Santa
Brígida, viúva e religiosa
São
João Cassiano, presbítero
1ª
Leitura (Sab 12,13.16-19): Não há Deus, além de Vós, que tenha cuidado
de todas as coisas; a ninguém tendes de mostrar que não julgais injustamente. O
vosso poder é o princípio da justiça e o vosso domínio soberano torna-Vos
indulgente para com todos. Mostrais a vossa força aos que não acreditam na
vossa omnipotência e confundis a audácia daqueles que a conhecem. Mas Vós, o Senhor
da força, julgais com bondade e governais-nos com muita indulgência, porque
sempre podeis usar da força quando quiserdes. Agindo deste modo, ensinastes ao
vosso povo que o justo deve ser humano e aos vossos filhos destes a esperança
feliz de que, após o pecado, dais lugar ao arrependimento.
Salmo
Responsorial: 85
R. Senhor, sois um Deus
clemente e compassivo.
Vós, Senhor, sois bom e
indulgente, cheio de misericórdia para com todos os que Vos invocam. Ouvi,
Senhor, a minha oração, atendei a voz da minha súplica.
Todos os povos que criastes virão
adorar-Vos, Senhor, e glorificar o vosso nome, porque Vós sois grande e operais
maravilhas, Vós sois o único Deus.
Senhor, sois um Deus bondoso e
compassivo, paciente e cheio de misericórdia e fidelidade. Voltai para mim os
vossos olhos e tende piedade de mim.
2ª
Leitura (Rom 8,26-27): Irmãos: O Espírito Santo vem em auxílio da nossa
fraqueza, porque não sabemos que pedir nas nossas orações; mas o próprio
Espírito intercede por nós com gemidos inefáveis. E Aquele que vê no íntimo dos
corações conhece as aspirações do Espírito, pois é em conformidade com Deus que
o Espírito intercede pelos cristãos.
Aleluia. Bendito sejais, ó
Pai, Senhor do céu e da terra, porque revelastes aos pequeninos os mistérios do
reino. Aleluia.
Evangelho
(Mt 13,24-43): Jesus apresentou-lhes outra parábola: «O Reino dos Céus é
como alguém que semeou boa semente no seu campo. Enquanto todos dormiam, veio
seu inimigo, semeou joio no meio do trigo e foi embora. Quando o trigo cresceu
e as espigas começaram a se formar, apareceu também o joio. Os servos foram
procurar o dono e lhe disseram: ‘Senhor, não semeaste boa semente no teu campo?
Donde veio então o joio? ’ O dono respondeu: ‘Foi algum inimigo que fez isso’.
Os servos perguntaram ao dono: ‘Queres que vamos retirar o joio?’ ‘Não!’, disse
ele. ‘Pode acontecer que, ao retirar o joio, arranqueis também o trigo. Deixai
crescer um e outro até a colheita. No momento da colheita, direi aos que cortam
o trigo: retirai primeiro o joio e amarrai-o em feixes para ser queimado! O
trigo, porém, guardai-o no meu celeiro!’». Jesus apresentou-lhes outra parábola
ainda: “O Reino dos Céus é como um grão de mostarda que alguém pegou e semeou
no seu campo. Embora seja a menor de todas as sementes, quando cresce, fica
maior que as outras hortaliças e torna-se um arbusto, a tal ponto que os
pássaros do céu vêm fazer ninhos em seus ramos». E contou-lhes mais uma
parábola: “O Reino dos Céus é como o fermento que uma mulher pegou e escondeu
em três porções de farinha, até que tudo ficasse fermentado». Jesus falava tudo
isso em parábolas às multidões. Nada lhes falava sem usar de parábolas, para se
cumprir o que foi dito pelo profeta: ‘Abrirei a boca para falar em parábolas;
vou proclamar coisas escondidas desde a criação do mundo’». Então Jesus deixou
as multidões e foi para casa. Seus discípulos aproximaram-se dele e disseram:
“Explica-nos a parábola do joio!». Ele respondeu: «Aquele que semeia a boa
semente é o Filho do Homem. O campo é o mundo. A boa semente são os que
pertencem ao Reino. O joio são os que pertencem ao Maligno. O inimigo que
semeou o joio é o diabo. A colheita é o fim dos tempos. Os que cortam o trigo
são os anjos. Como o joio é retirado e queimado no fogo, assim também
acontecerá no fim dos tempos: o Filho do Homem enviará seus anjos e eles
retirarão do seu Reino toda causa de pecado e os que praticam o mal; depois,
serão jogados na fornalha de fogo. Ali haverá choro e ranger de dentes. Então
os justos brilharão como o sol no Reino de seu Pai. Quem tem ouvidos, ouça».
