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quarta-feira, 23 de novembro de 2022

III Domingo do Advento

Sta. Maria Maravilhas de Jesus, Virgem de nossa Ordem
Bto. Franco de Siena, Leigo eremita de nossa Ordem

1ª Leitura (Is 35,1-6a.10): Alegrem-se o deserto e o descampado, rejubile e floresça a terra árida, cubra-se de flores como o narciso, exulte com brados de alegria. Ser-lhe-á dada a glória do Líbano, o esplendor do Carmelo e do Saron. Verão a glória do Senhor, o esplendor do nosso Deus. Fortalecei as mãos fatigadas e robustecei os joelhos vacilantes. Dizei aos corações perturbados: «Tende coragem, não temais: Aí está o vosso Deus, vem para fazer justiça e dar a recompensa. Ele próprio vem salvar-vos». Então se abrirão os olhos dos cegos e se desimpedirão os ouvidos dos surdos. Então o coxo saltará como um veado e a língua do mudo cantará de alegria. Voltarão os que o Senhor libertar, hão de chegar a Sião com brados de alegria, com eterna felicidade a iluminar-lhes o rosto. Reinarão o prazer e o contentamento e acabarão a dor e os gemidos.

Salmo Responsorial: 145
R. Vinde, Senhor e salvai-nos.

O Senhor faz justiça aos oprimidos, dá pão aos que têm fome e a liberdade aos cativos.

O Senhor ilumina os olhos dos cegos, o Senhor levanta os abatidos, o Senhor ama os justos.

O Senhor protege os peregrinos, ampara o órfão e a viúva e entrava o caminho aos pecadores.

O Senhor reina eternamente. o teu Deus, ó Sião, é rei por todas as gerações.

2ª Leitura (Tg 5,7-10): Irmãos: Esperai com paciência a vinda do Senhor. Vede como o agricultor espera pacientemente o precioso fruto da terra, aguardando a chuva temporã e a tardia. Sede pacientes, vós também, e fortalecei os vossos corações, porque a vinda do Senhor está próxima. Não vos queixeis uns dos outros, a fim de não serdes julgados. Eis que o Juiz está à porta. Irmãos, tomai como modelos de sofrimento e de paciência os profetas, que falaram em nome do Senhor.

Aleluia. O Espírito do Senhor está sobre mim: enviou-me a anunciar a boa nova aos pobres. Aleluia.

Evangelho (Mt 11,2-11): Naquele tempo, ora, João Batista, estando na prisão, ouviu falar das obras do Cristo e mandou alguns discípulos para lhe perguntar: «És tu, aquele que há de vir, ou devemos esperar outro?». Jesus respondeu-lhes: «Ide contar a João o que estais ouvindo e vendo: cegos recuperam a vista, paralíticos andam, leprosos são curados, surdos ouvem, mortos ressuscitam e aos pobres se anuncia a Boa-Nova. E feliz de quem não se escandaliza a meu respeito!». Enquanto os enviados se afastavam, Jesus começou a falar às multidões sobre João: «Que fostes ver no deserto? Um caniço agitado pelo vento? Que fostes ver? Um homem vestido com roupas finas? Olhai, os que vestem roupas finas estão nos palácios dos reis. Que fostes ver então? Um profeta? Sim, eu vos digo, e mais do que profeta. Este é de quem está escrito: ‘Eis que envio meu mensageiro à tua frente, para preparar o teu caminho diante de ti’. Em verdade, eu vos digo, entre todos os nascidos de mulher não surgiu quem fosse maior que João Batista. No entanto, o menor no Reino dos Céus é maior do que ele».

«Entre todos os nascidos de mulher não surgiu quem fosse maior que João Batista»

Dr. Johannes VILAR (Colônia- Alemanha)

Hoje, como no domingo anterior, a Igreja apresenta-nos a figura de João Baptista. Ele tinha muitos discípulos e uma doutrina clara e diferenciada: para os publicanos, para os soldados, para os fariseus e saduceus... O seu empenho consiste em preparar a vida pública do Messias. Primeiro enviou João e André, hoje envia outros para que O conheçam. Chegam com uma pergunta: «És tu aquele que há de vir, ou devemos esperar outro?» Mt 11,3) Bem sabia João quem era Jesus. Ele mesmo o testemunhava: «Eu não O conhecia, mas aquele que me mandou batizar com água disse-me: «Aquele sobre quem vires descer e permanecer o Espírito, esse é quem batiza no Espírito Santo» (Jo 1,33). Jesus responde com factos: os cegos veem e os coxos andam...
 
