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sábado, 31 de dezembro de 2016

1º de janeiro: Santa Maria, Mãe de Deus

Textos: Nm 6, 22-27; Gal 4, 4-7: Lc 2, 16-21

Evangelho (Lc 2,16-21): Foram, pois, às pressas a Belém e encontraram Maria e José, e o recém-nascido deitado na manjedoura. Quando o viram, contaram as palavras que lhes tinham sido ditas a respeito do menino. Todos os que ouviram os pastores ficavam admirados com aquilo que contavam. Maria, porém, guardava todas estas coisas, meditando-as no seu coração. Os pastores retiraram-se, louvando e glorificando a Deus por tudo o que tinham visto e ouvido, de acordo com o que lhes tinha sido dito. No oitavo dia, quando o menino devia ser circuncidado, deram-lhe o nome de Jesus, como fora chamado pelo anjo antes de ser concebido no ventre da mãe.

«Foram, pois, às pressas a Belém e encontraram Maria e José, e o recém-nascido deitado na manjedoura»

Rev. D. Manel VALLS i Serra (Barcelona, Espanha)

Hoje, a Igreja contempla agradecida a maternidade da Mãe de Deus, modelo de sua própria maternidade para com todos nós. Lucas nos apresenta o “encontro” dos pastores “com o Menino”, o qual está acompanhado de Maria, sua Mãe, e de José. A discreta presença de José sugere a importante missão de ser custódio do grande mistério do Filho de Deus. Todos juntos, pastores, Maria e José, «Foram com grande pressa e acharam Maria e José, e o menino deitado na manjedoura» (Lc 2,16) é como uma imagem preciosa da Igreja em adoração.

“A Manjedoura”: Jesus já está na manjedoura, numa noite alusiva à Eucaristia. Foi Maria quem o colocou lá! Lucas fala de um “encontro”, de um encontro dos pastores com Jesus. Em efeito, sem a experiência de um “encontro” pessoal com o Senhor, a fé não acontece. Somente este “encontro”, o qual se entende um “ver com os próprios olhos”, e em certa maneira um “tocar”, faz com que os pastores sejam capazes de chegar a ser testemunhas da Boa Nova, verdadeiros evangelizadores que podem dar a conhecer o que lhes haviam dito sobre aquela Criança. «Vendo-o, contaram o que se lhes havia dito a respeito deste menino» (Lc 2,17).

Aqui vemos o primeiro fruto do “encontro” com Cristo: «Todos os que os ouviam admiravam-se das coisas que lhes contavam os pastores» (Lc 2,18). Devemos pedir a graça de saber suscitar este “maravilhamento”, esta admiração naqueles a quem anunciamos o Evangelho.

Ainda há um segundo fruto deste encontro: «Voltaram os pastores, glorificando e louvando a Deus por tudo o que tinham ouvido e visto, e que estava de acordo com o que lhes fora dito» (Lc 2,20). A adoração do Menino lhes enche o coração de entusiasmo por comunicar o que viram e ouviram, e a comunicação do que viram e ouviram os conduz até a pregaria de louvor e de ação de graças, à glorificação do Senhor.

Maria, mestra de contemplação —«Maria conservava todas estas palavras, meditando-as no seu coração» (Lc 2,19) — nos dá Jesus, cujo nome significa “Deus salva”. Seu nome é também nossa Paz. Acolhamos coração este sagrado e doce Nome e tenhamo-lo frequentemente nos nossos lábios!

Maria é Mãe de Deus e Mãe nossa.

Pe. Antonio Rivero, L.C.

Foi o Papa Paulo VI quem transladou para o dia 1º de janeiro a festa da Maternidade divina de Maria, que antes caia no dia 11 de outubro. De fato, antes da reforma litúrgica realizada depois do concilio Vaticano II, no primeiro dia do ano se celebrava a memória da circuncisão de Jesus no oitavo dia depois do seu nascimento- como sinal de submissão à lei, sua inserção oficial no povo eleito- e no domingo seguinte se celebrava a festa do nome de Jesus.

Como nossos irmãos orientais de rito sírio, demos hoje os augúrios e felicitações a Maria Santíssima, por ser a Mãe de Deus. Aproximemo-nos dela com esses sentimentos, pois também é nossa Mãe no plano da graça.

Em primeiro lugar, esta verdade de que Maria é verdadeira Mãe de Deus, a Theotokos, a Igreja a definiu no concílio de Éfeso por volta do ano 431. São Cirilo de Alexandria, que presidiu o Concílio, escrevia a continuação a seus fiéis: “Sabeis que se reuniu o santo sínodo na grande igreja de Maria, Mãe de Deus. Passamos ali o dia todo… Havia ali uns duzentos bispos reunidos. Todo o povo esperava com ansiedade, aguardando desde o amanhecer até o crepúsculo a decisão do santo Sínodo… Quando saímos da igreja, acompanharam-nos com tochas até nossos domicílios, porque era de noite. Respirava-se alegria no ambiente; a cidade estava salpicada de luzes; inclusive as mulheres nos precediam com incensários e abriam a marcha” (Epístola 24). Santo Inácio de Antioquia chama Jesus “o filho de Deus e de Maria”. Isto coloca a Maria a uma altura que da vertigem, ao lado do Padre. Mas também, por ser de nossa raça “nascido duma mulher”, está perto de nós e se faz também nossa mãe, mãe da Igreja. De escravos que éramos passamos a ser filhos no Filho (segunda leitura). Maravilhoso intercambio este como para felicitar a Maria y felicitarmos entre nós.

Em segundo lugar, vejamos a missão que esta Mãe tem, como toda mãe. Uma mãe da a luz seu filho com amor e acompanha seu filho até o final. Assim fez Maria com seu Filho Jesus. Uma mãe amamenta seu filho. Uma mãe cuida seu filho. Uma mãe respeita a liberdade de seu filho. Uma mãe acompanha seu filho nos momentos alegres e também nos momentos difíceis. Maria é mãe de todos os homens na ordem da graça. Ao dar à luz a seu primogénito, deu à luz também espiritualmente a aqueles que pertenceriam a Ele, aos que seriam incorporados a Ele e se converteriam assim em membros seus. Ella desde o céu intercede por nós, consola-nos, anima-nos e nos aponta o seu Filho dizendo-nos: “Fazei o que Ele vos disser”.

Finalmente, preguntemos o que podemos imitar de Maria, nossa Mãe. O evangelho nos dá dois segredos: “Ela conservava estas coisas e as meditava no seu coração”. Sejamos homens que saibamos ruminar as coisas de Deus na nossa vida, e como dizia santo Agostinho, dado que não podemos imitá-la na primeira Encarnação física, imitemos Maria na segunda encarnação espiritual “concebendo o Verbo com a mente”. E segundo, saiamos do Natal como os pastores que “dando glória e louvor a Deus por todo quanto ouviram e viram”, ou seja, sejamos testemunhas desta Encarnação do Filho de Deus e desta Maternidade divina de Maria.

Para refletir: Tenho a Maria como mãe da minha fé, esperança e amor? Rezo continuamente a Maria? Posso, como Maria, receber a palavra, custodiá-la no meu coração, fazer dela a luz para meus passos, alimento da minha vida espiritual.

Qualquer sugestão ou dúvida podem se comunicar com o padre Antonio neste e-mail:  arivero@legionaries.org

sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

31 de dezembro (Dia sétimo da Oitava de Natal)

Evangelho (Jo 1,1-18): No princípio era a Palavra, e a Palavra estava junto de Deus, e a Palavra era Deus. Ela existia, no princípio, junto de Deus. Tudo foi feito por meio dela, e sem ela nada foi feito de tudo o que existe. Nela estava a vida, e a vida era a luz dos homens. E a luz brilha nas trevas, e as trevas não conseguiram dominá-la. Veio um homem, enviado por Deus; seu nome era João. Ele veio como testemunha, a fim de dar testemunho da luz, para que todos pudessem crer, por meio dele. Não era ele a luz, mas veio para dar testemunho da luz. Esta era a luz verdadeira, que vindo ao mundo a todos ilumina. Ela estava no mundo, e o mundo foi feito por meio dela, mas o mundo não a reconheceu. Ela veio para o que era seu, mas os seus não a acolheram. A quantos, porém, a acolheram, deu-lhes poder de se tornarem filhos de Deus: são os que creem no seu nome. Estes foram gerados não do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus. E a Palavra se fez carne e veio morar entre nós. Nós vimos a sua glória, glória que recebe do seu Pai como filho único, cheio de graça e de verdade. João dá testemunho dele e proclama: «Foi dele que eu disse: ‘Aquele que vem depois de mim passou à minha frente, porque antes de mim ele já existia». De sua plenitude todos nós recebemos, graça por graça. Pois a Lei foi dada por meio de Moisés, a graça e a verdade vieram por meio de Jesus Cristo. Ninguém jamais viu a Deus; o Filho único, que é Deus e está na intimidade do Pai, foi quem o deu a conhecer».

