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quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

CONSTITUIÇÃO PASTORAL “GAUDIUM ET SPES” IV



A GAUDIUM ET SPES E O ATEÌSMO

Pe. Vilmar Adelino Vicente

A razão principal da dignidade humana é a comunhão com Deus! Afinal, homem e mulher são frutos do amor de Deus!

A Verdade e o Amor são dois anseios antropológicos perenes e universais. Todavia, muitos seres humanos não têm essa concepção teísta e até rejeitam, explicitamente, a possibilidade da existência de Deus, ao menos do Deus revelado no cristianismo ou no judaísmo. O mesmo se diga das divindades manifestas por inspiração e cultuados nas grandes expressões religiosas. Esse fenômeno merece um exame mais diligente da Igreja (GS 252).

O ateísmo é um fenômeno diversificado envolvendo não só os que negam expressamente a Deus, como também os que pensam que sobre Deus nada podemos declarar. Alguns negam claramente todo o pensamento filosófico metafísico e afirmam apenas o reinado das ciências positivas que tudo explicam. Não haveria, portanto, verdades absolutas, mas apenas saber científico relativo. Neste processo histórico, geralmente, há uma exaltação do homem e uma negação de Deus. Alguns reduzem a concepção de Deus a uma fantasia; não chegam a compreender o Deus revelado nos Evangelhos (GS 253). Na verdade, num mundo secularizado, sequer o problema de Deus causa inquietação e, o fenômeno religioso, não merece atenção ou investigação.

Todavia, há de se reconhecer que, muitas vezes, o ateísmo se origina da indignação diante do mal no mundo e de expressões religiosas alienantes e repressoras, ou da absolutização de bens humanos atribuídos a Deus.

É preciso considerar que, os que negam a Deus e a religião, nem sempre seguem os ditames de sua consciência e, por isso, não são isentos de culpa moral. Portanto, o ateísmo não é algo inato à consciência humana, mas tem origem em causas diversas, entre estas a crítica da religião em diversas perspectivas e até mesmo movimentos contra a religião católica.

Nesta gênese do ateísmo, os crentes que negligenciam a educação da fé promovendo a distorção doutrinal, ou vivendo uma heresia vital no campo espiritual, moral e social têm grande responsabilidade porque obscurecem a genuína face de Deus e da religião (GS 254).

O ateísmo sistemático moderno busca uma autonomia radical do homem sem Deus. Nesta ótica, a liberdade é o próprio fim do ser humano, único artífice e demiurgo da própria história. Com isto afirmam que sua posição existencial não reconhece um Senhor, autor e fim de todas as coisas. Prefere-se confiar na potência do progresso científico e tecnológico. A tendência, nesse caso, é de um reducionismo da libertação humana à libertação econômico-social e político-cultural.

A religião, nessa ótica, é vista com restrição e rechaço, como um impeditivo que aposta apenas numa libertação futura e quimérica, sem compromisso com a construção da cidade terrestre. Não raro os governos que assumiram esta concepção perseguem a experiência religiosa autêntica e apostam na educação atéia da juventude.

A Igreja busca simultaneamente ser fiel a Deus e aos seres humanos e, por isso mesmo, reprova dolorosamente tudo o que impede a experiência universal de transcendência, pois isso contradiz a razão histórica e priva a pessoa humana de sua grandeza inata. Descobrindo nas raízes do pensamento ateu as motivações mais profundas da negação de Deus, a Igreja reconhece a gravidade destas questões e deseja, com extrema caridade, examinar seriamente os argumentos do ateísmo. Não há, na verdade, nenhuma incongruência entre a emancipação humana e o reconhecimento de Deus, pois decorrem daí exatamente a liberdade e a inteligência dos seres humanos como partícipes da felicidade e da comunhão divina.

De outro lado, a esperança escatológica em nada diminui o sentido humano da vida e dos valores imanentes, antes, apóia e fornece motivos novos. Sem essa dimensão meta-histórica o problema humano da dor e da morte se torna insolúvel, a dignidade humana é prejudicada e o desespero redunda em solução final. Só Deus dá uma resposta plena e total aos enigmas da vida das pessoas, também dos ateus, nos quais a graça opera de modo invisível (Lumen Gentium II, l6).

Os Padres Conciliares afirmam que o remédio para o ateísmo está não só na clareza da doutrina cristã, mas também na autenticidade e pureza da Igreja e de seus membros como testemunhas vivas e visíveis do Pai, do Filho encarnado e das moções do Espírito Santo. Esta é a fé testemunhada pelos mártires e pelos confessores na prática do amor radical e no compromisso pela justiça, que tornam presentes no mundo profano a fé do Evangelho.

Embora a Igreja rejeite o ateísmo, acolhe com sinceridade todos os não crentes como protagonistas da construção de um mundo justo e fraterno. Um diálogo sincero e prudente contribui para a superação de toda a forma de discriminação entre crentes e não crentes. A Igreja denuncia governantes que não respeitam a liberdade essencial das pessoas no campo da fé e conclama os não crentes a refletirem com objetividade sobre o Evangelho de Jesus Cristo, que responde às aspirações mais profundas do coração humano: “Fizeste-nos para vós, Senhor, e o nosso coração permanece inquieto enquanto em vós não descansar!” (Agostinho de Hipona – Confissões l, 1).

LEIA, ABAIXO, A LECTIO DIVINA DA QUARTA-FEIRA DA II SEMANA DO TEMPO COMUM

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