João tinha um caráter firme no seu modo de viver e de se manter na Verdade, o que lhe custou ser encarcerado e martirizado. Mesmo no cárcere fala eficazmente com Herodes. João ensina-nos a compaginar a firmeza de caráter com a humildade: «Não sou digno de lhe desatar as correias do calçado» (Jo 1,27); «Importa que ele cresça e que eu diminua» (Jo 3,30); alegra-se por Jesus batizar mais do que ele, pois considera-se somente “amigo do esposo” (cf Jo 3, 26).

Numa palavra: João ensina-nos a levar a sério a nossa missão na terra: ser cristãos coerentes, que se sabem e atuam como filhos de Deus. Devemos perguntar-nos: —Como se preparariam Maria e José para o nascimento de Jesus Cristo? Como preparou João os ensinamentos de Jesus? Como nos preparamos para o comemorar e para a segunda vinda do Senhor no final dos tempos? Pois, como dizia São Cirilo de Jerusalém: «Nós anunciamos a vinda de Cristo, não somente a primeira, mas também a segunda, muito mais gloriosa do que aquela. “Pois aquela esteve impregnada de sofrimento, mas a segunda trará o diadema da glória divina».

Os cegos veem e os coxos andam, os leprosos são limpos e os surdos ouvem, os mortos ressuscitam e a Boa Nova é anunciada aos pobres.

Escrito por P. Américo no site DOMUS IESU

* À frente para preparar o caminho. Como é sabido, João Batista era primo de Jesus e, por isso, partimos facilmente do suposto que, em termos gerais, o conheceria bastante bem. No entanto, bem examinados os textos, as coisas não parecem bem o que são. Afinal, também João Batista tinha dúvidas acerca do seu primo. E isso torna-se ainda mais evidente, como se costuma dizer, «quando a vida aperta» (como é, por exemplo, o caso de João, que se encontra na prisão, donde já não sairá com vida). É então que a dúvida «existencial» o assalta e manda perguntar a Jesus se é Ele ou não Aquele que há de vir, ou seja, o Messias. Então, assim, apesar de parente, talvez O não conhecesse assim tão bem como isso (nada se sabe da infância do Batista e, de resto, há conhecer e conhecer). Vindo a nós, parece-me que se trata de uma pergunta sempre atual: a de saber se realmente Jesus é o Mestre ou se devemos esperar por outro. Há certos momentos da vida das pessoas - e o caso do Batista não é exceção - em que se questiona se a ideia que temos do Messias corresponde ou não à ideia de que Deus faz dele. Surgem então algumas dúvidas, que em si, ao fim e ao cabo, são perfeitamente legítimas. O Batista procura tirá-las e, ao que podemos supor, perante a resposta de Jesus, ele fica esclarecido e já pode morrer em paz. Nós também não devemos estranhar que nos assaltem as dúvidas (não ter dúvidas é que é de estranhar). O que temos a fazer é ver o que Jesus disse e fez e depois daí tirar as devidas consequências e aplicações à vida de todos os dias.