«E a Palavra se fez carne»

Rev. D. David COMPTE i Verdaguer (Manlleu, Barcelona, Espanha)

Hoje é o último dia do ano. Frequentemente, uma mistura de sentimentos — incluso contraditórios — sussurram nos nossos corações nesta data. É como se uma amostra dos diferentes momentos vividos, e dos que gostaríamos de ter vivido, se tornassem presentes na nossa memória. O Evangelho de hoje pode ajudar-nos a decantá-los para podermos começar o novo ano com um empurrão.

«A palavra era Deus (…). Tudo foi feito por meio dela» (Jo 1, 1.3). No momento de fazer o balanço do ano, devemos ter presente que cada dia vivido é um dom recebido. Por isso, seja qual for o aproveitamento realizado, hoje devemos agradecer cada minuto do ano.

Mas o dom da vida não é completo. Estamos necessitados. Por isso o Evangelho de hoje aporta-nos uma palavra-chave: “acolher”. «E a Palavra se fez carne» (Jo 1,14). Acolher o próprio Deus! Deus, feito homem, fica ao nosso alcance. “Acolher” significa abrir-lhe as nossas portas, deixar que entre nas nossas vidas, nos nossos projetos, nos atos que enchem as nossas jornadas. Até que ponto acolhemos a Deus e lhe permitimos que entre em nós?

«Esta era a luz verdadeira, que vindo ao mundo a todos ilumina» (Jo 1,9). Acolher a Jesus quer dizer deixar-se guiar por Ele. Deixar que os seus critérios deem luz tanto aos nossos pensamentos mais íntimos como a nossa atuação social e de trabalho. Que as nossas ações se relacionem com as suas!

«A vida era a luz» (Jo 1,4). Mas a fé é algo mais que uns critérios. É a nossa vida enxertada na Vida. Não é apenas esforço — que também —. É, sobretudo, dom e graça. Vida recebida no seio da Igreja, sobretudo mediante os sacramentos. Que lugar têm eles na minha vida cristã?

«A quantos, porém, a acolheram, deu-lhes poder de se tornarem filhos de Deus» (Jo 1,12). Todo um projeto apaixonante para o ano que vamos estrear!

Reflexões de Frei Carlos Mesters, O.Carm

Sta Catarina Labouret, virgem
* O Prólogo é a primeira coisa que se vê ao abrir o evangelho de João. Mas foi a última a ser escrita. É o resumo final, colocado no início. Nele João descreve a caminhada da Palavra de Deus. Ela estava junto de Deus desde antes da criação e por meio dela tudo foi criado. Tudo que existe é expressão da Palavra de Deus. Como a Sabedoria de Deus (Prov 8,22-31), a Palavra quis chegar mais perto de nós e se fez carne em Jesus. Viveu no meio de nós, realizou a sua missão e voltou para Deus. Jesus é esta Palavra de Deus. Tudo que ele diz e faz é comunicação que nos revela o Pai.

* Dizendo "No princípio era a Palavra", João evoca primeira frase da Bíblia que diz: "No princípio Deus criou o céu e a terra" (Gn 1,1). Deus criou tudo por meio da sua Palavra. "Ele falou e as coisas começaram a existir" (Sl 33,9; 148,5). Todas as criaturas são uma expressão da Palavra de Deus. Esta Palavra viva de Deus, presente em todas as coisas, brilha nas trevas. As trevas tentam apagá-la, mas não conseguem. A busca de Deus, sempre de novo, renasce no coração humano. Ninguém consegue abafá-la. Não conseguimos viver sem Deus por muito tempo!

* João Batista veio para ajudar o povo a descobrir e saborear esta presença luminosa e consoladora da Palavra de Deus na vida. O testemunho de João Batista foi tão importante, que muita gente pensava que ele fosse o Cristo (Messias). (At 19,3; Jo 1,20). Por isso, o Prólogo esclarece dizendo: "João não era a luz! Veio apenas para dar testemunho da luz!"

* Assim como a Palavra de Deus se manifesta na natureza, na criação, da mesma maneira ela se manifesta no "mundo", isto é, na história da humani­dade e, de modo particular, na história do povo de Deus. Mas o "mundo" não reconheceu nem recebeu a Palavra. Ela "veio para o que era seu, mas os seus não a receberam". Aqui, quando fala mundo, João quer indicar o sistema tanto do império como da religião da época, ambos fechados sobre si e, por isso mesmo, incapazes de reco­nhecer e de receber a Boa Nova (Evangelho) da presença luminosa da Palavra de Deus.

* Mas as pessoas que se abrem aceitando a Palavra, tornam-se filhos e filhas de Deus. A pessoa se torna filho ou filha de Deus não por mérito próprio, nem por ser da raça de Israel, mas pelo simples fato de confiar e crer que Deus, na sua bondade, nos aceita e nos acolhe. A Palavra entra na pessoa e faz com que ela se sinta acolhida por Deus como filha, como filho. É o poder da graça de Deus.

* Deus não quer ficar longe de nós. Por isso, a sua Palavra chegou mais perto ainda e se fez presente no meio de nós na pessoa de Jesus. O Prólogo diz literalmente: "A Palavra se fez carne e montou sua tenda no meio de nós!" Antigamente, no tempo do êxodo, lá no deserto, Deus vivia numa tenda no meio do povo (Ex 25,8). Agora, a tenda onde Deus mora conosco é Jesus, "cheio de graça e de verdade!" Jesus veio revelar quem é este nosso Deus que está presente em tudo, desde o começo da criação.

Para um confronto pessoal
1. Tudo que existe é uma expressão da Palavra de Deus, uma revelação da sua presença. Será que sou suficientemente contemplativo para poder perceber e experimentar esta presença universal da Palavra de Deus?
2. O que significa para mim poder ser chamado filho de Deus?

quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

A Sagrada Família

Textos: Eclesiástico 3, 2-6.12-14; Colossenses 3, 12-21; Mateus 2, 13-15.19-23

Evangelho (Mt 2,13-15.19-23): Depois que os magos se retiraram, o anjo do Senhor apareceu em sonho a José e lhe disse: «Levanta-te, toma o menino e sua mãe e foge para o Egito! Fica lá até que eu te avise, porque Herodes vai procurar o menino para matá-lo». José levantou-se, de noite, com o menino e a mãe, e retirou-se para o Egito; e lá ficou até à morte de Herodes. Assim se cumpriu o que o Senhor tinha dito pelo profeta: «Do Egito chamei o meu filho». Quando Herodes morreu, o anjo do Senhor apareceu em sonho a José, no Egito, e lhe disse: «Levanta-te, toma o menino e sua mãe, e volta para a terra de Israel; pois já morreram aqueles que queriam matar o menino». Ele levantou-se, com o menino e a mãe, e entrou na terra de Israel. Mas quando soube que Arquelau reinava na Judéia, no lugar de seu pai Herodes, teve medo de ir para lá. Depois de receber em sonho um aviso, retirou-se para a região da Galileia e foi morar numa cidade chamada Nazaré. Isso aconteceu para se cumprir o que foi dito pelos profetas: «Ele será chamado nazareno».

«Levanta-te, toma o menino e sua mãe, e volta para a terra de Israel»

Rev. D. Joan Ant. MATEO i García (La Fuliola, Lleida, Espanha)

Hoje contemplamos o mistério da Sagrada Família. O Filho de Deus inicia sua andança entre os homens no seio de uma família. São os desígnios do Pai. A família será sempre o habitat humano insubstituível. Jesus tem um pai legal que o “leva” e uma Mãe que não se separa Dele. Deus se serviu em todo momento de São José, homem justo, esposo fiel e pai responsável para defender à Família de Nazaré: «Depois de sua partida, um anjo do Senhor apareceu em sonhos a José e disse: Levanta-te, toma o menino e sua mãe e foge para o Egito; fica lá até que eu te avise, porque Herodes vai procurar o menino para matá-lo. » (Mt 2,13).