«Foi algum inimigo que fez
isso»
P. Ramón LOYOLA Paternina LC (Barcelona,
Espanha)
Hoje Cristo. Sempre, Cristo. Dele
viemos; de Ele vêm todas as boas sementes semeadas na nossa vida. Deus
visita-nos —como diz o Kempis— com a consolação e a desolação, com o sabor doce
e o amargo, com a flor e a espinha, com o frio e o calor, com a beleza e o
sofrimento, com a alegria e a tristeza, com o valor e com o medo... Porque tudo
foi redimido em Cristo (Ele também teve medo e venceu-o). Como nos diz são
Paulo, «que tudo contribui para o bem daqueles que amam a Deus» (Rm 8,28).
Tudo isto está bem, mas... Existe
um mistério de iniquidade que não procede de Deus e que nos excede e que
devasta o jardim de Deus que é a Igreja. E quiséramos que Deus fosse “como”
mais poderoso, que estivesse mais presente, que mandasse mais e não deixasse
atuar essas forças desoladoras: «Queres que vamos retirar o joio? (Mt 13,28).
Isto dizia o Papa João Paulo II no seu último livro Memória e identidade:
«Sofremos com paciência a misericórdia de Deus», que espera até ao último
momento para oferecer a salvação a todas as almas, especialmente às mais
necessitadas da sua misericórdia («Deixai crescer um e outro até a colheita»
(Mt 13,30). Como é o Senhor da vida de cada pessoa e da história da humanidade,
move os fios de nossas existências, respeitando nossa liberdade, de modo que
—junto com a prova— dá-nos a graça sobre abundante para resistir, para
santificar-nos, para ir até Ele, para ser oferenda permanente, para fazer crescer
o Reino.
Cristo divino pedagogo,
introduze-nos na sua escola de vida a través de cada encontro, cada
acontecimento. Sai a nosso encontro; diz-nos —Não temais. Coragem. Eu venci o
mundo. Eu estou convosco todos os dias, até o fim (cf, Jo 16,33; Mt 28,20).
Diz-nos também: Não julgueis; ou melhor —como eu— esperai, confiai, rezai pelos
que se equivocam, santificai-os com membros que vos interessam muito por ser do
vosso próprio corpo.
“O Reino” é uma realidade
irreversível, que está em processo de crescimento no mundo.”
Pe. Francisco Cornelio F.
Rodrigues
Neste décimo sexto domingo do
tempo comum, continuamos a leitura do discurso em parábolas, localizado no
capítulo treze do Evangelho segundo Mateus. Esse é o terceiro dos cinco
discursos de Jesus nesse Evangelho, e tem como tema principal o Reino dos Céus,
o qual vem apresentado a partir de sete parábolas. O texto específico que a liturgia
propõe para esse domingo – Mateus 13,24-43 – contém três parábolas: do joio e o
trigo (vv. 24-30), a da semente de mostarda (vv. 31-32), e do fermento (v. 33).
Além das três parábolas, o texto contém ainda uma justificativa para o discurso
em parábolas, com fundamentação na Escritura (vv. 34-35), e a explicação da
parábola do joio e o trigo (vv. 36-43). Essa explicação é um acréscimo
posterior da comunidade de Mateus, provavelmente para amenizar um pouco o
impacto causado pela mensagem provocativa da parábola em específico, e de todo
o discurso.
Para compreender adequadamente
qualquer trecho desse discurso, devemos sempre considerar o seu contexto, como
já o fizemos no domingo passado, ao iniciar a leitura com a parábola do
semeador (Mt 13,1-23), e hoje recordamos de novo. O discurso em parábolas faz
parte da reação de Jesus à rejeição sofrida pela sua atuação na Galileia, junto
com seus discípulos, tendo sido desacreditado até mesmo pelo seu mentor, João,
o Batista (Mt 11,2-19). Além, da rejeição, havia também a falta de compreensão
da sua mensagem, principalmente da parte dos discípulos, uma vez que o modelo
de Reino anunciado e proposto por Jesus não correspondia às expectativas e
esperanças alimentadas por eles, que esperavam um messias glorioso e guerreiro.