Os caminhos de Deus. As pessoas raramente estão dispostas a aceitar os «tempos de Deus». Ao contrário de Deus, que (repito) é «cheio de misericórdia e compassivo» (cf. Tg 5,11), os homens podem cair facilmente na tentação de querer mudar tudo através da simples eliminação e destruição, invocando raios e coriscos e ameaçando castigos tremendos e catastróficos, (sempre contra os outros, que são uns malandros).  Não sei se faço ofensa ou não a João Batista (certamente não é essa a minha intenção) se disser que nem sequer ele conseguiu evitar esses sentimentos salpicados de ameaças, vinganças e castigos. Com efeito, aquando do batismo de Jesus, e segundo as versões de Mateus e Lucas (cf. Mt 3,7-10; Lc 3,7-9), João Batista não se abstém de «dizer uma série de coisas» (isto para não utilizar a palavra «ameaça») àqueles que vêm ter com ele para serem batizados.
É certo que, segundo o quarto Evangelho, João Batista apresenta a Jesus como «Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo» (cf. Jo 1, 29), mas isso não impede que eu faça uma pergunta que talvez alguém julgue menos legítima: segundo a maneira de pensar do Batista, até que ponto Jesus seria realmente o Messias que devia vir? Por outras palavras, a atividade de Jesus estaria de acordo com a figura de Messias que João Batista imaginara? Lendo o texto de Mateus de hoje, há razões para duvidar disso. Doutra forma, não se justificaria a «embaixada» que ele enviou a Jesus para lhe perguntar se era Ele ou não «aquele que devia vir».
Isto dá a possibilidade de intuir que o próprio João Batista, nesse momento da sua vida (já estava na prisão, donde não sairia senão decapitado), ainda não parecia inteiramente livre da «configuração» política de que, no seu tempo, era rodeado o papel do Messias. João tinha descrito a chegada do Messias com sinais terríveis e castigos exemplares. E nada disso se tinha verificado na prática. Ao contrário, Jesus não só não condenava nem destruía os pecadores, como inclusivamente comia com eles, desfrutando da sua amizade (cf. Lc 7,34). Ultrapassar uma mentalidade restrita e incorreta em relação ao papel do Messias terá sido, pois, o último obstáculo que o Batista teve que enfrentar.

O «escândalo» do Messias submisso. Na sua resposta aos enviados de João, Jesus limita-se a citar as Escrituras (Is 26,19; 35,5-6; 61,1). É de supor que o Batista terá sabido tirar a conclusão, «sem se escandalizar por causa de Jesus» (cf. Mt 11,6). Jesus apresenta-se como o Messias pensado e prometido por Deus, enumerando seis sinais mais uma conclusão: cura os cegos, os coxos, os leprosos, os surdos, ressuscita os mortos e proclama a Boa Nova aos pobres; e acrescenta que quem for capaz de aceitar isto será feliz.
As «obras» de Jesus não podem ser separadas da sua palavra e da sua pessoa. Não queiramos impor as nossas ideias a Jesus. Só quem compreende e aceita como certas as suas obras, está em condições de compreender e aceitar a sua pessoa. Quanto a este ponto, não pode haver dúvidas, se é que, de fato, se tem a noção exata do papel do Messias. Mas, na vida prática, por vezes, as dúvidas são mais fortes do que nós. A ideia dum Messias submisso, sem qualquer sinal de vitória, mas antes vergado sob o peso da condenação, parece-nos, senão um absurdo, pelo menos um escândalo. Mas a verdade é que «os caminhos de Deus não são os nossos caminhos» (cf. Is 55,8). Mas (e façamos-lhe essa justiça) os caminhos de Deus, se calhar, são mais acertados do que os nossos!

Advento do «Messias de Deus» O Advento é então, mais uma vez e sempre, um apelo a corrigirmos os desvios de que porventura a nossa noção de Messias e de messianismo possa enfermar. O episódio de hoje  referente a João Batista [e, neste capítulo específico, vale também o referente a Pedro, que é inclusivamente apostrofado de «demónio» por fazer da ideia de Messias uma ideia de poder e prestígio (cf. Mt 16,21-23)] deve ajudar-nos todos a ir ao encontro de Cristo sem esquemas preconcebidos. Ou seja, devemos aceitar o Messias como realmente Ele é e se apresenta através das suas obras, e não como gostaríamos que fosse.
É mais que patente que, bem lá no fundo, nos seria muito mais congenial e agradável imaginá-lo, não deitado na manjedoura tosca duma gruta qualquer no descampado, mas no esplendor dum palácio, rodeado de sinais de poder e de glória. E, claro, nós sempre a fazer parte do seu grupo de escolhidos! Jesus será, sem dúvida, Messias «Juiz» (juiz à maneira dele ou à nossa maneira?), mas, antes disso, é Messias «Salvador» e «Libertador». E é por isso que, antes de condenar e destruir, se apresta a estar perto da gente pobre e abandonada: cegos, coxos, leprosos, surdos, pobres e até mortos (e isso somo-lo todos nós no campo moral). «O menor no Reino do Céu é maior do que João Batista» (cf. Mt 11,11), precisamente ao descobrir essa realidade desconcertante em termos simplesmente humanos.

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