Hoje, mais que nunca, a Igreja está chamada a proclamar a boa nova do Evangelho da Família e a vida. Hoje más que nunca, uma cultura profundamente inumana tenta impor um anti-evangelho de confusão e de morte. João Paulo II nos lembrava em sua exortação Ecclesia in Europa: «A Igreja deve propor com fidelidade a verdade sobre o matrimonio e a família. É uma necessidade que sente de maneira urgente, porque sabe que esta tarefa lhe compete pela missão evangelizadora que seu Esposo e Senhor lhe confiou e que hoje se expressa com especial urgência. O valor da indissolubilidade matrimonial se corrompe cada vez mais; se reclamam formas de reconhecimento legal das convivências de fato, equiparando-as ao matrimonio legítimo...».

«Depois de sua partida, um anjo do Senhor apareceu em sonhos a José e disse: Levanta-te, toma o menino e sua mãe e foge para o Egito; fica lá até que eu te avise, porque Herodes vai procurar o menino para matá-lo. » (Mt 2,13). Herodes ataca novamente, mas não temamos, porque a ajuda de Deus não nos faltará. Vamos a Nazaré! Redescubramos a verdade da família e da vida. Vivamos gozosamente e anunciemos aos nossos irmãos sedentos de luz e esperança. O Papa nos convoca a isso: «É preciso reafirmar tais instituições [o matrimonio e a família] como provenientes da vontade de Deus. Além disso, é necessário servir ao Evangelho da vida».

Novamente, «Com a morte de Herodes, o anjo do Senhor apareceu em sonhos a José, no Egito, e disse: Levanta-te, toma o menino e sua mãe e retorna à terra de Israel, porque morreram os que atentavam contra a vida do menino. » (Mt 2,19-20). O retorno de Egito é iminente!

Esse Menino que nasce em Belém nasce numa família humana, que é modelo para todas as famílias.

P. Antonio Rivero, L.C.

Em primeiro lugar, nos perguntemos como vivia esta família humana de Jesus. Unidos na oração e na obediência a Deus: “Levanta-te, toma o menino e sua mãe e foge para o Egito … retorna à terra de Israel”. Unidos no amor mútuo: “levantou-se durante a noite, tomou o menino e sua mãe e partiu para o Egito”. Unidos no trabalho, na dor e nas provações: “…porque Herodes vai procurar o menino para o matar” (Evangelho). Um programa para as famílias de hoje.

Em segundo lugar, nos perguntemos como vivem algumas das nossas famílias hoje. Umas, unidas na oração, no amor e na dor. Outras, nem tanto, experimentando a separação, o divórcio, vivendo como se Deus não existisse e se deixando levar pelo canto das sereias, deixando as janelas da afetividade abertas de par em par aos novos ares de libertação, ou abrindo a porta do coração a piratas intrusos que pretendem somente destroçar a barca matrimonial e familiar. Famílias que vivem por motivos de interesse, ou de mera convivência civilizada, e não na fé, na oração e na certeza de saber que são amadas e abençoadas por Deus com um santo Sacramento.

Finalmente, nos perguntemos como deveriam viver as nossas famílias, seguindo o exemplo da Sagrada Família de Nazaré. Deus no centro. O amor como motivação e coroa. A dor como prova para exercitar as virtudes teologais e olhar para o alto. Os filhos honrando os seus pais, não lhes causando tristezas, obedecendo-lhes (segunda leitura) e cuidando deles na velhice (primeira leitura). Os pais revestidos de respeito e amor entre eles, e de bondade, humildade, mansidão, paciência, perdão, amor para com os filhos e piedade e gratidão com Deus (segunda leitura).

Para refletir:
Pais de família: parecem com José? Mães, parecem com Maria? Filhos, parecem com o Menino Jesus?
Meditam juntos sobre o Quarto Mandamento da lei de Deus, tão bem explicado no Catecismo da Igreja Católica nos números 2217-2218?

Para qualquer sugestão ou dúvida, podem se comunicar com o padre Antônio neste e-mail: arivero@legionaries.org

quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

29 de dezembro (Quinto dia da Oitava do Natal)

Evangelho (Lc 2,22-35): E quando se completaram os dias da purificação, segundo a lei de Moisés, levaram o menino a Jerusalém para apresentá-lo ao Senhor, conforme está escrito na Lei do Senhor: «Todo primogênito do sexo masculino será consagrado ao Senhor”. Para tanto, deviam oferecer em sacrifício um par de rolas ou dois pombinhos, como está escrito na Lei do Senhor. Ora, em Jerusalém vivia um homem piedoso e justo, chamado Simeão, que esperava a consolação de Israel. O Espírito do Senhor estava com ele. Pelo próprio Espírito Santo, ele teve uma revelação divina de que não morreria sem ver o Ungido do Senhor. Movido pelo Espírito, foi ao templo. Quando os pais levaram o menino Jesus ao templo para cumprirem as disposições da Lei, Simeão tomou-o nos braços e louvou a Deus, dizendo: «Agora, Senhor, segundo a tua promessa, deixas teu servo ir em paz, porque meus olhos viram a tua salvação, que preparaste diante de todos os povos: luz para iluminar as nações e glória de Israel, teu povo». O pai e a mãe ficavam admirados com aquilo que diziam do menino. Simeão os abençoou e disse a Maria, a mãe: «Este menino será causa de queda e de reerguimento para muitos em Israel. Ele será um sinal de contradição — e a ti, uma espada traspassará tua alma! — e assim serão revelados os pensamentos de muitos corações».

«Agora, Senhor, deixas (...) teu servo ir em paz, porque meus olhos viram a tua salvação»

Chanoine Dr. Daniel MEYNEN (Saint Aubain, Namur, Bélgica)

Hoje, 29 de dezembro, celebramos o santo Rei Davi. Mas, é a toda a família de Davi que a Igreja quer honrar e especialmente ao mais ilustre de todos eles: a Jesus, o Filho de Deus, Filho de Davi! Hoje, nesse eterno “hoje” do Filho de Deus, a Antiga Aliança do tempo do Rei Davi realiza-se e cumpre-se em toda sua plenitude. Pois, como relata o Evangelho de hoje, o Menino Jesus é apresentado ao Templo por seus pais para cumprir com a Antiga Lei: «E quando se completaram os dias da purificação, segundo a lei de Moisés, levaram o menino a Jerusalém para apresentá-lo ao Senhor, conforme está escrito na Lei do Senhor: Todo primogênito do sexo masculino será consagrado ao Senhor (Lc 2,22-23).

Hoje, eclipsa-se a velha profecia para dar passo à nova: Aquele, a quem o Rei Davi tinha anunciado ao entonar seus salmos messiânicos, entrou por fim no Templo de Deus! Hoje é o grande dia em que aquele que São Lucas chama Simeão logo abandonará este mundo de obscuridade para entrar na visão da Luz eterna: «Agora, Senhor, segundo a tua promessa, deixas teu servo ir em paz, porque meus olhos viram a tua salvação, que preparaste diante de todos os povos: luz para iluminar as nações e glória de Israel, teu povo» (Lc 2,29-32).

Também nós, que somos o Santuário de Deus em que seu Espírito habita (cf. 1Cor 3,16), devemos ficar atentos para receber a Jesus no nosso interior. Se hoje temos a fortuna de comungar, peçamos a Maria, a Mãe de Deus que interceda por nós ante seu Filho: que morra o homem velho e que novo homem (cfr.) Col 3,10) nasça em todo nosso ser, a fim de converter-nos nos novos profetas, os que anunciem ao mundo inteiro a presença de Deus três vezes, Pai, Filho e Espírito Santo!

Como Simão, sejamos profetas pela morte do “homem velho”! Como disse o Papa João Paulo II «a plenitude do Espírito de Deus vem acompanhada (...) antes que nada pela disponibilidade interior que provém da fé. Disso, o ancião Simeão “homem justo e piedoso”, teve a intuição no momento da apresentação de Jesus no Templo».

