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sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

3º DOMINGO DO ADVENTO:
MARIA DE NAZARÉ: A MULHER DO SIM A DEUS
Joaquim Manuel Garrido Mendes, scj

     Maria de Nazaré não é uma personagem com grande visibilidade nos textos neo-testamentários.  É fácil perceber porquê: aos primeiros cristãos não interessaria tanto a reportagem histórica sobre Jesus, a definição do seu bilhete de identidade (com filiação incluída), a sua história de família; mas interessava, sobretudo, tentar entrar no mistério de Jesus, descobrir o núcleo fundamental da sua proposta, apreender as coordenadas fundamentais do “Reino”.
     Apesar disso, há algumas referências significativas a Maria, sobretudo na versão lucana do Evangelho da Infância. São textos que impõem Maria de Nazaré como um modelo de espera atenta do Senhor. É por isso que, com João Baptista, ela é uma das figuras que a liturgia propõe à nossa consideração e que pode ajudar-nos a viver de forma mais empenhada e coerente o nosso “caminho de advento”.
     Há, sobretudo, dois textos lucanos que merecem a nossa atenção, pois definem as duas grandes coordenadas à volta das quais a vida de Maria se edificou. Um (cf. Lc 1,26-38), propõe-nos a mulher do “sim” a Deus; outro (cf. Lc 1,39-56), apresenta-nos a mulher do “sim” aos irmãos.
     Detenhamo-nos um pouco na história do anúncio do anjo a Maria (cf. Lc 1,26-38). Trata-se de um texto bem conhecido, abundantemente representado na liturgia e na arte cristã. O objetivo óbvio do relato de Lucas é apresentar Maria como o protótipo do crente ideal.
     Para percebermos o que está em jogo, vamos entrar um pouco no ambiente em que a narração nos situa.
     Maria vive em Nazaré – uma aldeia humilde da Galileia, nunca referenciada no Antigo Testamento e sem qualquer significado no contexto das vilas ou cidades ligadas às grandes instituições religiosas de Israel. A jovem Maria está matrimonialmente comprometida com um homem chamado José, que descende da família de David; no entanto, ainda não vivem em comum (o costume palestino previa que o compromisso dos noivos começasse com os esponsais; mas, só depois de o noivo receber a noiva em sua casa, o casamento era consumado).
     De acordo com o relato de Lucas, é nesse contexto que um mensageiro de Deus – o anjo Gabriel – vem ao encontro de Maria e lhe propõe ser a mãe do Messias.
     Não interessa se o texto é um relato fiel de acontecimentos concretos, ou se é apenas uma reflexão carregada de significado teológico, feita bem ao jeito dos relatos de vocação do Antigo Testamento, sobre o chamamento de Deus e a resposta de Maria…
     Seja como for, este texto assume um significado paradigmático: ele apresenta a “atitude de vida” que Maria de Nazaré assumiu diante de Deus; e é essa atitude que nos interpela e nos questiona.
     Na mensagem que o “anjo” dirige a Maria, fica claro que Deus tem um projeto de salvação para oferecer aos homens e conta com Maria para que esse projeto possa tornar-se uma realidade viva e concreta. Esse projeto, no entanto, comporta riscos e, inevitavelmente, abalará os esquemas sobre os quais Maria está a construir a sua vida e o seu futuro.
     Maria aceitará “correr riscos”, pôr em causa tudo o que está a construir com José para aceitar o desafio de Deus?
     Maria escolherá o caminho fácil do comodismo, ou preferirá entregar-se confiadamente nas mãos de Deus?
     O que é que terá mais peso na vida desta jovem: os seus projetos pessoais, ou o projeto libertador que Deus quer oferecer aos homens?
     A resposta de Maria não deixa qualquer dúvida: “eis a serva do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra”.
     Afirmar-se como “serva” significa, mais do que humildade, reconhecer que se é um eleito de Deus e aceitar essa eleição, com tudo o que ela implica – pois, no Antigo Testamento, ser “servo do Senhor” é um título de glória, reservado àqueles que Deus escolheu, que Ele reservou para o seu serviço e que Ele enviou ao mundo com uma missão (essa designação aparece, por exemplo, no Deutero-Isaías – cf. Is 42,1; 49,3; 50,10; 52,13; 53,2.11 – em referência à figura enigmática do “servo de Jahwéh”).
          Desta forma, Maria reconhece que Deus a escolheu, aceita com disponibilidade essa escolha e manifesta a sua disposição de cumprir, com fidelidade, o projeto de Deus.

