São
Bernardo, Abade
Georg
Häfner, Presbítero, Mártir e Terceiro Carmelita
1ª
Leitura (Is 56,1.6-7): Eis o que diz o Senhor: «Respeitai o direito,
praticai a justiça, porque a minha salvação está perto e a minha justiça não
tardará a manifestar-se. Quanto aos estrangeiros que desejam unir-se ao Senhor
para O servirem, para amarem o seu nome e serem seus servos, se guardarem o
sábado, sem o profanarem, se forem fiéis à minha aliança, hei de conduzi-los ao
meu santo monte, hei de enchê-los de alegria na minha casa de oração. Os seus
holocaustos e os seus sacrifícios serão aceites no meu altar, porque a minha
casa será chamada 'casa de oração para todos os povos'».
Salmo
Responsorial: 66
R/. Louvado sejais, Senhor,
pelos povos de toda a terra.
Deus Se compadeça de nós e nos dê
a sua bênção, resplandeça sobre nós a luz do seu rosto. Na terra se conhecerão
os vossos caminhos e entre os povos a vossa salvação.
Alegrem-se e exultem as nações,
porque julgais os povos com justiça e governais as nações sobre a terra.
Os povos Vos louvem, ó Deus,
todos os povos Vos louvem. Deus nos dê a sua bênção e chegue o seu temor aos
confins da terra.
2ª
Leitura (Rom 11,13-15.29-32): Irmãos: É a vós, os gentios, que eu falo:
Enquanto eu for Apóstolo dos gentios, procurarei prestigiar o meu ministério a
ver se provoco o ciúme dos homens da minha raça e salvo alguns deles. Porque,
se da sua rejeição resultou a reconciliação do mundo, o que será a sua
reintegração senão uma ressurreição de entre os mortos? Porque os dons e o
chamamento de Deus são irrevogáveis. Vós fostes outrora desobedientes a Deus e
agora alcançastes misericórdia, devido à desobediência dos judeus. Assim também
eles desobedecem agora, de modo que, devido à misericórdia obtida por vós,
também eles agora alcancem misericórdia. Efectivamente, Deus encerrou a todos
na desobediência, para usar de misericórdia para com todos.
Aleluia. Jesus proclamava o
evangelho do reino e curava todas as doenças entre o povo. Aleluia.
Evangelho
(Mt 15,21-28): Partindo dali, Jesus foi para a região de Tiro e Sidônia.
Uma mulher cananeia, vinda daquela região, pôs-se a gritar: «Senhor, filho de
Davi, tem compaixão de mim: minha filha é cruelmente atormentada por um
demônio!». Ele não lhe respondeu palavra alguma. Seus discípulos aproximaram-se
e lhe pediram: Manda embora essa mulher, pois ela vem gritando atrás de nós».
Ele tomou a palavra: «Eu fui enviado somente às ovelhas perdidas da casa de
Israel». Mas a mulher veio prostrar-se diante de Jesus e começou a implorar:
«Senhor, socorre-me!». Ele lhe disse: «Não fica bem tirar o pão dos filhos para
jogá-lo aos cachorrinhos”. Ela insistiu: «É verdade, Senhor; mas os
cachorrinhos também comem as migalhas que caem da mesa de seus donos!». Diante
disso, Jesus respondeu: «Mulher, grande é tua fé! Como queres, te seja feito!».
E a partir daquela hora, sua filha ficou curada.
«Senhor; mas os cachorrinhos
também comem as migalhas que caem da mesa de seus donos!»
Rev. D. Joan SERRA i Fontanet (Barcelona,
Espanha)
Hoje contemplamos a cena da
cananeia: uma mulher pagã, não israelita, que tinha uma filha muito doente,
endemoninhada, e que ouviu falar de Jesus. Saiu ao seu encontro e aos gritos
diz-lhe: «Senhor, filho de Davi, tem compaixão de mim: minha filha é cruelmente
atormentada por um demônio!» (Mt 15,22). Não lhe pede nada, apenas lhe conta a
doença de que padece a sua filha, confiando em que Jesus a curará.
Jesus finge-se surdo. Por quê?
Provavelmente porque tinha visto a fé daquela mulher e desejava que aumentasse.
Ela continua suplicando, de tal forma que até os discípulos pedem a Jesus que a
mande embora. A fé desta mulher manifesta-se, sobretudo, na sua humilde
insistência, sublinhada pelas palavras do discípulo: «Manda embora essa mulher,
pois ela vem gritando atrás de nós» (Mt 15,23).
A Mulher continua suplicando; não
se cansa. O silêncio de Jesus explica-se pois apenas veio para a casa de
Israel. Apesar disso, depois da ressurreição, dirá aos discípulos: «Ide por
todo o mundo e proclamai a Boa Nova a toda a criação» (Mc 16,15).
Este silêncio de Deus, por vezes,
atormenta-nos. Quantas vezes nos queixamos deste silêncio? Mas a cananeia
prostra-se, põe-se de joelhos. É a postura de adoração. Ele responde-lhe que
não é correto tirar o pão dos filhos e dá-lo aos cães. Mas ela responde: «É
verdade, Senhor; mas os cachorrinhos também comem as migalhas que caem da mesa
de seus donos!» (Mt 15,26-27).
Esta mulher é muito espevitada.
Não se zanga, não lhe parece mal, e até lhe dá razão: «Tens razão, Senhor». Mas
consegue pô-lo do seu lado. É como se lhe dissesse: —Sou como um cão, mas um
cão que está sob a proteção do seu amo.