Mateus retoma esse momento da vida de Jesus para responder também ao contexto
de crise vivido pela sua comunidade.
A crise vivida pela comunidade de
Mateus, respondida pelas três parábolas de hoje, girava em torno de três
grandes problemas ou tentações incompatíveis com a mensagem de Jesus: 1)
puritanismo (querer ser uma comunidade separada, formada apenas por pessoas
santas e justas); 2) projeto de grandeza (sede de poder e sobreposição sobre os
demais grupos); 3) desânimo (vontade de desistir por não ver resultados nem
efeitos gerados pela pregação e a forma de vida cristã). Mesmo incompatíveis
com a Boa Nova do Reino, essas três tendências têm marcado a história da
comunidade cristã, desde as suas origens com os Doze, até os dias atuais.
Ao primeiro problema, Jesus, e
posteriormente Mateus, responderam com a parábola do joio e o trigo: “O Reino
dos céus é como um homem que semeou boa semente no seu campo. Enquanto todos
dormiam, veio seu inimigo, semeou joio no meio e foi embora” (vv. 24-25). A
introdução da parábola apresenta o Reino em uma realidade de tensão e
hostilidade. Essa tensão é marcada pela presença simultânea da semente boa e da
semente nociva, o mal e o bem, o amor e o ódio, a vida e a morte. Essa forma de
conceber o Reino não agradava a muitos cristãos, inclusive aos discípulos, os
quais imaginavam o Reino como uma comunidade separada, formada apenas por
pessoas santas e justas. Jesus mostra o contrário: quem adere ao seu projeto de
vida deve estar preparado para conviver com o diferente e até mesmo com o mal,
sem compactuar com ele, obviamente.
O joio (em grego: ζιζάνια–
zizânia) semeado pelo inimigo enquanto todos dormiam (v. 25), era uma planta
muito parecida com o trigo, cujos grãos são tóxicos, capazes de provocar sérios
danos à saúde de quem os consumir. É obra das trevas, por isso, “semeado
enquanto todos dormiam”, ou seja, à noite, o que na Bíblia significa o que está
longe de Deus. É um sinal de perigo e, portanto, uma ameaça à colheita da boa
semente semeada no mesmo campo. Por isso, a ideia dos servos zelosos é arrancar
o quanto antes: “Queres que vamos arrancar o joio?” (v. 28b). A esses servos,
correspondem as pessoas muito religiosas de todos os tempos, dos fariseus dos
tempos de Jesus aos cristãos-católicos piedosos de hoje, e de outras religiões
também. São as pessoas intolerantes que, por causa de um falso zelo, alimentam
disseminam ódio e violência.
A resposta prudente do dono do
campo revela a atitude que Jesus espera de seus seguidores: “Não! Pode acontecer
que, arrancando o joio, arranqueis também o trigo. Deixai crescer um e outro
até a colheita” (vv. 29-30a). Jesus quer mostrar que, antes de tudo, o cristão
não pode apresentar-se como juiz de ninguém. Julgar é prerrogativa de Deus
apenas, e esse não julga pelas aparências, sem antes ver os frutos. Enquanto
não chegar o tempo da colheita, não é possível distinguir o bem do mal, o
saudável do nocivo. Somente pelos frutos é possível conhecer a árvore. A pressa
daqueles servos em arrancar logo o joio poderia comprometer toda a colheita.
Isso revela extremismo, intolerância, falta de capacidade para conviver com as
diferenças. Essa tendência continua presente ainda em muitos seguimentos da
religião cristã, infelizmente. O Reino dos céus proposto por Jesus não é uma
sociedade de pessoas perfeitas, alheia à história e às contradições da
existência, não é uma comunidade de puros. O Reino só pode ser construído no
meio do conflito. Por isso, exige capacidade de diálogo, respeito às diferenças
e paciência.
