São
Vicente de Paulo, presbítero
1ª
Leitura (Jó 3,1-3.11-17.20-23): Jó abriu a boca e amaldiçoou o dia do
seu nascimento. Tomou a palavra e disse: «Desapareça o dia em que eu nasci e a
noite em que se anunciou: ‘Foi concebido um homem’. Porque não morri no ventre
de minha mãe, ou não expirei ao sair do seio materno? Porque houve dois joelhos
para me acolherem e dois seios para me amamentarem? Estaria agora deitado e
tranquilo, dormiria o sono da morte e teria descanso, como os reis e os grandes
da terra, que edificaram os seus túmulos sumptuosos, ou como os poderosos, que
possuem ouro e enchem de prata os seus mausoléus. Ou porque não fui eu como o aborto
escondido, que já não existiria, como as crianças que não chegaram a ver a luz?
Ali acaba a agitação dos maus, aí repousam os homens extenuados. Porque se dá
luz ao infeliz e vida aos corações amargurados, que suspiram pela morte que
tarda em chegar e a procuram mais avidamente que um tesouro? Ficariam contentes
diante de um túmulo, exultariam à vista de um sepulcro. Por que se dá vida ao
homem que não vê o seu caminho e que Deus cerca por todos os lados?».
R. Senhor, chegue até Vós a minha súplica.
Senhor Deus, meu Salvador, dia e noite clamo na vossa presença. Chegue até Vós a minha oração, inclinai o ouvido ao meu clamor.
A minha alma está saturada de sofrimento, a minha vida chegou às portas da morte. Sou contado entre os que descem à sepultura, sou um homem já sem forças.
Estou abandonado entre os mortos, como os caídos que jazem no sepulcro, de quem já não Vos lembrais e que foram sacudidos da vossa mão.
Lançastes-me na cova mais profunda, nas trevas do abismo. Pesa sobre mim a vossa ira, todas as vossas ondas caíram sobre mim.
Aleluia. O Filho do homem veio
para servir e dar a vida pela redenção dos homens. Aleluia.
Evangelho (Lc 9,51-56): Quando ia se completando o tempo para ser elevado ao céu, Jesus tomou a firme decisão de partir para Jerusalém. Enviou então mensageiros à sua frente, que se puseram a caminho e entraram num povoado de samaritanos, para lhe preparar hospedagem. Mas os samaritanos não o queriam receber, porque mostrava estar indo para Jerusalém. Vendo isso, os discípulos Tiago e João disseram: «Senhor, queres que mandemos descer fogo do céu, para que os destrua?». Ele, porém, voltou-se e os repreendeu. E partiram para outro povoado».
«Jesus tomou a firme decisão
de partir para Jerusalém»
Rev. D. Félix LÓPEZ SHM (Alcalá
de Henares, Espanha)
Hoje, o Evangelho nos oferece
dois pontos principais para a reflexão pessoal. Em primeiro lugar, nos diz que
«quando se completaram os dias em que ia a ser levado ao céu, Jesus tomou a
decisão de ir a Jerusalém» (Lc 9,51). O verbo que usa são Lucas significa
“completar”, “consumar”; Jesus leva a plenitude o tempo marcado pelo Padre para
completar sua missão salvífica por meio da crucificação, morte e ressurreição.
Então ele será glorificado, "levado ao céu". Diante dessa
perspectiva, Jesus Cristo “tomou a decisão de subir a Jerusalém”, ou seja, a
decisão firme de amar o Pai realizando sua vontade redentora. Jesus morre na
cruz dizendo: "Tudo está consumado" (Jo 19,30). O Senhor viveu para
cumprir a vontade do Pai e manteve essa atitude de fidelidade até a morte.
Assim devemos viver também, mesmo
que experimentemos no caminho que nos leva a Deus a oposição ou a rejeição, o
desprezo ou a marginalização por ser fiel ao Senhor. Segundo o Papa Francisco:
«O verdadeiro progresso da vida espiritual não consiste em multiplicar os
êxtases, mas em saber perseverar nos tempos difíceis: caminhar, caminhar,
caminhar; se estiver cansado, pare um pouco e volte a andar, com perseverança.