A cananeia oferece-nos uma grande
lição: dá razão ao Senhor que sempre a tem. —Não queiras ter razão quando te
apresentares perante o Senhor. Não te queixes nunca e, se te queixares, termina
dizendo: «Senhor, faça-se a tua vontade».
Pensamentos para o Evangelho
de hoje
«Aprendamos a humildade, ou
melhor, agarremo-la. Se ainda não a possuímos, aprendamo-la. Se a possuímos,
não a percamos» (Santo Agostinho)
«O Senhor não fecha os olhos
diante das necessidades dos seus filhos e, se por vezes parece insensível às
suas súplicas, é somente para os pôr à prova e para refortalecer a sua fé»
(Benedito XVI)
«Do mesmo modo que Jesus ora ao
Pai e Lhe dá graças antes de receber os seus dons, assim também nos ensina esta
audácia filial: `tudo o que pedirdes na oração, acreditai que já o alcançastes´
(Mc 11, 24) (...). Assim como Jesus Se entristece por causa da “falta de fé”
dos seus conterrâneos (Mc 6, 6) e da «pouca fé» dos seus discípulos, também Se
enche de admiração perante a “grande fé” do centurião romano e da cananeia»
(Catecismo da Igreja Católica, nº 2.610)
COMENTÁRIO
As comunidades de Mateus,
semelhantes às nossas de hoje, viviam certas tensões provenientes das
diferentes tendências teológicas e pastorais no seu meio. Uma das tensões - que
aliás causou muita dificuldade na Igreja primitiva, como Atos e as Cartas
Paulinas testemunham - se referia à questão da integração de judeus e pagãos
nas comunidades cristãs, em pé da igualdade. É esta tensão interna que está
subjacente à história relatada pelo texto de hoje.
Os versículos anteriores
(15,1-20) versaram sobre a questão do puro e impuro, especialmente em
referência aos alimentos. Mas, entre as pessoas também havia classificação de
puro e impuro - uma distinção trazida para dentro da comunidade mateana pelos
convertidos provenientes da formação farisaica. Os judeus não podiam comer com
os pagãos para não se contaminar. Jesus veio abolir tal distinção, tornando
acessível a qualquer um o dom de Deus, pela fé na sua pessoa. Que esse
princípio foi muito difícil para os judeu-cristãos aceitarem é bem ilustrado
pela controvérsia que levou ao Concílio de Jerusalém (At 15) e pela polêmica
entre Paulo e Pedro na Igreja de Antioquia - talvez o berço da última redação
de Mateus - como relatado em Gl 2,11-14.
O local do relato é a região de
Tiro e Sidônia - o atual Líbano. Jesus é confrontado por uma mulher desesperada
por causa da doença da sua filha (“atormentada por um demônio”, na visão da
época). Ela é uma pessoa duplamente marginalizada - por ser mulher sozinha num
mundo machista e patriarcal e por ser pagã, considerada irreversivelmente
impura pelos judeus. Em um primeiro momento Jesus a ignora e nem responde.
Alguns autores, em uma tentativa de suavizar essa atitude do Senhor, dizem que
Ele estava testando a fé dela. Parece que o próprio texto dá outra explicação -
Jesus, nestas alturas, considera a sua missão como sendo somente aos judeus,
para restaurar a Aliança quebrada. O diálogo parece-nos até chocante pelo termo
que Jesus usa para descrever as pessoas de origem pagã - “cachorrinhos”. Mas a
mulher usa este termo como gancho para reivindicar a sua atenção - e acaba
mudando a visão de Jesus. Diante da sua insistência, motivada pela sua fé, Ele
lhe dá um louvor que ninguém mais recebe em Mateus - o de ter “grande fé”.
Este trecho nos traz uma grande
surpresa - Jesus aprofunda o sentido da sua missão através do contato com uma
mulher pagã - uma pessoa duplamente rejeitada e desprezada nas tradições da
religião e cultura dela. Jesus só deseja ouvir a voz do Pai - e aqui o Pai lhe
fala através da cananeia! Que lição para nós! Quantas vezes ficamos surdos
diante da voz do Pai porque nos fechamos diante de pessoas consideradas pela
sociedade vigente, ou pelo legalismo religioso, como indignas, impuras, ou
desprezíveis! O Pai normalmente não nos fala por grandes revelações
extraordinárias, mas através dos eventos, das pessoas e dos relacionamentos do
nosso dia a dia; mas, a surdez de espírito nos torna indiferentes a esta
revelação diária!
Surpreende o entusiasmo com que
Jesus louva a mulher: “Mulher, que fé tão grande ti tens!”. Em que consistia
essa fé? Certamente não em uma adesão aos dogmas do Judaísmo, da religião de
Jesus, pois ela era gentia, ou pagã. Muito mais consistia na certeza de que
Deus atende os gritos dos excluídos e sofridos desse mundo, que Deus é o Deus
da vida e da vida plena para todos/as (Jo 10, 10).
Nós temos o privilégio de termos
essa verdade revelada em Jesus; mas, embora adiramos aos dogmas e catecismos,
cumpre-nos questionarmos se realmente acreditamos na ação libertadora de Deus
em favor dos oprimidos. Ou, continuamos criando barreiras de “puros” e
“impuros” na sociedade e na Igreja de hoje? Que esse texto nos ajude para que
estejamos alertas aos sinais dos tempos, para ouvirmos a voz do Deus vivo nos
falando no dia a dia das nossas vidas e que tenhamos a coragem de mudar as
nossas estruturas mentais, tantas vezes condicionadas por preconceitos raciais,
de gênero ou de religião, seguindo o exemplo revelador de Jesus.
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