A segunda parábola, ainda
relacionada ao mundo agrícola, a do grão de mostarda (vv. 31-32) é a resposta
de Jesus aos desejos de grandeza e poder na sua comunidade. Diante da estrutura
imperial e da grande organização da sinagoga, o projeto de Jesus era praticamente
invisível. Os discípulos, sedentos de poder, não se conformavam com aquela
situação. A resposta de Jesus foi desconcertante: “O Reino dos céus é como uma
semente de mostarda que um homem pega e semeia no seu campo” (v. 31). É
necessário que a comunidade dos discípulos aceite a condição de pequenez em que
se encontra e reconheça essa pequenez como necessidade para compreender a
dinâmica do Reino. Esse, o Reino, não pode impor-se por sinais de grandeza nem
de espetáculo. O importante é que esse seja cultivado, mesmo como uma semente
pequena, e colocar-se no mundo para servir, como acontece com a mostarda:
depois que a planta cresce “os pássaros vêm e fazem ninhos em seus ramos” (v.
32b). A única preocupação dos que lutam pelo Reino deve ser se estão sendo abrigo
e serviço para os mais necessitados.
À terceira tentação ou problema,
o desânimo e falta de paciência, Jesus dá como resposta a parábola do fermento,
a mais difícil de ser aceita e compreendida entre as três, pelos discípulos de
então: “O Reino dos céus é como o fermento que uma mulher pega e mistura com
três porções de farinha, até que tudo fique fermentado” (v. 33). Essa é uma das
parábolas mais revolucionárias de Jesus porque apresenta o Reino dos céus sendo
comparado a um elemento considerado impuro pela tradição judaica, o fermento, e
com a atividade de uma mulher. Ora, para a cultura e tradição da época, a
mulher pouca teria a contribuir com um projeto de sociedade como era o Reino
dos céus e, no entanto, Jesus apresenta o seu agir como imagem da construção do
seu Reino.
O fermento era símbolo da
subversão, porque tinha a capacidade de, mesmo em pequena quantidade,
transformar a massa, dando-lhe nova forma e fazer crescer. O uso do pão
fermentado era, inclusive, proibido para o uso litúrgico dos judeus (cf. Ex
12,19; 13,7; Dt 16,3). Além de adulterar a massa, ainda exigia bastante
paciência até que seu efeito se tornasse visível no pão. E era exatamente a
paciência que estava acabando nos discípulos e levando-os ao desânimo. Como não
viam efeito algum na pregação deles e de Jesus, pois o mundo continuava do
mesmo jeito, estavam propensos a desistir, à medida em que aumentavam as
exigências de coragem e disposição. Com uma parábola como essa, Jesus quis
injetar ânimo e perseverança neles e, ao mesmo tempo, desconstruir a imagem
distorcida de um Reino marcado pela grandeza e pelos sinais exteriores. O Reino
de Deus, pelo contrário, se constrói no anonimato e na simplicidade. Ninguém vê
o fermento agindo dentro da massa. Uma vez que ele é injetado, se torna
invisível ao misturar-se com a massa. No entanto, quem tiver paciência de
esperar o seu efeito, o verá, e até de modo surpreendente.
A comunidade cristã tem o papel
do fermento: de modo subversivo, ou seja, mesmo contra a legalidade, irradiar
um jeito alternativo de viver, a partir de relações de solidariedade,
igualdade, justiça e amor, até contagiar toda a massa, ou seja, as sociedades
com seus padrões convencionais de comportamento. Esse trabalho de injetar
fermento na massa é inclusivo, deve ser feito por todos e todas, mas começa
pelos mais excluídos e desprezados da história, como as mulheres, conforme o
exemplo da parábola. Enfim, são os gestos pequenos e simples, de pessoas
humildes, marginalizadas, como era a mulher na época do texto, que podem
transformar o mundo e torná-lo apto à vivência do Evangelho. São os pequenos e
humildes os agentes privilegiados de Deus para introduzir o seu Reino no mundo.
Com essas três parábolas, de modo
brilhante, Mateus respondeu aos questionamentos da sua comunidade, recordando
como Jesus também reagia às crises do grupo dos doze. Certamente, essas
respostas são válidas para todos os momentos da história. É preciso reforçar
sempre que no Reino dos céus não há espaço para classificação entre bons e
maus, puros e impuros, porque é uma comunidade de iguais, cujos distintivos são
apenas os frutos; é uma comunidade pequena, mas acolhedora e servidora e,
sobretudo, transformadora, para aqueles que aceitam ser subvertidos pelo
Evangelho!
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