«Meus olhos viram a tua salvação»

Rev. D. Joaquim MONRÓS i Guitart (Tarragona, Espanha)

Hoje, contemplamos a Apresentação do Menino Jesus no Templo, cumprindo a prescrição da Lei de Moisés: purificação da mãe e apresentação e resgate do primogénito.

São Josemaria descreve esta situação no quarto mistério gozoso do seu livro O Santo Rosário, convidando-nos a fazer parte da cena: «E desta vez, meu amigo, hás de ser tu a levar a gaiola das rolas. – Estás a ver? Ela – a Imaculada! – submete-se à Lei como se estivesse imunda. Aprenderás com este exemplo, menino tonto, a cumprir a Santa Lei de Deus, apesar de todos os sacrifícios pessoais?

«Purificação! Tu e eu, sim, que realmente precisamos de purificação! – Expiação e, além da expiação, o Amor. – Um amor que seja cautério: que abrase a sujidade da nossa alma, que incendeie, com chamas divinas, a miséria do nosso coração».

Vale a pena aproveitar o exemplo de Maria para “limpar” a nossa alma neste tempo do Natal, fazendo uma confissão sacramental sincera, para poder receber o Senhor com as melhores disposições. Assim, José apresenta a oferenda de um par de rolas, mas oferece principalmente a sua capacidade de realizar, com o seu trabalho e com o seu amor castíssimo, o plano de Deus para a Sagrada Família, modelo de todas as famílias.

Simeão recebeu do Espírito Santo a revelação de que não morreria sem ver Cristo. Vai ao Templo e, ao receber o Messias nos seus braços, cheio de alegria, diz-lhe: «Agora, Senhor, segundo a tua promessa, deixas teu servo ir em paz, porque meus olhos viram a tua salvação» (Lc 2,29-30). Neste Natal, contemplemos, com olhos de fé, Jesus que vem salvar-nos com o seu nascimento. Assim como Simeão entoou um cântico de ação de graças, alegremo-nos cantando diante do presépio, em família, e no nosso coração, pois sabemo-nos salvos pelo Menino Jesus.

Reflexões de Frei Carlos Mesters, O.Carm

* Os primeiros dois capítulos do Evangelho de Lucas, escrito na metade dos anos 80, não são história no sentido em que nós hoje entendemos a história. Funcionam muito mais como espelho, onde os cristãos convertidos do paganismo descobriam que Jesus tinha vindo realizar as profecias do Antigo Testamento e atender às mais profundas aspirações do coração humano. São também símbolo e espelho do que estava acontecendo entre os cristãos do tempo de Lucas. As comunidades vindas do paganismo tinham nascido das comunidades dos judeus convertidos, mas eram diferentes. O Novo não correspondia ao que o Antigo imaginava e esperava. Era "sinal de contradição" (Lc 2,34), causava tensões e era fonte de muita dor. Na atitude de Maria, imagem do Povo de Deus, Lucas apresenta um modelo de como perseverar no Novo, sem ser infiel ao Antigo.

* Nestes dois primeiros capítulos do evangelho de Lucas tudo gira em torno do nascimento de duas crianças: João e Jesus. Os dois capítulos nos fazem sentir o perfume do Evangelho de Lucas. Neles, o ambiente é de ternura e de louvor. Do começo ao fim, se louva e se canta, pois, finalmente, a misericórdia de Deus se revelou e, em Jesus, ele cumpriu as promessas feitas aos pais. E Deus as cumpriu em favor dos pobres, dos anawim, como Isabel e Zacarias, Maria e José, Ana e Simeão, os pastores. Estes souberam esperar pela sua vinda.

* A insistência de Lucas em dizer que Maria e José cumpriram tudo aquilo que a Lei prescreve evoca o que Paulo escreveu na carta aos Gálatas: “Quando chegou a plenitude do tempo, Deus enviou o seu Filho. Ele nasceu de uma mulher, submetido à Lei para resgatar aqueles que estavam submetidos à Lei, a fim de que fôssemos adotados como filhos” (Gal 4,4-5).

* A história do velho Simeão ensina que a esperança, mesmo demorada, um dia se realiza. Ela não se frustra nem se desfaz. Mas a forma de ela realizar-se nem sempre corresponde à maneira como a imaginamos. Simeão esperava o Messias glorioso de Israel. Chegando ao templo, no meio de tantos casais que trazem seus meninos ao templo, ele vê um casal pobre lá de Nazaré. É neste casal pobre com seu menino ele vê a realização da sua esperança e da esperança do povo: “Meus olhos viram a tua salvação, que preparaste diante de todos os povos: luz para iluminar as nações e glória do teu povo, Israel."

* No texto do evangelho deste dia, aparecem os temas preferidos de Lucas, a saber, uma grande insistência na ação do Espírito Santo, na oração e no ambiente orante, uma atenção contínua à ação e à participação das mulheres, e uma preocupação constante com os pobres e com a mensagem a ser dada aos pobres.

Para um confronto pessoal
1. Você seria capaz de perceber numa criança pobre a luz para iluminar as nações?
2. Você seria capaz de aguentar uma vida inteira esperando a realização da sua esperança?

terça-feira, 27 de dezembro de 2016

28 de dezembro: Os Santos Inocentes, mártires.

Evangelho (Mt 2,13-18): Depois que os magos se retiraram, o anjo do Senhor apareceu em sonho a José e lhe disse: «Levanta-te, toma o menino e sua mãe e foge para o Egito! Fica lá até que eu te avise, porque Herodes vai procurar o menino para matá-lo». José levantou-se, de noite, com o menino e a mãe, e retirou-se para o Egito; e lá ficou até à morte de Herodes. Assim se cumpriu o que o Senhor tinha dito pelo profeta: «Do Egito chamei o meu filho». Quando Herodes percebeu que os magos o tinham enganado, ficou furioso. Mandou matar todos os meninos de Belém e de todo o território vizinho, de dois anos para baixo, de acordo com o tempo indicado pelos magos. Assim se cumpriu o que foi dito pelo profeta Jeremias: «Ouviu-se um grito em Ramá, choro e grande lamento: é Raquel que chora seus filhos e não quer ser consolada, pois não existem mais».

«José levantou-se, de noite, com o menino e a mãe, e retirou-se para o Egito»

Rev. D. Joan Pere PULIDO i Gutiérrez (Sant Feliu de Llobregat, Espanha)

Hoje celebramos a festa dos Santos Inocentes, mártires. Introduzidos nas celebrações de Natal, não podemos ignorar a mensagem que a liturgia quer nos transmitir para definir, ainda mais, a Boa Nova do nascimento de Jesus, com dois acentos bem claros. Em primeiro lugar, a predisposição de São José no desígnio salvador de Deus, aceitando sua vontade. E, por sua vez, o mal, a injustiça que frequentemente encontramos em nossa vida, concretizada na morte martirial das crianças Inocentes. Tudo isso pede-nos uma atitude e uma resposta pessoal e social.

São José nos oferece um testemunho bem claro de resposta decidida perante o chamado de Deus. Nele nos sentimos identificados quando devemos tomar decisões nos momentos difíceis de nossa vida e de nossa fé: «Levantou-se de noite, com o menino e a mãe, e retirou-se para Egito» (Mt 2,14).

Nossa fé em Deus implica a nossa vida. Faz que nos levantemos, quer dizer faz nos estar atentos às coisas que acontecem em nosso redor, porque —frequentemente — é o lugar onde Deus fala. Faz nos tomar ao Menino com sua mãe, quer dizer, Deus faz se nos próximo, companheiro de caminho, reforçando a nossa fé, esperança e caridade. E faz nos sair de noite para Egito, isto é, convida-nos a não ter medo perante nossa própria vida, que com frequência enche-se de noites difíceis de iluminar.

Estas crianças mártires, também hoje, têm nomes concretos em crianças, jovens, casais, pessoas idosas, imigrantes, doentes... que pedem a resposta de nossa caridade. Assim nos o diz João Paulo II: «Em efeito, são muitas, em nosso tempo, as necessidades que interpelam a sensibilidade cristã. É hora de uma nova imaginação da caridade, que se desdobre não só na eficácia da ajuda emprestada, mas também na capacidade de nos fazer próximos e solidários com o que sofre».

Que a nova luz, clara e forte de Deus feito Menino encha nossas vidas e consolide nossa fé, nossa esperança e nossa caridade.

