
fortalecer a fé vacilante dos membros de sua comunidade, quarenta anos depois
do acontecido. O texto os convidou a renovar a fé em Jesus e na sua Palavra. O
texto, ainda hoje, convida-nos a essa mesma atitude, conforme o convite de Deus
Pai: “Este é o meu Filho amado. Escutem o que ele diz!” O convite de ontem vale
hoje também para nós. Mais do que um convite é uma convocação para a missão e
para o engajamento na realidade concreta da missão.
* Contemplando hoje a face
de Jesus transfigurado e escutando o que ele diz, encontraremos força para
passar suportar os sofrimentos e dificuldades da vida, até o dia em que
poderemos contemplá-Lo na glória do Pai, realização definitiva da aliança e das
promessas.
* Que Deus nos ajude e que
as palavras finais do saudoso Dom Lucas nos interpelem: “Que eu possa sempre
ver o rosto sereno e radioso do meu Cristo”. E eu completo: sempre na realidade
da oração e do amor no irmão que vive e convive conosco no cotidiano. Amém!
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