O EXEMPLO DE MARIA

     Maria tem de ser, antes de mais, um modelo de vida, alguém que nos ensina uma “atitude”. Neste caso, é o seu “sim” incondicional a Deus que tem de nos marcar e de nos interpelar.
     O mensageiro de Deus apresenta a Maria um desafio. Diante da proposta de Deus, Ela não pensa nos seus projetos pessoais ou nas complicações em que Deus a ia meter. Nem sequer pede tempo para pensar. Também não impõe condições de qualquer espécie, nem “negocia” com Deus exigindo algo em troca…
     O seu “sim” é incondicional, total, radical: “eu sou a serva, estou disposta a entregar a minha vida nas mãos de Deus e a confiar n’Ele de forma total e plena. Que Ele faça o que é melhor para o seu plano e eu colaboro com Ele” – diz ela.
     É possível a alguém entregar-se tão cegamente a Deus, sem reservas, sem medir os prós e os contras? Como é que se chega a esta confiança incondicional em Deus e nos seus projetos?
    Não se chega a esta confiança cega em Deus e nos seus planos, sem uma vida de diálogo, de comunhão, de intimidade com Deus. Estamos, portanto, a falar de uma mulher para quem Deus ocupa o primeiro lugar e é a prioridade. Estamos a falar de uma pessoa de oração e de fé, que faz a experiência do encontro com Deus e aprende a confiar totalmente n’Ele. Estamos a falar de uma pessoa que, antes de qualquer coisa, considera os planos de Deus.
     Maria está na linha dos “profetas”: ela vive numa atitude de relação, de proximidade, de diálogo, de comunhão com Deus e Deus, na sua vida, ocupa um lugar primordial. Nesse diálogo, Maria apercebe-se dos projetos de Deus e do lugar que Deus lhe reserva na concretização desses projetos; e, como Deus é a sua prioridade, ela só pensa em cumprir a missão que Deus tem para ela.
     O “sim” incondicional e total de Maria permite que Deus venha ao encontro dos homens e comece a instaurar esse mundo novo de felicidade e de paz com que todos sonhamos… É que Deus age no mundo através dos homens e das mulheres; e dizer “sim” a Deus (quer dizer, aceitar cumprir o meu papel para que Deus, através de mim, “nasça” no mundo), é acolhê-lo e torná-lo uma realidade viva no mundo.
     Maria propõe-nos uma vida em que Deus seja o ponto de referência à volta do qual construímos tudo. Isso implica - como implicou para ela - uma experiência de encontro, de relação, de diálogo, de proximidade, de comunhão com Deus…
     Nessa experiência, crescemos na fé e na confiança; e, quando discernimos o projeto que Deus nos quer confiar, é preciso ter a coragem de dizer “sim” e de concretizá-lo, sem dramas, sem inquietações, sem angústias, sem medos. Ora, quando isso acontece, também nós – como ela – fazemos com que Deus venha a este mundo e o transforme.

PARA UM QUESTIONAMENTO PESSOAL OU EM GRUPO:

A Maria do “sim” a Deus, interpela-me…
• Vivo com Deus uma relação tão próxima que confio totalmente n’Ele?
• Estou tão em comunhão com Deus que percebo os seus planos para o mundo e consigo detectar e entender os “sinais” com que Ele me interpela?
• Aceito com total disponibilidade os projetos de Deus para mim, mesmo quando Ele me pede algo que parece pôr em causa os meus projetos muito pessoais?

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