Reflexões de Frei Carlos Mesters, O.Carm

* O Evangelho de Mateus, redigido em torno dos anos 80 e 90, tem a preocupação de mostrar que em Jesus se realizam as profecias. Muitas vezes se diz: “Isto aconteceu para que se realizasse o que diz a escritura...” (cf. Mt 1,22; 2,17.23; 4,14; 5,17; etc). É porque os destinatários do Evangelho de Mateus são as comunidades de judeus convertidos que viviam uma crise profunda de fé e de identidade. Depois da destruição de Jerusalém no ano 70, os fariseus eram o único grupo sobrevivente do judaísmo. Nos anos 80, quando eles começaram a se reorganizar, crescia a oposição entre judeus fariseus e judeus cristãos. Estes últimos acabaram sendo excomungados da sinagoga e separados do povo das promessas. A excomunhão tornou agudo o problema da identidade. Já não podiam mais frequentar suas sinagogas. E vinha a dúvida: Será que erramos? Quem é o verdadeiro povo de Deus? Jesus é realmente o Messias?

* É para este grupo sofrido que Mateus escreve o seu evangelho como Evangelho da consolação para ajudá-los a superar o trauma da ruptura; como Evangelho da revelação para mostrar que Jesus é o verdadeiro Messias, o novo Moisés, no qual se realizam as promessas; como Evangelho da nova prática para ensinar o caminho de como alcançar a nova justiça, maior do que a justiça dos fariseus (Mt 5,20).

* No evangelho de hoje transparece esta preocupação de Mateus. Ele consola as comunidades perseguidas mostrando que Jesus também foi perseguido. Ele revela que Jesus é o Messias, pois por duas vezes insiste em dizer que as profecias nele se realizaram; e sugere ainda que Jesus seja o novo Moisés, pois como Moisés foi perseguido e teve que fugir. Ele aponta um novo caminho, sugerindo que devem fazer como os magos que souberam driblar a vigilância da Herodes e voltaram por um ouro caminho para casa.

Para um confronto pessoal
1. Herodes mandou matar as crianças de Belém. O Herodes de hoje continua matando milhões de crianças. Elas morrem de fome, de doença, de desnutrição, de aborto. Quem é hoje Herodes?
2. Mateus ajuda a superar a crise de fé e de identidade. Hoje, muitos vivem uma crise profunda de fé e de identidade. Como o Evangelho pode ajudar a superar esta crise?

segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

27 de dezembro: São João, apóstolo e evangelista

Evangelho (Jo 20,2-8): Maria Madalena saiu correndo e foi se encontrar com Simão Pedro e com o outro discípulo, aquele que Jesus mais amava. Disse-lhes: «Tiraram o Senhor do túmulo e não sabemos onde o colocaram». Pedro e o outro discípulo saíram e foram ao túmulo. Os dois corriam juntos, e o outro discípulo correu mais depressa, chegando primeiro ao túmulo. Inclinando-se, viu as faixas de linho no chão, mas não entrou. Simão Pedro, que vinha seguindo, chegou também e entrou no túmulo. Ele observou as faixas de linho no chão, e o pano que tinha coberto a cabeça de Jesus: este pano não estava com as faixas, mas enrolado num lugar à parte. O outro discípulo, que tinha chegado primeiro ao túmulo, entrou também, viu e creu.

«Viu e creu»

Rev. D. Manel VALLS i Serra (Barcelona, Espanha)

Hoje, a liturgia celebra a solenidade de são João, apóstolo e evangelista. Ao dia seguinte de Natal, a Igreja celebra a festa do primeiro mártir da fé cristã: são Estevão. E ao dia seguinte, a festa de são João, aquele que melhor e mais profundamente penetra no mistério do Verbo encarnado, o primeiro "teólogo" e modelo de tudo verdadeiro “teólogo”. A passagem do seu Evangelho que hoje se propõe ajuda-nos a contemplar o Natal desde a perspectiva da Ressurreição do Senhor. Por isso, João, ao chegar até o túmulo vazio, «viu e creu» (Jo 20,8). Confiados na testemunha dos Apóstolos, nos vemos movidos em cada Natal a "ver" e "crer".

Cada um pode reviver esses "ver" e "crer" a propósito do nascimento de Jesus, o Verbo encarnado. João movido pela intuição do seu coração —e, deveríamos acrescentar pela "graça"— "vê mais além do que seus olhos naquele momento podem contemplar. Na realidade, se ele crê, vê sem "ter visto" ainda a Cristo, com o qual já tem implícita a louvação para aqueles que «não viram, e creram!» (Jo 20,29), com o qual acaba o capítulo do seu Evangelho.

Pedro e João "correm" juntos até o túmulo, mais o texto nos diz que João «o outro discípulo correu mais depressa, chegando primeiro ao túmulo» (Jo 20,4). Parece como se João desejasse mais estar ao lado de Aquele que amava —Cristo— do que estar fisicamente ao lado de Pedro, ante o qual, porém —com um gesto de esperá-lo e que seja ele quem entre primeiro ao túmulo— demonstra que é Pedro quem tem a primazia no Colégio Apostólico. Com tudo, o coração ardente, cheio de zelo, fervoroso de amor por João, é o que o leva a "correr" e "avançar", convidando-nos a viver igualmente a nossa fé com este desejo ardente de encontrar ao Ressuscitado.

Reflexões de Frei Carlos Mesters, O.Carm

* O evangelho de hoje traz o trecho do Evangelho de João, que fala do Discípulo Amado. Provavelmente, escolheram este texto para ser lido e meditado no dia de hoje, festa de São João Evangelista, por causa da identificação espontânea que todos fazemos do discípulo amado com o apóstolo João. O curioso é que, em canto algum do evangelho de João, se diz que o discípulo amado é João. Mas desde o mais remoto início da Igreja sempre se insistiu na identificação dos dois. Porém, insistindo demais na semelhança entre os dois corremos o risco de perder um aspecto muito importante da mensagem do Evangelho a respeito do discípulo amado.

* No evangelho de João o discípulo amado representa a nova comunidade que nasce ao redor de Jesus. O Discípulo Amado está ao pé da Cruz junto com Maria, a mãe de Jesus (Jo 19,26). Maria representa o Povo da antiga aliança. No fim do primeiro século, época em que foi feita a redação final do Evangelho de João, havia o conflito crescente entre a sinagoga e a igreja. Alguns cristãos queriam abandonar o Antigo Testamento e ficar só com o Novo Testamento. Ao pé da Cruz Jesus diz: “Mulher, eis aí teu filho!” E ao discípulo amado: “Filho, eis aí tua mãe!” Os dois devem permanecer unidos, como mãe e filho. Separar o Antigo Testamento do Novo Testamento era naquele tempo o mesmo que hoje chamamos de separação entre fé (NT) e vida (AT).

* No evangelho de hoje, Pedro e o Discípulo Amado, alertados pelo testemunho de Maria Madalena, correm juntos para o Santo Sepulcro. O jovem é mais veloz que o velho e chega primeiro. Ele olha para dentro do sepulcro, observa tudo, mas não entra. Ele deixa Pedro entrar primeiro. Pedro entrou. É sugestiva a maneira como o evangelho descreve a reação dos dois homens diante do que ambos viram: “Então Pedro, que vinha correndo atrás, chegou também e entrou no túmulo. Viu os panos de linho estendidos no chão e o sudário que tinha sido usado para cobrir a cabeça de Jesus. Mas o sudário não estava com os panos de linho no chão; estava enrolado num lugar à parte. Então o outro discípulo, que tinha chegado primeiro ao túmulo, entrou também. Ele viu e acreditou”. Ambos viram a mesma coisa, mas só se diz do Discípulo Amado que ele acreditou: “Depois entrou o discípulo: olhou e acreditou!” Por quê? Será que Pedro não acreditou?

* O discípulo amado tem um olhar diferente que percebe mais que os outros. Tem um olhar amoroso que percebe a presença da novidade de Deus. Na madrugada depois daquela noite de pescaria e depois da pesca milagrosa, é ele, o discípulo amado, que percebe a presença de Jesus e diz: “É o Senhor!” (Jo 21,7). Naquela ocasião, Pedro, alertado pela afirmação do discípulo amado também reconheceu e começou a enxergar. Pedro aprendeu do discípulo amado. Em seguida, Jesus perguntou três vezes; “Pedro, você me ama?” (Jo 21, 15.16.17). Por três vezes, Pedro respondeu: “Tu sabes que eu te amo!” Depois da terceira vez, Jesus confiou as ovelhas aos cuidados de Pedro, pois neste momento também Pedro se tornou “Discípulo Amado”.