«Voltou-se e os repreendeu»
Rev. D. Jordi POU i Sabater (Sant
Jordi Desvalls, Girona, Espanha)
Hoje no Evangelho contemplamos
como «Tiago e João disseram: ‘Senhor, queres que mandemos descer fogo do céu,
para que os destrua?’. Ele, porém, voltou-se e os repreendeu. E partirem para
outro povoado» (Lc 9,54-55). São defeitos dos Apóstolos, que o Senhor corrige.
Conta a história de um homem que
transportava água da Índia, carregava dois cântaros um a cada lado pendurado no
extremo de um pau que se apoiava em seus ombros: Um era perfeito, e o outro
tinha uma rachadura e perdia água. Este –triste- observava o outro tão perfeito
e com vergonha e sentindo-se miserável, disse um dia ao seu amo: sinto muito,
que por causa do meu defeito perca metade do meu conteúdo. Ele lhe respondeu:
Quando voltarmos para casa repara nas flores que crescem no lado do caminho. E
reparou: eram belíssimas flores, mas vendo que continuava a perder água,
repetiu: Não sirvo, faço tudo mal. O senhor lhe respondeu: —reparaste que as
flores só crescem no teu lado do caminho? Isto porque eu sempre soube que em ti
havia uma rachadura, então plantei sementes do teu lado e a cada dia que fazia
este trajeto tu regavas as sementes e assim pude recolher estas flores para o
altar da Virgem Maria. Sem ti e a tua maneira de ser, não seria possível esta
beleza.
Todos, de alguma maneira somos cântaros rachados, mas Deus conhece bem os seus filhos e dá-nos a possibilidade de aproveitar as rachaduras-defeitos para alguma coisa boa. Assim o apóstolo João —que hoje quere destruir—, com a correção do Senhor converte-se no apóstolo do amor nas suas cartas. Não se desanimou com as correções, senão que aproveitou o lado positivo do seu caráter impulsivo —a paixão— para o serviço do amor. Que nós, também sejamos capazes de aproveitar as correções, as contrariedades —sofrimento, fracasso, limitações— para “começar e recomeçar”, tal como São Josemaria definia a santidade: dóceis ao Espírito Santo para convertermos a Deus e sermos seus instrumentos.
Pensamentos para o Evangelho de hoje
«Em nosso tempo, a Esposa de Cristo prefere usar a medicina da misericórdia e não empunhar as armas da severidade» (São João XXIII)
«Como desejo que os anos por vir estejam impregnados de misericórdia para poder ir ao encontro de cada pessoa levando a bondade e a ternura de Deus» (Francisco)
«(...) Toda a Igreja é apostólica, na medida em que é “enviada” a todo o mundo. Todos os membros da Igreja, embora de modos diversos, participam deste envio (...)» (Catecismo da Igreja Católica, n° 863)
Reflexões de Frei Carlos
Mesters, O.Carm.
* O evangelho de hoje conta como Jesus decide
ir para Jerusalém. Descreve também as primeiras dificuldades que ele
encontra nesta caminhada. Traz o começo da longa e dura caminhada da periferia
para a capital. Jesus deixa a Galileia e segue para Jerusalém. Nem todos o
compreendem. Muitos o abandonam, pois as exigências são grandes. Hoje acontece
o mesmo. Na caminhada das nossas comunidades também há incompreensão e
abandono.
* “Jesus decide ir para Jerusalém”. Esta
decisão vai marcar a longa e dura viagem de Jesus desde a Galileia até
Jerusalém, da periferia até a capital. Esta viagem ocupa mais de uma terça
parte de todo o evangelho de Lucas (Lc 9,51 até 19,28). Sinal de que a
caminhada até Jerusalém teve uma importância muito grande na vida de Jesus. A longa
caminhada simboliza, ao mesmo tempo, a viagem que as comunidades estavam
fazendo. Elas procuravam realizar a difícil passagem do mundo judeu para o
mundo da cultura grega. Simbolizava também a tensão entre o Novo que continuava
avançando e o Antigo que se fechava cada vez mais. E simboliza, ainda, a
conversão que cada um de nós tem que fazer, procurando seguir Jesus. Durante a
viagem, os discípulos e as discípulas tentam seguir Jesus, sem voltar atrás.
