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sábado, 20 de abril de 2013

IV Domingo da Páscoa


«Eu dou a vida eterna às minhas ovelhas»

No domingo do “Bom Pastor” o nosso olhar sobre a Palavra de Deus ganha um horizonte vocacional. A imagem do “Bom Pastor” aqui identificada com o Senhor Jesus é o modelo de comunhão e de entrega de todos os seguidores de Cristo. E porque lançamos um especial olhar sobre as vocações de consagração e de serviço na Igreja, pedimos também que o Senhor continue a enviar muitos “bons pastores” à sua Igreja, muitos homens e mulheres capazes de um “sim” incondicional e de fidelidade ao amor manifestado por Jesus. Num tempo tão marcado pelo secularismo e pelo relativismo são precisas testemunhas de fé capazes de, sem constrangimentos, elevar até a presença de Deus a humanidade do nosso tempo.
Ir. Alzira Sousa, fma

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João (Jo 10, 27-30) - Naquele tempo, disse Jesus: «As minhas ovelhas escutam a minha voz. Eu conheço as minhas ovelhas e elas seguem-Me. Eu dou-lhes a vida eterna e nunca hão de perecer e ninguém as arrebatará da minha mão. Meu Pai, que Mas deu, é maior do que todos e ninguém pode arrebatar nada da mão do Pai. Eu e o Pai somos um só».

«As minhas ovelhas escutam a minha voz.»
A liturgia deste Domingo apresenta-nos Jesus Cristo como o Bom Pastor, que dá a vida eterna às suas ovelhas, no amor universal por todos os homens. Para os destinatários do evangelho de João, a figura do pastor era muito significativa. Os profetas usavam-na muitas vezes para falar dos guias e responsáveis do povo. Era geralmente para denunciar os abusos: “Ai dos pastores de Israel que se apascentam a si mesmos!” Abundavam os maus pastores. Por isso, os leitores de João entendiam perfeitamente a afirmação de que Jesus é o Bom Pastor que dá a vida pelas suas ovelhas.
Escutar não é apenas identificar e relacionar sons, mas estar atento ao que se ouve e deixar-se interpelar, numa atitude de discernimento. É da escuta que decorre a possibilidade de acolher uma proposta e de percorrer um itinerário de seguimento de Jesus. O que é decisivo para pertencer ao rebanho de Jesus é a disponibilidade para “escutar” as propostas que Ele faz e segui-lo no caminho do amor e da entrega. Como distinguimos a “voz” de Jesus de outras vozes e propostas enganosas? Através de um encontro permanente com a sua Palavra, da participação nos sacramentos e num frequente diálogo íntimo com Ele.
As ovelhas de Jesus escutam a sua voz: não se trata unicamente de uma escuta externa (3, 5; 5, 37) mas de uma escuta atenta (5, 28; 10, 3), a ponto de ser uma escuta obediente (10, 16.27; 18, 37; 5, 25). No discurso do bom pastor esta escuta expressa a confiança e a união das ovelhas em relação ao pastor (10, 4). O adjetivo “minhas” não indica somente a simples possessão das ovelhas, mas realça também que as ovelhas pertencem-lhe, e pertencem-lhe enquanto Ele é o dono delas (10, 12).

«Eu conheço as minhas ovelhas e elas seguem-Me.»
Jesus é o bom pastor que conhece e ama as suas ovelhas, é o pastor que deseja ser escutado, e espera obediência e seguimento confiante. O que Jesus quer dizer com estas imagens é que Ele conhece os seus discípulos (e, como Deus, conhece todos os homens). Conhece-os pelo seu nome, o que biblicamente revela a essência do ser humano. E ama-as com um amor pessoal e único. Parece que Jesus só sabe contar até um e esse um é cada um de nós.
As ovelhas sabem que podem confiar no Pastor de forma incondicional, porque reconhecem que Jesus não procura o seu bem pessoal, mas o bem do seu rebanho. E seguem-no, isto é, tornam-se discípulos de Jesus. Numa óptica de amor o seguimento não significa vender a própria liberdade, mas assumir uma resposta de amor a Jesus, ou seja, compreender que na obediência amorosa e fiel se pode encontrar a vida em plenitude. Pergunto-me quais são as razões pelas quais me aproximo de alguém, mostro interesse por ele ou ela, ofereço a minha ajuda ou simplesmente o apoio… será que procuro alguma recompensa ou arrisco ser dom para os outros por amor e desinteressadamente? E no que respeita a seguir os passos de Jesus… o que é que isto implica no meu dia-a-dia concreto?
Eis que se estabelece uma relação íntima entre Jesus e as ovelhas: “e eu conheço-as”. Não se trata de um conhecimento intelectual. “Conhecer alguém” em sentido bíblico, significa, sobretudo, ter uma relação pessoal com ele, viver em certo sentido em comunhão com ele. É um conhecimento que não exclui os traços humanos da simpatia, amor, comunhão de natureza.
Em virtude deste conhecimento de amor, o Pastor convida os seus a segui-lo. A escuta da palavra comporta um discernimento, para que entre todas as vozes que aparecem seja escolhida a que corresponde a uma pessoa concreta: Jesus. Como consequência deste discernimento, a resposta torna-se ativa, pessoal e converte-se em obediência. Esta deriva da escuta. Portanto, entre a escuta e o seguimento do Pastor está o conhecimento de Jesus.