Para um confronto pessoal
1. Todos que acreditamos em Jesus somos hoje o Discípulo Amado. Será que tenho o mesmo olhar amoroso para perceber a presença de Deus e crer na sua ressurreição?
2. Separar o Antigo do Novo Testamento é o mesmo que separar Vida e Fé. Como faço e vivo isto?

domingo, 25 de dezembro de 2016

26 de dezembro: São Estevão, promártir

Evangelho (Mt 10,17-22): Naquele tempo, Jesus disse aos Apóstolos: «Cuidado com as pessoas, pois vos entregarão aos tribunais e vos açoitarão nas suas sinagogas. Por minha causa, sereis levados diante de governadores e reis, de modo que dareis testemunho diante deles e diante dos pagãos. Quando vos entregarem, não vos preocupeis em como ou o que falar. Naquele momento vos será dado o que falar, pois não sereis vós que falareis, mas o Espírito do vosso Pai falará em vós. O irmão entregará à morte o próprio irmão; o pai entregará o filho; os filhos se levantarão contra seus pais e os matarão. Sereis odiados por todos, por causa do meu nome. Mas quem perseverar até o fim, esse será salvo».

«Eles vos levarão aos seus tribunais e açoitar-vos-ão»

Fray Josep Mª MASSANA i Mola OFM (Barcelona, Espanha)

Hoje, mal acabámos de saborear a profunda experiência do Nascimento do Menino Jesus, muda o panorama litúrgico. Podíamos pensar que celebrar um mártir não combina com o encanto do Natal… O martírio de Sto. Estevão, que veneramos como protomártir do cristianismo, entra plenamente na teologia da Encarnação do Filho de Deus. Jesus veio ao mundo para derramar o seu Sangue por nós. Estevão foi o primeiro a derramar o seu sangue por Jesus. Lemos neste Evangelho como o próprio Jesus o anuncia: «Eles vos levarão aos seus tribunais e (…) sereis levados diante dos governadores e dos reis: servireis de testemunha» (Mt 10,17.18). Precisamente, “mártir” significa exatamente isto: testemunha.

Este testemunho de palavras e de obras dá-se graças à força do Espírito Santo: «O Espírito do vosso Pai (…) falará em vós» (Mt 10,19). Tal como lemos nos “Atos dos Apóstolos”, capítulo 7, Estevão, levado aos tribunais, deu uma lição magistral, percorrendo o Antigo Testamento, demonstrando que todo ele converge no Novo, na Pessoa de Jesus. N’Ele se cumpre tudo o que tinha sido anunciado pelos profetas e ensinado pelos patriarcas.

Na narrativa do seu martírio encontramos uma belíssima alusão trinitária: «Estevão, cheio do Espírito Santo, fitou o céu e viu a glória de Deus e Jesus de pé à direita de Deus» (At 7,55). A sua experiência foi como uma antecipação da Glória do Céu. E Estevão morreu como Jesus, perdoando aos que o imolavam: «Senhor, não lhes leves em conta este pecado» (At 7,60); rezou as palavras do Mestre: «Pai, perdoa-lhes; porque não sabem o que fazem» (Lc 23, 34).

Peçamos a este mártir que saibamos viver como ele, cheios do Espírito Santo, a fim de que, fixando o olhar no céu, vejamos Jesus à direita de Deus. Esta experiência fará que gozemos já do céu, enquanto estamos na terra.

«Vos entregarão aos tribunais e vos açoitarão »

+ Pe. Joan BUSQUETS i Masana (Sabadell, Barcelona, Espanha)

Hoje, a Igreja celebra a festa do seu primeiro mártir, o diácono São Estevão. O Evangelho, às vezes, parece desconcertante. Ontem transmitia-nos sentimentos de gozo e de alegria pelo Nascimento do Menino Jesus: «Os pastores retiraram-se, louvando e glorificando a Deus por tudo o que tinham visto e ouvido, de acordo com o que lhes tinha sido dito» (Lc 2,20). Hoje parece como se quisera-nos pôr sob aviso perante os perigos: «Cuidado com as pessoas, pois vos entregarão aos tribunais e vos açoitarão nas suas sinagogas» (Mt 10, 17). É que aqueles que queiram ser testemunhos, como os pastores na alegria do Nascimento, devem ser valentes como Estevão no momento de proclamar a Morte e Ressurreição de aquele Menino que tinha nele a Vida.

O mesmo Espirito que cobriu com sua sombra a Maria, a Mãe virgem, para que fosse possível a realização do plano de Deus de salvar aos homens; o mesmo Espirito que posou sob os Apóstolos para que saíssem do seu esconderijo e difundiram a Boa Nova —o Evangelho— pelo mundo todo, é o que dá forças àquele menino que discutia com os da sinagoga e perante o que «não podiam resistir à sabedoria e ao Espirito com que falava» (At 6,10).

Era um mártir na vida. Mártir significa “testemunho”. E foi também mártir por sua morte. Em vida teve em consideração as palavras do Mestre: «Quando vos entregarem, não vos preocupeis em como ou o que falar. Naquele momento vos será dado o que falar» (Mt 10,19). «Cheio do Espírito Santo, Estêvão olhou para o céu e viu a glória de Deus; e viu também Jesus, de pé, à direita de Deus». (Ats.7,55). Estevão o viu e disse. Se o cristão hoje é um testemunho de Jesus Cristo, o que viu com os olhos da fé o vai dizer sem medo com as palavras mais compreensíveis, quer dizer, com fatos, com obras.

Reflexões de Frei Carlos Mesters, O.Carm

* O contraste é grande. Ontem, dia de Natal, foi o presépio do recém-nascido com o canto dos anjos e a visita dos pastores. Hoje é o sangue derramado de Estevão, apedrejado até a morte, porque teve a coragem de crer na promessa expressa na simplicidade do presépio. Estevão criticou a interpretação fundamentalista da Lei de Deus e o monopólio do Templo. Por isso foi morto por eles (At 6,13-14).

* Hoje, na festa de Estevão, primeiro mártir, a liturgia traz um trecho do evangelho de Mateus (Mt 10,17-22), tirado do assim chamado Sermão da Missão (Mt 10,5-42). Nele Jesus adverte os seus discípulos dizendo que a fidelidade ao evangelho traz dificuldades e perseguição: “eles entregarão vocês aos tribunais e açoitarão vocês nas sinagogas deles”. Mas para Jesus o que importa na perseguição não é o lado doloroso do sofrimento, mas sim o lado positivo do testemunho: “Vocês vão ser levados diante de governadores e reis, por minha causa, a fim de serem testemunhas para eles e para as nações”. A perseguição é uma oportunidade para dar testemunho da Boa Nova de Deus que Jesus nos trouxe.

* Foi o que aconteceu com Estevão. Ele deu testemunho da sua fé em Jesus até o último momento da sua vida. Na hora de morrer ele disse: “Vejo os céus abertos, e o Filho do Homem em pé à direita de Deus” (At 7,56). E ao cair morto debaixo das pedradas imitou Jesus gritando: “Senhor, não lhes leve em conta este pecado!” (At 7,60; Lc 23,34).

* Jesus tinha dito: “Quando entregarem vocês, não fiquem preocupados como ou com aquilo que vocês vão falar, porque, nessa hora, será sugerido a vocês o que vocês devem dizer. Com efeito, não serão vocês que irão falar, e sim o Espírito do Pai de vocês é quem falará através de vocês”. Esta profecia de Jesus também se realizou em Estevão. Os seus adversários “não podiam resistir à sabedoria e ao Espírito com o qual ele falava” (At 6,10). “Os membros do sinédrio tiveram a impressão de ver em seu rosto o rosto de um anjo” (At 6,15). Estevão falava “repleto do Espírito Santo” (At 7,55). Por isso, a raiva dos outros era maior e o lincharam na hora.

* Até hoje acontece o mesmo. Em muitos lugares muita gente é arrastada diante dos tribunais e sabe dar respostas que superam em sabedoria aos sábios e entendidos (Lc 10,21).

