15
DE AGOSTO
PREPARANDO-NOS
PARA A
SOLENIDADE DA ASSUNÇÃO DA MÃE DE DEUS
SOLENIDADE DA ASSUNÇÃO DA MÃE DE DEUS
«Hoje, a Arca Santa e Viva do Deus Vivo,
Aquela cujo seio tinha trazido o Seu
próprio Criador,
repousa no templo do Senhor,
templo não construído pela mão do homem.
David, seu antepassado e parente de Deus,
dança de alegria (2 Sm 7,14);
os Anjos dançam em coro,
os Arcanjos aplaudem
e as Potestades dos céus cantam a sua
glória…»
Santo
Padre João Damasceno (cerca de 675-749), Monge, Teólogo e Doutor da Igreja
«Segunda
Homilia sobre a Dormição»
ASSUNÇÃO DE NOSSA SENHORA AO CÉU
Uma mulher vestida de sol.
Leituras: Ap 11, 19a; 12,
1.3a.10 - 1 Cor 15, 20-27a – Lc 1, 39-56
“Hoje a Virgem Maria, Mãe de Deus, foi elevada à gloria do Céu. Aurora e
esplendor da Igreja triunfante, ela é consolo e esperança para o vosso povo
ainda em caminho....” (Prefácio da Festa).
Em breves e sublimes palavras, a liturgia nos
oferece o cerne do mistério que a Igreja contempla e celebra hoje na Solenidade
de Nossa Senhora Assunta ao céu. Ela canta a intrínseca e inseparável relação
da Virgem Maria com Cristo, morto e ressuscitado e, ao mesmo tempo, com o povo
de Deus peregrino na história, e que de Cristo é o corpo vivo. Este povo
peregrino fica caminhando na esperança rumo à vinda gloriosa do mesmo Cristo,
consolado e fortalecido nas suas tribulações pelo exemplo e a intercessão da
Bem-Aventurada Virgem.
Ao celebrarmos o mistério da Ressurreição e
Ascensão de Jesus Cristo junto ao Pai, já realizado plenamente em Maria, Mãe de
Deus e mãe nossa, junto com a Igreja vislumbramos nela a meta do nosso caminho,
vivenciado ainda através das provações do deserto da história, fortalecidos,
porém, pela esperança da vitória final sobre os sofrimentos e a morte; vitória
esta que já resplandece na história e no rosto de Maria Assunta.
“Cristo Jesus subiu aos céus e preparou, no reino eterno, um lugar
para sua mãe, a Santa Virgem, aleluia”: canta a
Antífona das Primeiras Vésperas da Solenidade. Cristo Jesus, ressuscitado dos
mortos “como primícias dos que
morreram” (1 Cor 15,20 – primeira leitura), cumpre primeiro em sua mãe
a sua páscoa, que é também o destino e a meta de todos os membros do seu corpo.
A Leitura breve das Primeiras Vésperas, introduz a solenidade com as palavras
do apóstolo na carta aos Romanos e que evidenciam como, no plano de Deus, a
meta do caminho está potencialmente já inserida no primeiro passo do próprio
caminho da salvação: “Aqueles que
Deus predestinou, também os chamou; e aos que chamou, também os tornou justos;
e aos que tornou justos, também os glorificou” (Rm 8,30 ).
Na carta aos Efésios Paulo sublinha com vigor o
dinamismo da ressurreição participada em Cristo: “Deus manifestou sua força em Cristo, quando o ressuscitou dos
mortos e o fez assentar à sua direita nos céus... Com ele nos ressuscitou e nos
fez assentar nos céus, em Cristo Jesus, a fim de mostrar nos tempos vindouros a
extraordinária riqueza da sua graça, pela sua bondade para conosco” (Ef
1,20.2, 6-7).
Maria, por primeiro, foi assunta por graça ao céu
em alma e corpo, na integridade da sua pessoa, superando os laços da morte, no
exemplo e em solidariedade a seu filho, Jesus ressuscitado. Ela nos antecipou
ao chegar à meta; tornou-se, de tal modo, sinal certo do caminho a percorrer e
do objetivo a alcançar que nos é prometido por graça.
O vidente do apocalipse, com seu olhar profético,
antecipa na luz da fé o futuro do povo de Deus e orienta nossos passos para
aquela meta: “Abriu-se o templo de
Deus que está no céu e apareceu no templo a arca da aliança.... Então apareceu
no céu um grande sinal: uma mulher vestida de sol, tendo a lua debaixo dos pés
e, sobre a cabeça, uma coroa de doze estrelas” (Ap. 11,19a; 12.1).
A visão profética deixa vislumbrar aquilo que na
experiência sofrida do dia a dia daqueles que acreditam no Senhor e o seguem,
fica escondido e constitui um desafio sempre novo à fé e à esperança de seus
seguidores. Em Cristo morto e ressuscitado, que é o verdadeiro templo de Deus
(cf Jo, 2, 21-22), foi inaugurada a aliança nova e definitiva. A “arca”,
guardada no segredo, na tenda de Moisés e no templo de Salomão em Jerusalém,
como símbolo da aliança, agora se torna visível, no céu. A liturgia identifica
a arca com Maria, pois ela guarda em si mesma e revela ao mundo a aliança
vivente que é o próprio Cristo.