Nem sempre o conseguem. Jesus dedica muito tempo à instrução dos que o seguem
de perto. Um exemplo concreto desta instrução temos no evangelho de hoje. Logo
no início da viagem, Jesus sai da Galileia e leva seus discípulos para dentro
do território dos samaritanos. Ele procura formá-los para que possam entender a
abertura para o Novo, para o “outro”, o diferente.
* Lucas 9,51: Jesus decide ir para Jerusalém. O texto grego diz literalmente: "Quando se completaram os dias da sua assunção (ou arrebatamento), Jesus firmou o seu rosto para ir a Jerusalém”. A expressão assunção ou arrebatamento evoca o profeta Elias que foi arrebatado ao céu (2 Rs 2,9-11). A expressão firmar o rosto evoca o Servo de Javé que dizia: “Faço meu rosto duro como pedra, certo de não ser enganado” (Is 50,7). Evoca ainda uma ordem que o profeta Ezequiel recebeu de Deus: "Fixa a teu rosto contra Jerusalém!" (Ez 21,7). Usando tais expressões, Lucas sugere que, com a caminhada em direção a Jerusalém, começa uma oposição mais declarada de Jesus contra o projeto da ideologia oficial do Templo de Jerusalém. A ideologia do Templo queria um Messias glorioso e nacionalista. Jesus quer ser o Messias-Servo. Durante a longa viagem, esta oposição vai crescer e, no fim, vai terminar no arrebatamento ou na assunção de Jesus. A assunção de Jesus é a sua morte na Cruz, seguida da ressurreição.
2. Lucas 9,52-53: Fracassa a missão na Samaria. Durante a viagem, o horizonte da missão se alarga. Logo no início, Jesus ultrapassa as fronteiras do território e da raça. Ele manda seus discípulos preparar a sua vinda numa aldeia da Samaria. Mas a missão junto dos samaritanos fracassou. Lucas diz que os samaritanos não receberam Jesus porque ele estava indo para Jerusalém. Porém, se os discípulos tivessem dito aos samaritanos: “Jesus está indo para Jerusalém para criticar o projeto do Templo e para exigir maior abertura”, Jesus teria sido aceito, pois os samaritanos eram da mesma opinião. O fracasso da missão deve-se, provavelmente, aos discípulos. Eles não entenderam por que Jesus “firmou a cara contra Jerusalém”. A propaganda oficial do Messias glorioso e nacionalista impedia-os de enxergar. Os discípulos não entenderam a abertura de Jesus, e a missão fracassou!
3. Lucas 9,54-55: Jesus recusa o pedido de vingança. Tiago e João não querem levar desaforo para casa. Não aceitam que alguém não concorde com a ideia deles. Querem imitar Elias e usar o fogo para se vingar (2 Rs 1,10). Jesus recusa a proposta. Não quer o fogo. Certas Bíblias acrescentam: "Vocês não sabem de que espírito são movidos!" Significa que a reação dos dois discípulos não era do Espírito de Deus. Quando Pedro sugeriu a Jesus para não seguir pelo caminho do Messias Servo, Jesus chamou Pedro de Satanás (Mc 8,33). Satanás é o mau espírito que quer mudar o rumo da missão de Jesus. Recado de Lucas para as comunidades: os que querem impedir a missão junto dos pagãos são movidos pelo mau espírito!
* Durante os dez capítulos que descrevem a viagem até Jerusalém (Lc 9,51 a 19,28), Lucas, constantemente, lembra que Jesus está a caminho de Jerusalém (Lc 9,51.53.57; 10,1.38; 11,1; 13,22.33; 14,25; 17,11; 18,31; 18,37; 19,1.11.28). Raramente, porém, ele diz por onde Jesus passava. Só aqui no começo da viagem (Lc 9,51), no meio (Lc 17,11) e no fim (Lc 18,35; 19,1), você fica sabendo algo a respeito do lugar por onde Jesus estava passando. Isto vale para as comunidades de Lucas e para todos nós. O que é certo é que devemos caminhar. Não podemos parar. Nem sempre, porém, é claro e definido por onde passamos. O que é certo é o objetivo: Jerusalém.
Para um confronto pessoal
1) Quais os problemas que já apareceram em sua vida como consequência da decisão que você tomou de seguir Jesus?
2) O que aprendemos da pedagogia de Jesus com seus discípulos que queriam vingar-se dos samaritanos?
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