Para um confronto pessoal
1. Colocando-se na posição de Estevão: você já sofreu alguma vez por causa da sua fidelidade ao Evangelho?
2. A simplicidade do presépio e a dureza do martírio vão de par em par na vida dos Santos e Santas e na vida de tantas pessoas que hoje são perseguidas até a morte por causa da sua fidelidade ao evangelho. Você conheceu de perto pessoas assim?

sábado, 24 de dezembro de 2016

A Natividade do Senhor (Missa da Meia Noite)

Evangelho (Lc 2,1-14): Naqueles dias, saiu um decreto do imperador Augusto mandando fazer o recenseamento de toda a terra — o primeiro recenseamento, feito quando Quirino era governador da Síria. Todos iam registrar-se, cada um na sua cidade. Também José, que era da família e da descendência de Davi, subiu da cidade de Nazaré, na Galileia, à cidade de Davi, chamada Belém, na Judéia, para registrar-se com Maria, sua esposa, que estava grávida. Quando estavam ali, chegou o tempo do parto. Ela deu à luz o seu filho primogênito, envolveu-o em faixas e deitou-o numa manjedoura, porque não havia lugar para eles na hospedaria. Havia naquela região pastores que passavam a noite nos campos, tomando conta do rebanho. Um anjo do Senhor lhes apareceu, e a glória do Senhor os envolveu de luz. Os pastores ficaram com muito medo. O anjo então lhes disse: «Não tenhais medo! Eu vos anuncio uma grande alegria, que será também a de todo o povo: hoje, na cidade de Davi, nasceu para vós o Salvador, que é o Cristo Senhor! E isto vos servirá de sinal: encontrareis um recém-nascido, envolto em faixas e deitado numa manjedoura» De repente, juntou-se ao anjo uma multidão do exército celeste cantando a Deus: «Glória a Deus no mais alto dos céus, e na terra, paz aos que são do seu agrado!».

«E a Palavra se fez carne e veio morar entre nós (Jo 1,14)»

Mons. Jaume PUJOL i Balcells Arcebispo de Tarragona e Primaz de Catalunha (Tarragona, Espanha)

Hoje, com a simplicidade das crianças, consideramos o grande mistério de nossa fé. O nascimento de Jesus marca a chegada da “plenitude dos tempos”. Desde o pecado de nossos primeiros pais, a linhagem humana se havia afastado do Criador. Mas Deus, compadecido de nossa triste situação, enviou o seu Filho eterno, nascido da Virgem Maria, para resgatar-nos da escravidão do pecado.

O apóstolo João o explica usando expressões de grande profundidade teológica: «No princípio era o Verbo, e o Verbo estava junto de Deus e o Verbo era Deus.» (Jo 1,1). João chama “Palavra” ao Filho de Deus, a segunda pessoa da Santíssima Trindade. E complementa: «E o verbo se fez carne e habitou entre nós, e vimos sua glória, a glória que o filho único recebe do seu pai, cheio de graça e de verdade» (Jo 1,14).

Isto é o que celebramos hoje, por isso fazemos festa. Maravilhados, contemplamos Jesus acabado de nascer. É um recém-nascido… E, ao mesmo tempo, Deus onipotente; sem deixar de ser Deus, agora é também um de nós.

Veio à terra para devolver-nos a condição de filhos de Deus. Mas é necessário que cada um acolha em seu interior a salvação que Ele nos oferece. Tal como explica São João, «Mas a todos aqueles que o receberam, aos que creem no seu nome, deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus» (Jo 1,12). Filhos de Deus! Ficamos admirados ante este mistério inefável: «O Filho de Deus se fez filho do homem para fazer aos homens filhos de Deus» (São João Crisóstomo).

Acolhamos Jesus, busquemos: somente Nele encontraremos a salvação, a verdadeira solução para nossos problemas; só Ele dá o último sentido da vida e das contrariedades e da dor. Por isto, hoje lhes proponho: vamos ler mais o Evangelho, vamos meditá-lo; vamos procurar viver verdadeiramente de acordo com os ensinamentos de Jesus, ele Filho de Deus que veio a nós. E então veremos como será verdade que, entre todos, faremos um mundo melhor.

Refletindo o Evangelho com Pe. Thomaz Hughes, SVD

Esta passagem é típica do estilo de Lucas, e contém muito material peculiar a ele. Ele toma as tradições de que Maria e José eram de Nazaré e que Jesus nasceu em Belém, liga-as com as figuras de Augusto, Herodes o Grande e o Governador Quirino, e através destas figuras tece um texto que une oito dos seus temas favoritos: “comida”, “graça”, “alegria”, “pequenez”, “paz”, “salvação”, “hoje” e “universalismo”. Lucas é um verdadeiro artista das palavras evangélicas!

Este trecho pode ser subdivido assim:
1) O contexto histórico e o nascimento de Jesus - 2, 1-7
2) Pronunciamentos angélicos explicando o sentido de Jesus - 2, 8-14
3) Respostas aos pronunciamentos dos anjos - 2, 15-20

A chave para a compreensão do texto se acha nos versículos 11-14. Aqui Lucas apresenta Jesus como o Messias davídico que trará o dom escatológico de paz, o Shalom de Deus. Assim ele faz contraste com a figura de César Augusto. Na impotência da sua infância, Jesus é o Salvador que traz a verdadeira paz, em contraste com o poderoso Augusto, que era celebrado no culto oficial imperial como o fundador de um reino de paz, a “Pax Romana”. O “Shalom” é na verdade o contrário da “Pax Romana,” como hoje seria o oposto da pretensa “paz” imposta pelos canhões e bombardeiros da força militar prepotente - a “Pax Americana!”. Esta revelação da parte dos anjos é recebida e aceita pelos humildes pastores, e meditada por Maria, modelo de fé, e os discípulos, que terão que meditar e aprofundar o sentido de Jesus para eles, sem cessar!

Desde a Idade Média, o presépio tem mantido o seu lugar como um dos símbolos mais caros aos cristãos. Porém, é bom não deixar que a cena do nascimento de Jesus se torne uma cena somente sentimental, com lembranças saudosas da nossa infância! O relato quer sublinhar a opção de Deus que se encarnou como pobre, sem as mínimas condições para um parto digno. Em nossos presépios, até os bois e o asno tomaram banho! A realidade de nascer em uma gruta ou estrebaria era diferente! Jesus nasce em condições semelhantes a milhões de pobres e excluídos pelo mundo afora, nos dias de hoje! É mais uma manifestação da fraqueza de Deus, que é mais forte do que os homens! (1Cor 1, 25).

Diferente de Mateus - que tem outros interesses teológicos - os protagonistas desta cena são os pastores. Na época, eles eram considerados pessoas desqualificadas, marginais, sujos, ritualmente impuros. Mas é para essa gente que os anjos revelam o sentido do acontecido e são eles os primeiros a encontrar Jesus recém-nascido. Assim, em Lucas, são pessoas à margem da sociedade que testemunham o nascimento de Jesus, e igualmente são pessoas desqualificadas que são as testemunhas da Ressurreição - as mulheres! Lucas não perde uma oportunidade para destacar a opção preferencial de Deus pelos pobres e humilhados!

O trecho continua com mais três ênfases tipicamente lucanas - “não ter medo”, “sentir e expressar alegria” e o termo “hoje”. Os ouvintes poderão ter coragem e alegria, porque a salvação de Deus irrompe no mundo “hoje” - não em data futura distante. Esta ideia volta diversas vezes - na sinagoga, depois de fazer a leitura de Isaías, Jesus dirá que “hoje cumpriu-se essa passagem” (4, 21); ao condenado na cruz, Jesus garante que “hoje estará comigo no paraíso” (23, 43). O reino da salvação está sendo inaugurado, e por Jesus, na fraqueza da exclusão social, e não por César, com toda a pompa da corte e das armas! Em uma manjedoura, e não em um palácio imperial! Por parte de quem carece de força e prestígio, e não pelos poderosos e fortes do mundo!