«Eu dou-lhes a vida eterna.»
O Bom pastor dá a vida eterna: é esta a grande missão de Jesus, foi por isso que o Filho se fez homem e viveu a sua humanidade revelando-nos o Pai e o seu amor. A vida eterna é o conhecimento e relação de comunhão com o Pai e com Jesus, o Seu Filho.
Bem sabemos que o maior dom que Deus nos concede é o dom da vida. Mas esta vida dura alguns anos, muitos ou poucos... e depois? Voltará ao nada o grande dom da criação de Deus? A resposta encontra-se em Cristo ressuscitado. É Ele o Senhor da vida, que pode dispor dela e tornar-nos participantes, desde já, da sua própria vida, que não está submetida à morte. E neste caminho de santidade, de seguimento de Jesus Cristo, vivemos já como ressuscitados. Como perspectivo o meu dia? Como enfrento as crises e desafios normais da vida? A ressurreição de Cristo é uma esperança que me inunda de força e esperança no hoje da minha história?
O conhecimento de Jesus relativamente às suas ovelhas abre um caminho que conduz ao amor: “E eu dou-lhes a vida eterna”. Para o evangelista a vida é o dom da comunhão com Deus. Enquanto nos sinópticos a “vida” ou “vida eterna” aparece unida ao futuro, no evangelho de João está unida a uma posse atual. Este aspecto é repetido frequentemente na narração de João: “O que acredita no Filho tem a vida eterna” (3, 36): “Em verdade, em verdade vos digo: o que escuta a minha Palavra e acredita naquele que me enviou, tem a vida eterna” (5, 24; 6, 47).

«Nunca hão de perecer e ninguém as arrebatará da minha mão.»
Este discurso tem presente, de modo especial, a passagem do Livro do Profeta Ezequiel, Ez 34. Falando aos exilados na Babilônia, Ezequiel constata que os líderes de Israel tinham sido, ao longo da história, falsos pastores e que conduziram o Povo por caminhos de morte. Ao contrário, o Bom Pastor libertará o Povo da escravidão e conduzi-lo-á à vida. Ninguém poderá arrebatar o povo das mãos do Bom Pastor e ninguém o poderá privar da vida em plenitude porque essa vida é Deus quem a concede.
Para os cristãos, o Pastor é Cristo. Os que aceitam a proposta de vida que Jesus lhes faz nunca se perderão, pois a qualidade de vida que Jesus lhes comunica supera a própria morte. Será que levo até às últimas consequências esta afirmação de Jesus? Deixo-me de fato conduzir pela sua mão? Vivo confiante o meu dia-a-dia na presença do Senhor? O que poderá separar do amor de Jesus?