A “arca da aliança”, no Antigo Testamento
simbolizava o compromisso de Deus em favor do seu povo, a presença fiel com a
qual ele o acompanhava em todas as suas aventuras, alegres e tristes. Continha
também as indicações de vida (as duas tábuas da Lei), que o povo devia seguir
para responder de maneira digna à sua vocação de povo escolhido e chamado à
liberdade.
Lucas, no evangelho de hoje, descreve a visita de
Maria à sua prima Isabel nos mesmos termos de festa e alegria com os quais a
arca de Deus foi acolhida por parte do rei Davi na cidade de Jerusalém, que se
torna daquele momento em diante a “cidade santa”, a “cidade do Senhor” (2 Sam
6). Maria é a verdadeira arca da aliança enquanto, depois de ter recebido na fé
e gerado na carne o filho de Deus (São Leão Magno), o apresenta ao mundo novo
dos simples de coração, como o menino João, que reage dançando de alegria ao
aproximar-se de Jesus, ainda escondido no ventre de sua mãe.
Os cantos de agradecimentos e de louvor de Isabel e
de Maria interpretam não somente os sentimentos das duas mães, fecundas por
graça, mas também a alma profunda de toda a história renovada. Esta presença do
Senhor no meio do seu povo o sustenta em seu caminho e no seu combate.
No céu aparece o segundo grande sinal: “uma mulher vestida de sol, tendo a
lua debaixo dos pés e, sobre a cabeça, uma coroa de doze estrelas”. A
mulher no seu esplendor de luz, aparece já capaz de dominar as mutabilidades da
história, simbolizadas pela lua posta debaixo dos pés. Mas ela se encontra ao
mesmo tempo na condição de extrema fragilidade, pelo fato de estar grávida e
estar nas dores do parto. Diante dela se posiciona o dragão com a intenção de
devorar o filho que está para nascer. Ele porém, será posto a salvo junto de
Deus, e a mulher acolhida no deserto, como Israel no seu caminho para a terra
prometida.
A tradição da Igreja, desde os Padres dos primeiros
séculos, reconhece no símbolo desta mulher, gloriosa e frágil ao mesmo tempo,
as etapas de realização da mesma e única Palavra de Deus que cumpre seu
dinamismo ao longo da história da salvação. Nela vislumbra a comunidade de
Israel da qual nasce o messias; a Igreja que gera o Cristo em cada cristão pela
pregação do evangelho e pela fé; enfim, vê também Maria que acolhe Cristo na
sua fé e o gera segundo a carne.
No contexto da celebração da Solenidade de Maria
Assunta ao céu, o texto hoje proclamado nos orienta a contemplar em conjunto a
experiência de Maria e o caminho de fé da Igreja e de cada cristão e cristã.
A Igreja celebra a Virgem Maria como a “Mãe de
Deus” e do seu unigênito Jesus Cristo, por ter dado ao Verbo de Deus sua
própria carne. Hoje aquela mesma carne é glorificada e acolhida na plenitude da
vida de Deus. Quando confessamos na fé que Maria foi Assunta junto de Deus em
alma e corpo, falamos da integridade da sua pessoa, com todos seus sentimentos
e sua existência humana de mulher. Ela viveu deixando-se guiar em plena
obediência e liberdade de amor pelo Espírito, que a tornou fecunda da vida
mesma de Deus.
O cântico do “Magnificat”, centro do evangelho de
hoje, constitui o reconhecimento humilde e alegre por parte de Maria das
maravilhas cumpridas por Deus na sua vida pessoal, e ainda mais na história do
seu povo e em prol da inteira família humana.
A obra mais maravilhosa cumprida pelo Pai, e objeto
da contemplação de hoje, porém, é a própria Maria. Seu primeiro “sim”,
expressão de fé incondicionada ao surpreendente anúncio do anjo em Nazaré,
desemboca no “sim”, pronunciado no grito silencioso da alma transpassada pela
espada da dor, aos pés da cruz. De Nazaré ao calvário, ela acompanhou com
renovada entrega de si mesma o caminho do Filho, guardando no seu coração sem
entender, o que acontecia, e sempre confiando na fidelidade de Deus às suas
promessas. “Eles, porém, não
compreenderam a palavra que ele lhes dissera... Sua mãe, porém, conservava a
lembrança de todos estes fatos em seu coração” (cf Lc 2, 50.51).
Enquanto contempla e celebra em Maria esta obra
maravilhosa de Deus, a Igreja reconhece nela seu próprio inicio e modelo, pela
fé e o amor com os quais ela consentiu ao chamado de Deus, chamado que a
conduziu até a plenitude do reino no céu.