Os pastores não somente testemunham a presença do recém-nascido em Belém, mas anunciam o que disseram os anjos (v. 17). Essa Boa-Notícia complementa o que foi já anunciado à Maria em 1, 31-33, por Maria em 1, 46-45, e por Zacarias em 1, 68-79. É muito significante o termo que Lucas emprega para descrever a reação de Maria: “Maria, porém, conservava todos esses fatos, e meditava sobre eles em seu coração” (v. 19)

Aqui Lucas retrata, através de Maria, a atitude do/a discípulo/a diante dos mistérios de Deus, revelados em Jesus - Maria não capta o significado pleno dos eventos e os rumina no seu íntimo. A ideia volta de novo em Lc 2, 51:“Sua mãe conservava no coração todas essas coisas”.

É uma maneira de apontar para a caminhada de fé que Maria trilhou - e que todos nós, que não captamos o sentido pleno da ação de Deus em nossas vidas, teremos que andar.

O texto encerra afirmando que os pobres e marginalizados - personificados nos pastores: “voltaram, glorificando e louvando a Deus por tudo o que haviam visto e ouvido” (v. 20). Qualquer celebração de Natal que não dê para os sofridos motivo para alegria, coragem e louvor a Deus, pode ser tudo, menos uma celebração cristã!

sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

Feira privilegiada do Advento: 24 de dezembro


Evangelho (Lc 1,67-79): Naquele tempo, Zacarias, seu pai, cheio do Espírito Santo, profetizou dizendo: «Bendito seja o Senhor, Deus de Israel, porque visitou e libertou o seu povo. Ele fez surgir para nós um poderoso salvador na casa de Davi, seu servo, assim como tinha prometido desde os tempos antigos, pela boca dos seus santos profetas: de salvar-nos dos nossos inimigos e da mão de quantos nos odeiam. Ele foi misericordioso com nossos pais: recordou-se de sua santa aliança, e do juramento que fez a nosso pai Abraão, de nos conceder que, sem medo e livres dos inimigos, nós o sirvamos, com santidade e justiça, em sua presença, todos os dias de nossa vida. E tu, menino, serás chamado profeta do Altíssimo, porque irás à frente do Senhor, preparando os seus caminhos, dando a conhecer a seu povo a salvação, com o perdão dos pecados, graças ao coração misericordioso de nosso Deus, que envia o sol nascente do alto para nos visitar, para iluminar os que estão nas trevas, na sombra da morte, e dirigir nossos passos no caminho da paz».

«Que envia o sol nascente do alto para nos visitar, para iluminar os que estão nas trevas»

Rev. D. Ignasi FABREGAT i Torrents (Terrassa, Barcelona, Espanha)

Hoje, o Evangelho recolhe o cântico de louvor de Zacarias após o nascimento do seu filho. Na primeira parte, o pai de João dá graças a Deus, na segunda parte os seus olhos voltam-se para o futuro. Todo ele propaga alegria e esperança ao reconhecer a ação salvadora de Deus para com Israel, que culmina na vinda do próprio Deus encarnado, preparada pelo filho de Zacarias.

Já sabemos que Zacarias tinha sido castigado por Deus devido à sua incredulidade. Porém, agora quando a ação divina se manifesta totalmente na sua própria carne – pois recupera a fala — exclama aquilo que até então não podia dizer senão com o coração; e certamente que o dizia: «Bendito seja o Senhor, Deus de Israel … (Lc 1,68). Quantas vezes vemos as coisas de forma obscura, negativa, pessimista! Se tivéssemos a visão sobrenatural que Zacarias demonstra no Canto do Benedictus, viveríamos permanentemente com alegria e esperança.

«O Senhor está próximo; o Senhor já está aqui!» O pai do Percursor está consciente de que a vinda do Messias é, acima de tudo, luz. Uma luz que ilumina os que vivem na obscuridade, nas sombras da morte, ou seja, nós próprios! Oxalá nos demos conta, com plena consciência, de que o Menino Jesus vem iluminar as nossas vidas, vem guiar-nos, assinalar-nos por onde devemos andar…! Oxalá nos deixemos guiar pelas suas inspirações, por aquela esperança que nos transmite!

Jesus é o «Senhor» (cf. Lc 1,68.76), mas também é o «Salvador» (cf. Lc 1,69). Estas duas confissões (atribuições) que Zacarias faz a Deus, tão próximas da Noite de Natal, sempre me surpreenderam, porque são exatamente as mesmas que o Anjo do Senhor atribuirá a Jesus no anúncio aos pastores e que podemos escutar com emoção logo à noite na Missa da Meia Noite. É que quem nasce é Deus!

Reflexões de Frei Carlos Mesters, O.Carm

* O Cântico de Zacarias é um dos muitos cânticos e refrãos das comunidades dos primeiros cristãos, que até hoje estão espalhados pelos escritos do Novo Testamento: nos evangelhos (Lc 1,46-55; Lc 2,14; 2,29-32), nas cartas paulinas (1Cor 13,1-13; Ef 1,3-14; 2,14-18; Filp 2,6-11; Col 1,15-20) e no Apocalipse (1,7; 4,8; 11,17-18; 12,10-12; 15,3-4; 18,1 até 19,8). Estes cânticos nos dão uma ideia de como eram a vivência da fé e a liturgia semanal naqueles primeiros tempos. Eles deixam entrever uma liturgia que era, ao mesmo tempo, celebração do mistério, profissão de fé, animação da esperança e catequese.

* Aqui no Cântico de Zacarias, os membros daquelas primeiras comunidades, quase todos judeus, cantam a alegria de terem sido visitados pela bondade de Deus que, em Jesus, veio realizar as promessas. O Cântico tem uma estrutura bonita, bem elaborada. Parece uma lenta subida que leva os fiéis até o alto da montanha, de onde observam o caminho percorrido desde Abraão (Lc 1,68-73), experimentam o começo da realização das promessas (Lc 1,74-75) e de onde olham para frente prevendo o caminho a ser percorrido pelo menino João até o nascimento de Jesus, o Sol da justiça, que virá preparar para todos o caminho da Paz (Lc 76-79).

* Zacarias começa louvando a Deus por Ele ter visitado e redimido o seu povo (Lc 1,68) e ter realizado uma salvação poderosa na casa de Davi seu servo (Lc 1,69) conforme havia prometido pelos profetas (Lc 1,70). E ele descreve em que consiste esta salvação poderosa: na “libertação dos nossos inimigos e de todos que nos têm ódio” (Lc 1,71). Esta salvação é o resultado, não do esforço nosso, mas sim da bondade misericordiosa do pró­prio Deus que se lembrou da sua aliança sagrada e do juramento que tinha feito a Abraão, nosso pai (Lc 1,72). Deus é fiel. Este é o fundamento da nossa segurança.

* Em seguida, Zacarias descreve em que consiste o juramento de Deus a Abraão: é a esperança de “que, libertos dos inimigos, possamos viver sem medo, em santidade e justiça na presença de Deus, todos os dias da nossa vida”. Este era o grande desejo do povo daquele tempo e continua sendo o grande desejo de todos os povos de todos os tempos: viver em paz, sem medo, servindo a Deus e ao próximo, em santidade e justiça, todos os dias da nossa vida. Este é o alto da montanha, o ponto de chegada, que apareceu no horizonte com o nascimento de João (Lc 1,73-75).

* Agora, a atenção do cântico se dirige para João, o menino que acabou de nascer. Ele será o profeta do Altíssimo, pois irá à frente do Senhor para preparar-lhe o caminho e anunciar ao povo o conhecimento da salvação pelo perdão dos pecados (Lc 1,76-77). Aqui temos uma alusão clara à profecia messiânica de Jeremias que dizia: “Ninguém mais precisará ensinar seu próximo ou seu irmão, dizendo: "Procure conhecer a Javé". Porque todos, grandes e pequenos, me conhecerão, oráculo de Javé, pois vou perdoar suas culpas e não me lembrarei mais de seus pecados” (Jr 31,34). Na Bíblia, “conhecer” é sinônimo de “experimentar”. É o perdão e a reconciliação que nos fazem experimentar a presença de Deus.

* Tudo isso será fruto da ação misericordiosa do coração do nosso Deus e se realizará plenamente com a vinda de Jesus, o sol que virá do alto para iluminar todos que estão nas trevas e na sombra da morte e guiar nossos passos no caminho da Paz (Lc 1,78-79).

Para um confronto pessoal
1. Às vezes é bom ler o cântico como se fosse pela primeira vez para poder descobrir nele toda a novidade da Boa Nova de Deus.
2. Você já experimentou alguma vez a bondade de Deus? Você já experimentou alguma vez o perdão de Deus?