«Meu Pai, que Mas deu, é maior do que todos e ninguém pode arrebatar nada da mão do Pai.»
Estar nas mãos de Jesus é o mesmo que estar na mão de Deus Pai. Enquanto criaturas pertencemos a Deus, todo o homem está nas mãos de Deus, as mãos que nos criaram e plasmaram, como canta o Salmista (Sl 118). João abre-nos um horizonte sem limites, com origem no imenso amor do Pai que ama cada um dos seus filhos. E ninguém as pode arrebatar da mão do Pai. A maldade humana até pode pôr termo à vida terrena, mas nunca poderão arrancar das mãos do Pai o poder de dispor da vida eterna.
Mesmo sendo «maior do que todos», Deus nada impõe: é com liberdade que as ovelhas do seu rebanho aceitam ser conduzidas. Porém, esta confiança em Deus não significa passividade da nossa parte, no sentido acrítico, desenraizado ou indiferente a tudo. Requer, sim, a nossa abertura e a confiança espontânea de quem decide dar-se no seguimento de Jesus com espírito de participação e de iniciativa.
Desta experiência de me sentir seguro em Deus brota uma pergunta fundamental: se em Ti tudo posso, o que queres que eu faça?
A relação de amor de Jesus concretiza-se através da experiência de proteção que o homem experimenta: é dito que as ovelhas “não perecerão jamais”. Talvez se trate de uma alusão à perdição eterna. E é acrescentado que “ninguém as arrebatará”. Tal expressão sugere o papel da mão de Deus e de Cristo que impedem que os corações das pessoas sejam arrebatados por outras forças negativas. Na Bíblia, a mão, em alguns contextos, é uma metáfora que indica a força de Deus que protege (Dt 33, 3; Sal 31, 6). Por outro lado, o verbo “arrebatar” sugere a ideia de que a comunidade dos discípulos não estará livre dos ataques do mal e das tentações. Mas a expressão “ninguém as arrebatará” indica a presença de Cristo que assegura à comunidade a certeza de uma estabilidade granítica que lhe permite ultrapassar toda a tentação de medo.

«Eu e o Pai somos um só.»
Jesus auto-proclama expressamente a sua união com o Pai. A vida e a obra de Jesus são feitas em união com o Pai. O dom de Jesus é a vida que vence a morte e essa é a missão que o Pai Lhe deu. E esta afirmação causou tal escândalo aos judeus que se opõem a Jesus, que Ele entregou a sua própria vida para cumpri-la.
«O Pai e eu somos um». Esta missão é também o fundamento da nossa união com Jesus e da preocupação e cuidado para com os nossos irmãos, pois todo o cristão há de ter os traços do Bom Pastor, configurar-se a Ele. Mas também hoje Jesus provoca “terremotos”, nas pessoas e nos povos, confrontando-se com as ideologias e o pensamento pós-moderno, na sociedade com as suas denúncias contra a permissividade e relativismo, com os seus fortes chamamentos a reconhecer a dignidade do homem, feito à imagem e semelhança de Deus e redimido por Jesus Cristo. 

Algumas perguntas para ajuda na meditação e na oração

* A primeira atitude que a palavra de Jesus pôs em evidência é que o homem deve “escutar”. Na linguagem bíblica, este verbo está cheio de ressonâncias: implica a adesão alegre ao conteúdo do que se escuta, a obediência à pessoa que fala, a escolha de vida d'Aquele que se dirige a nós. Estás imerso na escuta de Deus? Na tua vida diária há espaços dedicados, de modo particular, à escuta da Palavra de Deus?

* O diálogo ou comunicação íntima entre ti e Cristo é definido na liturgia de hoje com um grande verbo bíblico: “conhecer”. Este implica todo o ser do homem: a mente, o coração, a vontade. O conhecimento que tens de Cristo restringe-se unicamente a um conhecimento teórico-abstrato ou deixas-te transformar e guiar pela sua voz no caminho da tua vida?

* Quem escutou e conheceu Deus “segue” Cristo como único guia da sua vida. O teu seguimento diário é contínuo, mesmo que no teu horizonte apareçam o pesadelo de outras vozes e ideologias que procuram separar-te da comunhão com Deus?

* Na meditação do evangelho de hoje aparecem outros dois verbos: nós não “pereceremos” e ninguém nos poderá “arrebatar” da presença de Cristo que protege a nossa vida. É isto o que fundamenta e motiva a nossa segurança diária. Esta ideia é expressa em São Paulo de modo luminoso: “Estou seguro de que nem a morte nem a vida, nem os anjos nem os principados, nem o presente nem o futuro, nem as potestades nem a altura, nem a profundidade nem qualquer outra criatura poderá separar-nos do amor de Deus manifestado Cristo Jesus, Senhor nosso (Rom 8, 38-39). Quando entre os crentes e a pessoa de Jesus se estabelece uma relação feita de chamada e de escuta, então procede-se na vida seguros de chegar à maturidade espiritual e ao êxito. O verdadeiro fundamento desta segurança está na descoberta diária da identidade divina deste Pastor que é a segurança da nossa vida. Fazes a experiência desta segurança quando te sentes ameaçado pelo mal?

* As palavras de Jesus “Dou-lhes a vida eterna” asseguram que a meta do teu caminho, como crente, não é obscura nem incerta. Para ti a vida eterna refere-se ao número de anos que podes viver ou, pelo contrário, é um chamamento à comunhão de vida com o próprio Deus? É motivo de alegria experimentares a companhia de Deus na tua vida?

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