O Concílio Vaticano II, na constituição Lumen
Gentium, que trata do mistério da Igreja, da sua identidade e da sua
missão, dedica o inteiro capítulo oitavo à Bem-Aventurada Virgem Maria no
mistério de Cristo e da Igreja. O dogma da assunção de Maria ao céu em corpo e
alma foi definido em maneira explícita pelo papa Pio XII no ano 1950, mas ele
estava enraizado na tradição espiritual da Igreja e no culto dos fiéis, desde
os primeiros séculos. Renovando e enriquecendo o ensino dos Padres da Igreja e
da sua tradição secular à luz do dogma, o Concílio oferece à inteligência
espiritual da Igreja e à piedade dos fiéis novos horizontes, que nos fazem
descobrir ainda melhor o lugar privilegiado de Maria no mistério de Cristo e da
Igreja e o grande dom que ela constitui na vida de cada um de nós.
O Concílio destaca esta profunda proximidade de
Maria com a experiência humana e espiritual do inteiro povo de Deus,
apresentando-a como “mãe da igreja”. Pela profunda unidade com todos os membros
da Igreja, Maria “é saudada também como membro super-eminente e de todo
singular da Igreja, como seu tipo e modelo excelente na fé e na caridade. E a
Igreja católica, instruída pelo Espírito Santo, honra-a com afeto de piedade
filial como mãe amantíssima” ( LG 53).
Partilhando a mesma sorte de combate e de graça, o
povo cristão, com o instinto profundo da fé, desde sempre tem sentido a Virgem
Maria como sua intercessora junto do Pai e do seu Filho unigênito.
O grande horizonte teológico delineado pelo
Concílio com suas reflexões sobre a Virgem Maria no mistério de Cristo e da
Igreja, e as riquezas espirituais oferecidas pela liturgia das variadas festas
marianas, constituem uma preciosa oportunidade para renovar e valorizar os
tesouros de autêntica devoção, que o povo de Deus tem criado e guardado ao
longo dos séculos, sobretudo na América Latina e no Brasil.
Como o batismo, que nos conforma ao Cristo morto e
ressuscitado, nos impele a viver na terra com a tensão da vida plena em Deus,
assim, ao celebrarmos a elevação à gloria do céu da Virgem Maria, mãe do filho
de Deus, pedimos ao Senhor com a Igreja: “dai-nos
viver atentos às coisas do alto, a fim de participarmos da sua glória”
(Oração do dia).
ORAÇÃO A NOSSA SENHORA
ASSUNTA AO CÉU (Composta pelo Papa Pio XII)
“Oh Virgem Imaculada, Mãe
de Deus e dos Homens. Cremos com todo o fervor de nossa fé em tua triunfante
Assunção em alma e corpo ao céu, onde és aclamada rainha por todo o coro dos
anjos e por todos os Santos, e a eles nos unimos para louvar e bendizer o
Senhor que Te exaltou sobre todas as demais criaturas: para oferecer-se a
veemência de nossa devoção e de nosso amor. Sabemos que teu olhar, que
maternalmente acaricia a humilde e sofredora humanidade de Cristo na terra, se
sacia no céu na contemplação da gloriosa humanidade da sabedoria incriada, e
que o gozo da tua alma, ao contemplar face a face a adorável Trindade faz com
que teu coração palpite com beatífica ternura. E nós, pobres pecadores, nós, a
quem o corpo se sobrepõe aos anseios da alma, nós te imploramos que purifique
nossos sentidos, de maneira a que aprendamos, cá em baixo, a deleitar-nos em
Deus, tão somente em Deus, no encanto das criaturas. Estamos certos de que teus
olhos misericordiosos fixar-se-ão em nossas misérias e em nossas angústias: em
nossas lutas e em nossas fraquezas; que teus lábios sorrirão sobre nossas
alegrias e em nossas vitórias; que Tu ouvirás a voz de Jesus dizer-te de todos
nós, como o fez Ele de seu amado discípulo: Aqui está teu filho.
“E nós, que te invocamos,
Mãe nossa, nós te tomamos como o fez João, como guia forte e consolo de nossa
mortal vida. Nós temos a vivificante certeza de que teus olhos, que choraram na
terra, banhada pelo sangue de Jesus, voltar-se-ão uma vez mais para este mundo
presa da guerra, de perseguições, de opressão dos justos e dos fracos. E, com
meio à escuridão deste vale de lágrimas, nós esperamos de Tua luz celestial e
de tua doce piedade, consolo para as aflições de nossos corações, para
atribulações da Igreja e de nosso país.
“Cremos finalmente que na
glória, na qual tu reinais, vestida de sol e coroada de estrelas tu és, depois
de Jesus, o gozo de todos os anjos e todos Santos. E nós, que nesta terra
passamos como peregrinos, animados pela fé na futura ressurreição, olhamos para
ti, nossa vida, nossa doçura, nossa esperança. Atraí-nos para ti com a mansidão
de tua voz, para ensinar-nos um dia, depois de nosso exílio, a Jesus, bendito
fruto de teu seio, ó graciosa, ó piedosa, ó doce Virgem Maria”.
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